terça-feira, 1 de março de 2022

Zelenski consegue o apoio do Parlamento Europeu para a entrada da Ucrânia na UE

Num relevante gesto de unidade, populares, socialistas, liberais, verdes, ultraconservadores e a esquerda, assinaram um texto comum. 

E isso foi transferido para a votação: 637 votos a favor, 13 contra e 36 abstenções.

O Presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, intervindo por videoconferência perante o Parlamento Europeu. (Foto: Sthephanie Lecoco )EFE)

Há dias em que parlamentares e políticos falam pelos livros de história, não pelo jornal das sessões. Esta terça-feira foi um desses dias no Parlamento Europeu. Quem mais o enfatizou foi o presidente da Ucrânia, Volodímir Zelenski . “Estamos a lutar pela liberdade que vocês têm”, proclamou na sua presença por videoconferência perante os deputados do PE reunidos. Em seu discurso emocionado, ele lembrou as vítimas do ataque russo—16 crianças morreram na segunda-feira— e reivindicou sua incorporação à União Européia. “Lutamos para ser membros de pleno direito da Europa. Mostrem que a UE está connosco e que não nos vão deixar em paz”, acrescentou, vestido com uma inconfundível camisa verde militar. Suas palavras foram recebidas pela câmara com uma ovação de pé, que durou apenas um minuto, o tempo que ele estava ouvindo antes de se levantar e deixar a lente da câmera.

O apoio ao seu pedido no Parlamento Europeu deu-lhe a certeza. A expressão mais ouvida no início ou no final dos cerca de cinquenta discursos programados é “Glória à Ucrânia”. A resolução que contém um ponto que "solicita às instituições da União que trabalhem para conceder à Ucrânia o estatuto de país candidato à União". Num relevante gesto de unidade, populares, socialistas, liberais, verdes, ultraconservadores e a esquerda, assinaram um texto comum. E isso foi transferido para a votação: 637 votos a favor, 13 contra e 36 abstenções.

Apelos à luta da democracia contra a autocracia, da liberdade contra a submissão ou do Estado de direito contra a tirania salpicaram todos os discursos dos dirigentes da União Europeia que foram ouvidos num hemiciclo repleto de bandeiras ucranianas e laços com a mesma bandeira no lapelas. “Não vamos olhar para o outro lado. Estamos enfrentando uma ameaça existencial à Europa que conhecemos”, gritou a primeira oradora, a presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola. “Proteger nossa liberdade tem um preço. Vamos pagar porque a liberdade não tem preço”, alertou a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. “Ninguém pode colocar a vítima em pé de igualdade com o agressor. E vamos lembrar daqueles que não estão ao nosso lado neste momento solene."

Zelensky assinou o pedido dessa candidatura na segunda-feira, convencido de que o futuro da Ucrânia, agora mais do que nunca, depende de sua integração europeia. A aproximação da Ucrânia à UE em 2013 foi precisamente o gatilho para a primeira agressão russa contra aquele país. O presidente o fez falando com Von der Leyen, que dias antes havia pronunciado uma frase que repetiu nesta terça-feira: "Os ucranianos são nossos e os queremos dentro". Uma frase que explica muito do que aconteceu nos dias de hoje, incluindo a resposta diferente aos refugiados que esta guerra está produzindo em comparação com a da Síria em 2015, quando vários países se recusaram a aceitar pessoas fugindo da guerra.

Em 2014, a intenção de Kiev de assinar um acordo de parceria comercial com o clube comunitário foi boicotada pelo presidente russo, Vladimir Putin. E logo depois, ele lançou um ataque secreto para anexar a península da Crimeia, na Ucrânia, e encorajou militarmente o separatismo nas regiões de Donbas, no leste da Ucrânia. Zelensky agora defende a consumação da integração na UE por meio de um procedimento de adesão acelerado. Oito países da Europa Central e Oriental, com a Polónia na liderança, apoiaram o pedido na segunda-feira e defendem o reconhecimento imediato da candidatura da Ucrânia -a Hungria aderiu esta terça-feira-, um estatuto que colocaria o país à beira da entrada e facilitaria acesso a fundos europeus substanciais para promover a convergência política e económica.

Mas a maioria das capitais considera que o debate sobre a candidatura ucraniana é prematuro e pode até ser contraproducente porque a impossibilidade de realizá-lo a médio e longo prazo geraria frustração na opinião pública daquele país.

O vice-presidente da Comissão, Josep Borrell, resumiu os sentimentos de muitos líderes europeus em relação à possível candidatura. "Temos que trabalhar em coisas mais práticas", apontou o chefe da diplomacia europeia na segunda-feira. "A adesão seria algo que, de qualquer forma, levaria muitos anos para acontecer e o que precisamos são respostas para as próximas horas, não para os próximos anos." Borrell acredita que "a Ucrânia tem uma perspectiva claramente europeia, mas agora é hora de lutar contra a agressão".

A experiência da Turquia, com sua candidatura paralisada há pelo menos mais de uma década, e o lento avanço de candidatos da ex-Iugoslávia (como Sérvia e Montenegro) impõe cautela nas principais capitais europeias.

Além disso, a Ucrânia está longe de cumprir os chamados critérios de Copenhaga, que definem as normas políticas (democracia estável e Estado de direito), normas económicas (uma economia viável e competitiva) e normas jurídicas (capacidade de assumir o património regulamentar da UE ) que devem ser atendidos para iniciar a negociação pré-entrada. Além disso, a pedido da França, o exame prévio e o processo de negociação foram recentemente reforçados para evitar a repetição de casos como os da Hungria ou da Polónia, que, uma vez dentro do clube, baixaram a qualidade do seu Estado de direito e adoptou políticas discriminatórias ou xenófobas que Bruxelas considera incompatíveis com o Tratado da UE.

Ainda assim, os principais grupos parlamentares europeus consideram conveniente reconhecer a candidatura solicitada por Zelenski como um gesto de apoio ao ataque do gigante russo. O Partido Liberal Europeu (ALDE) chegou mesmo a admitir na segunda-feira aderir à formação do partido do presidente ucraniano. E o partido do ex-presidente Petró Poroshenko, Solidariedade Europeia, faz parte do Partido Popular Europeu.

MANUEL V. GOMEZ e BERNARDO DE MIGUEL, de Bruxelas, em 01.03.22 para o El País.

"Fome no Brasil pode chegar a "situação explosiva"

Ex-diretor da FAO e coordenador do programa Fome Zero no governo Lula, José Graziano afirma que fome está em patamar que "nunca se tinha visto". Solução depende de crescimento e renda, não só de programas sociais, diz.

Menos de uma década após o Brasil ter deixado o Mapa da Fome, em 2014, o país vive hoje um aumento significativo da insegurança alimentar, que pode levar a uma "situação explosiva" antes do final do ano e precisa ser enfrentada pelas autoridades públicas e pela sociedade com urgência.

O alerta é de José Graziano da Silva, diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) de 2012 a 2019 e coordenador do programa Fome Zero no primeiro governo Luiz Inácio Lula da Silva.

Em entrevista à DW Brasil, Graziano, atualmente diretor do Instituto Fome Zero, afirma que a situação da fome no Brasil é hoje "muito mais difícil" do que quando o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, usou em 1992 o mote "quem tem fome tem pressa" para lançar sua campanha contra a insegurança alimentar.

"Além de atingir um número muito maior de famílias, como nunca se tinha visto antes no Brasil, nós não contamos com a ajuda do governo federal. São poucos os municípios e Estados que têm no combate à fome a sua prioridade. Eu, particularmente, que estive por 15 anos na FAO, parece que estou vendo um país em guerra", afirmou Graziano. "Algo tem que ser feito, um verdadeiro mutirão contra a fome, em 2022, para que o problema não saia do controle." 

Segundo uma pesquisa realizada em dezembro de 2021 pelo Datafolha, 15% dos brasileiros, ou cerca de 32 milhões de pessoas, deixaram de fazer alguma refeição nos meses anteriores porque não tinham dinheiro para comprar comida. E 26%, ou 55 milhões de pessoas, haviam comido menos do que necessitavam porque não tinham dinheiro suficiente.

Para ele, o Bolsa Família foi um aliado crucial no combate à fome, mas apenas programas de transferência de renda não solucionam esse drama. "O mais importante no programa de erradicação da fome é geração de emprego e renda dentro de um processo de desenvolvimento econômico inclusivo, que distribua melhor a renda. Ou seja, o país precisa crescer e distribuir a renda gerada. É isso que acaba com a fome. Políticas de transferência de renda são atores coadjuvantes", afirma.

DW Brasil: O Brasil construiu um longo caminho para sair, em 2014, do Mapa da Fome. Em 2017, já se observava um retorno gradual do país à conhecida situação de insegurança alimentar. Hoje, pelo menos 55% da população vive nessas condições. Quais as causas desse retrocesso ?

José Graziano: Na verdade, a gente já vê um declínio da segurança alimentar da população brasileira a partir de 2013, que se acentua muito nos últimos anos, a partir de 2018. A questão da fome hoje no país, e sempre, é uma questão de acesso. Não faltam alimentos. Falta dinheiro para a população comprar alimentos. Já era assim no tempo de Josué de Castro [médico, nutrólogo e autor do livro "Geografia da fome”, escrito em 1946, presidiu a FAO], há 75 anos, e agora está muito mais acentuado.

Eu listaria cinco causas mais importantes para esse rápido crescimento da fome: 1) Consequência da crise mundial: O Brasil passa por um período de baixo crescimento econômico, abaixo de 2% [por ano] é insuficiente para gerar emprego e renda. Consequentemente, aumenta a população desempregada ou ocupada informalmente, com baixíssimos salários. 2) Queda nos salários: A inflação se acentua e culmina com uma não valorização do salário mínimo, que deixa de ser reajustado acima da inflação. O salário mínimo serve de farol para o setor informal. Pesquisa do Dieese mostrou que, no último ano, praticamente todas as categorias não conseguiram repor nem mesmo as perdas inflacionárias nas negociações salariais. 3) Corte nas políticas sociais e de segurança alimentar: Houve um desmantelamento de políticas sociais e de segurança alimentar criadas no início dos anos 2000; 4) Descontrole inflacionário, particularmente nos últimos dois anos da pandemia: A inflação dos alimentos afeta mais a população mais pobre. 5) As políticas de transferência de renda do governo aplicadas durante a pandemia, via auxílio emergencial, foram insuficientes para evitar que mais gente fosse para baixo da linha da miséria. Com exceção do primeiro auxílio emergencial, que pagou R$ 600 para mais de 65 milhões de pessoas, todos os outros programas de transferência de renda não foram suficientes para evitar o agravamento da fome.

DW Brasil: A pandemia agravou as vulnerabilidades e desigualdades sociais. Mas o quadro de fome no Brasil seria contínuo inevitavelmente, diante das políticas públicas (ou da ausência delas) adotadas pelo Executivo nos últimos anos?

Graziano: A pandemia veio agravar o problema, mas não é sua causa original. Com mais concentração da renda, mais desemprego, menor crescimento, a situação só piorou e mais pessoas foram jogadas na miséria. Dizer o que teria sido sem a pandemia é difícil, mas pelo mapa da pesquisa Vigisan [projeto de monitoramento da condição alimentar e nutricional do Brasil, feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar Nutricional – Penssan], a trajetória do rápido crescimento da insegurança alimentar já era clara desde 2013 e se acentua muito em 2018. A falta de política de segurança alimentar e combate à fome do governo federal agravou muito essa situação, sem dúvida.

Graziano: Conselhos de Segurança Alimentar nos municípios podem fazer muito, como organizar mutirões e campanhas (Foto: Getty Images/AFP/S. Kambou)

DW Brasil: O Bolsa Família foi redesenhado na gestão Bolsonaro e há especialistas que apontam riscos para o êxito futuro da política de transferência de renda pelo desmonte nas áreas de educação e saúde. Como enxerga as mudanças no programa?

Graziano: A mudança que foi feita, de extinguir o Bolsa Família e criar o Auxílio Brasil, foi apenas uma jogada de marketing num ano eleitoral, para eliminar a associação do Bolsa Família com o Lula. Não vi vantagem nenhuma, e isso é unânime entre especialistas, no novo desenho do programa. Pelo contrário, parece até uma coisa provisória, que é para conseguir emprego formal. 

Sabemos que conseguir um emprego formal não é uma questão de tempo, para quem passa fome, seja pela falta de qualificação profissional, seja porque não há oferta suficiente de empregos gerados na economia pelo baixo crescimento econômico. O desenho do novo programa deixa muito a desejar. Mas o mais importante, na minha opinião, é ter claro que as políticas de transferência de renda são muito importantes para o contingente de população miserável, mas não resolvem o problema da fome. 

O mais importante é geração de emprego e renda dentro de um processo de desenvolvimento econômico inclusivo, que distribua melhor a renda. Isso que acaba com a fome. Políticas de transferência de renda são o que chamo de atores coadjuvantes das políticas macroeconômicas. A valorização do salário mínimo, na minha opinião, foi a grande política que tirou o país do Mapa da Fome nos governos Lula.

DW Brasil: A fome é um fenômeno multifacetado, sobretudo no Brasil, pelas camadas de desigualdade. Vê alguma possibilidade de o país dar respostas céleres ao problema no momento atual?

Graziano: A situação atual é dramática, em várias frentes. Mas o Brasil tem que enfrentar esse problema desde já. O problema da fome não pode ser deixado para um próximo governo, em 2023. Algo precisa ser feito em 2022. Senão, vamos chegar a uma situação explosiva no final do ano. A fome praticamente dobrou na pandemia, pelos dados de que dispomos. Hoje, em 2022, com eleição, só os municípios têm condições de tomar iniciativas, já que o governo federal e os governos estaduais estão totalmente absorvidos pelo processo eleitoral. Mas os municípios podem fazer muita coisa, restaurantes populares, feiras livres, apoio à agricultura familiar, hortas comunitárias... Os municípios têm os Conseas (Conselhos de Segurança Alimentar). Eles não foram extintos, como foi o Consea Federal. E os conselhos podem fazer muito nos municípios, organizar mutirões contra a fome, campanhas de arrecadação e distribuição de alimentos, implantar bancos de alimentos, melhoria de acesso da população mais pobre a alimentos. Algo tem que ser feito, um verdadeiro mutirão contra a fome, em 2022, para que o problema não saia do controle.

DW Brasil: Existe uma espécie de negligência ou normalização do problema por parte das autoridades governamentais e da sociedade brasileira? Os movimentos da sociedade civil que tentam aplacar a fome podem ser comparados à mobilização nacional à qual assistimos na década de 90, com Betinho?

Graziano: Sem dúvida há uma negligência por parte do governo federal, e muitos Estados e municípios também têm feito corpo mole. A pandemia virou a desculpa perfeita para essa inação de grande parte do setor público que lava as mãos frente à questão da fome. A fome tem crescido assustadoramente na pandemia. O último dado que temos é uma pesquisa Datafolha, de dezembro de 2021, que mostrou que 15% da população adulta, cerca de 32 milhões de pessoas, tinham deixado de comer porque não tinham dinheiro para comprar comida. E 26%, ou seja, 55 milhões de pessoas, haviam comido menos do que necessitavam porque não tinham dinheiro para comprar mais alimentos no segundo ano da pandemia. Isso é aproximadamente o dobro do que tinha sido registrado um ano antes pela Unicef. Ou seja, a fome dobrou no segundo ano da pandemia. 

As organizações da sociedade civil estão fazendo o possível, muitas vezes o impossível. Nota-se claramente uma canseira, fadiga dos doadores. É muito difícil manter esse ritmo acelerado de arrecadação e distribuição de alimentos. Mas uma série de outras iniciativas novas estão surgindo. A Ação da Cidadania está liderando, atualmente, um conjunto de entidades, entre as quais o Instituto Fome Zero, que eu dirijo, para realizar um encontro contra a fome ainda no primeiro semestre de 2022. O objetivo é procurar organizar melhor essas inúmeras iniciativas voluntárias que surgiram no país.

Mas não há dúvidas de que a situação hoje é muito mais difícil do que era antes, no tempo do Betinho. Além de atingir um número muito maior de famílias, como nunca se tinha visto antes no Brasil, nós não contamos com a ajuda do governo federal. São poucos os municípios e Estados que têm no combate à fome a sua prioridade. Eu, particularmente, que estive por 15 anos na FAO, parece que estou vendo um país em guerra. Essa é a imagem que me vem à mente quando vejo o que está se passando no Brasil, com muita tristeza.

DW Brasil: Além do custo social e político, a fome tem um custo financeiro. Poderia falar sobre alguns dados e estudos sobre os impactos econômicos que a fome gera às nações?

Graziano: Na América Latina temos estudos da Cepal, junto com o Programa Mundial de Alimentos, a partir de 2005. Infelizmente não tem um estudo específico para o Brasil. Mas os resultados para a América Central e República Dominicana mostram perdas de 2% a mais de 11% do PIB, em decorrência da fome, dependendo do país. A média é de 6,4% de perda do PIB. A fome afeta a produtividade das pessoas, com maior ocorrência de enfermidades, mortes, menor nível educacional decorrente de repetência ou ausência das crianças. Na América do Sul, há estudos para a Bolívia, Equador, Paraguai e Peru por parte da Cepal e PMA, que mostram uma perda, em média de 3,5% do PIB, tendo como referência o ano de 2005. Costumo dizer que a relação custo-benefício para erradicar a fome é de aproximadamente 1 para 10 na América Latina. Quer dizer que a cada R$ 1 investido na erradicação da fome, teríamos o retorno de R$ 10. Portanto, não fossem por razões morais e humanitárias, também do ponto de vista econômico é um grande negócio erradicar a fome até 2030.

Malu Delgado para a Deutsche Welle Brasil, em 01.03.22

Zelenski pede à União Europeia que prove que está ao lado de ucranianos

Em discurso ao Parlamento Europeu, presidente da Ucrânia solicita que bloco aceite a entrada imediata de Kiev à União Europeia.

O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski, pediu nesta terça-feira (01/03) à União Europeia para provar que está do lado dos ucranianos diante da extensa ofensiva militar lançada pela Rússia contra seu país. O apelo veio um dia após Kiev assinar um pedido oficial para ser incorporado ao bloco.

Num discurso por videoconferência durante uma sessão extraordinária do Parlamento Europeu, Zelenski reforçou o pedido para que a UE aceite a adesão imediata do país ao bloco e pediu a entrada como uma espécie de "prova" para demonstrar que os ucranianos não estão sozinhos na luta contra os russos.

"A Europa será muito mais forte com a Ucrânia. Sem vocês, a Ucrânia ficará sozinha. Nós provamos nossa força [...], então provem que estão conosco, provem que não vão nos deixar, provem que vocês são de fato europeus e, então, a vida vai vencer a morte, e a luz vai vencer a escuridão", afirmou Zelenski. A Ucrânia, segundo ele, já provou sua força e que "é exatamente igual" a da União Europeia.

"Preço a pagar"

O presidente destacou sua alegria por ver "todos os países da UE unidos" diante de uma perspectiva europeia para a Ucrânia no futuro, embora tenha lamentado que o preço a pagar por esse consenso tenha sido com "milhares de mortos, duas revoluções, uma guerra e cinco dias de invasão em grande escala da Rússia".

"Estamos dando nossas vidas por alguns valores, pela liberdade que vocês têm. Estamos colocando nossos melhores cidadãos, os mais fortes e os mais valiosos nesta encruzilhada. Os ucranianos precisam se sentir orgulhosos. Hoje, não apenas vocês têm falado sobre esse orgulho, mas também estão vendo", frisou Zelenski.

Ele também criticou o presidente russo, Vladimir Putin, por continuar citando uma operação contra a infraestrutura militar "quando crianças estão morrendo". Ele lamentou a morte de 16 menores de idade nesta segunda-feira e outras dezenas de pessoas nos ataques com mísseis nesta manhã na cidade de Kharkiv, no leste do país.

"É a cidade com mais universidades em nosso país. Naquele local, a juventude é brilhante e inteligente. Nesta manhã, dois mísseis atingiram a praça da Liberdade, e dezenas de pessoas morreram. Este é o preço a pagar pela liberdade, por nossa terra", acrescentou.

"Luta pela sobrevivência"

Zelenski afirmou ainda que, neste momento, os seus cidadãos são movidos não somente pela "luta pela sobrevivência", mas também pela luta "para serem membros de pleno direito da Europa". Ele contou que está convencido de que está sendo mostrado ao mundo exatamente "quem são os ucranianos e o que é a Ucrânia".

Ao término de seu discurso, Zelenski foi aplaudido de pé. Parte dos eurodeputados usava camisetas com dizeres como "Apoie a Ucrânia" e a bandeira do país. Já outros usavam broches ou adereços com as cores da bandeira ucraniana. O plenário do Parlamento Europeu recebeu também o embaixador ucraniano junto à UE e um grupo de cidadãos ucranianos.

Deutsche Welle Brasil, em 01.03.22

Como Putin está mudando a Europa

Invasão da Ucrânia gera pequena revolução na União Europeia. Nunca antes países europeus renunciaram a princípios políticos e tradições ideológicas tão rapidamente como nos últimos dias.


A guerra do presidente russo, Vladimir Putin, contra a Ucrânia desencadeou uma série de consequências não intencionais: uniu a Europa, pôs fim a bajulações econômicas e políticas de alguns países da União Europeia (UE), levou muitos de seus velhos amigos à clandestinidade e pôs um fim temporário às disputas mesquinhas.

O entusiasmo pela nova unidade pode ser temporário, pois o preço para as duras sanções ainda não foi pago. No entanto, a guerra de Putin é como um elixir da longa vida para a UE, vacas sagradas estão sendo abatidas e um novo vento sopra pelo bloco.

França: populistas perdem terreno

Desde que tomou posse, o presidente francês, Emmanuel Macron, tem pregado que a Europa deve se tornar mais autônoma economicamente e ser capaz de se defender. Seus colegas no bloco não o apoiavam. Agora está ficando claro o quanto Macron estava certo.

Entretanto, ele também tem que admitir erros: durante muito tempo, o francês havia cortejado Putin e acreditava que ele estava preocupado com a cooperação e o respeito na Europa. Após a  última e fracassada tentativa de negociar com o Kremlin, Macron se sentiu enganado.

Seus adversários políticos, no entanto, têm que renunciar a seu ídolo Putin da noite para o dia e não querem ser lembrados de seus tweets embaraçosos de antes. Até então, a linha pró-Putin do velho esquerdista Jean-Luc Melenchon, da populista de direita Marine Le Pen e seu rival de extrema-direita Eric Zemmour não desempenharam nenhum papel na campanha eleitoral.

Agora fotos de 2017 ao lado de Putin ficaram altamente embaraçosas para Le Pen. Naquele ano, sua campanha eleitoral recebeu doações do presidente russo. Um vídeo de Zemmour nas mídias sociais, onde ele elogiou Putin como um gênio e um francês quase virtual, é agora um sucesso negativo. E Melenchon admite que estava errado a respeito do russo. Todos os três estão agora se contendo e falando sobre paz.

Hungria: Orban muda de ideia

O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, havia se tornado um problema na UE nos últimos anos. Cada vez mais autoritário, corrupto e antidemocrata convencido, o húngaro tem causado discórdia e torpedeado decisões conjuntas. O desmantelamento do Estado de direito na Hungria o colocou em rota de colisão com Bruxelas. E sua total rejeição dos refugiados impediu uma política migratória comum.

Mas no fim de semana Orban foi à cidade fronteiriça de Beresegsurany, onde refugiados da Ucrânia atravessam a fronteira, para acolhê-los e prometer-lhes a ajuda da Hungria. É verdade que muitos que chegam ali pertencem à minoria húngara dos Cárpatos, mas Orban teve que retroceder nesta questão.

Orban está agora preso entre anos de proximidade com Putin e o ultraje europeu pela guerra na Ucrânia. Há apenas algumas semanas, ele havia visitado o Kremlin, quando declarou a exigência de garantias de segurança legítimas e as sanções da UE como contraproducentes. Então, no sábado passado, seu porta-voz anunciou que Budapeste apoiaria todas as sanções contra a Rússia. Viktor Orban não conseguirá retroceder tão rapidamente o quanto exigem as próximas eleições em abril, pois a opinião pública na Hungria é pró-Ucrânia.

As neutras Suécia e Finlândia

Desde a Segunda Guerra Mundial, os suecos têm considerado sua neutralidade como o mais alto bem. Em princípio, o país evita tomar partido e se distingue como negociador neutro na comunidade mundial. Agora, a primeira-ministra Magdalene Andersson declarou que entregaria capacetes, coletes de proteção e 5 mil armas antitanque à Ucrânia.

"Tomamos nossas próprias decisões em matéria de política de segurança", respondeu Andersson às ameaças de Putin sobre o suposto preço alto que Suécia e Finlândia teriam que pagar caso aderissem à Otan.

A Finlândia também reagiu friamente às ameaças de Putin. Lá, o não alinhamento imposto e a influência política do Kremlin após a Segunda Guerra Mundial são agora vistos de forma crítica. E, pela primeira vez, uma maioria de 53% dos entrevistados apoia agora que o país ingresse na Otan.  O desejo de proteção pela aliança militar ocidental parece mais importante do que a antiga tradição de neutralidade.

E quando perguntado sobre uma possível "finlandização" da Ucrânia, o ex-primeiro-ministro Alexander Stubb nega: "O termo é traumático para nós", seria um retorno às regras da Guerra Fria e não uma boa solução para a Ucrânia. "Finlandização" remete à época na década de 1970 quando a Finlândia fez concessões à União Soviética para manter uma política de boa vizinhança.

Alemanha: Fim de velhos princípios

"A Alemanha está assumindo seu papel como potência global" escreveu a agência de notícias Reuters nesta segunda-feira (28/02), resumindo os comentários mundiais expressando entusiasmo e espanto na virada histórica do chanceler federal alemão, Olaf Scholz, no domingo.

Da noite para o dia, ele removeu todas as crenças de décadas da política alemã: sim às armas para a Ucrânia, sim a uma Bundeswehr pronta para a ação, sim ao aumento dos gastos com a defesa e não à dependência energética da Rússia, não aos que entendem Putin e apologistas de seu governo autoritário.

A tradução inglesa do discurso de Scholz foi compartilhada como pão quente no Twitter entre os observadores anglo-saxões, tão grande foi o assombro com a reviravolta em Berlim. O chefe de governo alemão jogou no lixo cerca de 30 anos de política alemã em relação à Rússia, especialmente a de seu próprio partido. No dia seguinte, a política externa e de segurança da República Federal da Alemanha está irreconhecível.

Reações em outros países

O presidente tcheco, Milos Zeman, durante anos um ardente apoiador do presidente Putin, agora chama seu antigo amigo de "lunático que deve ser isolado" e que põe em perigo a paz na Europa.

O populista italiano de direita Matteo Salvini, que se deixou fotografar mais de uma vez usando uma camiseta estampando Putin, tenta apagar antigos elogios ao presidente russo nas mídias sociais e colocou flores na embaixada ucraniana em Roma.

Após a anexação da Crimeia, o ex-primeiro-ministro escocês Alex Salmond ainda havia elogiado Putin como um patriota russo. Agora, ele suspendeu seu talk show no canal de propaganda russo RT até que a paz seja restaurada.

O ex-candidato presidencial francês François Fillon, o ex-chanceler austríaco Christian Kern e outros renunciaram a seus cargos em empresas estatais russas em protesto. Somente o ex-chanceler alemão Gerhard Schröder permanece com seu cargo na Gazprom, falando que houve "erros de ambos os lados".

E por último: o premiê búlgaro Kiril Petkov demitiu seu ministro da Defesa porque ele se recusiou a definir o conflito na Ucrânia como "guerra".

Barbara Wesel para a Deutsche Welle Brasil, em 01.03.22.

Mais bilionários russos se manifestam contra a guerra de Putin na Ucrânia

O resto das dezenas de bilionários russos continuam em silêncio.

Alexei Mordashov, pessoa mais rica da Rússia, chamou a luta de “tragédia de dois povos irmãos”

À medida que os Estado Unidos e a Europa aumentam as sanções contra os mais ricos da Rússia – incluindo a promessa de “caçar” seus iates e mansões – oligarcas que acumularam suas fortunas permanecendo leais ao presidente russo Vladimir Putin estão começando a se manifestar contra a invasão da Ucrânia.

Nenhum citou diretamente Putin, mas suas declarações públicas pedindo paz são um indício sem precedentes de dissidência contra o presidente.

O ucraniano Mikhail Fridman, fundador do Alfa Bank, o maior banco privado da Rússia, tornou-se o primeiro oligarca a se manifestar – aparentemente sem querer – contra as ordens de invasão de Vladimir Putin, segundo o Financial Times.

“Não faço declarações políticas, sou um empresário que tem responsabilidades com milhares de funcionários na Rússia e na Ucrânia. Estou convencido, porém, de que a guerra nunca pode ser a resposta. Essa crise custará vidas e prejudicará duas nações que são irmãs há centenas de anos”, escreveu ele em um e-mail para funcionários de sua empresa de private equity LetterOne, que mais tarde se tornou público.

Nele, ele citou seu próprio histórico – Fridman viveu na Ucrânia Ocidental até os 17 anos. Os pais são cidadãos ucranianos e moram em Lviv, que ele chama de sua “cidade favorita”, e é uma das cidades ocupadas pelos militares russos.

A União Europeia impôs sanções a Fridman pessoalmente ontem (28), que incluem o congelamento de seus bens e a proibição de viajar. Seu parceiro de negócios, Alexey Kuzmichev, disse à Forbes Rússia em uma entrevista que concorda com Fridman, mas acrescentou: “Não vou fazer nenhuma declaração política”.

Oleg Deripaska, que construiu sua fortuna com matérias-primas russas e foi casado com Polina Yumasheva, enteada de uma das filhas de Boris Yeltsin, também pediu o fim da guerra em um post no Telegram, propondo paz. “O mundo é muito importante! As negociações precisam começar o mais rápido possível!”, escreveu. Ontem, ele chamou a situação econômica em rápida decadência na Rússia de “crise real” e pediu maiores reformas econômicas. “É preciso mudar a política econômica, acabar com todo esse capitalismo”, escreveu.

Ontem, no mesmo dia em que foi atingido pelas sanções da UE, a pessoa mais rica da Rússia, o barão do aço Alexei Mordashov, chamou a luta de “tragédia de dois povos irmãos” e disse que eles devem fazer tudo que for necessário para sair do conflito e parar o derramamento de sangue. “É terrível que ucranianos e russos estejam morrendo, que pessoas estejam passando por dificuldades e a economia esteja entrando em colapso. Devemos fazer todo o necessário para que uma saída desse conflito seja encontrada em um futuro muito próximo e o derramamento de sangue pare para ajudar as pessoas afetadas a restaurar a vida normal”, disse o bilionário.

“Não tenho absolutamente nada a ver com as atuais tensões geopolíticas. Não entendo por que as sanções foram impostas contra nós”, acrescentou.

Outros bilionários russos também pediram o fim da guerra. O bilionário Oleg Tinkov, fundador do Tinkoff Bank, que atualmente está em tratamento contra um câncer, disse que sua doença trouxe alguma perspectiva sobre a fragilidade da vida humana. “Pessoas inocentes estão morrendo na Ucrânia agora, todos os dias, isso é impensável e inaceitável! Os Estados devem gastar dinheiro no tratamento de pessoas, em pesquisas para derrotar o câncer, e não em guerra”, disse ele.

Dmitry e Igor Bukhman, os irmãos por trás da desenvolvedora de videogames Playrix, que faz jogos de aplicativos gratuitos como Homescapes e Fishdom, disseram que dariam a cada um de seus 4 mil funcionários um salário extra e enfatizaram que a violência “nunca pode ser a solução para um problema.”

“É difícil ficar calado na situação atual, o que está acontecendo é uma grande tragédia para todos, inclusive para nossa empresa. Era difícil imaginar”, escreveram os irmãos em um post no Facebook.

Igor Rybakov, o bilionário coproprietário da produtora de telhados e isolamento Technonicol, disse em seu canal no YouTube na semana passada que entende que “o limite foi ultrapassado e esta será uma grande história que tocará a vida de milhões de pessoas. É triste.” Ao mesmo tempo, ele disse aos espectadores que não entrassem em pânico e comprassem títulos depreciados de empresas russas. “Tudo isso me irrita. Quero que toda essa incerteza acabe”, acrescentou, segundo a Forbes Russia.

O significado dessas declarações é grande. Já se passaram quase duas décadas desde que o crítico de Putin e então homem mais rico da Rússia, Mikhail Khodorkovsky, foi preso por suposta evasão fiscal depois de financiar partidos de oposição contra Putin e teve sua fortuna confiscada. (Ele negou todas as acusações). Desde então, poucos ou nenhum oligarca ousaram se opor a Putin. O próprio Khodorkovsky tem pedido aos russos que saiam às ruas, dizendo no Instagram que “a guerra contra a Ucrânia deve ser interrompida a qualquer custo”.

É impossível saber se esses bilionários são sinceros em seus apelos para acabar com os combates ou se estão dando uma resposta a sanções iminentes ou a uma economia em colapso que está em queda livre.

Ainda há muitos que ainda não falaram. Roman Abramovich, o bilionário proprietário do time de futebol inglês Chelsea, entregou a “administração” (mas não a propriedade) do time a uma fundação de caridade – um gesto em grande parte sem sentido – e não tomou partido publicamente, mas estaria envolvido em negociações de paz na Belarus, após o governo ucraniano pedir sua ajuda. (Sua filha Sofia Abramovich supostamente colocou um post anti-guerra nas redes sociais, de acordo com a jornalista britânica Carole Cadwalladr). O resto das dezenas de bilionários russos, incluindo vários sancionados pela UE ontem, incluindo o antigo investidor do Facebook, Alisher Usmanov, permanecem em silêncio.

Leia mais em: https://forbes.com.br/forbes-money/2022/03/mais-bilionarios-russos-se-manifestam-contra-a-guerra-de-putin-na-ucrania/

Rachel Sandler para a Forbes Brasil, em 01.03.22

Quem são os bilionários russos alvos de sanções dos Estados Unidos e da Europa?

Empresários de diversos setores sentem o peso das proibições internacionais.

As sanções aos bilionários russos não param de chegar. Ontem (28), a União Europeia comunicou cortes a mais de 26 indivíduos, movimentação que se tornou corriqueira nas últimas semanas. Os Estados Unidos também seguem atrás das fortunas dos empresários mais ricos do país.

As sanções incluem o congelamento de bens das personalidades e a proibição de viajar. Com isso, os bilionários sentiram no bolso e começaram a se posicionar a favor do fim da guerra entre a Rússia e a Ucrânia.

No país vizinho, a situação foi levada de outra maneira. Por lá, os bilionários ucranianos uniram forças contra o presidente da Rússia, Vladimir Putin, na tentativa de preservar suas fortunas.

Quem são os bilionários russos afetados pelas sanções?

Alexei Mordashov

Alexei Mordashov é empresário e filantropo. Conhecido como barão de aço, ele é acionista majoritário da OAO Severstal, maior companhia russa do setor, da qual foi CEO por muitos anos.

Mordashov é o homem mais rico da Rússia e ocupa a 51ª posição no ranking de bilionários da Forbes, com uma fortuna de US$ 29,1 bilhões (R$ 150,1 bilhões).

O empresário fez uma declaração ontem pedindo o fim da guerra. Ele chamou a luta de “tragédia de dois povos irmãos” e disse que eles devem fazer tudo que for necessário para sair do conflito e parar o derramamento de sangue.

Gennady Timchenko

Gennady Timchenko tem ações em diversas companhias na Rússia, incluindo a companhia de gás Novatek e a petroquímica Sibur Holding.

Ele é uma das personalidades mais poderosas do país e sempre apoiou Putin, o que o levou a encarar sanções dos Estados Unidos em 2014, quando a Rússia anexou a Crimeia após disputa com a Ucrânia.

Sua fortuna está avaliada em US$ 21,1 bilhões (R$ 108,8 bilhões). Ele ocupa a 85ª posição no ranking da Forbes.

Alisher Usmanov

Alisher Usmanov tem a maior parte do seu dinheiro investido na empresa que fundou, a Metalloinvest, voltada para o setor de aço, prata e ferro. O empresário fez sua fortuna produzindo sacolas de plástico.

Usmanov já se arriscou em diversos ramos, investindo no Facebook, Xiaomi e outras empresas de mídia. Ele também era acionista no time de futebol Arsenal, mas vendeu sua participação por US$ 700 milhões (R$ 3,6 bilhões) em 2018.

Ele está posicionado na 127ª posição do ranking da Forbes, com fortuna de US$ 15,3 bilhões (R$ 78,9 bilhões)

Roman Abramovich

Roman Abramovich comprou o time inglês de futebol Chelsea há quase 20 anos por US$ 190 milhões (R$ 551 milhões na conversão da época), ficando responsável também pela administração do clube.

Após sanções do Reino Unido, o empresário deixou a direção aos curadores da fundação de caridade do Chelsea.

Além do time, ele conta com participação nas gigantes de aço, Evraz e Norilsk Nickel.

Sua fortuna está avaliada em US$ 13,1 bilhões (R$ 67,5 bilhões ), ocupando a posição de número 157 na lista de bilionários.

Mikhail Fridman

Fridman é um dos fundadores do maior banco privado da Rússia, o Alfa Bank, além da empresa de investimentos LetterOne. Ele é sócio de German Khan e Alexei Kuzmichev desde 1989.

Em 2013, os parceiros ganharam US$ 5,1 bilhões (R$ 26,3 bilhões) com a venda da participação na gigante petrolífera TNK-BP por US$ 14 bilhões (R$ 72,2 bilhões).

Atualmente, a fortuna de Fridman é avaliada em US$ 12,8 bilhões (R$ 66 bilhões), ocupando a posição 163 da lista.

Igor e Dmitry Bukhman

Os irmãos Bukhman começaram a criar jogos online ainda no colégio e hoje são donos da desenvolvedora de videogames Playrix. A companhia é conhecida por aplicativos de jogos para celular grátis, como Homescapes e Fishdom.

Em 2018, a empresa comprou a Nexters Global, companhia de vídeo e mídias sociais. Hoje, a receita anual da Playrix gira em torno de US$ 2,7 bilhões (R$ 13,9 bilhões)

Eles estão posicionados em 297º no ranking da Forbes e têm uma fortuna de US$ 8,1 bilhões (R$ 41,7 bilhões).

Oleg Deripaska

Oleg Deripaska é o fundador da Basic Element, um grupo industrial russo com interesses em alumínio, energia, construção, agricultura, entre outros setores.

Ele era a pessoa mais rica da Rússia e a 9ª mais rica do mundo em 2008, antes de perder quase tudo devido a mercados em queda e dívidas pesadas.

O empresário passou por diversas sanções nos anos seguintes, que prejudicaram a empresa e seu montante pessoal.

Hoje, sua fortuna é avaliada em US$ 3,9 bilhões (R$ 20,1 bilhões) ocupando a 790ª posição na lista da Forbes.

Alexander Ponomarenko

Ponomarenko é o presidente do aeroporto Sheremetyevo, o maior da Rússia. Junto ao seu sócio Alexander Skorobogatko, o empresário começou com portos marítimos e bancos, migrando então para o setor de aeroportos.

A dupla também fundou a TPS Real Estate, que detém mais da metade dos imóveis do Ocean Plaza, o maior shopping center de Kiev.

Ocupando a posição 1.100 da lista da Forbes, o empresário acumula o montante de US$ 2,9 bilhões (R$ 14,9 bilhões)

Boris Rotenberg


Rotenberg é proprietário do banco de investimento russo SMP Bank junto ao seu irmão mais velho.

O empresário também contou com sanções em 2014, durante a batalha pelo território da Crimeia, após estreitar laços com Putin.

Ocupando a posição 2.342 do ranking da Forbes, Rotenberg tem US$ 1,2 bilhão (R$ 6,1 bilhões).

Oleg Tinkov

Oleg fundou o banco Tinkoff em 2006. Atualmente é um dos maiores bancos online do mundo, com cerca de 8 milhões de clientes na Rússia.

Antes de entrar no setor bancário, o empresário fundou a produtora de alimentos congelados Daria, Tinkoff Beer e Tinkoff Restaurants.

Ele também lançou uma cadeia de hotéis de luxo no México, França, Itália e Rússia sob o nome La Datcha.

Tinkov era bilionário até as sanções causarem prejuízos, o que o fez perder US$ 295 milhões (R$ 1,5 bilhão). Hoje, sua fortuna está estimada em US$ 822,2 milhões (R$ 4,2 bilhões).

Leia mais em: https://forbes.com.br/forbes-money/2022/03/quem-sao-os-bilionarios-russos-alvos-de-sancoes-dos-estados-unidos-e-da-europa/

Vitória Fernandes para a Forbes Brasil, em 01.03.21

Ex-bilionário: banqueiro russo perde mais de R$ 25 bilhões em meio à guerra

O banco digital Tinkoff foi uma das histórias de sucesso de tecnologia da Rússia, mas a invasão da Ucrânia e as sanções subsequentes provocaram uma queda de 90% no preço de suas ações, apagando bilhões da fortuna de seu fundador, Oleg Tinkov.

© Sergei Bobylev\TASS via Getty Images

Oleg Tinkov tornou-se um dos homens mais ricos da Rússia depois de pular da venda de cerveja e bolinhos para vender seu banco digital Tinkoff na Bolsa de Valores de Londres. As ações da Tinkoff caíram mais de 90% desde o início do ataque da Rússia à Ucrânia. A fortuna de Tinkov caiu mais de US$ 5 bilhões (R$ 25,8 bilhões) em menos de um mês, e hoje ele perdeu seu status de bilionário.

Tinkov é um dos pelo menos 10 ex-bilionários russos que abandonaram o clube das três vírgulas como resultado da queda das ações russas e de o rublo ter batido recordes de baixa em relação ao dólar em meio a sanções e crescente isolamento da Rússia pelo Ocidente. Outras quedas notáveis ​​incluem Arkady Volozh, CEO e fundador do mecanismo de busca russo Yandex.

A Forbes estima que o patrimônio líquido de Tinkov agora encolheu para cerca de US$ 800 milhões (R$ 4,128 bilhões). Isso porque uma parcela significativa de sua riqueza está vinculada à participação da Rússia no Capital One, o Tinkoff Bank, cujo valor de mercado caiu de US$ 23 bilhões (R$ 118,7 bilhões) em novembro para pouco mais de US$ 1 bilhão (R$ 5,1 bilhões) hoje.

Embora a Bolsa de Valores de Moscou tenha sido fechada, o Tinkoff Bank e outras empresas russas com listagem dupla em Londres viram os preços de suas ações caírem vertiginosamente. As ações da Lukoil, maior produtora independente de petróleo da Rússia, fundada pelo bilionário Vagit Alekperov, também caíram quase 93%.

Mesmo antes da invasão da Ucrânia pela Rússia e das sanções contra os bancos russos, Tinkov enfrentou muitos problemas. O filho de um mineiro de carvão siberiano, que lançou o banco Tinkoff em 2006, foi preso em Londres em março de 2020 por uma acusação de evasão fiscal federal dos EUA. Tinkov pagou US$ 509 milhões (R$ 2,6 bilhões) para resolver o caso com o Departamento de Justiça dos EUA em outubro de 2021. Um mês após sua prisão, o empresário russo anunciou que deixaria o cargo de presidente do Tinkoff Bank em abril de 2020, depois de revelar que havia sido diagnosticado com leucemia aguda.

Embora sua fortuna tenha diminuído, o ex-bilionário ainda possui a coleção La Dacha, mansões de luxo na Baja California, chalés de esqui nos Alpes franceses e um Dassault Falcon 7X, embora todas as aeronaves russas agora estejam banidas do espaço aéreo britânico e europeu.

Tinkov, que já se gabou ao “Financial Times” de suas conexões com Putin, é um dos poucos super-ricos da Rússia a falar sobre a guerra. Ele disse que durante sua doença teve a oportunidade de ver como a vida humana é frágil e pediu o fim da “operação especial” na Ucrânia. “Pessoas inocentes estão morrendo na Ucrânia agora, todos os dias, isso é impensável e inaceitável! Os Estados deveriam gastar dinheiro no tratamento de pessoas, em pesquisas para derrotar o câncer, e não em guerra”, escreveu ele.

Iain Martin e David Dawkins para a Forbes Brasil, em 29.02.22.

Absolvição criminal e a nova Lei de Improbidade

Se não bastasse toda essa normativa agora expressa, o legislador trouxe o que há tempos era aguardado pela melhor doutrina no sentido que a absolvição criminal deve surtir efeitos na ação de improbidade, independentemente da causa de absolvição. Artigo de Viviane Melo e Valber Melo no Consultor Jurídico.

A recente Lei 14.230/2021, intitulada já por muitos de nova Lei de Improbidade, além das inúmeras e significativas mudanças, contemplou o que há muito já era preconizado pela doutrina e jurisprudência no que tange à aproximação de institutos do Direito Penal para o novo ramo do Direito Administrativo Sancionador.

A intenção do legislador no que concerne a essa aproximação, de praticamente emprestar conceitos do Direito Penal para a esfera da improbidade, foi exatamente impor limites à persecução estatal e à propositura descontrolada de ações de improbidade, sem elementos concretos aptos a aferir justa causa.

Nesse sentido, já tivemos a oportunidade de discorrer [1]: "Com a nova sistemática, ao adotar no âmbito da lei de improbidade os princípios do direito administrativo sancionador, o legislador nada mais fez do que limitar o poder persecutório do estado, ampliando o espectro de garantias constitucionais aos demandados e afastando do intérprete o manejo indevido de ações, notadamente pelo fato da antiga redação possuir conceitos extremamente abertos e nocivos aqueles que figuram no polo passivo da ação de improbidade".

No que tange a essa interface, foi assim por exemplo ao trazer a previsão e o conceito de dolo como elemento subjetivo para tipificação dos atos de improbidade, a exclusão da modalidade de improbidade culposa, a necessária individualização da conduta que se aproxima ao artigo 41 do CPP [2], a prescrição intercorrente que já existia no Direito Penal, bem como outros institutos que passaram a imperar mais forte após a previsão expressa do artigo 1º, §4º: "Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta Lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador".

Se não bastasse toda essa normativa agora expressa, o legislador trouxe o que há tempos era aguardado pela melhor doutrina no sentido que a absolvição criminal deve surtir efeitos na ação de improbidade, independentemente da causa de absolvição.

Na antiga sistemática, até por conta do princípio da independência das instancias (artigo 935 CC [3]), bem como pela previsão do artigo 65 do CPP [4], apenas a sentença penal que reconhecesse as excludentes de ilicitude ali mencionadas bem como a inexistência material do fato (interpretação a contrário sensu do artigo 66 do CPP [5]) poderiam fazer coisa julgada no âmbito cível.

Ou seja, as demais causas de absolvição criminal prevista no artigo 386 do CPP [6], embora o sujeito fosse absolvido na esfera criminal, continuava a responder e podendo ser condenado na esfera da ação de improbidade justamente pelo fato da responsabilidade civil ser independente da criminal.

Na prática, isso equivale a dizer por exemplo que várias pessoas que foram absolvidas no âmbito criminal por atipicidade de conduta (artigo 386, III do CPP) pelo mesmo fato que gerou ambas as ações (penal e improbidade), acabavam respondendo eternamente pela ação de improbidade, pois aquela causa específica de absolvição não fazia coisa julgada no âmbito cível. É dizer: o fato não constituía crime, mas poderia configurar improbidade administrativa

Para colocar fim a essa controvérsia, e na linha da aproximação com institutos do Direito Penal, o legislador trouxe a previsão expressa na nova lei do §4º no artigo 21 da LIA, que passou a possuir a seguinte redação: "A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no artigo 386 do Decreto-Lei 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal)".

Isso significa dizer que agora, independentemente da causa de absolvição criminal e independentemente do trânsito em julgado, o resultado dessa influencia diretamente na ação de improbidade, desde que a absolvição discuta os mesmos fatos e a decisão seja confirmada pelo tribunal.

Com efeito, malgrado o legislador se refira à confirmação por decisão colegiada, nada obsta que a sentença absolutória seja apenas em primeiro grau, notadamente naqueles casos em que não há recurso por parte do autor da ação. Essa parece ser a melhor a interpretação.

Por fim, ainda nessa direção, o próprio parágrafo 3º do artigo 21 da 14.230/2021 estabelece que "as sentenças civis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria", sem fazer qualquer ressalva à decisão colegiada.

[1] https://odocumento.com.br/valber-melo-nova-lei-de-improbidade-e-suas-significativas-mudancas/

[2] "Artigo 41 - A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas".

[3] "Artigo 935 - A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal".

[4] "Artigo 65 - Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito".

[5] "Artigo 66 - Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato".

[6] "Artigo 386 - O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

I - estar provada a inexistência do fato;

II - não haver prova da existência do fato;

III - não constituir o fato infração penal;

IV - estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

V - não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

VI - existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (artigos 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do artigo 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

VII - não existir prova suficiente para a condenação. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)".

Os autores deste artigo, Viviane Melo é especialista em Direito Público, pós-graduada em Direito Eleitoral, pós-graduanda em Direito Minerário e Ambiental e advogada do escritório Valber Melo Advogados Associados; e

Valber Melo é advogado criminalista, professor de Direito Penal e Processual Penal, doutor em direito pela UMSA, especialista em Direito Penal Econômico, especialista em Direito Penal e Processual Penal, especialista em Direito Público, pós-graduado em ciências criminais, autor de livros e artigos jurídicos e conselheiro nacional da Abracrim-MT.

Publicado originalmente no Consultor Jurídico, em 01.03.22.

A guerra cibernética paralela entre Rússia e Ucrânia

Além de tanques e mísseis, os hackers agora são parte integral de ofensivas que visam desmantelar a infraestrutura de um país e gerar choques de efeito psicológico na população.

Ataque cibernético envolveu o envio em massa de mensagens SMS aos celulares da população ucraniana dizendo que todos os caixas eletrônicos no país estavam inoperantes para saque - uma informação falsa (Sopa / Getty Images)

Semanas antes dos ataques militares da Rússia escalarem para a atual intensidade e força de destruição em terra, a Ucrânia já era alvo de ações no ciberespaço. Já é realidade um novo tipo de conflito: a guerra híbrida.

Além de tanques e mísseis, os hackers agora são parte integral de ofensivas que visam desmantelar a infraestrutura de um país e gerar choques de efeito psicológico na população.

No domingo (27/02), o encarregado de negócios da Ucrânia no Brasil, Anatoliy Tkach, disse que o site oficial da embaixada (que fica sob a estrutura de internet do governo ucraniano) e o e-mail dos funcionários estavam fora de operação devido a "ataques cibernéticos maciços".

Tkach disse que a embaixada está respondendo aos contatos pelas suas páginas nas redes sociais.

Duas semanas atrás, o governo ucraniano informou que quatro importantes websites - dois ligados às forças militares e dois pertencentes ao sistema bancário do país - sofreram um ataque conhecido como DDoS (Distributed Denial of Service ou, em inglês, ataque distribuído de negação de serviço).

Nesse tipo de ação, hackers geram artificialmente uma carga de acesso muito acima da capacidade da página para que ela fique indisponível aos usuários.

Sites e infraestrutura de internet da Ucrânia têm sido alvo de ataques desde a anexação da Crimeia em 2014 (Sergei Konkov / Getty Images)

Ao menos um dos ataques, como revelou a BBC, foi ligado a hackers amadores que se identificavam como "patriotas russos".

Essa comunidade de hackers, a princípio sem ligação com o governo Putin, também enviou 20 mensagens a escolas ucranianas com ameaças de bomba.

Outra investida foi o envio em massa de mensagens SMS aos celulares da população ucraniana dizendo que todos os caixas eletrônicos no país estavam inoperantes para saque - uma informação falsa.

O governo russo negou em comunicado qualquer envolvimento nessas ações e afirmou que nunca conduziu e não conduz nenhuma operação "maliciosa" no ciberespaço.

Rússia investe nesse campo

Para Luca Belli, professor da FGV Direito Rio e coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV, "esses são os últimos de uma longa série de ataques [cibernéticos] russos na Ucrânia".

"É importante destacar que desde a anexação da Crimeia em 2014 os russos vêm desenvolvendo competências de ponta no âmbito de ciberataque e ciberdefesa. Ou seja, ao longo desse tempo eles vêm testando, experimentando e até implementando essas tecnologias em uma escala ampla."

Belli lembra os efeitos do NotPetya, de 2017, considerado o maior ciberataque da história e que também envolve a Rússia (os hackers foram ligados ao setor de inteligência do governo) e a Ucrânia (a companhia nacional de energia e o principal aeroporto do país foram afetados, para destacar alguns dos distúrbios).

"80% da Ucrânia ficou paralisada por causa do NotPetya. Para dar um exemplo concreto: o sistema de monitoramento de radiação em Chernobyl ficou desativado por várias horas. Imagine o componente psicológico desse tipo de ataque, que deixa o alvo completamente perdido", diz o professor da FGV.

Uma estratégia ao longo dos anos tem sido embutir pacientemente dentro da infraestrutura ucraniana portas para explorar vulnerabilidades (Tomohiro Ohsumi / Getty Images).

Outra estratégia ao longo dos anos tem sido embutir pacientemente dentro da infraestrutura ucraniana diversos backdoors - pontos ou portas de acesso para explorar vulnerabilidades e permitir a tomada de controle pelos hackers.

Nos últimos dias, destaca Belli, um tipo de ataque comum no conflito Rússia-Ucrânia tem sido o que usa software do tipo data wiper (apagador de dados).

"É um software malicioso que infecta e apaga bancos de dados. Imagine o caos que pode ser provocado se a infraestrutura de internet das forças militares perder todos os seus arquivos."

"Essa é uma guerra híbrida, uma guerra que combina as táticas bélicas clássicas - invasão com tropas e tanques - às estratégias cibernéticas", afirma o professor da FGV.

Países com pouca infraestrutura tecnológica ou que não desenvolvem de forma eficiente esquemas de defesa online estarão mais vulneráveis nesse novo cenário.

Efeito psicológico da guerra cibernética

A ideia militar de desnortear o adversário vem servindo de base para ofensivas hackers nessa guerra. Derrubar a rede de celular e internet tem como objetivo instaurar pânico ao impedir que a população de um país sob ataque se comunique.

"O objetivo é criar confusão, é fazer com que as pessoas se sintam perdidas. Disparar em massa desinformação é parte de uma guerra psicológica, para minimizar as chances de os ucranianos terem uma reação", afirma Luca Belli.

"Foi o que aconteceu nos últimos dias. Foi difundido que o presidente ucraniano tinha fugido do país e depois ele postou vídeos mostrando que isso não era verdade. Imagine o efeito de espalhar que o próprio presidente já abandonou o país. O efeito psicológico é devastador nas pessoas."

Shin Suzuki, de S. Paulo para a BBC News Brasil, em 29.02.22

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Jair imponderável II

Judiciário e Ministério Público enfrentam operação para desacreditar as eleições, Artigo de William Waack hoje no Estado de S. Paulo

Profissionais em pesquisas e caciques políticos mantêm a suposição de que Jair Bolsonaro (PL) é o candidato mais fácil de ser derrotado. Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

A recuperação de Jair Bolsonaro registrada em algumas pesquisas não altera até aqui a forte probabilidade de que ele perderá as eleições. Profissionais em pesquisas e caciques políticos mantêm a suposição de que é o candidato mais fácil de ser derrotado.

Como Bolsonaro pretende reagir? Esferas do Judiciário e do Ministério Público preparam-se para uma contestação dos resultados, baseada na afirmação (falsa) de que o sistema eleitoral é viciado por juízes e pelos equipamentos eletrônicos. 

A operação para desacreditar as eleições está em curso. Há dúvidas sobre a existência de uma ordem de “Estado-Maior” para declarar as eleições como fraudulentas, mas o notável aumento de volume de fake news nessa direção sugere algum tipo de esforço centralmente coordenado.

O subprocurador-geral eleitoral, Paulo Gonet, admitiu que propagar falsidades sobre o sistema eleitoral constitui fake news e, portanto, passível de punição – e é ele quem denuncia. O mesmo dizem o presidente que sai e o presidente que entra no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O próximo na fila, Alexandre de Moraes, preside no Supremo Tribunal Federal (STF) o inquérito sobre fake news, cujo alvo principal é o campo bolsonarista.

Diante do que sempre foi impossível de se coibir – mentir sobre o adversário –, o aparato jurídico de supervisão e controle das eleições brasileiras está se concentrando em proteger a própria instituição. A questão é: o TSE cassaria uma candidatura envolvida diretamente, como a de Bolsonaro, na ampla operação de desacreditar as eleições?

Quando se podia, no caso do julgamento da chapa Bolsonaro-Mourão, e não se cassou a chapa, o argumento dos ministros era o de que não se poderia criar enorme instabilidade institucional. O TSE não cassa figurões, e esse entendimento se mantém. “Só em último caso”, acaba de dizer o novo presidente da Corte, ministro Edson Fachin.

Ocorre que mais de um integrante dos tribunais superiores considera não ser elucubração absurda um cenário no qual Bolsonaro contesta o resultado das urnas, incentiva seguidores a protestar nas ruas, polícias militares estaduais fazem corpo mole, desobedecendo a governadores, e caberia então ao STF chamar as Forças Armadas para uma operação de manutenção de ordem – sendo que o comandante delas é Bolsonaro.

Os conselheiros do Centrão têm recomendado a Bolsonaro comportamento político equivalente a canja de galinha. Para eles, a figura do presidente ainda reúne condições para ajudar a formar bancadas fortes, com as quais se manterão em situação confortável não importa o novo presidente.

Precisa saber se Bolsonaro gosta do prato.

William Waack, o autor deste artigo, é Jornalista e Apresentador do Jornal da CNN. Publicado originalmente n'O Estado de S. Paulo, em 28.02.22

Como Volodmir Zelenski mobilizou os ucranianos e o mundo contra Putin

Com a decisão de permanecer em Kiev e um excelente uso das mídias sociais, presidente ucraniano convenceu lideranças e incentivou nacionais a defender o país

O presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, caminha pelas ruas de Kiev durante invasão russa Foto: Reprodução Facebook via AFP

Antes de a Rússia invadir a Ucrânia, o presidente Volodmir Zelenski​ era frequentemente tomado como um comediante que se tornou um político improvável. Mas com a ajuda das redes sociais, ele se tornou o líder que a Ucrânia não sabia que precisava.

Vestido com uma camiseta verde de lã do exército, com a barba por fazer e pálido, Zelenski ​inspirou os ucranianos a lutar por seu país - e os europeus a ver a Ucrânia sob uma luz diferente, como uma vítima de agressão que luta bravamente por independência, liberdade e democracia.

A decisão de Zelenski  de permanecer na capital, Kiev, enquanto o país permanece sob ataque russo - e a de sua família de permanecer na Ucrânia - comoveu muitos. É um contraste particular com o presidente afegão, Ashraf Ghani, que fugiu de Cabul assim que o Taleban chegou na periferia da capital, desmoralizando o que restava do exército afegão.

Ele e sua equipe também fizeram um excelente uso das mídias sociais, com discursos apaixonados mostrando sua presença nas ruas de Kiev se tornando virais. Ucranianos comuns estão relatando os eventos na Ucrânia no TikTok. Alguns fazem vídeos saudando Zelensky e mostram ucranianos fazendo o que podem para repelir os russos – enchendo garrafas destinadas a coquetéis molotov, oferecendo-se para lutar, recebendo armas automáticas e prometendo defender seu país.

A resposta de Zelenski a uma oferta americana de tirá-lo da Ucrânia - "preciso de munição, não de uma carona" - provavelmente ficará na história do pais, quer ele sobreviva ou não a esse ataque.

Mas Zelenski também inspirou líderes europeus a fazer mais pela Ucrânia. Aparecendo na tela durante a cúpula de emergência da União Europeia em 24 de fevereiro, ele fez um discurso apaixonado de 10 minutos que levou alguns mandatários relutantes a endossar um pacote mais severo de sanções econômicas à Rússia, disse um alto funcionário europeu.

A sua intervenção vai ficar para a história, disse o responsável que se encontrava na sala. Foi muito emocionante, os líderes foram profundamente afetados, acrescentou. 

O silêncio na sala foi impressionante e o impacto foi claro, acrescentou o funcionário, e deu a impressão de que fez uma grande diferença ao persuadir países mais relutantes, como Alemanha, Itália e Hungria, a concordar com sanções financeiras e bancárias mais duras e entregar armas à Ucrânia.

"Esta pode ser a última vez que vocês vão me ver vivo", disse Zelenski.

As ações de Zelenski e os esforços de resistência de homens e mulheres ucranianos comuns – retardando o avanço russo e se voluntariando para lutar com armas automáticas – também tiveram um impacto importante na opinião europeia, dizem autoridades, facilitando que seus líderes fossem mais ousados e aceitassem os refugiados vindos da Ucrânia.

Steven Erlanger/The New York Times, O Estado de S.Paulo, em 28 de fevereiro de 2022 | 17h58

Da universidade aos militares na Ucrânia: "Tenho que ajudar a proteger meu país contra os terroristas russos"

Milhares de voluntários civis se unem à resistência para repelir o avanço das tropas de Putin.

Civis ucranianos preparam 'coquetéis molotov' no Dnipro, neste domingo. (Foto:STANISLAV KOZLIUK (EFE)

Um mês atrás, Lev Tiskin estava jogando videogames online e saindo com seus amigos para beber quase todo fim de semana. Eu tinha acabado de começar meu primeiro ano na faculdade, escola de negócios, e sonhava com férias de primavera em algum lugar quente e na praia. Hoje, o jovem de olhos azuis acinzentados carrega uma mochila pendurada no ombro com algumas mudas de roupa e espera entre dezenas de pessoas em um prédio da administração do Dnipro por instruções, talvez uma arma, e para partir para o local designado. destino, defender a cidade. "Tenho que ajudar a proteger meu país dos terroristas russos", diz ele.

Enquanto a Rússia intensifica sua ofensiva contra a Ucrânia e aumenta sua ameaça ao colocar suas armas nucleares em alerta, milhares de voluntários em todo o país arregaçaram as mangas e se juntaram a brigadas de defesa territorial, batalhões voluntários ou grupos de proteção. Eles se preparam para a guerra total. As tropas enviadas por Vladimir Putin, que invadiram pelos três flancos - norte, leste e sul - e atacaram por terra, mar e ar , já encontraram resistência não só do Exército ucraniano, que tenta conter seu avanço, mas também de parte de grupos de civis que, com ou sem armas, tentam proteger suas cidades e vilas e repelir o ataque de tropas que dobram o número e a força dos ucranianos. Em quatro dias de guerra, Moscou ainda não conquistou nenhuma cidade importante; embora sitie Kiev e Kharkiv .

Em Dnipro, lar de quase um milhão de pessoas, onde quase todas as entradas da cidade são guardadas por soldados armados, voluntários colocam armadilhas de tanques e sacos de areia. As tropas russas não chegaram à cidade no centro-leste da Ucrânia, com maioria de língua russa e uma grande comunidade judaica. Embora neste domingo os alarmes de ataques antiaéreos soaram fortemente. Também ao lado do Parque da Amizade dos Povos, onde Tiskin e seus amigos esperam.

O alarme troveja acima das vozes com uma indicação clara: "Corra, proteja-se". E uma enxurrada de pessoas corre e se agacha contra as paredes de um prédio próximo ou se amontoa no chão. Os pontos de recrutamento são os principais alvos. Se antes Tiskin, de 18 anos, dizia estar "um pouco assustado", agora ele admite que está com medo. "Meus pais não gostaram nem um pouco. Eles tentaram me impedir, mas eu vim mesmo assim. Tenho que fazer algo. Caso contrário, em alguns dias pode não haver mais Ucrânia”, diz ele.

Olga, vestida de calça de moletom cinza e penas azuis, acaba de receber um rifle. "Sempre fui um pacifista, mas trata-se de proteger os meus", diz ele. Ele tem 33 anos e um filho de nove anos. Ele é economista e trabalha em uma agência. Quando a Rússia reuniu dezenas de milhares de tropas ao longo das fronteiras ucranianas e grupos de defesa territorial , administrados pelo Ministério da Defesa, começaram a se formar, ele se alistou. Mais para proteção, para segurança, para aprender a fazer torniquetes e primeiros socorros. "Achei que no final não seria necessário, mas isso não é um exercício", diz ele. Ele garante que, se tiver que usar, o fará sem hesitação: “É um pesadelo. Putin está atrás de nós. E então ele irá para a Europa.”

Da esquerda para a direita: Danil, Danil, Lev e Sascha, 18 anos, que se alistaram nas forças de Defesa Territorial e esperavam no Dnipro neste domingo para serem mobilizados.

Agora, Olga espera por um carro que a levará para defender um objetivo que ela não pode revelar. As Brigadas de Defesa Territorial, que o Ministério definiu como “força de resistência” e dissuasora, protegem infraestruturas básicas, como pontes, estradas, túneis. O economista gosta desse conceito de resistência. Ele garante que todos em seu ambiente estejam prontos para contribuir para a defesa. “Putin é um idiota. Isso nos uniu mais, se possível. A Ucrânia passará neste teste e sairá mais forte e com honra”, diz ele.

Tutoriais da Internet para preparar um 'coquetel Molotov'

Quando o presidente russo anunciou a "operação militar em Donbas" para "desnazificar" a Ucrânia - um ataque que na verdade se transformou em uma guerra aberta em todo o país - o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, pediu à população que se acalmasse e resistisse. Após um dia de ataques a infraestruturas estratégicas e cerco de cidades-chave como Kiev, a capital, ou Kharkov, Zelensky convocou a população civil para ajudar na defesa com tudo ao seu alcance. como coquetéis molotovque dezenas de pessoas se preparam numa praça do Dnipro, onde se organiza uma maré de pessoas para cortar tiras de poliestireno, preparar garrafas de cerveja, enchê-las com líquido inflamável para fazer uma bomba caseira, embalar caixas, organizar mantimentos e preparar carros de voluntários que reparam explosivos domésticos.

Natalia Valeriovna prepara 'coquetéis molotov', este domingo no Dnipro.

Dois dias atrás, Natalia Valerievna aprendeu a fazer um coquetel molotov usando instruções que encontrou na Internet. Mas agora, na Ucrânia, vários meios de comunicação e até o rádio dão instruções aos civis para preparar o explosivo. Natalia (que prefere dar-lhe o patronímico e não o sobrenome) diz que não pensou —e prefere não pensar— na possibilidade de ter que usá-lo. Significaria o cerco de Dnipro, às margens do rio Dnieper, a chegada de tropas russas e a saída dos sabotadores que, segundo o Governo, se infiltraram em cidades de todo o país prontos para agir a qualquer momento. “Contribuo mais com tarefas organizacionais”, diz o engenheiro de 37 anos, “mas estou preparado para lutar pela minha vida. E se isso significa jogar um explosivo em um tanque ou em alguém, eu o faria."

Em 2014, quando a Rússia invadiu e anexou a Crimeia em um referendo ilegal e a guerra de Donbas eclodiu contra separatistas pró-Rússia apoiados por Moscou, Kiev já recorreu a batalhões voluntários para tentar compensar as deficiências de seu exército desorganizado e mal equipado . Então, grupos paramilitares —alguns com raízes claras da extrema direita e da ideologia neonazista, que pescam tão bem em territórios em conflito— foram lutar no leste.

Desta vez é diferente. A maioria desses grupos passou a formar uma unidade dentro do Exército e a mobilização que está ocorrendo nos dias de hoje no Dnipro e na maioria das cidades ucranianas tem mais a cor da resistência civil em todas as estruturas: de voluntários para levar comida aos soldados, doar sangue para os feridos, preparar material para as barricadas, fazer cumprir o toque de recolher, organizar batalhões de cibervigilância ou sair às ruas nas brigadas de defesa.

Não há lugar no batalhão de Alexander Klasko. Eles preencheram todos os cargos e estão rejeitando pessoas, diz este motorista de 57 anos. Veterano da guerra no Afeganistão, lutou em Cabul e Kandahar em 1982. Com um rifle no ombro, ele explica que se alistou logo após Putin lançar a invasão porque sua experiência militar pode ser útil. "Guerra é guerra, o que posso dizer, mas esta é a nossa casa e não podemos deixar ninguém entrar sem permissão."

Maria R. Sahuquillo, a autora deste artigo, é Correspondente do El País em Moscou, de onde cobre Rússia, Ucrânia, Bielorrússia e o resto do espaço pós-soviético. Anteriormente, foi enviada especial para grande cobertura e tratou com os países da Europa Central e Oriental. Ela passou quase toda a sua carreira no EL PAÍS e, além de questões internacionais, é especializada em questões de igualdade e saúde. Publicado originalmente em 28.02.22.

Lavagem de dinheiro é o calcanhar de Aquiles de Putin

A arma mais poderosa é perseguir as fortunas dos oligarcas no exterior, que respondem por 85% do PIB do país. Artigo de Paul Krugman hoje no El País.

Vladimir Putin, presidente da Rússia, em 24 de fevereiro. (ALEKSEY NIKOLSKYI (EFE)

Os Estados Unidos e seus aliados não vão intervir com suas próprias forças contra a invasão da Ucrânia por Vladimir Putin . Deixarei para outros com experiência no assunto adivinharem se enviaremos mais armas ao governo ucraniano ou, no caso de o ataque russo atingir rapidamente seu objetivo, ajudaremos a armar a resistência ucraniana.

No entanto, a resposta do Ocidente à brutal agressão de Putin consistirá principalmente em sanções financeiras e econômicas . Até que ponto essas sanções podem ser eficazes? A resposta é que podem ser muito assim se o Ocidente estiver disposto e disposto a assumir sua própria corrupção.

Pelos padrões convencionais, o regime de Putin não parece muito vulnerável , pelo menos no curto prazo. É verdade que a Rússia acabará pagando um preço alto. Não haverá mais acordos sobre gasodutos e quase nenhum investimento estrangeiro direto. Afinal, quem iria querer assumir compromissos duradouros com um país cuja liderança autocrática mostrou um desrespeito tão imprudente pelo Estado de direito? Mas essas consequências da agressão de Putin levarão anos para se tornarem visíveis. E quando se trata de sanções comerciais, parece que o escopo é limitado. Por isso podemos e devemos culpar a Europa, que tem muito mais relações comerciais com a Rússia do que os Estados Unidos.

Infelizmente, os europeus permitiram-se desnecessariamente tornar-se extremamente dependentes das importações russas de gás natural. Isso significa que, caso tentassem cortar totalmente as exportações russas, imporiam a si mesmos escassez e preços altíssimos. Se a provocação atingir um nível suficiente, eles poderão fazê-lo; as economias avançadas modernas podem ser incrivelmente resilientes em tempos de necessidade.

Mas mesmo a invasão da Ucrânia pode não ser suficiente para persuadir a Europa a fazer tais sacrifícios. É revelador, e não no bom sentido, que a Itália quer bens de luxo – que a elite russa adora comprar – excluídos do pacote de sanções.

Sanções financeiras, que reduziriam a capacidade da Rússia de levantar e movimentar dinheiro no exterior, são mais fáceis de aplicar e, de fato, na quinta-feira, o presidente Biden anunciou que reprimiria os bancos russos. Mas os efeitos serão limitados, a menos que a Rússia seja excluída do SWIFT, o sistema de pagamentos interbancários com sede na Bélgica. E a exclusão do SWIFT poderia efetivamente significar a interrupção do fornecimento de gás russo, o que nos traz de volta ao problema da vulnerabilidade auto-infligida da Europa.

Mas as democracias avançadas do mundo têm outra arma financeira poderosa contra o regime de Putin, se estiverem dispostas a usá-la: podem ir atrás das vastas fortunas ultramarinas dos oligarcas que cercam Putin e ajudá-lo a permanecer no poder.

Todo mundo já ouviu falar dos gigantescos iates desses personagens, suas franquias esportivas e suas residências incrivelmente caras em vários países. Na Grã-Bretanha há tanto dinheiro russo em exibição que alguns falam de Londongrad. E não são histórias isoladas.

Filip Novokment, Thomas Piketty e Gabriel Zucman apontaram que a Rússia registra enormes superávits comerciais todos os anos desde o início dos anos 1990, o que deveria ter levado a um grande acúmulo de ativos estrangeiros. No entanto, de acordo com estatísticas oficiais, os ativos da Rússia fora de suas fronteiras excedem apenas moderadamente seus passivos. Como é possível? A explicação óbvia é que os russos ricos têm recebido grandes somas e as depositado em outros países.

Os números em questão são impressionantes. Novokment e coautores calculam que, em 2015, as fortunas escondidas no exterior de russos ricos eram equivalentes a cerca de 85% do PIB de seu país. Para colocar as coisas em perspectiva, é como se os comparsas de um presidente americano tivessem conseguido esconder US$ 20 trilhões em contas no exterior. Outro artigo co-assinado por Zucman descobriu que, na Rússia, "a grande maioria das grandes fortunas está no exterior". Até onde sei, a visibilidade da elite russa no exterior não tem precedentes na história e cria uma enorme vulnerabilidade que o Ocidente pode explorar.

Agora, os governos democráticos podem ir atrás desses ativos? Sim. A meu ver, a base legal já existe, por exemplo, no Countering America's Adversaries Through Sanctions Act, e também a capacidade técnica. De fato, a Grã-Bretanha congelou os ativos de três comparsas proeminentes de Putin no início desta semana e pode fazer o mesmo com muitos outros.

Portanto, temos os meios para exercer uma enorme pressão financeira sobre o regime de Putin (e não sobre a economia russa), mas estamos dispostos a fazê-lo? Esta é a pergunta de um trilhão de rublos. Dois fatos desconfortáveis ​​se apresentam neste momento. A primeira é que existem algumas pessoas influentes, tanto nos negócios quanto na política, que compartilham profundas complicações financeiras com cleptocratas russos. Isto é especialmente verdade na Grã-Bretanha. A segunda é que será difícil ir atrás de dinheiro russo lavado sem dificultar a vida de todos que lavam, de onde quer que venham. E enquanto os plutocratas russos podem ser os campeões mundiais neste esporte, eles certamente não são os únicos: os mega-ricos de todo o planeta têm dinheiro guardado em contas offshore.

O que isso significa é que tomar uma ação efetiva contra o ponto mais fraco de Putin exigiria confrontar e derrotar a própria corrupção do Ocidente. O mundo democrático pode enfrentar esse desafio? Veremos nos próximos meses.

Paul Krugman, o autor deste artigo, é Prêmio Nobel de Economia. Publicado originalmente pelo The New York Times. Tradução para o espanhol publicada pelo EL PAÍS, em  26.02.22.