quarta-feira, 28 de abril de 2021

Ivermectina: de tratamento para gado ao Nobel, a história do remédio sem eficácia comprovada contra covid-19

"Ela foi uma maravilha para a pecuária. Os rebanhos costumavam sofrer muito com verminoses intestinais, que fazem os animais perderem peso, e com os carrapatos, que se fixam no couro e inviabilizam seu uso comercial", descreve o biólogo Carlos Eduardo Winter, professor do Departamento de Parasitologia do ICB-USP.

Em pouco tempo, o medicamento começou a ser usado em larga escala em bois, cavalos, porcos e ovelhas.

A história da ivermectina começou num lugar bastante inusitado: um campo de golfe. (Crédito da foto: Getty Images).

Os moradores de alguns vilarejos na África Central tinham duas certezas na vida: a primeira era que, na infância e no início da adolescência, eles precisariam guiar e auxiliar os familiares e vizinhos mais velhos, a maioria deles vítima de cegueira.

E o destino inexorável se certificava que, após os 20 e poucos anos de idade, eles também seriam acometidos pela deficiência visual e necessitariam do auxílio dos mais jovens para sobreviver.

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O drama, que se repetia geração após geração, era causado pelo verme Onchocerca volvulus, transmitido pela picada de mosquitos borrachudos muito comuns nessa região (e também na América Latina e no Iêmen).

O parasita pode viver escondido no corpo por até 15 anos — com o passar do tempo, ele libera milhões de larvas microscópicas que afetam a pele, o sistema linfático e o nervo óptico, que nos dá a capacidade de ver o mundo.

O quadro, conhecido como oncocercose ou cegueira dos rios, ainda afeta cerca de 18 milhões de pessoas todos os anos.

A condição acomete principalmente um grupo de 28 países africanos, que respondem por 99% dos casos.

A cada 12 meses, um total de 6,5 milhões de pessoas desenvolvem sintomas da infecção, como lesões na pele e dificuldade para enxergar.

Dessas, 270 mil perdem a visão de forma definitiva.


Essa foto, tirada nos anos 1970, retrata três vítimas da "cegueira dos rios" num povoado da África Central. (Crédito da foto: Getty Images)

Mas a situação já foi ainda pior e só começou a melhorar a partir 1988, com a adoção de um remédio que acabara de ser aprovado para uso em humanos: a ivermectina.

No final dos anos 1980, esse medicamento passaria a fazer parte de um gigantesco programa de doação e alcançaria um dos maiores sucessos de saúde pública da história recente.

Mas para entender como esse fármaco saiu das bancadas de laboratórios, mudou a realidade do mundo e voltou aos holofotes durante a pandemia de covid-19 por causa de disputas politizadas em torno de sua suposta eficácia (que ainda não foi comprovada por estudos científicos rigorosos), é preciso voltar ao ano de 1973 e acompanhar uma descoberta inusitada que aconteceu num campo de golfe da cidade de Ito, no Japão.

Ali começaria a história que mudaria a vida de milhões de pessoas pelos próximos anos.

Surpresas da terra

Desde o início de sua carreira, o bioquímico japonês Satoshi Õmura se especializou em estudar a produção de moléculas por micro-organismos.

Sua ideia era identificar moléculas com potencial farmacológico, que poderiam eventualmente ser utilizadas como tratamento para várias doenças.

Vale lembrar que esse tipo de pesquisa já rendeu grandes avanços à humanidade. A penicilina, o primeiro antibiótico da história, por exemplo, foi obtida pela primeira vez a partir de uma colônia de fungos, cultivada em 1928 pelo cientista escocês Alexander Fleming.

No início dos anos 1970, o trabalho de Õmura no Instituto Kitasato, em Tóquio, consistia em coletar amostras do solo e investigar o comportamento dos seres microscópicos que viviam ali.

As substâncias que mostravam algum potencial eram então enviadas aos laboratórios da farmacêutica Merck, Sharpe & Dome (MSD), nos Estados Unidos, onde passavam por uma nova rodada de testes mais aprofundados.

Foi assim que surgiu a ivermectina: o bioquímico japonês coletou um pouco de terra nas cercanias de um campo de golfe da cidade de Ito, que fica a 130 quilômetros de Tóquio.

"Foi lá que ele descobriu uma cepa da bactéria Streptomyces avermitilis", conta o microbiologista Gabriel Padilla, coordenador do Laboratório de Bioprodutos do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP).

Nas análises, Õmura isolou uma molécula chamada avermectina, que parecia ter algum potencial para inibir vermes, insetos e aracnídeos.

O material foi entregue aos colegas americanos em 1974. Cinco anos depois, foram publicados os primeiros artigos científicos que descreviam a molécula e suas propriedades.

Após uma série de experimentos que perduraram até o final dos anos 1970, um time da MSD liderado pelo bioquímico irlandês e americano William Campbell chegava à formulação final do novo medicamento.

Nascia, assim, a ivermectina.

Mas a droga ainda demoraria quase uma década para chegar aos seres humanos: antes, ela seria usada por um bom tempo na medicina veterinária.

Remédio para gado

As experiências iniciais indicavam que a ivermectina era uma ótima molécula para tratar dois tipos de parasitas: aqueles que se instalam no sistema digestivo ou na pele.

"Ela foi uma maravilha para a pecuária. Os rebanhos costumavam sofrer muito com verminoses intestinais, que fazem os animais perderem peso, e com os carrapatos, que se fixam no couro e inviabilizam seu uso comercial", descreve o biólogo Carlos Eduardo Winter, professor do Departamento de Parasitologia do ICB-USP.

Em pouco tempo, o medicamento começou a ser usado em larga escala em bois, cavalos, porcos e ovelhas.

Nos primeiros cinco anos após seu lançamento, a ivermectina foi aprovada em 46 países e chegou a ser aplicada em quase 500 milhões de animais.

Seu uso nos Estados Unidos chegou a quase extinguir um verme chamado Onchocerca cervicalis, que afeta os cavalos e representa um verdadeiro pesadelo para os criadores.

Com o sucesso da aplicação no universo da veterinária, os cientistas puderam entender um pouco mais a fundo o mecanismo de ação do medicamento no combate aos vermes.

A ivermectina "paralisa" e "mata de fome" vermes como o Onchocerca volvulus (no centro da imagem), causador da cegueira dos rios. (Crédito da foto: Getty Images)

"Sabe-se que a ivermectina atua no sistema nervoso dos parasitas, causando uma paralisação do organismo deles", detalha o parasitologista Marcelo Beltrão Molento, professor da Universidade Federal do Paraná.

"Eles deixam de comer e de ter trocas com o hospedeiro. Com o tempo, morrem aos poucos e são metabolizados", completa.

Esse processo de matar os vermes acontece de forma relativamente lenta — e isso é essencial para o sucesso da terapia medicamentosa.

Se a ivermectina aniquilasse todos os parasitas numa só tacada, isso poderia causar uma inflamação no corpo, que não teria condições de lidar com tantos "bichos mortos" de uma só vez.

Com os bons resultados na pecuária no início dos anos 1980, chegava a hora de entender se o remédio seria capaz de repetir o mesmo sucesso quando usado em seres humanos.

Mudança de paradigma

Os testes clínicos que avaliaram o uso do medicamento contra verminoses que atingem as pessoas se arrastaram entre 1982 e 1986.

Em 1987, a ivermectina ganhou na França seu primeiro reconhecimento como tratamento médico.

Nesse mesmo ano, a MSD, farmacêutica detentora dos direitos comerciais do produto, assinou um acordo com a Organização Mundial da Saúde e outras instituições em que se comprometeu a fazer doações de doses por tempo ilimitado.

O objetivo? Eliminar definitivamente a oncocercose da face da Terra.

Desde então, a ivermectina é distribuída gratuitamente em países da África e da América Latina.

Nos locais onde essa parasitose é comum, os moradores chegam a receber as doses todos os anos, como tratamento profilático, até que a doença seja controlada e eliminada daquela região.

Esse foi o primeiro programa massivo de doação de drogas da história e está ativo até hoje, com mais de 4 bilhões de doses distribuídas para 49 países.

Com 34 anos, o programa já produziu inúmeros resultados significativos, com mais de 300 milhões de pessoas tratadas todos os anos.

Conquistas na América Latina

"Em nossa região, a iniciativa começou em 1992 e nós já conseguimos eliminar a oncocercose de quatro países: Colômbia, Equador, México e Guatemala", relata o médico Mauricio Sauerbrey, diretor do programa de eliminação da doença nas Américas mantido pelo Carter Center, uma instituição sem fins lucrativos criada pelo ex-presidente americano Jimmy Carter.

Por ora, a cegueira dos rios só persiste em dois lugares da América Latina: Brasil e Venezuela.


Indígena recebe comprimido de ivermectina no maior programa de doação de medicamentos do mundo. A oncocercose já foi eliminada de quatro países latino-americanos e só é encontrada atualmente na divisa entre Brasil e Venezuela. (Crédito da foto: Getty Images)

"Os casos se concentram em regiões de difícil acesso, como as áreas de fronteira na Floresta Amazônica, e afetam principalmente populações nômades que vivem em comunidades muito pequenas, como os ianomâmis. É mais difícil encontrá-los e oferecer o tratamento duas vezes ao ano", detalha Sauerbrey.

"Mas tenho certeza que também vamos ser bem-sucedidos no Brasil e na Venezuela e teremos boas notícias para compartilhar nos próximos anos", acredita o especialista.

Resultados na África

Do outro lado do Atlântico, os resultados também são considerados excelentes, embora nenhum país tenha eliminado a doença definitivamente de seu território.

De acordo com relatórios disponibilizados no site da Organização Mundial da Saúde, o número de pacientes com oncocercose caiu 61% nas regiões africanas beneficiadas pelo projeto.

No mesmo período, a notificação de casos de cegueira relacionados à infecção foi reduzida pela metade.

Além da cegueira dos rios, a ivermectina mostrou ser uma ótima terapia contra a filariose, outra enfermidade muito comum nesses mesmos lugares do planeta.

Também conhecida como elefantíase, a condição é provocada pelo parasita Wuchereria bancrofti e está relacionada a inchaços e deformações nas pernas e na região genital.

Droga-maravilha

Tantos serviços prestados fazem a ivermectina entrar para o seleto rol das "wonder-drugs" (ou "drogas-maravilha", numa tradução literal), ao lado de aspirina, penicilina e morfina.

"Esse é um grupo de medicamentos que realmente mudou a face da saúde pública", constata Molento.

A descoberta do medicamento rendeu até o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 2015 aos pioneiros nos estudos: o japonês Satoshi Õmura e o irlandês/americano William Campbell.

Naquele ano, eles dividiram o reconhecimento com a farmacologista chinesa Tu Youyou, que desenvolveu a artemisinina, um tratamento contra a malária.

Da esquerda para a direita: Satoshi Õmura, William Campbell e Tu Youyou foram os vencedores do Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia em 2015 (Crédito da foto: Getty Images)

Reposicionamento de drogas e a covid-19

A ivermectina foi alçada a um novo patamar de fama com a chegada da pandemia de covid-19: a partir do segundo semestre de 2020, ela passou a ser apontada como um possível tratamento contra o novo coronavírus, apesar da falta de evidências científicas suficientes para dar suporte a essa afirmação.

Mas como que o remédio entrou nessa história?

Tudo começou com uma estratégia bastante comum na área da farmacologia: o reposicionamento de drogas.

Com o auxílio de plataformas de tecnologia e programas de computador, os cientistas avaliam, de uma vez só, o potencial de centenas ou até milhares de medicamentos contra uma determinada doença.

"Essa é uma estratégia excelente, pois seleciona produtos já utilizados e comprovadamente seguros para ver se podem ajudar num outro contexto", avalia o microbiologista Leandro Araújo Lobo, professor do Instituto de Microbiologia Paulo de Góes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

O reposicionamento permite acelerar algumas etapas na criação de um novo tratamento — o que certamente é desejável quando uma enfermidade recém-descoberta está matando milhares de pessoas todos os dias em vários países.

A ivermectina, então, foi testada nos laboratórios da Universidade Monash, da Austrália, e mostrou ali que seria capaz de contra-atacar o coronavírus.

Repare bem: os experimentos eram simples e foram realizados em culturas de células, que estão longe de representar toda a complexidade de uma infecção no corpo humano.

E a situação fica ainda mais distante da vida real porque a dose empregada nestes testes iniciais era muito superior ao limite considerado seguro para as pessoas.

"Nos trabalhos iniciais, a dosagem chegava a ser proporcionalmente 17 vezes mais alta do que poderíamos dar a uma pessoa", calcula Lobo.

A estratégia de reposicionamento de drogas envolve programas de computador e experimentos em laboratórios (Crédito da foto: Getty Images)

Outro problema: o reposicionamento de drogas é apenas o primeiro passo e deve ser sucedido de estudos mais rigorosos, que comprovem ou não a eficácia e a segurança daquele fármaco contra a doença.

"No laboratório, até vinagre, sal, açúcar ou refrigerante podem mostrar alguma atividade. Mas quando passamos para a próxima fase dos testes, que envolvem animais, esse efeito geralmente desaparece ou fica tóxico demais", explica Padilla.

"Em praticamente 99% das vezes, aquilo que vai bem nos experimentos in vitro não funciona nas pesquisas posteriores", concorda Winter.

Leite derramado

Quando os resultados iniciais da ação da ivermectina contra o coronavírus foram divulgados, já era tarde demais: em questão de dias, numa espécie de telefone sem fio potencializado por redes sociais, as informações sobre o potencial do remédio foram distorcidas e exageradas, de tal forma que muitas pessoas passaram a utilizá-lo até para tentar prevenir a infecção.

"Em maio e junho do ano passado, nós já assistimos a um aumento do interesse pela ivermectina, inclusive com a ação direta de prefeitos e secretários municipais da Saúde brasileiros, que naquela época começaram os planos de um tratamento em massa", rememora Molento.

Prova disso são os números do Conselho Federal de Farmácia (CFF): em comparação com 2019, as vendas de ivermectina dispararam 557% no país ao longo de 2020.

A título de comparação, a hidroxicloroquina, outro princípio ativo muito debatido nos últimos meses, teve um crescimento de 110% no mesmo período.

Outros integrantes do comprovadamente ineficaz kit-covid também tiveram uma maior procura, mas os números nem chegam perto do "sucesso" da ivermectina: vitamina D (81%), vitamina C (59%) e nitazoxanida (9%) também figuraram no ranking divulgado pelo CFF.

Um dos mais contumazes defensores do tratamento precoce e da ivermectina foi (e continua sendo) o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Foram várias as manifestações de apoio a esse coquetel farmacológico.

Numa conversa com apoiadores no dia 16 de abril, o presidente voltou a afirmar: "É o tempo todo o pessoal só atrapalhando. Isso não dá certo. Ô idiota, o que dá certo? O cara é um jumento. Fica falando: 'Ivermectina não pode, não tem comprovação científica'. E não dá alternativa. Deixa o cara tomar, pô. O médico vai decidir o que o cara vai tomar."

O que diz a ciência

Ao longo dos últimos meses, diversos grupos de pesquisa se debruçaram sobre o efeito da ivermectina nas várias etapas da covid-19.

Os resultados, porém, não foram nada animadores e não mostraram resultados satisfatórios.

A procura por ivermectina nas farmácias brasileiras 'explodiu' a partir de maio de 2020 (Crédito da foto: Getty Images).

Isso fez com que várias instituições mundo afora contra-indicassem seu uso na prevenção ou no tratamento da infecção pelo coronavírus.

A Food and Drug Administration (FDA), a agência regulatória dos Estados Unidos, atualizou suas recomendações sobre o assunto no dia 5 de março de 2021:

"A FDA não revisou dados que justificam o uso da ivermectina em pacientes com covid-19. Contudo, algumas pesquisas sobre o tema ainda estão em andamento. Tomar um remédio que ainda não foi aprovado pode ser muito perigoso".

Duas semanas depois, foi a vez de a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) se posicionar oficialmente a respeito do tema:

"Acompanhando as recentes discussões sobre o uso da ivermectina, a EMA revisou a evidência publicada a partir de estudos em laboratório, estudos observacionais, testes clínicos e meta-análises [...] A maioria dos trabalhos que revisamos foram pequenos e apresentam uma série de limitações, incluindo diferentes regimes de doses e o uso de outras medicações. Com isso, concluímos que a evidência disponível até o momento não é suficiente para indicar o uso da ivermectina contra a covid-19".

No dia 31 de março, a OMS também divulgou o seu parecer sobre a discussão:

"A evidência atual sobre o uso da ivermectina para tratar a covid-19 é inconclusiva. Enquanto não possuímos mais informações, a OMS recomenda que essa droga só seja utilizada em estudos clínicos. Essa recomendação se aplica a todos os graus da doença e passa a fazer parte de nossas diretrizes de tratamento".

No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já havia publicado a sua avaliação sobre a questão em julho de 2020, também refutando o uso da medicação para conter a pandemia.

Efeitos futuros (e imediatos)

O descompasso e a desinformação sobre a ivermectina e outros remédios usados indiscriminadamente nos últimos meses já apresentam efeitos adversos palpáveis.

Numa reportagem da BBC News Brasil do dia 23 de março, diretores de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) de hospitais de referência no Brasil afirmam que a promoção do kit-covid contribuiu para aumentar as mortes no país.

Outra matéria, publicada no mesmo dia no jornal O Estado de S. Paulo, mostra que o tratamento precoce causou graves problemas no fígado e fez com que muitos pacientes precisassem ir para a fila de transplante.

"Infelizmente, mais casos como esses serão registrados. O que vemos é uma overdose de ivermectina que sobrecarrega o fígado e pode provocar sérios problemas", observa Lobo.

O uso do fármaco sem acompanhamento e em doses exageradas também está relacionado a casos de diarreia, tontura, dor de cabeça, náusea, intoxicações renais e até hepatite medicamentosa.

Bolsonaro fez uma série de apelos públicos a favor do 'tratamento precoce' contra a covid-19 (Crédito da foto: Reuters)

Um dos argumentos mais usados por adeptos do remédio como tratamento da covid-19 é a experiência pessoal: muitos dizem que tiveram a doença e se recuperaram após tomarem esses comprimidos.

"A questão é que mais de 95% dos infectados vão ter uma cura espontânea, independentemente se fizerem um tratamento ou apenas ficarem em repouso", responde Molento.

"Eu também posso dizer que peguei covid-19, subi no telhado da minha casa, tomei duas xícaras de café olhando para o Sul e me curei", compara.

É óbvio que não há validade científica nesse tipo de relato e ninguém deve tentar repetir essa e outras 'experiências' em casa.

Nossa população está passando por testes toxicológicos de forma voluntária. As pessoas estão se intoxicando como animais de laboratório sob o pretexto de uma promessa de cura, sem que exista qualquer evidência científica sobre isso", completa o especialista.

André Biernath, da BBC News Brasil em São Paulo, em 25 abril 2021

terça-feira, 27 de abril de 2021

Brasil registra mais 3.120 mortes por Covid e ultrapassa 395 mil

País contabiliza 14.446.541 casos e 395.324 óbitos, segundo balanço do consórcio de veículos de imprensa com informações das secretarias de Saúde. Média móvel de mortes aparece abaixo de 2.400 depois de mais de um mês.

O Brasil registrou 3.120 mortes pela Covid-19 nas últimas 24 horas e totalizou nesta terça-feira (27) 395.324 óbitos desde o início da pandemia. Com isso, a média móvel de mortes no Brasil nos últimos 7 dias chegou a 2.399. O índice ficou abaixo da marca de 2,4 mil pela primeira vez desde 25 de março --quando estava em 2.276. Em comparação à média de 14 dias atrás, a variação foi de -20%, indicando tendência de queda nos óbitos decorrentes da doença.

Os números estão no novo levantamento do consórcio de veículos de imprensa sobre a situação da pandemia de coronavírus no Brasil, consolidados às 20h desta quarta. O balanço é feito a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde.

No sábado (24), o mês de abril se tornou o mais letal da pandemia da Covid-19 no Brasil; e no domingo (25), as mortes pelo vírus registradas em 113 dias de 2021 superaram o montante registrado em todo o ano de 2020.

Já são 97 dias seguidos no Brasil com a média móvel de mortes acima da marca de mil; o país completa agora 42 dias com essa média acima dos 2 mil mortos por dia.

Em casos confirmados, desde o começo da pandemia 14.446.541 brasileiros já tiveram ou têm o novo coronavírus, com 76.085 desses confirmados no último dia. A média móvel nos últimos 7 dias foi de 56.522 novos diagnósticos por dia. Isso representa uma variação de -18% em relação aos casos registrados em duas semanas, o que indica tendência de queda nos diagnósticos.

Pelo segundo dia seguido, nenhum estado apresenta tendência de alta nas mortes por Covid. Antes, não havia qualquer registro de um dia sequer sem algum estado em alta desde a criação do consórcio de veículos de imprensa, em julho de 2020. Esse bom indicativo era longamente esperado após os números muito altos dos últimos meses em todo o país --em março, o Brasil chegou a apresentar tendência de alta simultânea em 24 dos 27 estados. É importante agora acompanhar o ritmo de queda nos óbitos, já que a estagnação em um patamar alto também seria muito alarmante.

Por G1, em 27/04/2021 20h03  Atualizado 27/04/2021

Para FHC, Tasso tem ‘capacidade de ampliar forças’

Ao ser consultado ontem sobre a disposição de Tasso Jereissati em entrar na disputa de 2022 – o senador admitiu pela primeira vez, em entrevista ao Estadão, que pode disputar as prévias – FHC observou à coluna que o tucano pode ser um nome catalisador que satisfaça o centro. “Acho muito positivo, ele tem capacidade de ampliar forças”, resumiu o ex-presidente.  

Entretanto, entre os tucanos, há quem duvide que Tasso vá mesmo aceitar o desafio gigante. Pelo que se apurou, sua família não vê com bons olhos a dura campanha política que certamente será para lá de desgastante 

Sonia Racy, O Estado de S. Paulo, em 27 de abril de 2021 | 00h40

Base de Alcântara fecha primeiras parcerias com empresas para lançamento de satélites

A expectativa é de que as primeiras operações ocorram entre o fim deste ano e início de 2022

A  Aeronáutica vai anunciar nesta quarta-feira, 28, as primeiras parcerias com empresas privadas que passarão a explorar a base de lançamento de Alcântara, no Maranhão. Trata-se dos primeiros acordos com a iniciativa privada para uso compartilhado da base, que é considerada um dos pontos mais estratégicos do mundo para lançamentos espaciais.

Em entrevista ao Estadão, o presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Carlos Moura, disse que serão conhecidos os primeiros acordos de uma relação de nove empresas que demonstraram interesse em utilizar a base para suas operações. A lista inclui companhias estrangeiras e nacionais.

“A base de Alcântara é nossa joia da coroa, um local privilegiado, onde vamos receber diversos tipos de operação. E não se tratar de ser alugada ou estendida. A Aeronáutica é o órgão que opera a base, com serviços e logística, é ela que vai prestar serviços para as empresas”, comentou Moura. “Poderemos receber veículos lançadores ou mesmo empresas que queiram se implantar na base e fazer lançamento de forma contínua.”

Base de Alcântara é considerada um dos pontos mais estratégicos do mundo para lançamentos espaciais. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

A expectativa é de que as primeiras operações ocorram entre o fim deste ano e início de 2022. Uma das prioridades deve ser o lançamento de nanossatélites, equipamentos pequenos, do tamanho de uma caixa de sapatos, mas que têm alta tecnologia embarcada e podem apoiar diversos tipos de monitoramento, atraindo a exploração comercial da atividade espacial. Trata-se de uma opção a lançamentos caros capitaneados por agências governamentais no passado. Por trás dos lançamentos, há uma indústria crescente de aplicativos que passam a utilizar imagens para todo tipo de atuação.

Até hoje, a base de Alcântara havia feito alguns testes para operações. Já faz um ano e meio que há lançamentos no local. Ocorreram lançamentos governamentais, com mais de 500 já foram realizados, mas limitados a equipamentos suborbitais e de treinamento. A estreia de Alcântara, portanto, será em relação a lançamentos não governamentais. “Alcântara ainda não fez essa estreia. Agora, nós imaginamos que, com essas empresas previamente qualificadas e com veículos inscritos, nós podemos finalmente dizer que Alcântara já lançou um satélite e esperamos que, em breve, isso ocorra com um veículo lançador brasileiro. É o início da fase de lançamentos orbitais. Vamos conseguir colocar satélites em órbita.”

A entrada de empresas ajuda ainda a suplantar as restrições orçamentárias que as operações espaciais enfrentam. Na semana passada, a própria Agência Espacial teve corte de R$ 1,2 milhão de seu orçamento, atingindo justamente a implantação do centro espacial de Alcântara.

Em fevereiro, foi feito o lançamento do satélite brasileiro Amazônia 1, resultado do trabalho de parceria da AEB com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O satélite opera normalmente em órbita e está situado numa altitude média de 752 km acima da superfície terrestre. Seu lançamento, porém, ocorreu a partir da Índia.

“Por que a partir da Índia? Porque hoje ainda não tem, no Brasil, nenhuma empresa com veículo lançador (foguete) para fazer esse tipo de lançamento no País. Mas agora saberemos que empresas poderão fazer isso”, diz Carlos Moura.  

O Amazonia 1 é um projeto nacional, que envolveu a participação de vários órgãos governamentais, de profissionais da área, da academia e da indústria. Foram nove empresas envolvidas no processo de produção do satélite, cinco delas estão ligadas ao Parque Tecnológico São José dos Campos (PqTec).

O lançamento, em si, tem custo maior que o do próprio satélite, chegando a cerca de US$ 30 milhões. “Isso mostra como Alcântara terá uma missão crucial nessas operações. Imagine quanto essa operação custaria sendo feita no Brasil, com acordos nacionais”, comenta o presidente da AEB.

O mercado de veículos lançadores deverá movimentar algo em torno de US$ 20 bilhões até 2030. As estimativas apontam que, até 2040, a economia espacial atinja o valor de US$ 1 trilhão.

André Borges, O Estado de S.Paulo, em 27 de abril de 2021 | 11h23

"Missão é interromper cronômetro da morte", diz Renan Calheiros

Em seu primeiro discurso como relator da CPI da Pandemia, senador prometeu investigação "despolitizada" e pautada na ciência, com a punição dos responsáveis pelas milhares de mortes devido à covid-19 no Brasil.    

Renan Calheiros prometeu investigação técnica e profunda

Em seu primeiro discurso como relator daCPI da Pandemia, o senador Renan Calheiros disse nesta terça-feira (27/04) que a comissão não fará perseguições, mas que os culpados pelas milhares de mortes por covid-19 no Brasil precisam ser punidos.

Segundo Renan, a missão da CPI é "zerar o cronômetro da morte". 

"O país tem o direito de saber quem contribuiu para as milhares de mortes, e eles devem ser punidos imediata e emblematicamente", afirmou.

Renan garantiu que, como relator, vai se pautar pela "isenção e imparcialidade que a função impõe" e que a "investigação será técnica, profunda, focada no objeto que justificou a Comissão Parlamentar de Inquérito e despolitizada".  

"Tenho a perfeita noção do prejuízo que o abuso de autoridade pode causar. Podem esperar um trabalho isento, objetivo, técnico, desapaixonado, destemido e colegiado", afirmou em outro trecho do discurso. 

O relator disse que é "impossível esquecer todos os dias fúnebres em mais de um ano de pandemia" e lembrou, em especial, o dia 6 de abril de 2021, "com uma morte a cada 20 segundos". No total, o Brasil já ultrapassa as 391 mil mortes por covid-19.

"Os inimigos dessa relatoria são pandemia e aqueles que, por ação, omissão, incompetência ou malversação, se aliaram ao vírus e colaboraram com o morticínio", disse.

Em outro trecho do discurso, o relator afirmou que tudo será analisado "sem medo de absolver quem merecê-lo e sem hesitação para imputar quem é responsável".

Trabalho pautado na ciência

Renan também afirmou, em vários momentos do discurso, que os trabalhos da comissão serão pautados pela ciência e pelo combate ao "negacionismo". Para isso, vários especialistas serão consultados.

"A comissão será um santuário da ciência, do conhecimento e uma antítese diária e estridente ao obscurantismo negacionista e sepulcral", garantiu.

"Estaremos defendendo a vida, o conhecimento, a ciência, a civilização, as instituições, o SUS e a própria democracia. Vamos dar um basta aos suplícios, à inépcia e aos infames. Não deixaremos de lembrar diariamente o tamanho da nossa tragédia. Os brasileiros estão morrendo em uma velocidade assustadora. Não temos tempo a perder com manobras regimentais, obstruções, diversionismo, politiquices e chicanas. Nossa missão é interromper esse cronômetro da morte".

Alvo da Lava Jato, Renan aproveitou para, indiretamente, criticar a forma como a operação foi conduzida e afirmar que fará diferente na CPI. 

"Não somos discípulos de Deltan Dallagnol nem de Sérgio Moro. Não arquitetaremos teses sem provas ou power points contra quem quer que seja. Não desenharemos o alvo para depois disparar a flecha", declarou. 

Renan tem sido alvo de ataques nas redes sociais por parte de apoiadores de Bolsonaro. Quanto a isso, o relator disse que "intimidações” e "arreganhos” não vão detê-lo. 

Ações do Ministério da Saúde

Renan também garantiu que as ações do Ministério da Saúde "serão investigadas a fundo". Sem citar nomes, Renan criticou, indiretamente, o ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello.

"A memória remete para as 454 mortes em combate na segunda grande guerra, com um universo de 25 mil pracinhas. Esse pequeno número de baixas reflete a liderança de um estrategista de guerra. Imaginem um epidemiologista conduzindo nossas tropas em Monte Castelo. Na pandemia o ministério foi entregue a um não especialista, um general", declarou.

"O que teria acontecido se tivéssemos enviado um infectologista para comandar nossas tropas? Provavelmente um morticínio. Porque guerras se enfrentam com especialistas, sejam elas bélicas ou sanitárias. A diretriz é clara: militar nos quartéis e médicos na Saúde. Quando se inverte, a morte é certa. E foi isso que aconteceu. Temos que explicar, como, por que isso ocorreu", completou Renan.

Comissão preocupa aliados de Bolsonaro

A comissão preocupa Bolsonaro e seus aliados, pois a maioria dos 11 membros do colegiado é considerada independente ou de oposição ao governo. Entre os principais temas a serem investigados estão a demora na compra de vacinas, a falta de oxigênio hospitalar e de medicamentos, além da produção e incentivo ao uso de drogas não recomendadas para tratar a doença, como a cloroquina.

A deputada Carla Zambelli, fiel apoiadora de Bolsonaro, encabeçou uma ação popular nesta segunda-feira para barrar a indicação de Renan como relator. Entre outros pontos, ela argumentou que o senador responde a processos na Justiça, fato que "comprometeria sua imparcialidade".

O juiz Charles Renaud Frazão de Moraes, da 2ª Vara Federal Cível de Brasília, atendeu ao pedido. No entanto, nesta terça-feira, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) derrubou a liminar e Renan foi confirmado no cargo.

Deutsche Welle Brasil, em 27 de abril de 2007.

Paraguai se 'descolou' do Brasil e conteve dano econômico da pandemia, diz ministro da Fazenda do país

No primeiro ano da pandemia, 2020, a economia do Brasil sofreu contração de 4,1%, de acordo com levantamento do Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas apesar de seu histórico vínculo com o mercado brasileiro, o Paraguai registrou retração muito menor, 0,6%, segundo dados oficiais.

Foi a economia que teve a menor queda entre os países latino-americanos, apontou a Cepal. Para comparação, a economia argentina encolheu 10,5%, a do Uruguai, 5,9% e a do Peru, mais de 11%.

Economia paraguaia conseguiu 'desacople' das economias dos vizinhos, afirmou à BBC News Brasil o ministro da Fazenda do país, Oscar Llamosas Díaz. (Crédito da foto: Ag. IP / Min. de Tecnologias de la Informa)

A pandemia de coronavírus provocou a maior queda das economias da América Latina em 120 anos, segundo dados recentes da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal).

Em média, diz o organismo, a retração foi de 7,7% e a recuperação de cerca de 3,7%, prevista para este ano, não será suficiente para devolver os níveis econômicos pré-pandêmicos na região.

Em outros tempos, dizem analistas paraguaios, o comportamento da economia brasileira - e também da Argentina - teria influenciado.

Durante a pandemia, no entanto, o Paraguai "se descolou" da economia do Brasil e da região, diz o ministro paraguaio da Fazenda, Oscar Llamosas Díaz, em entrevista à BBC News Brasil.

"Se olharmos (inclusive) os dados anteriores à pandemia, podemos dizer que a economia paraguaia conseguiu, de certa forma, o 'descolamento' das economias dos nossos vizinhos. No caso do Brasil e da Argentina, nos últimos anos, os desempenhos econômicos foram negativos ou quase negativos e o Paraguai continuou tendo desempenho econômico positivo", disse o ministro.

A expectativa é que a economia paraguaia registre crescimento de 4% em 2021, afirmou. Ele ressalvou, porém, que existem setores do país que continuam dependendo dos vizinhos.

"São os casos dos comércios nas fronteiras com a Argentina, que estão fechadas (por determinação argentina), e com o Brasil que apesar da reabertura das fronteiras, registra queda no movimento", disse.

Homem caminha solitário em meio a medidas restritivas contra o coronavírus em Assunção, capital do Paraguai (Crédito da foto: Nathalia Aguilar / EPA)

Em termos "macro", porém, o Paraguai "conseguiu, em grande medida, esse descolamento dos vizinhos". No ano passado, logo no início da pandemia, o Paraguai fechou a fronteira com o Brasil e com a Argentina. Mas a medida não deverá ser retomada, disse o ministro.

"Aprendemos muita coisa no último ano e uma delas é que hoje o vírus, cedo ou tarde, entra nos nossos países. O que queríamos, no ano passado, era ganhar tempo para fortalecer o sistema de saúde", disse o economista Llamosas Díaz.

De acordo com os organismos internacionais, como em outros países, as medidas de estímulo, incluindo planos sociais para os mais vulneráveis e fiscais no âmbito de serviços e empresarial, entre outros, contribuíram para amenizar o impacto negativo da pandemia.

"A situação teria sido outra sem o plano de emergência que implementamos", disse Llamosas Díaz.

Ele reconhece, porém, que o cenário é de "incertezas" e que os resultados de 2021 dependerão da pandemia, já que os hospitais públicos registram ocupação completa praticamente de leitos e as doses de vacinas chegam lentamente.

"O governo enviou ao Congresso uma lei de emergência para reforçar o sistema sanitário, um setor que foi abandonado durante anos, e triplicamos o total de leitos. Mas ainda assim hoje o sistema sanitário está trabalhando praticamente em seu nível máximo", disse.


Parentes de pessoas infectadas com coronavírus acampam nas proximidades de hospital em San Lorenzo, Paraguai; ministro reconhece lotação no atendimento. (Crédito da foto: Mayeli Villalba).

Auxílio do Estado

Com quase 70% da sua população na economia informal, o governo optou, no primeiro momento da pandemia, por distribuir ajuda a todas as pessoas maiores de 18 anos que são trabalhadores informais ou idosos sem recursos.

Para evitar filas, contou o ministro, foi implementado o programa com nome em guarani Pytyvõ (ajuda/ajudar), que consiste na entrega de recursos através de celulares ou, no caso dos que não têm celular ou computador, usando a identidade para compras alimentos e de medicamentos, por exemplo.

"Num primeiro momento, chegamos a sete de cada dez trabalhadores. Hoje, esta ajuda está mais focalizada. Mas mantemos os apoios, por exemplo, aos comércios na fronteira, que sentem forte o impacto das restrições. Mas se a situação da pandemia piorar, teremos que voltar a ajudar os diferentes setores", disse.

Ele lembrou que o Paraguai tem uma Lei de Responsabilidade Fiscal que teve metas iniciais não cumpridas em 2020 e neste ano em função das necessidades de recursos na pandemia.

Em 2010, recordou, o Paraguai tinha cerca de 39% de pobres e, quase dez anos depois, em 2019, este índice foi de cerca de 23%.

"Com a pandemia, a pobreza subiu para 26%, mas, sem as ajudas provisórias ou permanentes que o governo distribui, ela teria sido em torno de 29%", afirmou.

O índice alto vinha em queda, acompanhando oito meses seguidos de expansão da economia, quando a pandemia surgiu.

País com cerca de 7,3 milhões de habitantes, que compartilha a hidrelétrica de Itaipu com o Brasil e a hidrelétrica de Yacyretá com a Argentina, o Paraguai tem três motores fundamentais para sua economia - a agropecuária, o agronegócio e as obras públicas. Setores que por suas dinâmicas internacionais (agronegócio) e internas (obras públicas) não dependem dos desempenhos das economias do Brasil ou das de outros vizinhos.

"Estes foram pilares fundamentais para nossa economia no ano passado, ano de pandemia", disse o ministro.

O Paraguai está entre os maiores produtores e exportadores de soja do mundo e entre seus clientes da carne que produz estão Chile, Taiwan e Israel, por exemplo. Foi no ciclo das commodities, entre cerca de 2000 e 2014, que o Paraguai fortaleceu sua "independência econômica", dizem analistas, do Brasil.

"Mesmo a partir de 2013, 2014, quando as economias da região começaram a desacelerar, o Paraguai manteve crescimento econômico, de entre 3% e 4%", disse o analista político e econômico Fernando Masi, do Centro de Análise e Difusão Econômica do Paraguai (Cadep).

Ele disse que, nos últimos anos, o Paraguai passou a adotar medidas que contribuíram para sua estabilidade e previsibilidade, como a reforma tributária. Quando foi realizada, em 2004, disse, o país tinha 100 mil contribuintes e hoje conta com um milhão e cem mil.

Mas, ele ressalva que, apesar da queda nos indicadores de pobreza e do longo período de crescimento sustentável, antes da pandemia, o Paraguai tem desafios como "diversificar sua matriz econômica" e saber se crescer 4% é "suficiente" para acabar com a pobreza.

"Temos que ver o modelo econômico de cada país. O crescimento de 4%, por exemplo, é suficiente para acabar com a pobreza e a vulnerabilidade do Paraguai? Suficiente para que existam mais oportunidades de emprego e para que o mercado interno cresça? Essa inclusão pode ocorrer dentro da própria agricultura. Hoje, as exportações estão concentradas na soja e na carne. Apesar de estarem surgindo diversificações nesse terreno, como é o caso, por exemplo, do arroz ou do têxtil, no campo industrial", disse Masi.

Marcia Carmo, de Buenos Aires para a BBC News Brasil, em 26 abril 2021

CPI da Covid começa com Renan na relatoria e adesão de governista

 A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid — que investigará ações ou omissões de autoridades na pandemia — teve início nesta terça-feira (27/04) com uma derrota para o presidente Jair Bolsonaro. A maioria dos integrantes escolheu dois senadores independentes para comandar os trabalhos e produzir seu relatório final.

Renan Calheiros cumprimenta petista Humberto Costa - senador do MDB será relator da CPI (Crédito da foto: Edilson Rodrigues / Ag. Senado)

Omar Aziz (PSD-AM), senador do Amazonas, Estado cujo sistema de saúde colapsou no início do ano devido à gravidade da pandemia, foi eleito presidente. Para a vice-presidência, foi eleito Randolfe Rodrigues (Rede-AP)

Em acordo com outros integrantes, Aziz indicou o senador Renan Calheiros (MDB-AL) para ser o relator. Ambos integram partidos com as maiores bancadas no Senado.

A eleição de Aziz já era esperada, pois senadores opositores e independentes somam sete dos onze titulares da CPI. A surpresa ficou com o apoio do senador Ciro Nogueira (PP-PI), um dos quatro senadores aliados de Bolsonaro que integram a comissão. Com isso, Aziz recebeu oito votos e o candidato bolsonarista, senador Eduardo Girão (Podemos-CE) levou três.

O presidente eleito prometeu um "trabalho técnico" que buscará "a verdade".

"Essa CPI não pode servir para se vingar de absolutamente ninguém. Essa CPI tem que fazer justiça para milhares de órfãos que essa pandemia está deixando", disse Aziz.

"Ninguém de nós aqui conseguirá fazer milagre, mas podemos dar um norte ao tratamento e ter um protocolo nacional. Descobrir coisas que deixaram de ser feitas e por quem deixou de fazer, seja ele ministro, assessor, governador ou prefeito desse país", acrescentou.

Parlamentares bolsonaristas tentaram barrar a escolha de Calheiros, sob argumento de que ele seria suspeito para ocupar o cargo, já que um dos objetivos da CPI é investigar o repasse de recursos federais aos Estados, e o senador é pai do governador de Alagoas, Renan Filho.

Uma liminar chegou a ser concedida pela primeira instância da Justiça Federal de Brasília proibindo a escolha de Calheiros, a pedido da deputada Carla Zambelli (PSL-SP), mas a decisão foi derrubada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

À BBC News Brasil, o senador respondeu a essas críticas na semana passada afirmando que um sub-relator deve ser indicado como responsável caso haja apuração sobre repasses federais a Alagoas.

O próximo passo da CPI será a aprovação de um plano de trabalho, com diretrizes para a condução da investigação. Os senadores devem apresentar até às 12h de quarta-feira (28/04) suas sugestões a Calheiros, que consolidará o plano.

Na quinta-feira de manhã (29/04), esse planejamento será votado, assim como os primeiros requerimentos para convocação de testemunhas e pedidos de informações (por exemplo, o compartilhamento de investigações em andamento em outros órgãos, como o Ministério Público).

A expectativa é que os primeiros convocados a depor sejam os quatro ministros da Saúde de Bolsonaro: Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich, Pazuello, e o atual, Marcelo Queiroga.

Também deve ser chamado logo no início o presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres.

Quando era ministro, Pazuello disse que seguia as ordens de Bolsonaro (Crédito da foto: Ueslei Marcelino / Reuters)

A comissão tem previsão inicial de durar 90 dias, prazo que pode ser prorrogado. Além do potencial de gerar desgastes para o governo ao longo do seu funcionamento, a CPI será concluída com a produção de um relatório.

Esse documento pode sugerir a aprovação de novas leis pelo Congresso, a remessa ao Ministério Público de suas conclusões para possível responsabilização civil e criminal dos investigados, assim como servir de fundamento para novo pedido de impeachment contra o presidente.

A abertura de um processo para afastar Bolsonaro, porém, depende de decisão individual do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que tem se mantido aliado do Planalto.

Filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) disse que "a CPI será um grande palco importante para o governo deixar tudo às claras". Ele criticou, porém, o momento escolhido para a comissão.

"Quantas vacinas essa CPI vai aplicar no braço da população? Nenhuma. O momento é inoportuno", afirmou, nos debates que antecederam a eleição do comando da CPI.

"Lamento que alguns senadores queiram usar os caixões de quase 400 mil mortes para fazer política barata e rasteira contra o governo federal", disse ainda.

CPI começa com 'arsenal' perigoso contra Bolsonaro

Com o Brasil próxima de registrar 400 mil mortes pela covid-19, a CPI investigará a atuação do governo de Jair Bolsonaro no enfrentamento da crise do coronavírus.

Outro foco da comissão será apurar possíveis ilegalidades no uso de recursos repassados pela União para Estados e municípios atuarem contra a pandemia. A expectativa, porém, é que os trabalhos priorizem inicialmente a atuação do governo federal, e já há algumas "munições" disponíveis para serem usadas pelos senadores contra a gestão Bolsonaro.

A CPI poderá solicitar, por exemplo, ao Tribunal de Contas de União (TCU) e ao Ministério Público Federal (MPF) o compartilhamento de investigações que já apuram possível negligência do governo no abastecimento de medicamentos e insumos para a rede pública, assim como a demora em reagir à falta de oxigênio ocorrida em janeiro no Amazonas.

Protesto em Manaus contra atuação de Bolsonaro na pandemia - crise no Amazonas será investigada na CPI (Crédito da foto: Bruno Kelly / Reuters).

Além de solicitar documentos (inclusive sigilosos) a outros órgãos, a comissão também pode requerer quebras de sigilos fiscal, bancário e de dados, assim como convocar pessoas para depor. Já entrou na lista de prováveis convocados o ex-secretário de Comunicação do governo Bolsonaro, Fábio Wajngarten, que na última semana fez duras críticas ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, em entrevista à revista Veja.

Ele culpou o general pela decisão do governo de não adquirir 70 milhões de vacinas oferecidas pela Pfizer no ano passado — a responsabilidade do governo na demora para imunizar a população é um dos principais tópicos que a CPI pretende esclarecer.

Todos os requerimentos propostos na comissão terão que ser fundamentados e receber o aval da maioria dos integrantes para irem adiante. O governo, porém, conta com minoria na CPI, o que torna provável que pedidos perigosos para o presidente sejam aprovados.

Dos onze integrantes titulares da comissão, quatro são aliados do Palácio do Planalto: Ciro Nogueira (PP-PI), Marcos Rogério (DEM-RO), Jorginho Mello (PL-SC) e Eduardo Girão (Podemos-CE).

Cinco senadores são considerados independentes, mas têm uma postura crítica sobre a condução do enfrentamento da pandemia pelo governo: além de Renan Calheiros (MDB-AL) e Omar Aziz (PSD-AM), estão nesse grupo Eduardo Braga (MDB-AM), Otto Alencar (PSD-BA), e Tasso Jereissati (PSDB-CE).

Os últimos dois são abertamente de oposição a Bolsonaro: Humberto Costa (PT-PE) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

Após fazer graves acusações a Pazuello, Fabio Wajngarten deve ser convocado pela CPI (Crédito da foto: Marcelo Camargo / Ag. Brasil)

Testemunhas convocadas são obrigadas a comparecer

Pessoas convocadas por CPI na condição de testemunha são obrigadas a comparecer e dizer a verdade. Segundo o Código Penal, mentir é considerado crime, com pena prevista de dois a quatro anos de reclusão, além de multa.

Testemunhas, porém, têm direito a não responder a perguntas que possam comprometê-las diretamente. Isso segue o princípio de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Por esse mesmo motivo, pessoas convocadas como investigados podem escolher ficar calados ou nem comparecer.

O senador Randolfe Rodrigues já disse que pedirá a convocação de Wajngarten, e defendeu também que seja feita depois uma acareação entre ele e Pazuello. Isso significaria chamar os dois ao mesmo tempo para confrontar suas versões.

Há também a possibilidade de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, seja chamado.

"Alguns membros (da CPI) agora estão argumentando que o ministro Paulo Guedes era contra o auxílio emergencial. E colocando que Orçamento deste ano não tem dinheiro para covid, só para vacinas. Então, tendo um fato determinante para chamar o ministro Paulo Guedes ou o general, com certeza serão chamados", disse à BBC News Brasil o senador Omar Aziz, em entrevista na semana passada.

Mariana Schreiber - @marischreiber, da BBC News Brasil em Brasília, em 27 abril 2021, às 13:44  horas.

CPI da Covid: conheça os documentos e depoimentos que vão nortear investigação sobre o governo Bolsonaro

TCU e Ministério Público Federal já reuniram informações sobre a atuação do Ministério da Saúde na pandemia. Senado deve ignorar liminar que impede Renan Calheiros de assumir relatoria da comissão

TCU e MPF mapearam atuação do Ministério da Saúde na pandemia Foto: MARCOS CORREA/ Via REUTERS

Marcada para esta terça-feira, a primeira sessão da CPI da Covid será em formato presencial. Além de indicarem o presidente e o relator dos trabalhos — o acordo prevê que as vagas fiquem com Omar Aziz (PSD-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL) —, os senadores vão definir o formato sob o qual a comissão funcionará nos próximos meses. A tendência é que seja definido um modelo misto, com sessões presenciais aliadas ao funcionamento virtual da CPI. Há expectativa de que seja apresentado o plano de trabalho que vai ditar o ritmo e o andamento da comissão, que vai contar com documentos já colhidos pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pelo Ministério Público Federal (MPF), que já se debruçaram sobre a atuação do governo federal, mais especialmente do Ministério da Saúde, no curso da pandemia. A sessão também será marcada por um fato jurídico:  o Senado deve ignorar a liminar de primeira instância que impede Renan de ser relator.

Por serem maioria, com sete dos 11 senadores titulares, os independentes e oposicionistas passaram os últimos dias focados em elaborar juntos o plano de trabalho. Entre eles, há consenso sobre a convocação dos ex-ministros da Saúde no governo Bolsonaro e do ex-secretário de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten.

Parte do grupo também tem intenção de chamar o ministro da Economia, Paulo Guedes, para falar sobre auxílio emergencial. A iniciativa, porém, enfrenta resistência de Renan, que é próximo ao ministro. O “grupos dos sete”, como está sendo chamada a ala formada por oposicionistas e independentes do governo, se reuniu na noite de ontem na casa de Omar Aziz para tentar alinhar os pontos principais a serem apresentados. O objetivo é atuar de forma unificada para vencer as votações contra os governistas, que estão em minoria.

Omissão do Ministério da Saúde

O Ministério da Saúde fez alterações no Plano de Contingência para reduzir suas atribuições durante a epidemia. Entre elas, estava a responsabilidade pelo monitoramento do consumo de medicamentos e insumos.

Editoria de Arte Foto: Reprodução

Um relatório do Tribunal de Contas da União diz que, diante da situação, o Ministério da Saúde tinha obrigação de auxiliar os estados menos estruturados e que esse tipo de omissão configura “abuso de poder”.

Outro eixo percorrido pelos procuradores do Ministério Público Federal do Amazonas é o incentivo ao "tratamento precoce" por parte do ministro e seus subordinados, fazendo pressão para adoção de medicamentos sem eficácia comprovada. No ofício enviado à Secretaria municipal de Saúde de Manaus pela secretária de Gestão do Trabalho e da Educação da Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, ela pressiona pela adoção do tratamento precoce e ressalta "a comprovação científica sobre o papel das medicações antivirais orientadas pelo Ministério da Saúde".

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Para sustentar que o Ministério da Saúde impulsionava o tratamento com remédios sem eficácia comprovada conscientemente, o Ministério Público Federal cita a nota informativa produzida pelo órgão em maio do ano passado, logo após o ex-ministro Eduardo Pazuello assumir a pasta. O documento traz orientações sobre o manejo de pacientes desde os sintomas iniciais da doença e orienta prescrição de medicamentos sem eficácia comprovada como cloroquina e hidroxicloroquina.

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O MPF chama a atenção, no entanto, para o fato de a própria pasta admitir, no mesmo documento, em páginas posteriores à indicação dos medicamentos uma ressalva de que  "até o momento não existem evidências científicas robustas que possibilitem a indicação famarcológica específica para Covid-19".

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Colapso no Amazonas

O relatório do MPF-AM também indica a omissão e a lentidão do Ministério da Saúde em lidar com o colapso no sistema de saúde do Amazonas. Atas e depoimentos colhidos pelo órgão  mostram, por exemplo, que o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, tinha conhecimento da situação crítica no estado desde 2020, conforme trechos do chamado "Plano Manaus", do próprio ministério, citado pelos procuradores.

Christiano Cruz, gerente da White Martins, prestou depoimento ao Ministério Público Federal sobre o colapso no abastecimento de oxigênio em Manaus

Christiano Cruz, gerente da White Martins, prestou depoimento ao Ministério Público Federal sobre o colapso no abastecimento de oxigênio em Manaus

A pasta cita que decidiu enviar uma comitiva à cidade apenas após o Ano Novo, embora já se soubesse que o número de hospitalizações havia dobrado em comparação com a semana anterior.

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Consideração do MPF:

"Do documento citado, extrai-se mais do que a ciência concreta da cúpula do Ministério da Saúde quanto à situação de iminente colapso que vivia Manaus. Vê-se também que, a despeito da emergência posta, o então Ministro da Saúde não adotou medidas com a urgência necessária ao enfrentamento da pandemia".

Ministério da Saúde aguardava óbitos em ambulância e colapso de oxigênio para enviar doentes a outros estados. A informação foi prestada por uma servidora do órgão, durante depoimento no Ministério Público Federal

Ministério da Saúde aguardava óbitos em ambulância e colapso de oxigênio para enviar doentes a outros estados. A informação foi prestada por uma servidora do órgão, durante depoimento no Ministério Público Federal

Atraso na compra de testes e falta de política de testagem

O documento do TCU aponta ainda que o governo foi lento para comprar testes para detectar a Covid-19 e que sua política de testagem não era adequada à gravidade da doença no país.

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Técnicos descobriram que a distribuição de kits de testes pelo Ministério da Saúde aos estados não atendia a um plano estratégico definido. Foi possível concluir que a distribuição dos testes aos Estados, Municípios e DF não obedece a nenhum critério ou tampouco está vinculada a qalquer estratégia, sendo realizada de acordo com a demanda. E que a  pasta tinha testes suficientes para realizar uma ampla testagem na população,o que poderia evitar o “recrudescimento da epidemia”. 

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Falta de controle sobre “kit intubação”

Os técnicos também descobriram que, apesar de o país ter vivido escassez de medicamentos do chamado “kit intubação” em meados de 2020, o Ministério da Saúde continuava sem ter um mecanismo próprio de monitoramento sobre o consumo dos medicamentos. Nas últimas semanas, diversos estados relataram a falta do medicamento usado para anestesiar pacientes que precisam ser intubados. A  pasta acompanhava o uso desses medicamentos somente nos leitos de hospitais públicos e não considerava o consumo em Unidades Básicas de Saúde (UBSs) e Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) e que a distribuição dos medicamentos do kit intubação não considerava as peculiaridades das demandas dos Estados.

Na avaliação dos técnicos do TCU, a gestão da compra e distribuição dos medicamentos feita pela equipe comandada por Pazuello foi “ineficaz”.

Editoria de Arte Foto: Reprodução

Baixo orçamento

O relatório do TCU aponta que não houve planejamento orçamentário para este ano. A proposta de recursos para o Ministério da Saúde era de R$ 20,05 bilhões para ações de combate à pandemia, sendo R$ 19,9 bilhões para a compra de vacinas. Técnicos avaliam que verba é "pequena" e o cenário "preocupante". 

Editoria de Arte Foto: Reprodução

Paula Ferreira, Leandro Prazeres, Julia Linder, Paula Cappelli e Jussara Soares para O Globo, em 27/04/2021 - 04:30

Senado deve ignorar liminar que impede Renan de assumir relatoria da CPI da Covid

Parlamentares consideram que decisão judicial não tem embasamento; Rodrigo Pacheco criticou interferência e disse que indicação cabe ao presidente da CPI

O Senado deve ignorar a decisão da Justiça Federal do Distrito Federal que impede Renan Calheiros (MDB-AL) de assumir a relatoria da CPI da Covid. Parlamentares consideram que a decisão não tem embasamento jurídico por citar uma regra inexistente no regimento interno sobre a indicação no colegiado (a eleição do relator). A tese é apoiada pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que criticou a interferência entre poderes.

“A escolha de um relator cabe ao presidente da CPI, por seus próprios critérios. Trata-se de questão interna corporis do Parlamento, que não admite interferência de um juiz. A preservação da competência do Senado é essencial ao estado de direito. A Constituição impõe a observância da harmonia e independência entre os poderes", disse Pacheco, em nota.

Na decisão, o juiz Charles Frazão de Morais, da 2ª Vara Federal Cível da Justiça de Federal do Distrito Federal, afirma que Pacheco deve impedir que o nome de Renan Calheiros seja submetido à votação para compor a CPI na condição de relator. Não há, no entanto, eleição para a relatoria. A prerrogativa da indicação é do presidente do colegiado, que é eleito na primeira sessão.

"Determino que a União diligencie junto ao Senado da República, na pessoa do seu presidente, para que este obste a submissão do nome do Ilustríssimo Senhor Senador José Renan Vasconcelos Calheiros à votação para a composição da CPI da Covid-19 na condição de relator", diz trecho da decisão.

Segundo pessoas próximas, Pacheco sinalizou que iria ignorar a decisão por considerar que ela não tem embasamento. Na visão dele, o documento indica desconhecimento com o regimento interno da Casa. Além disso, o constrange a eventualmente tomar uma decisão que caberia exclusivamente ao presidente da CPI - o escolhido deve ser o senador Omar Aziz (PSD-AM). 

O senador Otto Alencar (PSD-BA) afirma que os trabalhos seguirão normalmente nesta terça-feira e que Renan ainda pode ser indicado como relator. Por ser o integrante mais velho da comissão, Alencar é responsável pela abertura dos trabalhos no colegiado.

— Sim, claro [pode seguir normalmente]. Foi uma decisão sem embasamento jurídico, ao ponto do despacho do juiz dizer que o Renan não pode ser eleito, mas o Renan será designado por decisão do presidente eleito — avaliou.

Ao GLOBO, Renan classificou a decisão como "uma interferência indevida de um juiz de primeira instância no poder Legislativo, limitando a liberdade de atuação do parlamento". Para ele, a iniciativa de Carla Zambelli (PSL-SP), autora da ação, faz parte de uma estratégia do governo.

— Estamos apresentando recurso. A CPI é uma investigação, ela tem poderes constitucionais. Não há precedente quanto a uma decisão tão esdrúxula quanto essa. Nunca houve uma decisão tão esdrúxula e indevida, de primeira instância, e que contém censura prévia, porque sequer fui escolhido relator (oficialmente). Isso não é Carla Zambelli, isso é uma questão do governo, vide a entrevista que o Flávio [Bolsonaro] deu [ao GLOBO]. Estão fazendo muito esforço — declarou Renan.

Julia Lindner e Paulo Cappelli para O Globo, em 26/04/2021 - 22:01 / Atualizado em 26/04/2021 - 22:24

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Senadores veem lista do governo sobre condução da pandemia como ‘confissão antecipada’

‘É um caso único de delação precoce’, ironiza senador Randolfe Rodrigues, cotado para ser vice-presidente da CPI da Covid

A ideia da Casa Civil de enumerar erros do governo de Jair Bolsonaro no combate à pandemia de coronavírus para construir a narrativa de defesa do Palácio do Planalto na CPI da Covid foi recebida com estranhamento por senadores. A oposição enxergou o gesto como confissão antecipada de culpa. A CPI será instalada nesta terça-feira, 27, e as falhas listadas pela Casa Civil serão usadas por integrantes da comissão para fustigar o governo.

“É um caso único de delação precoce”, ironizou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que deve ser escolhido vice-presidente da CPI. “Tem um roteiro ali que a CPI tem de pegar e investigar. Eles contribuíram com um roteiro a ser seguido por nós”.

Além de Randolfe na vice-presidência, o acordo feito por senadores independentes e de oposição – que são maioria na CPI – prevê Omar Aziz (PSD-AM) na presidência do colegiado e Renan Calheiros (MDB-AL) na função de relator. A eleição que confirmará a escolha dos ocupantes dos principais postos da comissão será feita nesta terça-feira.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) Foto: Dida Sampaio/Estadão

Aliado de Bolsonaro, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) quer furar o acordo fechado pela maioria e anunciou que vai concorrer ao comando da CPI. Além disso, bolsonaristas ainda fazem pressão nas redes sociais para impedir Renan de assumir o cargo de relator porque ele não apenas é crítico de Bolsonaro como apoia o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Nas plataformas digitais, seguidores do presidente afirmam que o senador não pode integrar a CPI por ser pai do governador de Alagoas, Renan Filho (MDB-AL). Ao avaliar ações e omissões do Executivo no combate à pandemia de covid-19, a CPI também vai investigar o destino do dinheiro repassado pelo governo federal a municípios e Estados, entre os quais Alagoas. 

Renan avisou pelo Twitter, na sexta-feira, 23, que se declarava “parcial” para tratar qualquer tema na CPI que envolva Alagoas. “Não relatarei ou votarei. Não há sequer indícios quanto ao Estado, mas a minha suspeição antecipada é decisão de foro íntimo”, disse ele.

Nesta segunda-feira, 26, o senador afirmou que os temas agora citados pela Casa Civil já são de amplo conhecimento e encarou o assunto como uma espécie de “treino” do Executivo contra o que pode acontecer na CPI. Renan também criticou as tentativas de interferência do governo na comissão.

“Esses assuntos já estavam postos. É bom que o governo levante as informações sobre eles porque isso certamente ajudará a elevar o nível do debate da própria comissão. É treino pessoal, melhor do que ficar obstruindo, mexendo na correlação do Tribunal de Contas, querendo eleger um presidente para não investigar para e indicar um relator para também não investigar”, afirmou.

A Casa Civil, comandada pelo general Luiz Eduardo Ramos, enviou um e-mail para as secretarias executivas de 13 ministérios com uma lista contendo 23 acusações e críticas ao desempenho do governo no combate à pandemia, que podem ser usadas como objeto na CPI da Covid. A informação foi revelada pelo UOL e confirmada pelo Estadão.

A lista de Ramos destaca a acusação de que o governo teria recusado 70 milhões de doses da vacina da Pfizer. Também é levantado questionamento a respeito da pressão do presidente Jair Bolsonaro para que os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich recomendassem cloroquina contra covid, medicamento sem eficácia comprovada, podendo acarretar efeitos colaterais adversos.

O incentivo ao tratamento precoce, o desestímulo ao isolamento social e uma negligência no acordo com a Coronavac, vacina produzida pelo laboratório chinês Sinovac, também são listados pelo Planalto.

O senador Humberto Costa (PT-PE), integrante titular da CPI, também vê a lista da Casa Civil como uma confissão de culpa. “Eu acho que é. Eu acho que eles precisam realmente tentar explicar tudo aquilo ali, as coisas são muito objetivas, muito claras. O que o governo vai precisar é tentar justificar porque agiu daquela maneira. Não tem como negar aquelas coisas todas que eles mesmos falam. Vão precisar se mexer muito para conseguir explicar”, declarou o senador.

Bolsonaro tem dito que “acertou todas” na pandemia, apesar de declarações minimizando a doença e previsões de que a crise iria acabar logo, o que não ocorreu. “Não errei nenhuma desde março do ano passado”, disse o presidente a apoiadores, em frente ao Palácio da Alvorada. 

O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), também integrante da CPI, demonstrou estranheza com a lista preparada pelo governo. “Nunca vi o governo agir dessa forma sobre uma denúncia”.

Braga afirmou que uma equipe está analisando os tópicos listados pelo governo para verificar a forma como poderão ser usados na CPI. “Acho muito estranho esse documento. O nosso pessoal já está debruçado sobre ele para ver os desdobramentos e o que a gente consegue apurar. Parece um guia de como o próprio governo vê onde ficou fragilizado”, observou.

Uma versão preliminar do plano de trabalho da CPI prevê investigar questões como o atraso na compra de imunizantes pelo País, a omissão do Ministério da Saúde no colapso na rede de saúde de Manaus no início do ano e a insistência de Bolsonaro em recomendar o chamado tratamento precoce. Além de não ter eficácia comprovada, a medida ainda pode causar efeitos colaterais e levar pacientes à fila dos transplantes.

Abaixo, os 23 erros apontados contra o governo, segundo a Casa Civil:

1- O Governo foi negligente com processo de aquisição e desacreditou a eficácia da Coronavac (que atualmente se encontra no PNI (Programa Nacional de Imunização);

2- O Governo minimizou a gravidade da pandemia (negacionismo);

3- O Governo não incentivou a adoção de medidas restritivas;

4- O Governo promoveu tratamento precoce sem evidências científicas comprovadas;

5- O Governo retardou e negligenciou o enfrentamento à crise no Amazonas;

6- O Governo não promoveu campanhas de prevenção à Covid;

7- O Governo não coordenou o enfrentamento à pandemia em âmbito nacional;

8- O Governo entregou a gestão do Ministério da Saúde, durante a crise, a gestores não especializados

9- O Governo demorou a pagar o auxílio-emergencial;

10- Ineficácia do PRONAMPE (programa de crédito);

11-O Governo politizou a pandemia;

12-O Governo falhou na implementação da testagem (deixou vencer os testes);

13-Falta de insumos diversos (kit intubação);

14-Atraso no repasse de recursos para os Estados destinados à habilitação de leitos de UTI;

15-Genocídio de indígenas;

16-O Governo atrasou na instalação do Comitê de Combate à Covid;

17-O Governo não foi transparente e nem elaborou um Plano de Comunicação de enfrentamento à Covid;

18-O Governo não cumpriu as auditorias do TCU durante a pandemia;

19-Brasil se tornou o epicentro da pandemia e ‘covidário’ de novas cepas pela inação do Governo;

20-Gen Pazuello, Gen Braga Netto e diversos militares não apresentaram diretrizes estratégicas para o combate à Covid;

21-O Presidente Bolsonaro pressionou Mandetta e Teich para obrigá-los a defender o uso da Hidroxicloroquina;

22-O Governo Federal recusou 70 milhões de doses da vacina da Pfizer;

23-O Governo Federal fabricou e disseminou fake news sobre a pandemia por intermédio do seu gabinete do ódio.

Lauriberto Pompeu, O Estado de S.Paulo, em 26 de abril de 2021 | 18h26

Justiça Federal do DF barra Renan da relatoria da CPI da Covid

Comissão será instalada nesta terça-feira. Há um acordo feito por senadores independentes e da oposição para Omar Aziz (PSD-AM) ser presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice presidente e Renan Calheiros, relator

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) discursa no plenário do Senado, em Brasília. Foto: Dida Sampaio / Estadão

Na véspera da instalação da CPI da Covid, a Justiça Federal do Distrito Federal decidiu nesta segunda-feira (26) barrar a possibilidade de o senador Renan Calheiros (MDB-AL) assumir a relatoria dos trabalhos da comissão. A decisão, que marca uma vitória do Palácio do Planalto, foi tomada no âmbito de uma ação popular movida pela deputada bolsonarista Carla Zambelli (PSL-SP). Renan já avisou que vai recorrer para derrubar o veto.

Há um acordo feito por senadores independentes e da oposição para Omar Aziz (PSD-AM) ser presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice presidente e Renan Calheiros, relator. A eleição que confirmará a escolha dos ocupantes dos principais postos da comissão será feita nesta terça-feira (27).

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL

Seção Judiciária do Distrito Federal

2ª Vara Federal Cível da SJDF

 PROCESSO: 1022047-33.2021.4.01.3400

CLASSE: AÇÃO POPULAR (66) 

POLO ATIVO: CARLA ZAMBELLI SALGADO 

REPRESENTANTES POLO ATIVO: SORMANE OLIVEIRA DE FREITAS - CE15406 

POLO PASSIVO:JOSE RENAN VASCONCELOS CALHEIROS

 DESPACHO 

Trata-se de pedido de tutela de urgência em Ação Popular manejada pela Deputada CARLA ZAMBELLI SALGADO em face da União e do Senador JOSÉ RENAN VASCONCELOS CALHEIROS, com o objetivo de “(...) impedir/suspender qualquer ato a ensejar a possível ascensão do requerido à função de

Relator da CPI da Covid-19, em atenção ao princípio da moralidade pública”

Sustenta na inicial que o Presidente do Senado determinou a instalação da referida CPI, com

previsão de início de seus trabalhos entre os dias 22 e 29 deste mês. E que, por acordo entre uma parcela de parlamentares indicados pelos partidos, ao Presidente do Senado será submetido à votação para a relatoria o nome do Senador da República Renan Calheiros.

Argumenta que o ato de nomeação que se projeta afrontará a moralidade administrativa, tendo

em conta que o Senador Renan Calheiros responde a apurações e processos determinados pelo Supremo Tribunal Federal, envolvendo fatos relativos a improbidade administrativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o que compromete a esperada “imparcialidade que se pretende de um relator”, e levará ao (sic) “ desvirtuamento das proposituras objetivas e uma verdadeira guerra de interpretações que nada vão ajudar à solução dos grandiosos problemas noticiados na rotina cotidiana”, terminando por criar “um ambiente hostil ao

Presidente da República (...)”.

Aduz, por fim, que tendo a CPI espectro que alcança a gestão das medidas relativas ao combate da Covid-19 igualmente nos Estados, que haveria impedimento da relatoria da CPI pelo Senador Renan Calheiros, que é pai do Governador do Estado de Alagoas, reforçando a “expectativa de um direcionamento dos trabalhos para o mais distante possível de seu objeto secundário (em ordem de análise, não de importância), que é a fiscalização dos recursos públicos direcionados aos entes federativos para o combate da pandemia”.

Assinado eletronicamente por: CHARLES RENAUD FRAZAO DE MORAIS - 26/04/2021 18:13:51 Num. 517008854 - Pág. 1 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=21042618135171600000511301047

Número do documento: 21042618135171600000511301047

A autora, no ID n. 512671597, emendou a inicial para incluir a União no polo passivo, ao tempo

em que reforçou a urgência do atendimento do seu pedido.

É a síntese do necessário.

Decido.

Não obstante a melhor doutrina aponte que é suficiente a constatação da presença da legitimidade e de eventual ilegalidade do ato a ser praticado para o curso da ação popular, tendo como escopo, no dizer de Bielsa, citado por Hely Lopes Meirelles (Mandado de Segurança e Ações Constitucionais, 37ª Ed., pág., 194) não apenas se prestar a restabelecer a legalidade, “mas também para punir ou reprimir a imoralidade administrativa”, como valores constitucionalmente protegidos (CF, art. 5º, inciso LXXII), ainda não vislumbro elementos argumentativos mais densos para avançar na análise do pedido de tutela de urgência.

Contudo, diante da proximidade do ato que se quer obstar (noticiado pelos meios de comunicação para a próxima terça-feira) e em prestígio ao direito de ação da autora, nobre Deputada Federal, que se soma à iminência do esvaziamento da utilidade do processo ou, no mínimo, o indesejável tumulto dos trabalhos da CPI da Covid-19, na hipótese da concessão futura do pedido de tutela de urgência formulado na inicial, é prudente, si et in quantum, determinar à Ré que o nome do Senhor Senador Renan Calheiros, não seja submetido à votação para compor a CPI em tela, e isso somente até a vinda da manifestação preliminar sua e da Advocacia Geral da União no caso.

Na hipótese, o exercício do poder geral de cautela do juiz é medida que se impõe para, por prudência, salvaguardar o direito postulado pela autora e, ao mesmo tempo, evitar prejuízo para o desenvolvimento dos trabalhos da CPI e à própria atividade parlamentar do senador demandado.

Pelo exposto, com fulcro no art. 297 do CPC, determino que a União diligencie junto ao Senado da República, na pessoa do seu presidente, para que este obste a submissão do nome do Ilustríssimo Senhor Senador JOSÉ RENAN VASCONCELOS CALHEIROS à votação para a composição da CPI da Covid-19 na condição de relator, exclusivamente até a juntada das manifestações preliminares dos requeridos quanto ao pedido de tutela de urgência formulado pela autora, oportunidade em que será reapreciado o pedido no ponto, desta feita com mais subsídios fundados no contraditório das partes, tudo sem nenhum prejuízo para o prazo de contestação.

Intime-se com urgência, por oficial de justiça plantonista, o Excelentíssimo Senhor Presidente do Senado Federal; e o Excelentíssimo Senhor Senador Renan Calheiros, este último facultando-lhe a manifestação preliminar sobre o pedido de urgência da autora, no prazo de 72 horas.

Intime-se também, com urgência, a Advocacia Geral da União (PRF1) para a manifestação preliminar no prazo de 72 horas, sem prejuízo da devolução integral do prazo para contestação.

 Cumpra-se.

 BRASÍLIA, 26 de abril de 2021.

Assinado eletronicamente por: CHARLES RENAUD FRAZAO DE MORAIS - 26/04/2021 18:13:51 Num. 517008854 - Pág. 2 http://pje1g.trf1.jus.br:80/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=21042618135171600000511301047

Número do documento: 21042618135171600000511301047

“Isso não tem sentido. Uma interferência de um poder limita o Senado Federal. O Senado tem poderes constitucionais para proceder com a investigação, não pode ter interferência judicial. Na história do Brasil, é a decisão mais esdrúxula”, afirmou Calheiros ao Estadão/Broadcast.

“Não é Carla Zambelli. É o Bolsonaro. O Flávio Bolsonaro anunciou essa decisão segunda-feira”, disse o senador, em referência à entrevista do filho do presidente da República ao jornal O Globo, em que Flávio criticou a indicação de Renan para compor a CPI. “Eu continuo sem saber por que esse medo”, afirmou Renan.

Renan Calheiros negou que a decisão interfira em seu posicionamento como relator da CPI, que deve ser instalada amanhã para investigar a conduta do governo federal na pandemia e o repasse de verbas a Estados e municípios. “Conduzirei a relatoria com absoluta isenção e imparcialidade. Nós queremos ver como destravar a vacinação e, paralelamente, fazer a apuração dos fatos.”

Para o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a decisão do juiz federal deve ser derrubada. “É uma liminar cloroquina: tratamento precoce sem eficácia comprovada e com efeitos colaterais gravíssimos. Acho que não resiste.”

Imparcialidade. Zambelli alegou à Justiça Federal do DF que Calheiros responde a inquéritos no STF por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e improbidade administrativa, o que comprometeria a “imparcialidade que se pretende de um relator”. A parlamentar também sustentou que Renan não poderia assumir a relatoria da comissão, já que as investigações devem também mirar a atuação dos Estados no enfrentamento da pandemia. O senador é pai do governador de Alagoas, Renan Filho (MDB-AL).

Em um despacho de apenas duas páginas, a Justiça Federal do DF determina que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), impeça o nome de Renan em “votação para a composição da CPI da Covid-19 na condição de relator”. A escolha do relator, porém, não depende de eleição e é feita por indicação do presidente da CPI, que deve ser o senador Omar Aziz (PSD-AM). Integrantes da CPI devem se reunir na noite desta segunda-feira, 26, na residência de Omar Aziz.

“Diante da proximidade do ato que se quer obstar (noticiado pelos meios de comunicação para a próxima terça-feira) e em prestígio ao direito de ação da autora, nobre deputada federal, que se soma à iminência do esvaziamento da utilidade do processo ou, no mínimo, o indesejável tumulto dos trabalhos da CPI da Covid-19, na hipótese da concessão futura do pedido de tutela de urgência formulado na inicial, é prudente determinar à Ré que o nome do Senhor Senador Renan Calheiros, não seja submetido à votação para compor a CPI em tela, e isso somente até a vinda da manifestação preliminar sua e da Advocacia Geral da União no caso”, determinou o juiz Charles Renaud Frazão de Morais.

Na mesma decisão, Morais também deu um prazo de 72 horas para que Renan e a Advocacia-Geral da União (AGU) se manifestem sobre o caso. “O exercício do poder geral de cautela do juiz é medida que se impõe para, por prudência, salvaguardar o direito postulado pela autora e, ao mesmo tempo, evitar prejuízo para o desenvolvimento dos trabalhos da CPI e à própria atividade parlamentar do senador demandado”, ressaltou o juiz.

Aziz deve consultar os demais integrantes da comissão sobre a decisão judicial em uma reunião na noite desta segunda-feira, 26. A interlocutores, ele manifestou surpresa pela liminar ter sido dada por um juiz do Distrito Federal e criticou a interferência às vésperas da instalação.

Pressão. Bolsonaristas têm feito pressão nas redes sociais para impedir Renan de assumir o cargo de relator porque ele não apenas é crítico de Bolsonaro como apoia o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nas plataformas digitais, seguidores do presidente afirmam que o senador não pode integrar a CPI por ser pai do governador de Alagoas. Ao avaliar ações e omissões do Executivo no combate à pandemia de covid-19, a CPI também vai investigar o destino do dinheiro repassado pelo governo federal a municípios e Estados, entre os quais Alagoas.

Renan avisou pelo Twitter, na sexta-feira, 23, que se declarava “parcial” para tratar qualquer tema na CPI que envolva Alagoas. “Não relatarei ou votarei. Não há sequer indícios quanto ao Estado, mas a minha suspeição antecipada é decisão de foro íntimo”, disse ele.

Rafael Moraes Moura, Daniel Weterman e Lauriberto Pompeu, de Brasília - DF, para o Estado de S. Paulo, em 26 de abril de 2021 | 19h11.