Presidente nega, mas seu tarifaço começa a se espalhar pelos preços nos EUA
Como esperado, os efeitos da guerra tarifária do presidente Donald Trump já alimentam a inflação nos EUA. Em julho, o índice de preços ao produtor (PPI, na sigla em inglês) subiu 0,9% em relação a junho, quando o esperado era um avanço de 0,2%. Em 12 meses, o PPI teve elevação de 3,3%, o maior patamar desde fevereiro deste ano. Já o núcleo do PPI, que exclui preços mais suscetíveis à volatilidade, como os de alimentos e energia, teve alta mensal de 0,6% em julho, maior patamar desde março de 2022.
Poucos dias antes, os dados de inflação ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) já sinalizavam que o período em que empresas utilizaram o que tinham em estoque, anteciparam importações e seguraram os repasses ao consumidor das tarifas impostas por Trump era coisa do passado.
Mas mesmo com CPI anual de 2,7% em julho, muito acima da meta de 2% ao ano perseguida pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), parte do mercado chegou a apostar em queda de juros no mês que vem.
O secretário do Tesouro, Scott Bessent, não se furtou a aventar (e depois negar) a possibilidade de corte nos juros norte-americanos em setembro, numa clara tentativa de agradar ao chefe Trump, para quem a inflação nos EUA é praticamente inexistente.
Não é o que dizem os dados. A bem da verdade, o PPI demolidor de julho reflete apenas efeito parcial do tarifaço, já que as alíquotas mais punitivas (como a de 50% sobre o café brasileiro, por exemplo) entraram em vigor recentemente e ainda não aparecem nos indicadores. O que está ruim, portanto, só tende a piorar.
Em um cenário desses, dificilmente um banco central técnico e independente, como tem sido ao longo das últimas décadas o dos EUA, tem margem para reduzir juros. O único elemento que, no momento, permitiria vislumbrar um corte de juros é o enfraquecimento do mercado de trabalho.
Ocorre que Trump não só alardeia que a inflação é zero nos EUA, como também bravateia que o mercado de trabalho está a pleno vapor, exibindo orgulhosamente toda a sua ignorância econômica. Mercado de trabalho pleno e inflação inexistente são realidade apenas em mentes alienadas como a do republicano.
O problema é que Trump é um delirante com poder nas mãos, e tem conseguido impor, na base do grito e da chantagem, praticamente tudo o que deseja. Irritado com as estatísticas oficiais, que somente refletem uma economia que apenas começou a se deteriorar, o presidente vem atirando para matar os mensageiros.
Foi o que aconteceu com Erika McEntarfer, a comissária que comandava o departamento responsável pela coleta, análise e divulgação dos dados de emprego, bem como do CPI e PPI. Trump não só a demitiu, como para o lugar dela indicou um economista obscuro que já propôs suspender o relatório mensal de emprego.
Até o momento, o Fed, na figura do presidente Jerome Powell, é uma das poucas forças de resistência a Trump. O PPI de julho apenas corrobora a conduta cautelosa da política monetária. Powell tem o apoio dos dados, mas não o de Trump.
Da resolução desse impasse depende não só o futuro dos juros nos EUA, como o da economia global.
Editorial / Notas e Informações, O Estado de S. Paulo, em 16.08.25
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