terça-feira, 9 de dezembro de 2025

É sério isso?

Ao ungir Flávio como sucessor político, Bolsonaro tenta prolongar relevância política. Cena foi mal coreografada e ninguém acreditou que candidatura do filho é para valer

O ex-presidente Jair Bolsonaro e seu filho Flávio - Sérgio Lima/AFP - SERGIO LIMA/AFP

Eu até entendo o que Jair Bolsonaro quis fazer ao ungir o filho Flávio como seu substituto na disputa presidencial. O ainda capitão deve ter imaginado que o gesto pacificaria a família, que está em pé de guerra, e prolongaria por mais algum tempo o maior poder político que ainda lhe resta, que é o de influir sobre o campo da direita no primeiro turno da eleição do ano que vem.

O raciocínio se assenta sobre uma assimetria fundamental. Se Bolsonaro der sua bênção a algum candidato da direita sobre o qual não tenha controle total, como Tarcísio de Freitas ou a algum outro governador, ele na prática se condena à irrelevância, pois teria esgotado seu poder derradeiro.

Dois homens em traje formal, o primeiro em primeiro plano desfocado e o segundo ao fundo focado, ambos com expressão séria. Ambiente interno com outras pessoas ao fundo.

E o quadro fica pior, pois o candidato bolsonarista, para ter uma chance de triunfar no segundo turno, em algum momento precisará afastar-se de Bolsonaro e da grande rejeição que vem com ele.

Com Flávio como indicado, o ex-presidente seguiria no controle do processo, até abril, se for trabalhar para que a direita tenha um candidato competitivo, ou até outubro, se opção for por manter o sobrenome Bolsonaro em evidência.

O problema é que a cena foi tão mal coreografada que ninguém acreditou que os Bolsonaros falavam a sério. Com menos de 48 horas de ungido, o próprio Flávio já anunciava que poderia desistir.

O último Datafolha mostra que o bolsonarismo, embora ainda longe de morto, é uma força em decadência. A maioria dos brasileiros (54%) acredita que a condenação de Jair foi justa —é golpista!— e que ele tentou evadir-se —é fujão!. Se o clã esticar demais a corda, poderá vê-la romper-se. O centrão, embora prefira ver a vitória de um presidente de direita em 2026, sobrevive bem em qualquer ambiente. O bloco não deixou de prosperar com Lula à frente do Executivo.

Resta uma boa notícia para a parcela dos brasileiros que acredita que criminosos condenados devem sofrer na cadeia. A prisão acelera o ocaso da influência política do ex-presidente, e a perda de status social acarreta intenso sofrimento psicológico.

Hélio Schwartsman, o autor deste artigo, é jornalista. Foi editor de Opinião da Folha de S.Paulo. Publicado originalmente em 07. 12. 25 (edição impressa).

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