quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Bolsonaro pode ser preso? Conheça os 5 inquéritos que ameaçam o presidente

Se perder a eleição, os inquéritos criminais contra Bolsonaro saem das mãos do ministro Alexandre de Moraes e vão para um juiz de primeira instância, onde as decisões costumam ser mais céleres

Presidente Jair Bolsonaro. Foto: Dida Sampaio/Estadão

No último dia 16 de maio, o presidente Jair Bolsonaro expôs publicamente um temor que seus interlocutores mais diretos ouvem com frequência. A um grupo de empresários do setor de alimentos afirmou sem meias palavras: “Mais da metade do meu tempo eu me viro contra processos. Até já falam que eu vou ser preso… Por Deus que está no céu, eu nunca vou ser preso.”

Um mês depois, repetiu sua teoria para outro público. Desta vez, Bolsonaro comentava a condenação da ex-presidente da Bolívia Jeanine Áñez por atitudes antidemocráticas. “A turma dela perdeu, voltou a turma do Evo Morales. Agora foi confirmado dez anos de cadeia para ela. Qual a acusação? Atos antidemocráticos. Alguém faz alguma correlação com Alexandre de Moraes e os inquéritos por atos antidemocráticos? Ou seja, é uma ameaça para mim quando deixar o governo?”, afirmou.

E nesta semana, disse o mesmo numa conversa reservada com um ministro do Supremo. Bolsonaro justificava o porquê de atender a pressão do ministro Nunes Marques para nomear desembargadores para o Superior Tribunal de Justiça. Ele precisava de um aliado entre os magistrados para defendê-lo de uma eventual prisão.

O temor do presidente não é em vão. Atualmente, ele é alvo de cinco investigações no Supremo Tribunal Federal (STF). São elas: 1) tentativa de interferência na Polícia Federal; 2) espalhar notícias falsas sobre as urnas eletrônicas e o processo eleitoral; 3) ataque a instituições de forma organizada nas redes sociais; 4) vazar dados de investigação sigilosa da PF e 5) fazer ligação falsa entre a vacina da covid-19 e a AIDS.

Todas as apurações tramitam no gabinete do ministro Alexandre de Moraes, alvo constante de hostilidades do presidente.

O Estadão apurou que um dos inquéritos que mais preocupa Bolsonaro é o que aponta sua “atuação direta, voluntária e consciente”, segundo a Polícia Federal, na prática do crime de violação de sigilo funcional. O deputado Filipe Barros (PSL-PR) e o ajudante de ordens do presidente Mauro Cid também foram implicados.

Segundo a delegada Denisse Ribeiro, que presidiu a investigação, o deputado entregou ao presidente cópia de um inquérito sigiloso “a fim de municiá-lo na narrativa de que o sistema eleitoral brasileiro era vulnerável e permitiria fraudar as eleições”.

Embora a PF diga que o seu inquérito estava sob sigilo, a Procuradoria-Geral da República afirmou que não e pediu o arquivamento do caso. O ministro Alexandre de Moraes não atendeu ao Ministério Público Federal e mandou dar prosseguimento as investigações. A decisão gerou um cabo de guerra com a PGR. Nesta segunda-feira, 1,º, a vice-procuradora-geral da República Lindôra Araújo voltou a defender o arquivamento do caso, sustentando que o ministro “violou o sistema acusatório”.

Caso Bolsonaro seja reeleito, as investigações seguem sob responsabilidade do Supremo. Nesse contexto, eventual denúncia criminal contra ele só poderá ser oferecida pela Procuradoria-Geral da República, cargo atualmente ocupado pelo procurador Augusto Aras, a quem se atribui alinhamento ao Planalto. Aras exerce seu segundo mandato consecutivo, por escolha de Bolsonaro. Ele ainda fica no cargo mais um ano. Para oposicionistas, a permanência de Aras na cadeira número um do Ministério Público Federal garante blindagem de Bolsonaro.

No entanto, caso Bolsonaro saia derrotado das urnas, as investigações sobre suas condutas serão remetidas à primeira instância judicial, podendo tomar um ritmo de tramitação diferenciado, com rito mais célere. Neste caso, a blindagem de Bolsonaro se dilui. Em tese, qualquer promotor ou procurador poderá requerer uma eventual prisão de Bolsonaro, sem foro especial e sem a ‘proteção’ do guarda-chuva de Aras.

Ordens de prisão decretadas em meio a apurações podem ser de duas classes – temporária e preventiva (sem data para acabar). A primeira é determinada sob o argumento de cumprimento de diligências ou até para fazer cessar determinada conduta pelo investigado. A segunda é justificada sob alegação de ‘garantia da ordem pública’, ou para garantir o prosseguimento das investigações quando há ocultação de provas, ameaça a testemunhas e até risco de fuga do investigado. Já prisão decorrente de condenação hoje só é possível após o trânsito em julgado do processo, ou seja, após todos os recursos judiciais se esgotarem.

Um exemplo claro da mudança nos procedimentos quando a competência se desloca da corte máxima para o primeiro grau é o recente caso do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. Ele foi preso em junho na Operação Acesso Pago, por ordem do juiz Renato Borelli, da 15ª Vara Federal do DF após o Estadão revelar esquema de pagamento de propina em troca de liberação de verbas do ministério. O caso agora voltou ao Supremo e está sob sigilo, após a Procuradoria apontar suposta interferência de Bolsonaro nas apurações.

A suspeita da Procuradoria surgiu a partir de um telefonema de Milton Ribeiro para sua filha, em que o ex-ministro diz ter recebido ligação de Bolsonaro o alertando da investigação da Polícia Federal. Nesta ligação, segundo Milton, o presidente teria dito que teve um ‘pressentimento’ de que ele seria alvo de buscas da PF.

Presidente Jair Bolsonaro. (FOTO: ADRIANO MACHADO/REUTERS)

Confira detalhes de cada uma das apurações que miram Bolsonaro:

Ataques às urnas eletrônicas

Às vésperas da campanha que sua reeleição, Bolsonaro é investigado pela live realizada em julho de 2021, na qual o chefe do Executivo voltou a propagar notícias falsas e declarações infundadas sobre supostas fraudes no sistema eletrônico de votação, além de promover ameaças ao pleito deste ano.

O inquérito foi aberto por ordem do ministro Alexandre de Moraes a pedido do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Inicialmente a petição foi distribuída por prevenção ao inquérito das fake news. Em maio deste ano, Alexandre atendeu pedido da Procuradoria-Geral da República e determinou o apensamento do caso ao inquérito das milícias digitais.

No despacho de abertura do inquérito, o ministro do STF pontou que as condutas relatadas na notícia-crime do TSE configuram, em tese, os crimes de calúnia, difamação, injúria, incitação ao crime, apologia ao crime, associação criminosa e denunciação caluniosa. Além disso, Alexandre citou possível delito de ‘injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda’, além de três crimes previstos na Lei de Segurança Nacional.

Os mesmos ataques que motivaram a investigação criminal levaram à abertura de um inquérito administrativo no TSE. O procedimento apurar se, com a ofensiva de Bolsonaro contra as urnas, Bolsonaro praticou “abuso do poder econômico e político, uso indevido dos meios de comunicação, corrupção, fraude, condutas vedadas a agentes públicos e propaganda extemporânea”.

Milícias Digitais

A investigação mira a atuação coordenada de grupos na internet para divulgar notícias falsas e atacar opositores bolsonaristas e instituições democráticas. Depois que o inquérito das fake news esfriou no STF, a investigação se tornou a frente com maior potencial explosivo contra aliados do presidente.

A Polícia Federal já apontou a “atuação orquestrada” de apoiadores do governo para promover notícias falsas e ataques antidemocráticos, usando para isso até mesmo a estrutura do chamado “gabinete do ódio”.

Bolsonaro entrou na mira do inquérito das milícias digitais em fevereiro, após o ministro Alexandre de Moraes acolher pedido da Polícia Federal e autorizar o compartilhamento de provas do inquérito sobre o vazamento de uma investigação sigilosa com a apuração que mira a atuação de uma milícia digital contra a democracia.

Depois, em maio, o ministro do STF atendeu a Procuradoria-Geral da República e determinou que investigação sobre notícias falsas divulgadas por Bolsonaro sobre as urnas eletrônicas seja fosse incorporada ao inquérito.

m relatórios entregues ao STF, a Polícia Federal (PF) relacionou a investigação ao discurso do presidente na live em que ele lançou suspeitas infundadas sobre a segurança das urnas. A PF apontou “semelhança no modo de agir”, “aderência ao escopo descrito na hipótese criminal” e “atuação direta de Bolsonaro na promoção da ação de desinformação”.

Associação entre a vacina da covid-19 e a AIDS

A investigação se debruça sobre declarações dadas por Bolsonaro durante live feita em 21 de outubro, exatamente um dia após a leitura do relatório da CPI da Covid no Senado. O colegiado pediu o indiciamento por 11 crimes relacionados à conduta do chefe do Executivo no enfrentamento à pandemia.

Durante a transmissão ao vivo, o presidente citou uma notícia falsa sobre pessoas que tomaram as duas doses da vacina contra o novo coronavírus no Reino Unido e passaram a desenvolver o vírus aids. Cientistas do mundo todo desmentiram as declarações.

Em junho Alexandre atendeu um pedido da Polícia Federal e prorrogou as investigações por mais 60 dias. Os investigadores apontaram a necessidade de prosseguimento das apurações.

Uma das movimentações mais recente do inquérito foi o envio, pelo Google da íntegra da transmissão ao vivo em que o presidente divulgou, em outubro de 2021, a informação falsa sobre a vacina.

Vazamento de inquérito da Polícia Federal

A investigação também foi aberta com base em pedido do Tribunal Superior Eleitoral, em agosto de 2021. A Polícia Federal apurou se o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime ao divulgar o inquérito sigiloso da corporação sobre uma invasão ao sistema eleitoral ocorrida em 2018.

O inquérito tornado público pelo presidente nas redes sociais foi aberto dez dias após o segundo turno das eleições de 2018, sobre uma denúncia de invasão do sistema interno do TSE. A investigação foi solicitada pelo próprio tribunal. Desde então, nunca não foram encontrados indícios de que o ataque tenha afetado o resultado das eleições daquele ano.

Ao abrir a investigação sobre a conduta de Bolsonaro, Alexandre indicou que o objetivo do inquérito era apurar “notícias fraudulentas (fake news), falsas comunicações de crimes, denunciações caluniosas, ameaças e demais infrações”, que buscam atingir “a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal” e de seus membros, assim como de familiares dos magistrados.

Em fevereiro, a PF decidiu concluir o inquérito, mesmo sem colher o depoimento de Bolsonaro, que faltou a interrogatório. A corporação apontou ‘atuação direta, voluntária e consciente’ do presidente na prática do crime de violação de sigilo funcional, mas deixou de promover o indiciamento do chefe do Executivo em razão de seu foro por prerrogativa de função.

O crime de violação de sigilo também foi imputado ao deputado Filipe Barros. Quem não saiu ileso foi o tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, homem da confiança de Bolsonaro, que acabou indiciado uma vez que, “na condição de funcionário público, revelou conteúdo de inquérito policial que deveria permanecer em segredo até o fim das diligências, ao qual teve acesso em razão do cargo de Chefe Militar da Ajudância de Ordem da Presidência da República”.

A Procuradoria-Geral da República contrariou a conclusão da Polícia Federal e pediu arquivamento do inquérito contra Bolsonaro, alegando que o material divulgado pelo chefe do Executivo não estava protegido por sigilo.

Após a manifestação, Alexandre não acolheu de imediato o parecer do Ministério Público Federal, determinando que a PF realizasse ‘relatório minucioso’ de análise de materiais colhidos em quebra de sigilo telemático – ou seja, de emails – no âmbito do inquérito. Segundo Alexandre, o documento é ‘essencial para a completa análise’ dos elementos de prova pela Procuradoria-Geral da República.

Nesta segunda-feira, 1º, a vice-procuradora-geral da República Lindôra Araújo reforçou o pedido de arquivamento da investigação alegando que o ministro Alexandre de Moraes ‘violou o sistema acusatório’ ao determinar a realização do relatório citado. Lindôra sustenta que, ao determinar que a PF realizasse nova diligência, Alexandre ‘adentrou nas funções precípuas e exclusivas do Ministério Público, o que é vedado pelo sistema constitucional brasileiro’.

Interferência na PF

A investigação mais antiga sobre o chefe do Executivo é a que apura tentativa de interferência política na Polícia Federal. O inquérito foi aberto na esteira da renúncia do ex-juiz Sérgio Moro – atual candidato ao Senado pelo Paraná – do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em abril de 2020. Tal investigação ganhou fôlego após a divulgação da controversa reunião ministerial do dia 22 de abril daquele ano.

No entanto, em março passado, a Polícia Federal informou ao Supremo que, ‘dentro dos limites da investigação’, não há elementos mínimos para indiciar o chefe do Executivo na esfera penal. O caso agora aguarda parecer da Procuradoria-Geral da República.

Pepita Ortega e Weslley Galzo / O Estado de S. Paulo, em 03.08.22

terça-feira, 2 de agosto de 2022

Quem é Mara Gabrilli, indicada como vice de Simone Tebet

Senadora pelo PSDB de São Paulo foi a primeira secretária da Pessoa com Deficiência da capital paulista; também foi vereadora e deputada federal

A senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) foi secretária da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida, vereadora de São Paulo e deputada federal por dois mandatos consecutivos.  (Foto: Paulo Giandalia)

A senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) foi a indicada pela federação entre PSDB e Cidadania para concorrer à vice-presidência da República na chapa de Simone Tebet (MDB). O anúncio formal da composição da chapa foi feito na manhã desta terça-feira, 2.

Nascida em São Paulo em 1967, Mara começou a carreira política em 2004, quando disputou as eleições municipais para o cargo de vereadora. Não alcançou a quantidade de votos necessária para se eleger, mas ficou na lista de suplentes.

Em 2005, na gestão de José Serra (PSDB) na Prefeitura, Mara propôs a criação de uma secretaria municipal para pessoas com deficiência e mobilidade reduzida. O então prefeito acatou a proposta e criou a pasta, que foi a primeira no País a ser voltada para a área. A então suplente da Câmara Municipal foi nomeada secretária, cargo que ocupou em 2005 e 2006. 

Nas eleições proporcionais de 2006, alguns vereadores do município de São Paulo foram eleitos deputados federais e estaduais, deixando lacunas na Câmara Municipal. Mara, que era suplente, tomou posse para cumprir os dois últimos anos de mandato. Foi reeleita em 2008 e ficou na Casa até 2011, quando tomou posse como deputada federal, após disputar o cargo no pleito de 2010.

No Congresso, seu trabalho de maior destaque foi a relatoria da Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que modernizou a legislatura brasileira e ampliou direitos para as pessoas com deficiência. O texto, que entrou em vigor em 2016, estabeleceu mudanças em relação aos direitos civis dessa população: pessoas com deficiência intelectual, por exemplo, passaram a ter garantido em lei o direito ao voto e a ser votado, ao casamento e a ter filhos, entre outros, sem a necessidade de uma decisão judicial para isso

“A principal inovação se dá na mudança do conceito de deficiência, que agora não é mais entendida como uma condição estática e biológica da pessoa, mas sim como o resultado da interação das barreiras impostas pelo meio com as limitações de natureza física, mental, intelectual e sensorial do indivíduo”, afirma a senadora.

“Nesse sentido, uma pessoa que tenha uma tetraplegia, como eu, mas que tenha condições financeiras de ter um cuidador e para trabalhar, pode ser considerada com menos deficiência do que alguém com uma deficiência menos severa, mas que more em uma comunidade e não consiga sair de casa por falta de acessibilidade, por exemplo”, completa.

Mara sofreu um acidente de carro em agosto de 1994, e desde então não tem mobilidade do pescoço para baixo. Em 1997, fundou o Instituto Mara Gabrilli, uma ONG para fomentar pesquisas científicas destinadas à cura de paralisias e atuar no desenvolvimento social de pessoas com deficiência em situação de vulnerabilidade.

Em 2018, foi eleita senadora por São Paulo com 6,5 milhões de votos. No mesmo ano, tornou-se a primeira brasileira a integrar o Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU).

Agora, na metade de seu mandato no Senado, Mara teve seu nome anunciado como vice de Simone nesta terça-feira, no diretório tucano de São Paulo, com a presença da emedebista e dos presidentes dos três partidos envolvidos na aliança: Baleia Rossi, do MDB; Bruno Araújo, do PSDB; e Roberto Freire, do Cidadania.

Durante o anúncio de seu nome como vice na chapa presidencial, nesta terça-feira, Mara retomou um tema recorrente em suas falas: o assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel (PT), em 2002, quando o pai dela tinha uma empresa de ônibus na cidade. “Eu vivi dentro de casa meu pai sendo extorquido pelo PT com uma arma na cabeça” disse a senadora.

Pesquisas qualitativas feitas pela campanha do MDB mostraram que uma chapa com duas mulheres seria um diferencial. Além do MDB, o PSTU lançou duas mulheres: Vera Lúcia, candidata a presidente, e a líder indígena Kunã Yoporã, como vice. Já a chapa do PCB é encabeçada pela economista Sofia Manzano, que terá o jornalista Antonio Alves como candidato a vice.

A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) também era cotada para a vaga, mas os tucanos não abriram mão de indicar um nome da legenda, já que, pela primeira vez desde a criação do partido, o PSDB não terá candidato próprio na disputa pelo Palácio do Planalto. O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que era considerado como primeira opção, declinou do convite. Ele também confirmou presença no anúncio da vice.

Davi Medeiros / O Estado de S. Paulo, em 02.08.22

Tebet defende ‘revogaço’ de decretos sobre armas e firma compromisso com empresários por inovação

Candidata do MDB pretende, em um eventual governo, recriar o Ministério da Segurança Pública e reforçar o monitoramento de fronteiras

Simone Tebet em debate do grupo Derrubando Muros nesta terça-feira, 2. Foto: Reprodução/Derrubando Muros

Em reunião com o grupo Derrubando Muros nesta terça-feira, 2, a candidata à Presidência pelo MDB, Simone Tebet (MDB), defendeu um “revogaço” dos decretos do governo Bolsonaro que flexibilizaram o acesso às armas no Brasil. Ela também se comprometeu com propostas do grupo nas áreas de inovação, ciência, tecnologia e desenvolvimento sustentável se for eleita.

“A maior parte das drogas e armas não é fabricada pelos grandes centros, elas vêm do meu Estado (o Mato Grosso do Sul), vêm das fronteiras. E já adianto que a gente tem falado em um ‘revogaço’ dos decretos do presidente sobre armas”, disse Simone. “O pior é o que permite tirar a possibilidade de rastrear as munições. Vários decretos do presidente estão suspensos na raça pela bancada feminina do Senado Federal.”

Simone Tebet em debate do grupo Derrubando Muros nesta terça-feira, 2. Foto: Reprodução/Derrubando Muros

Simone também afirmou que, em um eventual governo, pretende recriar o Ministério da Segurança Pública, reforçar o monitoramento de fronteiras e investir em serviços de informação das polícias, além da melhoria do sistema carcerário. “Para os detentos não saírem piores do que entraram.”

Definição de vice

No dia em que confirmou como sua candidata a vice a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), Simone Tebet reforçou que não cogita desistir da corrida pelo Planalto e disse que aposta em crescimento nas pesquisas eleitorais nos dois meses que antecedem o primeiro turno.

“Caiu muito bem essa chapa, não por ser 100% feminina, mas por ser inclusiva com Mara Gabrilli. Eu tinha tudo para não estar aqui. Muitos (pré-candidatos) foram caindo, uns porque tinham seus interesses e outros talvez por não conhecer o jogo político. De alguma forma, sobramos eu e o PSDB”, disse.

Com críticas e elogios aos governos do PT, Simone também criticou o “salto alto” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT à Presidência, e o comparou com o ex-presidente argentino Juan Domingo Perón pela suposta tentativa de se “perpetuar na política”. Sobre Bolsonaro, voltou a falar em retrocesso e afirmou que “não há chances” de o presidente ser reeleito.

“Eu me apresento como a candidata do centro democrático. Eu tenho convicção de que nós temos condições de chegar no segundo turno e de ganhar as eleições”, afirmou a senadora.

Economia verde, ciência e tecnologia

Provocada pelos integrantes do Derrubando Muros sobre investimentos e desenvolvimento sustentável, Simone Tebet reafirmou que defende o “agronegócio parceiro do meio ambiente” e listou uma série de propostas de sua chapa na área para atrair investimentos internacionais ao País.

“Eu falo em desmatamento ilegal zero. Os órgãos de segurança têm de ir para dentro do nosso Cerrado, das nossas florestas, para combater o desmatamento ilegal”, observou. A candidata também citou um prejuízo de R$ 60 bilhões para os produtores do agronegócio de Estados do Sul e do Centro Oeste, em apenas dois anos, devido a períodos de seca agravados pelas mudanças climáticas.

Ela destacou ainda a intenção de revalorizar o Ministério da Ciência e Tecnologia e de incentivar a permanência de talentos no Brasil. “A gente não tem hoje jovens preparados e nem uma política do governo federal que transforme o Ministério da Ciência e Tecnologia em uma casa parceira.”

Um documento do Derrubando Muros intitulado ‘Uma agenda inadiável para mudar o Brasil’, elaborado por mais de 30 especialistas em políticas públicas, foi entregue à equipe de Simone Tebet. Outros candidatos à Presidência também foram convidados pelo grupo para debates, ainda sem datas confirmadas.

O Derrubando Muros é um grupo apartidário formado por, entre outros, ativistas, cientistas, comunicadores, acadêmicos e empresários. O grupo reúne especialistas como Ana Toni, diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade; Fersen Lambranho, empreendedor; Horácio Lafer Piva, economista e empresário; Joana Monteiro, doutora em economia, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança da FGV; Luíz Barroso, engenheiro especializado em energia, diretor-presidente da PSR Consultoria; Pedro Hallal, epidemiologista e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas, entre outros.

Bibiana Borba e Giordanna Neves / O Estado de S. Paulo, em 02.08.22

segunda-feira, 1 de agosto de 2022

Tebet busca apoio do Podemos e estuda outros vices do PSDB

MDB aprovou coligação com abertura para mais siglas aderirem à senadora

Tebet busca apoio do Podemos e estuda outros vices do PSDBA senadora Simone Tebet, pré-candidata à presidência pelo MDB, prefere composição de chapa com Tasso para vice Agência O Globo

Candidata do MDB ao Palácio do Planalto, a senadora Simone Tebet (MS) negocia apoio do Podemos à sua chapa presidencial. Na última quinta-feira, em aceno à sigla chefiada por Renata Abreu (SP), a Executiva do MDB aprovou a coligação com PSDB e Cidadania, deixando em aberto a possibilidade de mais partidos se somarem à campanha da parlamentar. O movimento intensificou um flerte que já vinha ocorrendo.

Como mostrou a colunista do GLOBO Bela Megale, o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) chegou a ser cotado para a vaga de vice de Tebet caso as conversas com o PSDB não avançassem. A costura política é considerada difícil por interlocutores dos dois partidos. Nas últimas semanas, porém, o presidente nacional do MDB, Baleia Rossi, manteve conversas com Renata Abreu, que pede como contrapartida o apoio da legenda à candidatura do senador Alvaro Dias no Paraná. Lá, no entanto, o diretório emedebista apoia a reeleição de Ratinho Jr (PSD), que deve ter Sergio Moro (União Brasil) em sua chapa ao Senado.

Além de mais um apoio, a campanha de Tebet corre contra o tempo para definir quem ocupará a vaga de vice. Por enquanto, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) desponta como preferido de dirigentes de ambos os partidos.

Mas, segundo aliados da senadora, Tasso vem resistindo a aceitar a função. Entre os motivos estão o desejo por mais domínio sobre a campanha da colega de Senado, sobretudo na área de comunicação e marketing, e um investimento financeiro maior na campanha. Pesaria ainda o apelo da família para que ele se aposentasse da política.

Na esteira de uma possível recusa de Tasso, um dos nomes que passaram a ser ventilados para ocupar o posto foi o da senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA). A cúpula emedebista, porém, prefere uma indicação tucana para a vaga. A avaliação é que a ausência do PSDB na composição poderia reforçar o discurso de que o apoio da sigla a Simone não vai sair do papel — tese levantada por parlamentares como o deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG).

Entre os nomes tucanos cobiçados por pessoas próximas à senadora está o da ex-prefeita de Caruaru (PE) Raquel Lyra. Pré-candidata ao governo de Pernambuco, ela não tem demonstrado interesse em abandonar a disputa estadual. A campanha de Tebet, no entanto, avalia que uma chapa exclusivamente feminina tem potencial de atrair a atenção do eleitorado.

Também é citado o nome do ex-senador José Aníbal, opção parecida com Tasso.

Bianca Gomes, Gustavo Schmitt e Eduardo Gonçalves, de São Paulo para O Globo, em 31.07.22


A rejeição feminina a Bolsonaro

É provável que ela seja fruto menos de suas ofensas e mais de seu desgoverno, que prejudicou a vida de mulheres responsáveis pelo bem-estar familiar num ambiente de privação

Todas as pesquisas eleitorais apontam que o índice de rejeição a Jair Bolsonaro é expressivamente maior entre mulheres do que entre homens. À primeira vista, o dado pode suscitar uma conclusão óbvia e, por isso mesmo, incompleta. Seria uma resposta a um presidente que não perde a chance de proferir piadas machistas ou reproduzir discursos misóginos. Essa atitude de Bolsonaro, no entanto, precede a vitória que o presidente obteve no pleito de 2018 – e, se essa visão fosse majoritária, ele jamais teria se sagrado vencedor da disputa em um país em que as mulheres são maioria.

Poucos são os que exploram com profundidade as razões por trás dessa avaliação tão negativa. Um deles foi o cientista político Felipe Nunes, diretor do instituto de pesquisas Quaest. Em entrevista à jornalista Thaís Oyama, do UOL, ele sugeriu que a resposta pode estar no papel central que as mulheres têm no gerenciamento doméstico e na relevância que o eleitorado feminino dá a políticas públicas.

Pagar contas, fazer compras e administrar um lar não é uma atribuição exclusiva das mulheres, mas é inegável que a divisão de tarefas entre a maioria dos casais não é equilibrada, algo que transcende a questão da renda. Portanto, é sobre as mulheres, sobretudo as mães, que recai a responsabilidade de lidar com um orçamento doméstico apertado ante a alta dos preços, de administrar a escassez quando o desemprego afeta a família e de recorrer a serviços públicos de qualidade duvidosa para cuidar da saúde e da educação dos filhos.

É certo que isso ajuda a explicar o fracasso das tentativas de aproximação que Bolsonaro faz com esse público. Há poucos dias, num almoço com cerca de 50 empresárias em São Paulo, o presidente disse que em seu governo as mulheres “praticamente conseguiram quase tudo que queriam”. Diante de um público previamente selecionado composto por simpatizantes, Bolsonaro foi aplaudido, mas certamente não seria se ali estivessem algumas das inúmeras mulheres anônimas que têm escassa ajuda para enfrentar o desafio de cuidar da família num cenário de carestia e de serviços públicos precários.

É incerto que essas eleitoras rejeitem Bolsonaro porque o presidente faz declarações consideradas ofensivas às mulheres; afinal, Bolsonaro venceu a eleição de 2018 com expressiva votação feminina, inclusive entre as mais pobres, mesmo demonstrando pouco respeito pelas mulheres. O mais provável é que a robusta rejeição feminina a Bolsonaro no momento seja resultado de seu desgoverno, que prejudicou diretamente a vida de mulheres responsáveis pelo bem-estar familiar num ambiente de privação. 

Bolsonaro, hoje, não tem como vender às mulheres o sonho de um futuro melhor, como faz o petista Lula da Silva, porque foi incapaz de resolver as questões do presente. Nesse sentido, é irrelevante fazer um inventário das leis e políticas públicas aprovadas pelo presidente, como fez a primeira-dama Michelle Bolsonaro no lançamento da candidatura do marido, a título de provar a preocupação dele com as mulheres. Pouco importa se foram 46 iniciativas, como apontou uma reportagem do Estadão, ou 70, como disse a primeira-dama. Nenhuma delas teve impacto significativo na vida das mulheres.

Para piorar, Bolsonaro estragou o que de fato tinha relevância para as mulheres pobres: o programa de transferência forçada de renda. Ao desejar ardentemente capturar para si o maior ativo eleitoral do PT, o Bolsa Família, o presidente destruiu o espírito do programa, que era o foco em quem mais precisava do dinheiro. Agora, o programa bolsonarista, chamado de Auxílio Brasil, em vez de priorizar as mães que são chefes de família e que têm mais filhos pequenos, paga o mesmo valor a todos, inclusive homens que vivem sozinhos. Além disso, em vez de aumentar o benefício pago a mulheres pobres que chefiam famílias, ele optou por privilegiar categorias em que a presença feminina é absolutamente minoritária, como caminhoneiros e taxistas.

Bolsonaro está coberto de razão quando afirma que as eleitoras estão à procura de um presidente, não de um casamento. Ser presidente requer governar. Mais que uma questão ideológica ou mera antipatia, a rejeição feminina expressa a disfuncionalidade de seu governo e seu fracasso como presidente.

Editorial / Notas&Informações, O Estado de S.Paulo, em 01.08.22

O medo da derrota de quem tem apego ao poder

Jair Bolsonaro dá a sensação de que nasceu no tempo errado da História; se dependesse de si, permaneceria no poder eternamente

Se as instituições democráticas estivessem funcionando perfeitamente mesmo, tendo Collor sofrido impeachment em 1992 pelo Fiat Elba e Dilma, em 2016, pelas pedaladas fiscais, Bolsonaro já deveria igualmente ter sido retirado do poder. Começando pelo negacionismo sanitário, que implicou milhares de mortes, que ele deveria ter evitado durante a pandemia.

Pela atitude de afirmar em público que não cumpriria decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), pela corrupção abundante. Manipula dados e espalha ao mundo desinformação envenenadora de mentes, para instabilizar nossa democracia, o que repetiu em reunião com embaixadores de diversos países.

Tem quase 150 pedidos de impeachment acumulados – nenhum avança, pois o aliado Lira, ícone do Centrão, com slogan de campanha “Arthur Lira é foda”, blinda o presidente. Mesmo que o povo vá às ruas, que Dalai Lama ou papa Francisco apelem ou até mesmo que Lira receba mensagem psicografada de Gandhi ou da Madre Tereza, será em vão! Quem manda é Lira e tudo está condenado a mofar na poderosa gaveta do presidente da Câmara.

O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, reconduzido ao cargo pelo presidente, mesmo fora da lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República, é tido como omisso, descumpridor da missão de defesa da ordem jurídica e do regime democrático. É importante a lista tríplice constitucional em nível federal, como há nos Estados, para que o Ministério Público Federal credencie três nomes. Hoje o fiscalizado escolhe a dedo e nomeia o próprio fiscal (PGR).

Bolsonaro dá a sensação de que nasceu no tempo errado da História, pois, se dependesse de si, permaneceria no poder eternamente, como o rei francês Luís 14, o Rei Sol (“o Estado sou eu”). Desde o primeiro dia do mandato, dedica-se à reeleição. Apresenta-se como o salvador da Pátria e acaba de convocar o povo às ruas em tom apelativo messiânico, para 7 de setembro, destilando ódio contra o STF, tendo ao lado ex-presidiários por corrupção e um ex-presidente cassado.

Disse que só Deus poderia tirá-lo da Presidência, como se não existissem povo, democracia ou Constituição. Despreza a nova Carta aos Brasileiros, que, 45 anos depois, renasce bela pela democracia e será lida nas Arcadas do Largo de São Francisco em 11 de agosto. Assinada por pessoas de todos os segmentos, corre rápido para 1 milhão de assinaturas.

É preocupante lermos, a dois meses das eleições, a pesquisa do Poder Data que acaba de ser divulgada: para 41% dos brasileiros ouvidos, a democracia por aqui vai mal ou muito mal. Para 33%, vai mais ou menos. Muito bem, 21%. Feita entre 17 e 19 de julho, ouviu 3 mil pessoas em 309 municípios de todas as unidades da Federação.

Números oportunos para reflexão, após esta tosca reunião do presidente com os embaixadores em Brasília, na qual mais uma vez o presidente repetiu inverdades sem comprovação acerca do sistema de urnas eletrônicas utilizado no Brasil desde 1996 e apontado pela comunidade internacional como referência. Por temer a derrota, pode querer seguir o roteiro de Trump, que, conforme apurado em investigações oficiais, articulou a invasão do Capitólio, após ser derrotado nas urnas.

Afirmar, como tem feito, que desrespeitará as decisões do STF, além de hostilizar diariamente jornalistas e estimular seus seguidores a vir às ruas para gritar tiranicamente em defesa do fechamento do STF e do Congresso, contribui decisivamente para os números ruins detectados pelo Poder Data. Sem esquecer o homicídio de Foz do Iguaçu, fruto de sua disseminação permanente do ódio e do armamentismo.

Exatamente em razão de tal contexto, o cientista político de Harvard Steven Levitsky, um dos autores da obra Como as Democracias Morrem, em entrevista ao Estadão, externou preocupação com o risco de autogolpe por Bolsonaro, cuja atitude lembra a de Erdogan, Orbán, Putin e outros tiranos.

Com apresentação estruturada de forma amadora, que chamou a atenção pela quantidade gigante de erros grotescos de tradução para o inglês, Bolsonaro omitiu aos embaixadores que o uso das urnas eletrônicas foi deliberado pelo Congresso. Assim como sonegou a análise do Tribunal de Contas da União (TCU) da total confiabilidade do sistema, que é utilizado em mais de 40 nações e que deu a Bolsonaro seis mandatos de deputado federal e um de presidente, sem contestação.

Ficou claro para o mundo que, mesmo defendendo a tese esdrúxula e inconstitucional da apuração paralela pelas Forças Armadas, estas não quiseram comparecer à mal-intencionada reunião. A enxurrada de reações de instituições e entidades à atitude do presidente foi inversamente proporcional a seus bons propósitos.

Sem qualquer pudor em relação a limites de gastos públicos, especialmente em período eleitoral, em tempos de candidaturas legislativas sem qualquer exigência de afinidade com programas partidários e surreal elogio ao nepotismo como modelo de política pública, vivemos hoje uma orgia do vale-tudo do poder.

A Constituição é remendada via PEC PIX e as leis se liquefazem para acomodar os interesses de ocasião, sob a trilha sonora do orçamento secreto. Que se respeite, ao menos, a soberana vontade do povo nas urnas eletrônicas – fórmula brasileira designadora da nossa democracia legal eleitoral. E que as escolhas que serão feitas possam nos trazer alguma esperança.

Roberto Livianu, o autor deste artigo, é Procurador de Justiça, Doutor em Direito Pela USP, Escritor, Professor, Palestrante e idealizador e Presidente Do Instituto 'Não Aceito Corrupção'. Publicado originalmente n'O Estado de S. Paulo, em 01.08.22

MDB do RS decide apoiar Eduardo Leite e destrava acordo com PSDB nacional

    Em convenção neste domingo, 31, o MDB do Rio Grande do Sul decidiu         apoiar o indicativo da direção nacional do partido e abrir mão da                     candidatura local em prol de Eduardo Leite (PSDB). 

Eduardo Leite ( Foto: Eduardo Beleske)

Dessa forma, o então candidato Gabriel Souza vai ocupar a vaga de vice na chapa de Leite.

A votação foi apertada, 239 votos a favor da aliança com o PSDB ante 212 votos contrários.

Com a oficialização do MDB gaúcho, PSDB e MDB voltam a negociar a vice de Simone Tebet (MDB) no plano nacional, com a possibilidade de os tucanos indicarem o nome que vai compor a chapa da candidata. O nome preferido dela no PSDB é o de Tasso Jereissatti mas ele indicou a correligionários que prefere não ser candidato, o que pode levar a sigla a indicar ou José Aníbal ou Mara Gabrilli, ambos do PSDB de São Paulo.

Coluna do Estadão / O Estado de S. Paulo, em 01.08.22

Somente 1 em cada 4 deputados tem atuação boa ou ótima, diz pesquisa

Desempenho é medido pela plataforma Legisla Brasil, com base em 17 índices; fiscalização e controle derrubam média


Deputados em dia de trabalho

A qualidade da atuação parlamentar virou desafio na Câmara dos Deputados em uma gestão marcada pelo aumento do controle sobre o Orçamento por parte de integrantes do Congresso. Apesar de muitos deputados irem bem em indicadores como produção legislativa, menos de um quarto deles tiveram desempenho geral considerado bom ou ótimo nesta legislatura.

A maioria deles deixa a desejar em atos de fiscalização e controle, o que joga a média da Casa para baixo e mostra que a atuação não deve se restringir à elaboração de leis. O desempenho é medido pela plataforma Legisla Brasil, por meio de um índice a ser lançado hoje.

A ferramenta calcula a qualidade do trabalho dos deputados a partir de 17 indicadores distribuídos nos eixos de produção legislativa, atos de fiscalização e controle, iniciativas de mobilização e alinhamento partidário. O estudo aponta que parlamentares governistas pontuam melhor em indicadores que medem o número de relatorias e de cargos ocupados. Já a oposição atua bem na fiscalização e na convocação de audiências públicas – dos cem deputados que mais pediram requerimentos de informação ao Executivo, por exemplo, apenas seis dão sustentação ao governo.

Base e oposição se dividem na incidência e mobilização interna e externa no Congresso. O indicador mede a capacidade de articulação dos deputados e sua relação com líderes. Partidos como União Brasil, Republicanos, PSDB, PP, PL e PSD têm maior pontuação em número de cargos ocupados, enquanto legendas de oposição lançam mão de projetos com status de tramitação especial.

Critérios

As notas são distribuídas de zero a dez, e aplicadas em faixas que vão de uma a cinco estrelas. Cerca de 42% dos parlamentares não ultrapassam duas estrelas, desempenho considerado fraco; 35% tiveram atuação regular e 16% alcançaram quatro estrelas. A análise considera todos os deputados que assumiram cargos na Câmara, mesmo que temporariamente, entre janeiro de 2019 e julho de 2022.

Apenas 41 quadros alcançaram nota superior a 5,3 – equivalente a cinco estrelas. Destes, 15 são petistas e seis compõem a bancada do PSB. Três são do PCdoB, mesma quantidade de representantes do PDT e do PSOL na lista. União Brasil, Republicanos, Cidadania, Novo e PL aparecem com dois quadros cada. O PTB tem um representante.

Entrega

Segundo a economista Olivia Carneiro, uma das criadoras da ferramenta, o índice mede a entrega do parlamentar, e não sua atuação ideológica. “Existem vários tipos de caminhos que podem seguir e ir bem: tem o mais fiscalizador, o mais propositivo, tem o que negocia mais, e eles podem desempenhar bem cada um na sua esfera”, afirmou.

Um dos achados do índice é que o partido e o tempo de Casa não são definidores da performance, disse Luciana Elmais, cofundadora do Legisla. “Quando você vê quais são os parlamentares cinco estrelas, tem gente que está lá há muitos mandatos e tem gente que está no primeiro. Isso quebra vários estereótipos.”

Gustavo Queiroz / O Estado de S. Paulo, em 01.08.22

Procuradores buscam candidatos ao Planalto para defender lista tríplice na escolha de PGR

Entidade de integrantes do MPF quer diálogo com candidatos, tem dificuldade para se aproximar de Bolsonaro e só recebeu sinalização positiva de Simone Tebet

O presidente da ANPR, Ubiratan Cazetta, afirma que tem procurado os presidenciáveis para tratar de temas de interesse do Ministério Público.  Foto: Divulgação/Associação Nacional dos Procuradores da República

Para tentar evitar futuras indicações à Procuradoria-Geral da República com base em critérios políticos, como ocorreu com Augusto Aras, integrantes do Ministério Público Federal vão entregar um documento em defesa da lista tríplice aos candidatos ao Palácio do Planalto. Preocupados, procuradores abriram diálogo especialmente com aliados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder nas pesquisas de intenção de voto.

O petista tem se esquivado de dizer se resgatará, caso eleito, uma tradição a que ele mesmo deu início, no primeiro mandato, de indicar um nome votado pela carreira. A lista para PGR não está prevista em lei e a escolha é uma prerrogativa do presidente, mas, desde os anos 2000, a Associação Nacional dos Procuradores da República realiza eleições e entrega aos chefes do Executivo os três nomes mais bem colocados na disputa no MPF.

Em junho de 2021, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a indicação de Augusto Aras para um mandato de mais dois anos no comando da procuradoria-geral da República.

Em junho de 2021, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a indicação de Augusto Aras para um mandato de mais dois anos no comando da procuradoria-geral da República. Foto: Dida Sampaio / Estadão

O documento será levado aos candidatos em meio ao segundo mandato de Aras, que foi escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) sem integrar a lista da entidade. Integrantes do MPF fazem críticas, reservadas e abertas, ao que chamam de alinhamento do PGR com o atual governo.

O presidente da ANPR, Ubiratan Cazetta, afirma que tem procurado os presidenciáveis para tratar de temas de interesse do Ministério Público. Segundo ele, um dos principais assuntos é a lista tríplice, que, na sua avaliação, torna a escolha mais transparente. “Com ela, não tem candidaturas tiradas do peito ou do bolso do paletó”, diz o procurador.

De acordo com Cazetta, os três mais bem votados “são pessoas cujas histórias de carreira passam a ser avaliadas por um número grande de membros” do MPF. Após a indicação do presidente, cabe ao Senado a realização da sabatina e a aprovação do indicado.

Neste momento, os procuradores estão abordando todos os candidatos à Presidência. Até agora, apenas a senadora Simone Tebet (MDB) disse que vai escolher um dos nomes da lista da ANPR. Com Ciro Gomes (PDT), a reunião foi adiada em razão de um desencontro de agendas.

Bolsonaro também deve ser procurado, mas os integrantes do MPF enfrentam dificuldades para identificar um interlocutor. Sob reserva, eles dizem que a conversa será dura, posto que o presidente ignorou a lista por duas vezes.

Tratativas

Sobre Lula e entorno, as investidas se intensificaram mais recentemente, porém, desde 2021, a diretoria da APNR já dialoga com o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP), o ex-presidente do PT Rui Falcão e o ex-ministro Eugênio Aragão, que defende a legenda durante a eleição. Dos três nomes, procuradores afirmam ao Estadão que Falcão foi o mais receptivo ao respeito da lista tríplice.

Já Aragão, que foi subprocurador-geral da República, é o mais refratário ao rito da ANPR. O ex-ministro da Justiça de Dilma Rousseff (PT) era próximo do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, mas a amizade acabou em meio à Operação Lava Jato. Petistas reclamam da atuação de Janot à frente da PGR, quando o partido foi alvo de inquérito por envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras.

Investigado, condenado e preso, mas solto por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) de reverter o cumprimento da pena após a segunda instância e de anular suas sentenças por erros processuais, Lula não descartou, segundo apurou o Estadão, a lista como critério de escolha, mas pode deixar de indicar o primeiro colocado. O ex-presidente Michel Temer (MDB), por exemplo, escolheu Raquel Dodge, segunda colocada. Pessoas próximas dizem que o petista tem adiado o debate para evitar o assunto na campanha eleitoral.

Luiz Vassallo e Pedro Venceslau / O Estado de S. Paulo, em 01.08.22

domingo, 31 de julho de 2022

Estamos cegos?

Raras vezes houve traficância política tão espúria no Congresso Nacional, em detrimento de um Brasil viável no futuro

Estamos cegos? Plenário da Câmara vota a PEC Eleitoral (Cristiano Mariz/Agência O Globo)

Existe um ponto cego natural no campo de visão de todo ser humano. Mesmo para quem é dotado de visão perfeita, enxerga atrevidamente bem de longe e perto e nunca terá necessidade de usar óculos. Esse ponto cego tem nome — mancha de Mariotte, em homenagem ao físico francês que o descobriu quatro séculos atrás. Nunca nos impediu de tocar a vida. Aliás, podemos ignorar a existência dessa minúscula área da retina de cada olho desprovida de receptores de luz. Isso porque as duas manchas monoculares não se sobrepõem, e nossa visão binocular compensa esse defeito de fábrica que, não fosse assim, nos impediria de ver em toda a amplitude aquilo que olhamos.

O caso do Brasil atual é inverso. A mancha da cegueira nacional não é inata nem pequena. É como se toda a terra, águas, ar e vida nacional estivessem desprovidos de receptores de luz. Uma cegueira que nos impede de reagir àquilo que desfila a nossa frente e que olhamos com os dois olhos bem abertos: a destruição a marretadas de leis, instituições, Estado de Direito, civilidade em sociedade. Ou, pelo menos, assim pareceu ao longo desta semana particularmente sombria. Raras vezes houve traficância política tão espúria no Congresso Nacional, em detrimento de um Brasil viável no futuro. Nesse quesito, igualam-se em cinismo, demagogia e hipocrisia os bolsonaristas e oposicionistas que votaram (469 votos a 17) a favor da PEC de estelionato eleitoral, embrulhada em papel de presente social. Na verdade, não se igualam. Os primeiros foram mais explícitos, não precisavam esconder seu interesse pessoal, os segundos se mostraram mais covardes. Como escreveu Hélio Schwartsman na Folha de S.Paulo no artigo “Falso dilema”, “paro um pouco antes de concluir que, com uma oposição dessas, o Brasil merece mesmo ser governado por Jair Bolsonaro e seus comparsas”.

Além da opção nacional por não querer ver, marchamos rumo ao precipício empunhando um apagão cívico que, a cada ciclo eleitoral, se torna menos desculpável. Segundo dados elaborados pelo Instituto Quaest a pedido do RenovaBR, só 15% dos eleitores brasileiros lembram em quem votaram para o Congresso na eleição de 2018! E, mesmo assim, se consideram no direito de reclamar: mais de 65% dos entrevistados se declararam insatisfeitos com a atuação dos congressistas. Não espanta que mais da metade (55%) admita não saber para que serve um deputado, justo quando a gula de poder no Congresso atinge níveis e$catológicos. Faltam 77 dias para que os 156,4 milhões de brasileiros aptos a votar façam suas escolhas — se é que chegaremos lá em condição de pensar num futuro decente.

Nos 100 anos de sigilo que o bolsonarismo tenta impor à memória nacional, não pode caber também o pretendido apagão da cultura, da educação cívica, ambiental, científica e sexual brasileiras. Como explicar a vida e o Brasil de hoje ao adulto de amanhã que veio ao mundo num hospital público enquanto a mãe era violentada por um anestesista/estuprador em série? Como, no futuro, explicar o Brasil de 2022 ao bebê de 1 mês e à sua irmã de 6 anos que na semana passada perderam o pai, assassinado por gostar de ser petista? O que fará no Brasil de amanhã a menina loirinha de menos de 2 anos com a foto em que aparece como coadjuvante da felicidade familiar, junto a um bolo de aniversário em formato de revólver calibre 38? Sairá atirando na democracia como o avô, tios e pai? Ou terá a chance de conviver com outras gentes?

Está tudo em aberto. Não só aqui, no mundo todo.

Trinta e cinco anos atrás, o historiador americano Arthur M. Schlesinger Jr., um dos conselheiros mais próximos do ouvido de John Kennedy, debruçou-se sobre a despedida do século em que vivia. “Os dois maiores vilões pereceram — o fascismo com um estrondo, o comunismo com um gemido”, escreveu. Acrescentou que o triunfalismo do mundo democrático obscureceu a precariedade dessa vitória. “Se, no século XXI, o sistema falhar na construção de um mundo mais humano, próspero e pacífico, como falhou no século XX, estará lançado o convite para a emergência de credos alternativos assemelhados ao fascismo e ao comunismo”, avisou. Acertou só pela metade — justamente a que nos toca.

Dorrit Harazim, a autora deste artigo, é jornalista e documentarista. Publicado originalmente n'O Globo, em 17.07.22

Bolsonaro é considerado tóxico até por aliados

Quando o partido do ministro da Casa Civil entra na Justiça para impedir que seus candidatos sejam identificados com Bolsonaro, tem-se a exata noção do tamanho da rejeição a ele

É notório o esforço do presidente Jair Bolsonaro em difundir desconfiança contra as urnas eletrônicas e as pesquisas de opinião. O objetivo é transmitir a mensagem de que teria um grande apoio popular, muito maior do que o registrado nas urnas e aquele medido pelos institutos de pesquisa. Afinal, a fantasia bolsonarista inclui alçar Jair Bolsonaro à categoria de líder de uma maioria silenciosa, que estaria incondicionalmente a seu lado.

A farsa só convence quem quiser ser convencido por ela. Jair Bolsonaro teve 57,8 milhões de votos no segundo turno das eleições de 2018, mas seu desgoverno foi capaz de produzir uma altíssima taxa de rejeição, além de ser o presidente da República candidato à reeleição mais mal avaliado desde a redemocratização. Segundo a última enquete realizada pelo Datafolha, 53% dos brasileiros afirmam que não votam em Jair Bolsonaro de jeito nenhum. Vê-se logo por que o bolsonarismo tem verdadeira ojeriza a pesquisas de opinião – afinal, estas retratam uma realidade que esse movimento fanático teima em negar.

Bolsonaristas podem continuar acreditando que seu líder é querido e admirado pela maioria do povo. Mas a farsa recebeu agora um novo capítulo, especialmente vexaminoso, a escancarar a desconexão do discurso do bolsonarismo com a realidade. Segundo informou o Estadão, os principais aliados políticos de Jair Bolsonaro, cientes do caráter tóxico da presença do presidente em suas campanhas, querem escondê-lo de sua comunicação com o eleitor.

Eis a realidade da rejeição do bolsonarismo por parte da população. Até o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), e o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (Progressistas-PI), vêm escondendo o presidente Jair Bolsonaro das campanhas próprias e de seus aliados no Nordeste.

Na convenção do PL que definiu Jair Bolsonaro como candidato à reeleição, Arthur Lira vestiu a camisa “Bolsonaro 22”. No entanto, isso era só para satisfazer a patota bolsonarista. Na hora de se comunicar com o eleitorado em Alagoas, o presidente da Câmara – justamente uma das pessoas que mais se beneficiam do orçamento secreto e das relações com o Palácio do Planalto – quer mostrar independência. Em vez de “Bolsonaro 22”, os marqueteiros de Arthur Lira almejam outra mensagem: a do tocador de obras independente e padrinho direto dos recursos para o Estado. Para piorar, Arthur Lira apoia para o governo de Alagoas o senador licenciado Rodrigo Cunha (União Brasil), que é contrário a Jair Bolsonaro.

Houve também o inusitado pedido do diretório estadual do Progressistas no Piauí, controlado por Ciro Nogueira, para que o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) proibisse a circulação de imagens de seus candidatos ao lado do presidente. Na ação, o partido do ministro-chefe da Casa Civil – a quem Jair Bolsonaro deu nada mais nada menos do que as chaves do Orçamento Federal – afirma que o presidente da República “possui altíssimo índice de rejeição em pesquisas mais recentes” e que o material que circula no WhatsApp de seus candidatos ao lado de Bolsonaro é fake news. Segundo o Progressistas, diante da alta impopularidade do presidente, eles serão prejudicados se aparecerem vinculados a Jair Bolsonaro.

O TRE do Piauí negou o pedido do Progressistas. “Está claramente nos limites da liberdade de expressão e comunicação”, disse a sentença, prolatada em junho deste ano. Certamente, é muito importante que o eleitor saiba, na hora de definir o seu voto, quem tem dado apoio e sustentação a Jair Bolsonaro.

As eleições são território de falsas promessas e de crescente desinformação. Mas elas também revelam muitas coisas. O processo eleitoral tem uma nota de realismo. Políticos sabem quem tem potencial de voto e quem horroriza o eleitor. Ao longo desses três anos e meio – sua primeira função na esfera do Executivo –, Jair Bolsonaro construiu e consolidou sua reputação de governante despreparado, irresponsável, conflituoso e que não é afeito ao trabalho. A alta rejeição não é fruto do acaso, mas simples consequência de seus atos.

Editorial / Notas&Informações, O Estado de S.Paulo, em 31.07.22

sábado, 30 de julho de 2022

Equipe econômica da campanha de Tebet ganha reforço de Edmar Bacha

 Ele já presidiu o BNDES, o IBGE e foi um dos criadores do Plano Real.

 Edmar BachaEdmar Bacha e Simone Tebet Ag. O Globo

Legitimada pela na última quarta-feira pela convenção do MDB, a campanha de Simone Tebet começou a recrutar novos quadros para reforçar os planos da presidenciável. Sobretudo no desenvolvimento do plano de governo. A convite de Elena Landau, cérebro econômico da candidatura, Edmar Bacha se juntou à equipe e vai cuidar da área de macroeconomia. Ele já presidiu o BNDES, o IBGE e foi um dos criadores do Plano Real.

João Paulo Saconi / Coluna de Lauro Jardim / O Globo, em 30.07.22

Ex-membros da gestão Doria trabalharão em programa de governo de Tebet

Rossieli Soares e João Gabbardo contribuirão nas áreas de educação e saúde, respectivamente


Senadora Simone Tebet, candidata à Presidência da República (MDB, PSDB, Cidadania)

O ex-ministro Rossieli Soares (PSDB) e o ex-prefeito de Porto Alegre José Fogaça (MDB) trabalharão na parte de educação do programa da senadora Simone Tebet (MDB).

O médico João Gabbardo, secretário-executivo do Ministério da Saúde durante a pandemia, colaborará com o programa em sua área.

Soares ocupou o cargo de secretário de Educação do governo de São Paulo durante a gestão João Doria (PSDB) até abril, quando deixou o posto para lançar candidatura a deputado federal. Na gestão, trabalhou com Gabbardo, que foi coordenador-executivo do Comitê Científico do estado.

Publicado originalmente no Painel da Folha de S. Paulo, em 30.07.22

Primeiros candidatos registrados no TSE declaram ter em casa R$ 5,6 milhões em dinheiro

Até a sexta-feira, 757 políticos tinham nome inscrito no tribunal; juntos, eles têm um patrimônio de R$ 668,5 milhões

Os primeiros políticos que pediram registro de candidatura ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) declararam, juntos, ter mais de R$ 5,6 milhões em dinheiro em espécie, em moeda nacional e estrangeira, guardados em casa. Dos 757 candidatos registrados até esta sexta-feira, 29, na Corte, 78 disseram ter quantias em dinheiro vivo. Desses, 28 têm ao menos R$ 50 mil em cédulas.

O resultado ainda parcial do registro de candidaturas mostra que o patrimônio desses políticos é de R$ 668,5 milhões em bens, entre imóveis, automóveis, aeronaves e participação em empresas.

A informação sobre os bens é feita por meio de autodeclaração e a Justiça Eleitoral não submete o patrimônio apresentado por candidatos à averiguação. Em alguns casos, porém, o Ministério Público Eleitoral pode entender que há prejuízo à interpretação do eleitor sobre o candidato e oferecer denúncia por falsidade ideológica.

Não é considerado crime deixar cédulas guardadas em casa. Altas quantias, porém, costumam gerar dúvidas sobre a origem dos recursos.

Na lista dos que inauguraram o registro de candidatura neste ano, o que apresentou o maior patrimônio em espécie foi o vereador do Rio de Janeiro Luciano Vieira (PL), que tentará uma vaga de deputado federal: R$ 1 milhão. Quando se elegeu para a Câmara Municipal, em 2020, declarou R$ 770,2 mil, no somatório de todas as posses. Agora, os bens declarados pelo vereador somam R$ 7,6 milhões. Um aumento de cerca de dez vezes em apenas dois anos. Ele não foi localizado ontem.

Em segundo lugar, aparece o candidato a deputado federal Elio Lacerda (Patriota-MG), com R$ 511 mil em dinheiro declarados. Depois dele, Sargento Hamilton (Patriota-MG), postulante à Assembleia Legislativa, com R$ 400 mil em espécie. Os montantes em espécie declarados variam de R$ 1 milhão a R$ 40. O candidato que declarou ter R$ 40 é o advogado Edney Duarte Jr. (Novo), que pretende concorrer a um assento na Assembleia paulista. Também postulante ao cargo de deputada estadual pelo Novo em São Paulo, Carol da Banca disse ao TSE ter R$ 200 em espécie.

Nas eleições de 2018, 2.540 candidatos declararam, somados, R$ 313 milhões em espécie, de um total de R$ 24,2 bilhões em bens. Pela primeira vez, em razão da Lei Geral da Proteção de Dados (LGPD), os bens declarados, como imóveis e carros, passaram a não ser detalhados pelo TSE. A base de dados permite apenas uma consulta genérica, sem qualquer referência a endereços e modelos, por exemplo.

O deputado Helio Lopes (PL-RJ) disse, na eleição de quatro anos atrás, não ter nada em seu nome. Desta vez, declarou à Justiça dois terrenos de R$ 18 mil cada. Já Altineu Côrtes (PL-RJ), líder do partido na Câmara, disse ter perdido patrimônio de uma eleição para outra. Os R$ 3,9 milhões em bens passaram a ser R$ 1,2 milhão. O deputado Carlos Jordy (PL-RJ), candidato à reeleição, declarou R$ 122 mil, ante R$ 102 apresentados em 2018.

Vinícius Valfré para o Estado de S. Paulo, em 30.07.22

‘Arma de fogo pode garantir liberdade no futuro’, diz Bolsonaro

Presidente voltou a defender armamento da população durante convenção que oficializou o deputado Major Vitor Hugo como candidato ao governo de Goiás

O presidente Jair Bolsonaro posa em estande de tiro do Comando da PF 

Em nova defesa do armamento da população, o presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou nesta sexta-feira, 29, que as armas podem garantir a “liberdade” no futuro. “Arma de fogo é a garantia que o cidadão pode dar à sua família e, quem sabe, garantir sua liberdade no futuro”, disse.

Bolsonaro discursou na convenção do PL de Goiás, que oficializou o deputado federal Major Vitor Hugo (PL) candidato ao governo local. Ele foi líder do governo Bolsonaro na Câmara de 2019 a 2020.

A convenção do PL aconteceu no Clube Jaó, em Goiânia. A vaga de vice de Vitor Hugo ainda não foi definida e Wilder Morais (PL) é o candidato ao Senado, em chapa pura. Morais foi senador de 2012 a 2019, após assumir o cargo de Demóstenes Torres, cassado por favorecimento ao bicheiro Carlinhos Cachoeira.

A chapa bolsonarista tem o apoio do senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), filiado ao PSD de Gilberto Kassab. No plano nacional, o PSD deve liberar suas bancadas no primeiro turno.

Antes de chegar à convenção do PL goiano, Bolsonaro participou de “motociata” com apoiadores. Ele foi recebido no ato político ao som do jingle “Capitão do Povo”, da dupla Mateus e Cristiano, e tirou fotos com apoiadores.

No discurso, Bolsonaro voltou a resgatar a facada que sofreu na campanha de 2018. “Me acusam de violência política, mas quem sofreu facada fui eu”, afirmou. “No nosso governo, apareceram falsas denúncias de corrupção. Se aparecer algo concreto, ajudamos a apurar”, acrescentou, sem citar escândalos como a prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro por suposta corrupção passiva no gabinete paralelo montado na pasta e revelado pelo Estadão.

O presidente ainda disse que ele e Vitor Hugo, se eleitos, teriam afinidades. “O outro lado quer destruir valores familiares, liberar as drogas no Brasil”, declarou Bolsonaro ao ressaltar o lado conservador do aliado.

Eduardo Gayer para o Estado de S. Paulo, em 29.07.22

Bolsonaro é blefe ou ameaça séria?

Podemos ser arrastados para um desastre, mas não por desatenção ou por grave erro de avaliação, como aconteceu na Alemanha.

Hitler e seus militares,

É voz corrente que Jair Bolsonaro tenta aliciar uma parte dos militares e das polícias estaduais para um golpe de Estado, mas desatinar é uma coisa, levar o desatino à prática é outra.

Tal desvario é levado a sério por muitas pessoas lúcidas, e antes isso, pois, como sabemos, “o preço da liberdade é a eterna vigilância”. Comparar o Brasil de hoje com a Alemanha da primeira metade do século passado não faz muito sentido, mas vale a pena registrar que a revista Foreign Affairs, numa recente edição retrospectiva, mostrou que vários jornalistas de primeira grandeza ainda se recusavam a crer que Hitler fosse mesmo levar suas alucinações à prática quando seu regime totalitário já estava praticamente implantado. No final de 1944, cerca de 100 mil opositores do nacional-socialismo, entre os quais comunistas, social-democratas e liberais, além de judeus e homossexuais, começavam a ser amontoados em campos de concentração. A pseudociência da “eugenia” começava a ser posta em prática mediante assassinatos e castração de indivíduos pertencentes a “raças inferiores”, como os ciganos. Contudo, em que pese aquele monstruoso precedente, não creio que Bolsonaro ponha em prática suas elucubrações golpistas, ou que permaneça sequer um mês no poder, caso o faça.

Embora mais vitriólico que a média dos populistas, ele é isto: um simples populista. Como todos dessa categoria, ele ostenta uma mescla de traços contraditórios. De um lado, um certo senso de realidade, que lhe permite espertamente atingir posições de poder; do outro, um apego a mitos, blefes e bravatas, que cedo ou tarde leva seus anseios à bancarrota. O que não ostentam, porque dele carecem, é ânimo para governar com seriedade. Todos nos lembramos de Jânio Quadros. Eleito presidente em 1960, ele renunciou oito meses depois acreditando no mito por ele mesmo criado de que “forças ocultas” o estariam impedindo de governar. Imaginou que o povo o carregaria nos ombros de volta ao palácio. Ficou a ver navios. Bolsonaro está cumprindo um roteiro semelhante. Se perder, como é provável, vai esgrimir a asnice da fraude eleitoral, sua versão das “forças ocultas” de Jânio Quadros.

O que não podemos é subestimar o estrago que políticos desse tipo podem causar ao País. Embora pessoalmente eu não creia que Bolsonaro vá muito longe, ou que consiga se manter na Presidência se de fato recorrer ao golpe, não podemos descartar a possibilidade de suas manias arrastarem o País para um buraco. Daí a conveniência de ponderarmos algumas das forças em tese capazes de protagonizar ações relevantes, de apoio ou resistência ao golpe anunciado. Refiro-me, em especial, (1) aos partidos políticos, (2) ao Congresso Nacional e (3) à opinião pública, incluindo nesta última a imprensa, instituições da chamada “sociedade civil” e, no limite, manifestações de massa.

Os partidos políticos podem ser descartados, pela singela razão de que já não os temos. Sabemos todos que nossa estrutura partidária praticamente se liquefez na eleição de 2018. Naquele ano, 24 siglas conseguiram acesso à Câmara federal, a maior delas detendo cerca de 15% das cadeiras – cifras suficientes para assegurarmos por larga margem o título de campeão mundial da fragmentação partidária, que, aliás, nos pertence há muito tempo. Mas a fragmentação é apenas uma parte da história. Ferreamente controladas por oligarquias, tais organizações não se renovam, não desenvolvem perfis programáticos e, não por acaso, carecem por completo de confiabilidade.

Precisamente porque nossos partidos são o que são, o Congresso é um desconexo aglomerado de especialistas em trocas clientelistas de apoio por cargos no Executivo. Trocam qualquer coisa por qualquer coisa, como vimos poucas semanas atrás, quando o Senado, quase por unanimidade – ficando o senador José Serra como uma solitária exceção –, atropelou as mais comezinhas regras do jogo eleitoral a fim de turbinar com R$ 41 bilhões a campanha do sr. Bolsonaro. Quem quiser mapear a atual anatomia do Legislativo, forçosamente terá de começar pela entidade que o domina, o Centrão. Se Jair Bolsonaro tivesse êxito em seu propalado intento de golpear o regime democrático, ele faria exatamente o que já vem fazendo, ou seja, delegará a essa pitorescamente denominada figura a tarefa de acomodar seus acólitos na máquina do Estado e de mandar a fatura aos contribuintes.

Contudo, errará por larga margem quem supuser que Bolsonaro ou qualquer outro interessado em solapar as instituições atingirá seu objetivo nadando de braçadas. Salta aos olhos que a sociedade está despertando do estado abúlico em que afundou desde os tempos da sra. Dilma Rousseff, senão antes. Entidades importantes como a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e a Academia Paulista de Letras já começaram a soar o alerta. Muitas outras logo seguirão pelo mesmo caminho. Ou seja, podemos ser arrastados para um desastre, mas não por desatenção ou por algum grave erro de avaliação, como aconteceu na Alemanha.

Bolívar Lamounier, o autor deste artigo, é cientista político, sócio-diretor da Augurium Consultoria e membro das Academias Paulista de Letras e Brasileira de Ciências, Bolívar Lamounier escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto d'O Estado de S. Paulo. Publicado originalmente, em 30.07.22

Para 73% dos eleitores, há corrupção no governo Bolsonaro

Pesquisa Datafolha mostra que índice é maior entre jovens (86%) e entre quem reprova a gestão do presidente (94%).

Pesquisa Datafolha divulgada nesta sexta-feira (29/07) mostra que 73% dos entrevistados acreditam que há corrupção no governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) - 19% responderam que não há corrupção, e 8% não souberam responder. A corrupção, no entanto, é apontada como o maior problema do Brasil por apenas 3% dos eleitores.

Em levantamento do Instituto Datafolha divulgado há dois meses, 70% disseram que havia atos de corrupção no governo, 23% que não e 7% não souberam responder.

De acordo com a pesquisa, o índice de pessoas que acreditam haver corrupção é maior entre os jovens (86%) e entre quem reprova o governo Bolsonaro (94%).

Por outro lado, entre os eleitores do presidente, 49% dizem que não há corrupção. Entre os que aprovam a gestão do presidente, 51% acreditam não haver atos corruptos.

A pesquisa também questionou os eleitores sobre qual o maior problema do Brasil: 20% responderam que é a saúde. Em seguida vem economia (13%), desemprego (10%), fome e miséria (10%), inflação (9%), educação (9%) e violência urbana (6%).

A pesquisa ouviu 2.566 eleitores de 183 municípios brasileiros nesta quarta e quinta-feira. A margem de erro é de dois pontos para mais ou para menos.

Intenções de votos

Na quinta-feira, o Datafolha divulgou levantamento sobre a corrida ao Planalto. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aparece com 47% das intenções de votos nas eleições de outubro, 18 pontos à frente do presidente Jair Bolsonaro (PL), que tem 29%.

Em relação à pesquisa Datafolha anterior, publicada em 23 de junho, Bolsonaro subiu um ponto, e Lula permaneceu com o mesmo percentual.

Em terceiro lugar, aparece o ex-governador de Ceará Ciro Gomes (PDT), com 8%, mesmo patamar da pesquisa anterior. Simone Tebet (MDB) tem 2%, e André Janones (Avante), Pablo Marçal (Pros) e Vera Lúcia (PSTU) aparecem com 1% cada. Votos em branco e nulos somam 6% e não sabem/não opinaram, 3%.

A pesquisa foi a primeira após o lançamento oficial das principais candidaturas e também a primeira após o Congresso aprovar um grande pacote de auxílios sociais, que ainda parece não ter se refletido positivamente para Bolsonaro.

Considerando apenas os votos válidos - que excluem brancos/nulos - Lula aparece com 52%, e poderia já vencer no primeiro turno. Bolsonaro registra 32% dos válidos. O terceiro colocado, Ciro Gomes, aparece com 9%.

Em um eventual segundo turno, Lula venceria com 55% dos votos, contra 35% de Bolsonaro. Entre os entrevistados, 7% disseram que não votariam em nenhum dos dois candidatos, e 2% se mostraram indecisos. No levantamento anterior, de junho, Lula venceria por 57% a 34%.

Em um cenário entre Lula e Ciro, o ex-presidente venceria por 52% a 33%, com 14% de votos nulos ou brancos e 2% de indecisos. 

Em uma disputa com Bolsonaro, Ciro venceria com 51% dos votos contra 38% do atual presidente. Brancos e nulos somariam 10% e indecisos, 2%.

Rejeição de Bolsonaro

Segundo o Datafolha, 53% dos eleitores não votariam de forma alguma em Bolsonaro - de longe a maior rejeição entre todos os candidatos. Lula registra 36% de rejeição, e Ciro Gomes (PDT), 25%.

O atual presidente também voltou a registrar maus índices de aprovação do seu governo. Em outra pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira, 45% dos entrevistados reprovaram o governo. Segundo o instituto, esse é o pior desempenho de um candidato à reeleição a esta altura do mandato desde que a possibilidade de um segundo mandato consecutivo no Executivo foi criada, em 1997. Apenas 28% dos brasileiros aprovam o governo Bolsonaro.

Publicado originalmente por Deutsche Welle Brasil, em 30.07.22 (https://www.dw.com/pt-br/para-73-dos-eleitores-h%C3%A1-corrup%C3%A7%C3%A3o-no-governo-bolsonaro/a-62655008)

sexta-feira, 29 de julho de 2022

A ‘fé no taco’ petista arruinou o País

Lula afirma que o teto de gastos só se impõe a governos sem credibilidade. Fato: a âncora fiscal se tornou um imperativo justamente porque petistas destruíram credibilidade do governo

Em recente entrevista ao portal UOL, Lula da Silva (PT) disse o seguinte: “Quando você faz uma lei de teto de gastos é porque você é irresponsável, porque você não confia em você, não confia no seu taco”. O candidato acrescentou que, caso seja eleito, não precisará governar com um teto de gastos porque a âncora fiscal só faz sentido, em sua visão, quando o governo “não tem credibilidade para garantir estabilidade e previsibilidade” aos agentes econômicos. Lula tem razão.

De fato, um presidente responsável e imbuído de espírito público até pode prescindir de um controle mais rigoroso dos gastos públicos, pois conhece muito bem os efeitos perversos da gastança desenfreada sobre a população, sobretudo os mais vulneráveis. O que Lula, malandramente, escondeu do distinto público é que o teto de gastos só foi instituído pela Emenda Constitucional (EC) 95, durante o governo de Michel Temer, porque sua cria, Dilma Rousseff, feriu de morte a racionalidade na elaboração do Orçamento da União e corroeu a confiança no governo.

O resultado desse voluntarismo petista é tristemente conhecido pelos brasileiros: a pior recessão econômica de toda a série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), iniciada em 1948. Até hoje, a conta desse descalabro é paga pelos contribuintes.

Na entrevista, Lula tentou enganar a população ao difundir a falácia de que a “Faria Lima”, aludindo ao centro financeiro da capital paulista, teria “obrigado” o governo Temer a criar o teto de gastos. Ora, para começar, a EC 95 foi uma construção coletiva do Palácio do Planalto e do Congresso, fruto do entendimento entre os dois Poderes e após ampla discussão na sociedade de que algo havia de ser feito para reorganizar as finanças públicas, destroçadas pela política econômica de Dilma. Ao fim e ao cabo, o teto de gastos se impôs justamente para que a credibilidade do governo federal, corroída pela ex-presidente, fosse restabelecida.

Tanto pior é o fato de que Lula, hoje o candidato mais bem posicionado nas pesquisas de intenção de voto, tem anunciado previamente que será, ele também, um irresponsável. É disso que se trata. O petista tenta ludibriar os eleitores sobre a motivação original para a criação do teto de gastos e, como consequência desse embuste, promete governar por mágica, como se dinheiro brotasse do chão a seu comando e em respeito a seus desejos. Se assim for, sua vitória tem tudo para ser uma reprise do desastre de 2014-2016.

Ao dizer que “não precisará” do teto de gastos para governar, Lula se mostra disposto, assim como Dilma, a dilapidar o Tesouro em nome de seu projeto de poder. É tudo o que o País, definitivamente, não precisa após a ruína das contas públicas decorrentes da irresponsabilidade populista dos governos petistas e, nos últimos três anos e meio, do presidente Jair Bolsonaro, ele mesmo um dos algozes do teto de gastos. Nesse ponto, Lula e Bolsonaro podem dar as mãos.

Ao fim e ao cabo, discutir a pertinência do teto de gastos significa falar sobre a qualidade da democracia representativa que queremos para o Brasil. O Orçamento da União é – ou ao menos deveria ser – o retrato mais bem acabado da concertação nacional em torno das prioridades na alocação dos recursos públicos, que são finitos. Há de ter, pois, espírito público e muita responsabilidade na sua elaboração e na sua execução. Um país, como um lar, não tem condições de dar qualidade de vida para seus habitantes quando as contas estão em desarranjo, quando gasta mais do que ganha.

Seja qual for seu matiz partidário ou ideológico, para que um governo possa implementar políticas públicas sustentáveis, das quais depende o bem-estar de milhões de brasileiros, é preciso antes de tudo haver dinheiro. Boas políticas públicas exigem responsabilidade fiscal. A forma mais segura e democrática de viabilizar essas políticas é negociar bem a alocação dos recursos orçamentários. A outra, bem mais fácil, é criar uma peça de ficção orçamentária e ver no que dá. O País já conhece o final dessa história.

Editorial / Notas&Informações, O Estado de S.Paulo, 29.07.22


Estamos esperando o quê?

Há muitas pessoas que detêm o poder político e o econômico no nosso país que não assumem sua responsabilidade como elite.

Nossas elites menosprezam a cara da revolta. Aparentam não ter olhos para ver os sinais de agravamento da miséria e do esgarçamento do tecido social e político do País. Será que o Brasil precisa aumentar mais a desigualdade, deteriorar ainda mais as condições ambientais e ameaçar mais e mais a democracia para que a insatisfação se torne visível?

Parte significativa da nossa elite, em sua insensibilidade e ignorância, não vê a potencialidade destruidora de uma força social descontrolada, desorganizada e crescente, dos que já não têm mais nada a perder e que poderão passar a agir no tudo ou nada. Pessoas invisibilizadas, discriminadas e desesperançadas são capazes de explodir como uma horda desenfreada, pronta para ultrapassar todo tipo de barreira e quaisquer limites.

A contagem regressiva se acelera com o aprofundamento do fosso que separa brasileiros pela cor da pele, pela região, condição social, orientação sexual, opção religiosa, por preferências políticas e tendências ideológicas. Nessas clivagens segregacionistas, viver ou morrer tende a ser indiferente para os que têm a vida relegada a níveis sub-humanos; e os efeitos desse tipo de apatia são devastadores.

O mundo dito civilizado caminha para o mundo da barbárie. Sinais disso são que o nazifascismo está voltando, a guerra assombra o mundo mais uma vez, intensificam-se as crises migratórias, energéticas e alimentícias e a cultura do Velho-Oeste estadunidense se infiltra nas sociedades. No Brasil, a propagação do ódio, a discriminação dos contrários, o cultivo do medo, a disseminação de notícias falsas, a demonização dos meios de comunicação e a destruição de reputações esterilizam o livre debate de ideias, que é o único caminho para a construção de soluções compartilhadas e duradouras.

O nosso país está dividido em dois blocos preocupantemente assimétricos: um pequeno, dos que têm acesso; e um gigante, dos que não o têm. E a pior desigualdade é a impossibilidade de acesso, que resulta na carência de meios para a realização individual e coletiva e na desumanização do viver. A educação, que é condição indispensável para o viver bem e para a ascensão social, não produzirá seus efeitos benéficos enquanto a escola pública brasileira não atingir padrão semelhante ao das escolas privadas; com isso, as discrepâncias continuarão sufocando aqueles que não têm acesso.

Os brasileiros não precisam de esmola nem deveriam ser tratados como fracos, inferiores e incapazes, como historicamente tem sido. A fraqueza, a inferioridade e a incapacidade nascem dos preconceitos dos poucos que, ao longo da nossa história, vêm tendo acesso às benesses civilizatórias, e se acomodaram no falso conforto da indiferença. A gravidade dessa deformação é tão destruidora que pioramos continuamente as diferenças entre os privilegiados e os apartados.

A bem da verdade, há muitas pessoas que detêm os poderes político e econômico no nosso país que não assumem sua responsabilidade como elite. Fazem com que as coisas públicas sejam confundidas com coisas que não têm dono. Esse desrespeito com o que é comum está na base do bloqueio ao acesso dos que não têm o suficiente para morar, se locomover, se comunicar, comer, se divertir, cuidar da saúde, se vestir e se educar dignamente.

Diante deste cenário de desarranjos e de injustiças, e considerando as eleições presidenciais que se aproximam, é evidente que a governabilidade do País não estará inteiramente nas mãos nem do ex-presidente Lula nem do atual presidente Bolsonaro, os dois candidatos que lideram todas as pesquisas de preferências realizadas até agora.

Quem acredita que Lula vitorioso conseguirá governar adequadamente tendo os bolsonaristas desencadeando ações agressivas, instigadas pelo perdedor? Ou, ao contrário, quem acredita que, se Bolsonaro ganhar, a crise nacional, nos campos político, econômico e social, não se agravará ainda mais?

Quem desconsidera o fato de parte da população estar sendo estimulada a se armar e a reagir àquilo de que discorda? Quem acredita que centenas de milhares de pessoas fanatizadas e armadas poderão ser controladas em eventuais desatinos?

Como fica a imagem do País, quando o presidente da República, perante o mundo, ataca sem provas nosso sistema eleitoral, o mesmo que o elegeu, e tenta desmerecer as autoridades constitucionalmente responsáveis por este sistema reconhecido internacionalmente por sua excelência e confiabilidade?

Como poderá desenvolver-se um país sendo repudiado pela comunidade internacional? O que acontecerá ao Brasil, se formos submetidos a boicotes?

O desmatamento da Amazônia, por exemplo, é algo tão grave quanto a desconstrução da democracia. O respeito pelo meio ambiente e os processos políticos de diálogo são valores perseguidos pelas pessoas que em todo o mundo defendem o crescimento humanizado e a convivência harmoniosa.

Compete a nós, integrantes das elites brasileiras, assim como a toda a sociedade, opormo-nos de forma clara aos ataques à democracia para fortalecer a ordem pública nacional e o Estado de Direito constitucional, saindo da passividade e da contemplação para agirmos com efetividade nos nossos ambientes de influência.

Amarílio Macêdo, o autor deste artigo, é empresário, CEO da holding do Grupo J. Macedo e Conselheiro do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial / IEDI. Publicado originalmente n'O Estado de S. Paulo, em 29.07.22.

Inaceitável chantagem

Bolsonaristas tentam coagir Justiça Eleitoral com ameaça de tumulto caso as exigências do presidente não sejam atendidas. Ora, se Bolsonaro não aceita as regras do jogo, não o dispute

O Estadão informou que o governo de Jair Bolsonaro realiza uma operação de bastidores para tentar convencer o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a adotar propostas do Ministério da Defesa sobre as urnas eletrônicas nas eleições de outubro. Segundo fontes do governo, essa negociação tem o objetivo de evitar reações violentas de bolsonaristas no 7 de Setembro e no dia das eleições. Nessas tratativas, há a indicação de que o acatamento das propostas por parte da Justiça Eleitoral seria também um modo de acalmar o próprio presidente Jair Bolsonaro, evitando que ele adote alguma atitude de incentivo a distúrbios e outras confusões.

Essa negociação é um completo disparate, rigorosamente inconstitucional. Em primeiro lugar, o Poder Executivo não tem nenhuma competência sobre as atribuições da Justiça Eleitoral a respeito das eleições. Toda pressão do governo federal para que o TSE faça mudanças nos procedimentos relativos às urnas é exercício abusivo da função pública.

Em segundo lugar, as sugestões do Ministério da Defesa, feitas no âmbito de um órgão consultivo da Justiça Eleitoral, são apenas isto: sugestões. O TSE não tem nenhuma obrigação de aceitar, tampouco de oferecer contrapartidas. Não existe, não pode existir, uma “negociação” entre Ministério da Defesa (ou outro órgão da administração federal) e Justiça Eleitoral, pelo simples e cristalino motivo de que o Ministério da Defesa (ou outro órgão da administração federal) não tem competência sobre as eleições.

Junto com outras entidades, o Ministério da Defesa foi convidado a oferecer sugestões sobre o processo eleitoral. Não lhe foi atribuída nenhuma competência adicional, como se pudesse interferir nas decisões da Justiça Eleitoral ou fazer barganhas públicas sobre as eleições.

Como se não bastasse essa atuação fora dos trilhos institucionais, há uma agravante muito séria nessa pretensão de interferir às vésperas das eleições no processo eleitoral: a chantagem. Quando o presidente e seu entorno sugerem que não têm como controlar a reação de seus apoiadores caso as propostas do Ministério da Defesa não sejam adotadas, configura-se inaceitável tentativa de coagir a Justiça Eleitoral.

Ora, não deveria ser necessário recordar que o respeito às leis e às normas eleitorais deve ser incondicional. Se Bolsonaro não aceita as regras do jogo nem reconhece a autoridade do árbitro, deve retirar-se da disputa. Insinuar que pode haver violência se Bolsonaro não puder ditar o regulamento das eleições beira o gangsterismo. Não é assim que funciona no Estado Democrático de Direito.

É preciso dizer, no entanto, que o presidente não se daria por satisfeito mesmo que todas as exigências bolsonaristas fossem atendidas, porque não lhe interessa o processo eleitoral, mas apenas o resultado da eleição: a esta altura já está claro que Bolsonaro não aceitará outro desfecho que não seja sua vitória.

Além disso, a chantagem sobre a Justiça Eleitoral é uma incrível inversão de responsabilidades. Desde a redemocratização, as eleições no País têm sido pacíficas. Mesmo nas mais ferrenhas disputas, nunca houve nada que se assemelhasse minimamente à confusão que vem sendo insinuada por bolsonaristas, a respeito de uma possível “convulsão social”, com participação de grupos armados. Se hoje há o risco de eventos violentos no 7 de Setembro ou no dia das eleições, isso é consequência direta do comportamento de Jair Bolsonaro, que não faz nenhum esforço para desestimular a violência. Ao contrário: o presidente estimula o tumulto com suas dúvidas sobre o processo de votação e suas invectivas contra a Justiça Eleitoral. 

Que a lei seja rigorosamente aplicada sobre todos os arruaceiros das eleições. A paz social e a ordem pública na campanha eleitoral e no dia do pleito são temas muito sérios. Não são moedas de troca. Assim como todos os que desejam se candidatar nas próximas eleições, o presidente Jair Bolsonaro tem o dever de promover a paz. Se não o faz, coloca-se à margem das regras do jogo, com consequências nefastas. Há lei no País, e deve valer para todos.

Editorial / Notas&Informações, O Estado de S.Paulo, em 29.07.22

Mais da metade dos eleitores rejeita votar em Bolsonaro

Datafolha aponta que 53% do eleitorado não votaria no presidente de jeito nenhum. Lula, favorito para vencer a disputa, registra 36% de rejeição. Pacote de auxílios sociais ainda não se refletiu na aprovação do governo.

Jair Bolsonaro segue como o candidato à Presidência mais rejeitado pelos eleitores brasileiros, segundo pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta-feira (28/07). O levantamento aponta que 53% dos eleitores não votariam de forma alguma no atual presidente, que concorre à reeleição. É de longe a maior rejeição entre todos os candidatos.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que aparece como favorito na disputa presidencial, registra 36% de rejeição. Ciro Gomes (PDT), terceiro colocado na disputa, tem 25% de rejeição entre os eleitores. No momento, a disputa para o Planalto é dominada por Lula, que tem 52% das intenções de votos válidos, contra 32% de Bolsonaro e 9% de Ciro Gomes, segundo o Datafolha.

Outros candidatos registram entre 15% e 19% de rejeição, mas o Datafolha aponta que os números mais baixos ocorrem porque eles são praticamente todos desconhecidos da maioria do eleitorado. Um exemplo é o caso de Simone Tebet (MDB), que registra 16% de rejeição, mas que é conhecida por apenas 24% dos eleitores - contra os índices acima de 95% de Lula e Bolsonaro. Na última pesquisa Datafolha para a eleição presidencial, Tebet registrou apenas 2% das intenções de votos totais.

Os índices são semelhantes aos da pesquisa anterior feita pelo Datafolha, divulgada na última quinzena de junho. A variação ocorreu dentro da margem de erro. Na pesquisa do mês passado, 55% dos eleitores afirmaram que não votariam em Bolsonaro de jeito nenhum. No caso de Lula, o índice foi de 35%.

Os levantamentos do Datafolha divulgados nesta semana também exibiram outros números negativos de Bolsonaro. Na fatia do eleitorado jovem, de 16 a 29 anos em 12 capitais, a rejeição de Bolsonaro chegou a 67% dos entrevistados; Lula registrou 32%, seguido por Ciro Gomes (PDT), com 22%.

Bolsonaro tem 45% de reprovação

O atual presidente também voltou a registrar maus índices de aprovação do seu governo. Em outra pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira, 45% dos entrevistados reprovaram o governo. Segundo o instituto, esse é o pior desempenho de um candidato à reeleição a esta altura do mandato desde que a possibilidade de um segundo mandato consecutivo no Executivo foi criada, em 1997. Apenas 28% dos brasileiros aprovam o governo Bolsonaro.

Em relação à pesquisa anterior o presidente até registrou uma oscilação positiva, mas dentro da margem de erro. No levantamento de junho, 47% dos brasileiros avaliaram seu governo como ruim ou péssimo. E 26% consideraram seu governo bom ou ótimo.

A nova pesquisa foi a primeira após o lançamento oficial das principais candidaturas e também a primeira após o Congresso aprovar um bilionário pacote de auxílios sociais, que recebeu críticas por pressionar ainda mais as contas públicas e ser considerado eleitoreiro. Mas, como os números de rejeição, aprovação e intenção de voto mostram, os efeitos do pacote ainda não mudaram a visão negativa que boa parte dos eleitores brasileiros têm de Bolsonaro.

Publicado originalmente por Deutsche Welle Brasil, em 29.07.22 (https://www.dw.com/pt-br/mais-da-metade-dos-eleitores-n%C3%A3o-votaria-em-bolsonaro-de-jeito-nenhum/a-62641716)

quinta-feira, 28 de julho de 2022

Vitória do espírito democrático

Ao insistir em sua candidatura, a despeito da oposição em seu próprio partido, Simone Tebet mostra apreço pelo debate democrático, o que inexiste na guerra entre Lula e Bolsonaro

A confirmação de Simone Tebet como candidata do MDB à Presidência da República foi uma vitória pessoal da senadora, diante da enorme resistência de caciques do próprio MDB que ainda defendem a adesão do partido à candidatura do petista Lula da Silva. Foi também uma vitória do espírito democrático.

Em que pesem as diferenças de estilo e objetivo que podem ser apontadas entre Lula da Silva e Bolsonaro, ambos encarnam candidaturas com inequívoco viés populista. Um e outro apostam alto na mistificação em torno de suas figuras, apresentando-se como os únicos representantes das reais aspirações do “povo” e os únicos capazes de evitar todo o mal que o outro poderá causar ao País caso seja eleito. Tanto é assim que, do alto das posições que ocupam nas pesquisas de intenção de voto no momento, Lula e Bolsonaro se sentem desobrigados a debater entre si e com os adversários, o que configura inaceitável desrespeito aos eleitores e um desdém pela própria ideia de democracia. Lula pensa que basta se apresentar ao País como o anti-Bolsonaro para merecer a confiança da maioria dos eleitores. Para o incumbente, idem, apenas com o sinal trocado. E é assim, ao rés do chão, que os dois populistas discutem o que será do Brasil nos próximos quatro anos.

É por isso que candidaturas alternativas, como a de Simone Tebet, têm potencial para qualificar esse debate, como contraponto a essa guerra entre inimigos figadais a que Lula e Bolsonaro pretendem reduzir a eleição. Tebet fez bem à democracia ao insistir em se candidatar, a despeito das inúmeras sabotagens de partidos aliados e até mesmo de alas do próprio MDB, que se preocupam apenas em melhorar as chances do partido no futuro Congresso.

A existência de uma candidatura do centro democrático é muito importante para o País. É fundamental que os valores e as ideias da democracia liberal estejam em circulação e que os eleitores tenham condição de conhecê-los. Se esses valores e ideias têm potencial para vencer uma eleição, só as urnas dirão. Mas ganhar ou perder faz parte do jogo democrático, e, se o futuro reservar ao País mais um governo populista irresponsável, como as pesquisas ora indicam, é tarefa dos democratas qualificar a oposição, hoje desfigurada por interesses paroquiais e fisiológicos. 

É claro que todo partido e todo candidato disputam eleições para ganhar, pois não há sentido em mobilizar eleitores e fundos se não for para exercer o poder. No entanto, a atual campanha mostra que muitos estão disputando o poder pelo poder, sem se preocuparem com projetos de país nem com ideologia. Esses cupins da República se unem aos favoritos na corrida presidencial não por afinidade política, mas exclusivamente por cálculo de potencial de votos para a formação de bancadas que lhes garantirão maior acesso ao dinheiro público que financia campanhas e luxos.

A tal ponto chegou essa desfaçatez que partidos estão leiloando o “passe” de possíveis candidatos com bom potencial de votos, como mostrou recente reportagem do Estadão. Com oferta de até R$ 1 milhão, nomes são disputados não por suas propostas para o País, mas apenas por sua eventual capacidade de “puxar votos” – isto é, iludir o maior número possível de eleitores.

Num ambiente assim, não surpreende que o mundo político se divida hoje entre Lula e Bolsonaro, os dois mais bem posicionados nas pesquisas – e, portanto, com maior potencial de transferência de votos para quem os apoiar. Partidos indignos do nome flertam com um e com outro como escolhem uma fruta na feira, sem qualquer preocupação com o futuro do País.

Diante disso, quem acredita na democracia como uma disputa de ideias precisa defender alternativas, mesmo que, à primeira vista, pareçam eleitoralmente fadadas ao fracasso. 

Mas os brasileiros ainda não estão condenados a escolher o “mal menor”. É bom ressaltar que nenhum candidato ainda obteve um voto sequer na urna. Há tempo, pois, para sonhar com um País melhor no futuro, um Brasil menos desigual e mais próspero. Há tempo para manifestar esse sonho em um voto de esperança, e não de repulsa ou ódio.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S.Paulo, em 28.07.22