quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Indicação ao STF descamba para a baixa política

Cancelamento da sabatina de Messias resulta de disputa mesquinha entre chefe do Senado e governo Lula. Haveria boas razões para o Senado rejeitar indicados ao Supremo agora e sob Bolsonaro, mas não foram nem são elas as levadas em conta

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Davi Alcolumbre (União Brasil -AP), presidente do Senado - Adriano Machado - 14.ago.25/Reuters

Quando se trata uma indicação para o Supremo Tribunal Federal como o preenchimento de mais um cargo de confiança do governante, uma consequência esperável é que também sua tramitação reproduza práticas rasteiras do varejo político. É o que ocorre agora.

Assim como Luiz Inácio Lula da Silva (PT) explicita a preferência por aliados e auxiliares diretos —sendo Jorge Messias o nome da vez— nas escolhas para a mais alta corte do país, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil), tampouco se constrange em reivindicar o posto para um colega e seu antecessor, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

A disputa chegou a níveis vexatórios. Na terça-feira (2), Alcolumbre cancelou a sabatina de Messias que marcara para o próximo dia 10 na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, em decisão resultante de uma sucessão de fofocas e picuinhas digna de eleição de condomínio.

Diz-se em Brasília que a data fora escolhida de modo a não dar tempo suficiente para que o indicado vencesse resistências entre os parlamentares; em aparente reação, o Palácio do Planalto não enviou à Casa legislativa a papelada da indicação. Alcolumbre pretendia levar adiante o processo mesmo assim, mas capitulou.

O atual chefe do Senado é reincidente na pretensão de instalar alguém de seu agrado no Supremo. Quando ocupava o mesmo posto no governo Jair Bolsonaro (PL), retardou por mais de quatro meses a sabatina de André Mendonça, ao fim aprovado, por preferir Augusto Aras, de triste passagem pelo comando da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Ora, é papel da Casa, definido pela Constituição, escrutinar os indicados pelo presidente da República ao STF e deliberar se preenchem os requisitos de reputação ilibada e notável saber jurídico. Haveria boas razões para rejeitar tanto Mendonça como Messias —escolhidos por fidelidade ao chefe, não pelo currículo jurídico. Mas não foram nem são elas as levadas em conta.

O que se vê é tão somente um embate de poderes —com letra minúscula. Busca-se uma cadeira no Supremo como se faz com cargos em ministérios e estatais, à base de barganhas e represálias, e naturalmente esperando a colaboração futura do agraciado.

A essa peleja mesquinha não se furtam nem mesmo ministros da corte que, conforme se noticia amiúde, defendem este ou aquele candidato em jantares brasilienses, inclusive com o próprio Lula. É mais uma conduta imprópria da parte de magistrados que deveriam dar exemplo de equilíbrio, discrição e autocontenção.

Com protagonismo crescente nos últimos anos, o STF cometeu e comete não poucos erros e excessos, mas mostrou independência e altivez em julgamentos como os do mensalão e da condenação de Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado. Enfraquecê-lo em nome de interesses políticos de ocasião é um retrocesso duradouro na institucionalidade democrática do país.

Editorial da Folha de S. Paulo, em 04.12.25 (editoriais@grupofolha.com.br)

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