quinta-feira, 9 de março de 2023

Comissão do Senado vai investigar escândalo das joias de Bolsonaro e Michelle

Bolsonaro almoçou na Embaixada da Arábia Saudita, no Brasil, no mesmo dia em que Bento Albuquerque recebia presentes na Arábia Saudita

Senador Omar Aziz diz que grupo vai apurar razões dos presentes dados pelo regime da Arábia Saudita e também os negócios fechados pelo governo anterior com empresas do Oriente Médio

A tentativa do governo Bolsonaro de entrar ilegalmente no País com joias milionárias presenteadas pelo regime da Arábia Saudita será investigada pela Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC) do Senado. A informação foi dada pelo presidente da comissão CTFC, Omar Aziz (PSB-AM). O parlamentar pretende direcionar os esforços da comissão para apurar negócios que foram fechados entre empresas do Oriente Médio durante a gestão Bolsonaro.

“É papel do Senado Federal a responsabilidade de apurar qualquer desvio de conduta de servidores públicos, seja ele um ministro ou presidente”, disse Aziz ao Estadão. “Essa é uma história mal contada, em que um ministro foi o portador de uma joia valiosa, que deveria ser do povo brasileiros, mas que ele disse que iria para a primeira-dama. Temos que apurar isso.”

Joias: Bolsonaro deu ordem para que diamantes apreendidos fossem cadastrados como acervo privado

Joias de três milhões de euros que seriam entregues a Michelle Bolsonaro foram apreendidas pela Receita Federal pela tentativa de entrada ilegal no País

Joias de três milhões de euros que seriam entregues a Michelle Bolsonaro foram apreendidas pela Receita Federal pela tentativa de entrada ilegal no País Foto: DIV - Wilton Junior/Estadão

Nas redes sociais, Omar Aziz disse que vai abrir a investigação no Senado para apurar temas como a venda refinaria da Petrobras Landulpho Alves, na Bahia, para o fundo árabe Mubadala Capital. “Qualquer violação ao interesse da União, relação com a tentativa de descaminho de joias, ou qualquer ato que tenha gerado vantagens a autoridades nessa venda, será levado à Justiça para punição dos envolvidos.”

O senador afirmou que o primeiro passo da comissão será pedir documentos da Petrobras sobre a eventual avaliação de preço abaixo do valor de mercado do ativo brasileiro para os estrangeiros.

Antes de voltar ao Brasil no dia 26 de outubro de 2021 e tentar entrar no Brasil de forma ilegal com as joias dadas a Bolsonaro pelo regime saudita, o então ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque e sua comitiva tiveram compromissos durante quatro dias em Riade, incluindo encontro com o príncipe Abdulaziz bin Salman Bin Abdulaziz Al-Saud, ministro de Energia da Arábia Saudita, e o príncipe Mohammed bin Salman.

Foi na despedida desta viagem, em 25 de outubro, que o regime árabe entregou os presentes milionários para Bolsonaro, quando deixava o hotel com a sua comitiva para retorno ao Brasil. Naquele mesmo momento, no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro almoçava na Embaixada da Arábia Saudita, em Brasília, na residência de Ali Abdullah Bahittam. Bolsonaro estava acompanhado do filho e senador Flávio Bolsonaro, além do ex-ministro das Relações Exteriores, Carlos França e diplomatas de demais países do Oriente Médio.

Naquele encontro, um dos temas abordados foi a venda da refinaria Landulpho Alves pela Petrobras. A estatal repassou a refinaria para o Mubadala Capital, dos Emirados Árabes. A operação foi concluída em novembro com o pagamento de US$ 1,8 bilhão (R$ 10,1 bilhões à época) para a Petrobras.

As relações que o governo Jair Bolsonaro mantinha com o regime da Arábia Saudita envolveram anúncios de acordos bilionários feitos diretamente pelo então presidente Bolsonaro e Mohammed bin Salman, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita. Dois anos antes da comitiva do então ministro de Minas e Energia deixar a Arábia Saudita com pacotes de joias de diamantes avaliados em cerca de R$ 16,5 milhões, Bolsonaro esteve em Riade, capital do país árabe, para celebrar acordos comerciais que envolviam US$ 10 bilhões (R$ 51,7 bilhões no câmbio atual).

No dia 29 de outubro de 2019, Bolsonaro celebrou a assinatura de um acordo que previa o investimento bilionário no Brasil, por meio do Fundo de Investimento Público saudita (PIF), que exploraria “oportunidades em parceria com o governo brasileiro”.

O próprio Bolsonaro tratou de ir às redes sociais para anunciar a negociação. “O fundo soberano da Arábia Saudita vai investir até US$ 10 bilhões em projetos no Brasil, cerca de R$ 40 bilhões”, escreveu o então presidente, em sua conta no Twitter

O ministro da Casa Civil à época, Onyx Lorenzoni, disse que iria “organizar um conselho de cooperação entre os dois governos, com a iniciativa privada dos dois países para fazer a definição em que áreas e em que velocidade esses recursos vão ser aplicados no Brasil”. Onyx afirmou que o conselho foi, inclusive, uma sugestão das autoridades árabes, e que seria formado em três semanas.

Um dos principais alvos dos árabes eram as concessões de infraestrutura no País, dentro da área de energia e em outros setores incluídos no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que reunia os projetos estatais que seriam repassados à iniciativa privada. Esses acordos, no entanto, não chegaram a avançar, devido a dificuldades tributárias que envolviam a entrada dos recursos no Brasil

Naquela ocasião, o governo Bolsonaro afirmou que a Arábia Saudita é o principal parceiro comercial do Brasil no Oriente Médio. O volume de intercâmbio comercial havia atingido US$ 4,42 bilhões em 2018, soma que superava os fluxos de comércio bilateral do Brasil com vizinhos da América do Sul, à exceção de Argentina, Chile e Colômbia. Tratava-se, também, do maior fornecedor de petróleo do Brasil, tendo suprido 33% do total importado do produto em 2018.

A lista completa das transações discutidas envolvia, ainda uma série de acordos, como cooperação na área de ciência e tecnologia, memorando de entendimento sobre vistos de visita, memorando sobre fundo bilateral de investimentos em produtos de Defesa, acordo de cooperação administrativa em matéria Aduaneira e memorando de entendimento entre o BNDES e o fundo de investimentos Saudi Development, para projetos em financiamento em parceria.

Em junho de 2019, Bolsonaro já tinha se encontrado com o príncipe Mohammed bin Salman, durante a reunião de Cúpula do G20, em Osaka, no Japão. “Há acordos bilaterais propostos em diversas frentes de cooperação, como facilitação de investimentos, ciência e tecnologia, uso pacífico de energia nuclear, e uso do espaço exterior. Em muitas delas, a cooperação bilateral poderia se beneficiar da complementaridade entre o conhecimento técnico existente no Brasil e a ampla disponibilidade recursos da Arábia Saudita”, afirmou o governo Bolsonaro, em outubro de 2019.

Adriana Fernandes e André Borges, de Brasília - DF para O Estado de S. Paulo, em 09.03.23, às 19h50

Nenhum comentário: