sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

‘Quem fizer algo errado será convidado a deixar o governo’, diz Lula em primeira reunião ministerial

Petista disse que ministros devem abrir a porta para receber parlamentares e que vai conversar com o Congresso sem veto ideológico

Lula realizou na manhã desta sexta-feira, 6, sua primeira reunião ministerial como presidente. Foto: Wilton Junior/Estadão

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) abriu a primeira reunião ministerial do seu terceiro mandato com um aviso aos ministros. O petista afirmou que “quem fizer algo errado, será convidado a deixar o governo”. Sua gestão começa em meio à polêmica do envolvimento da ministra do Turismo, Daniela Carneiro (União Brasil-RJ), com familiares de milicianos. Lula pediu a sua equipe que mantenha a porta aberta dos ministérios para receber parlamentares e disse que quer assegurar uma relação harmônica com o Congresso.

Em relação à conduta dos ministros, ao mesmo tempo em que deu o alerta sobre a possibilidade de demitir quem cometer irregularidades, prometeu não deixar ninguém para trás.

Presidente afirmou que não abandonará nenhum de seus ministros 'no meio da estrada'. 

“Todos sabem que a nossa obrigação é fazer as coisas corretas, é fazer as coisas da melhor forma possível. Quem fizer errado sabe que só tem um jeito: a pessoa será simplesmente, da forma mais educada possível, convidada a deixar o governo. E, se cometeu algo grave, a pessoa terá que se colocar diante das investigação e da própria Justiça”, disse Lula.

Como o Estadão mostrou, Lula rejeitou demitir a ministra do Turismo e o Palácio do Planalto saiu em defesa dela, minimizando o episódio.

O presidente ressaltou, porém, que vai apoiar cada um dos ministros nos “momentos bons e ruins” e vai agir como um irmão mais velho ou um pai, com a garantia de ser “honesto” com todos. “Não deixarei nenhum de vocês pela estrada”, afirmou aos 37 ministros. A reunião nesta sexta-feira, 6, foi convocada logo no primeiro dia de governo, mas, diante de desencontros entre os integrantes do governo, Lula decidiu aproveitar o encontro para impor um freio de arrumação.

O governo sofreu com desgastes de imagem e reações negativas do mercado financeiro provocados por opiniões pessoais de seus auxiliares e bate cabeça entre os projetos em análise nos ministérios.

O chefe do Executivo enfatizou que o governo não tem “pensamento único” e que é necessário “esforço” de todos os ministros para superar as divergências e atingir os resultados prioritários. “Nós não somos um governo de pensamento único. Somos um governo de pessoas diferentes. E mesmo pensando diferente, temos que fazer um esforço para que no processo de reconstrução do País a gente pense igual’, disse Lula.

Divergências entre ministros estão explícitas, tanto na equipe econômica, entre Planejamento e Fazenda, quando em áreas como Justiça e Defesa. “Somos um governo de pessoas diferentes e o importante é fazer um esforço para na reconstrução do País a gente construa igual.

Lula afirmou que os ministros têm obrigação de receber deputados e senadores. E ainda lembrou que estará aberto a conversar com todos os partidos e fez uma menção especial à atenção que dará aos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). “Não é o Lira que precisa de mim, é o governo que precisa da boa vontade do presidente da Câmara”, afirmou.

Lula assina termo de posse no Congresso ao lado dos presidentes da Câmara, Arthur Lira, e Rodrigo Pacheco.  Foto: Jacqueline Lisboa/Reuters

“Vou fazer a mais importante relação com o Congresso Nacional que já tive. Estive oito anos na Presidência e eu digo aos líderes Jacques Wagner, (José) Guimarães e Randolfe (Rodrigues), que, desta vez, vocês não se preocupem pois vão ter um presidente disposto a fazer tantas quantas conversas for necessário com lideranças, partidos políticos e os presidente Rodrigo Pacheco e Arthur Lira. Não tem veto ideológico para conversar e não tem assunto proibido em se tratando do bem do povo brasileiro”, afirmou.

O recado do presidente sobre a necessidade de seus auxiliares manter interlocução constante com o Congresso remonta ao mandato da ex-presidente Dilma Roussef (PT), que foi destituída por um processo de impeachment após ter a sua base de sustentação parlamentar esfacelada, enquanto enfrentava a oposição do então presidente da Câmara Eduardo Cunha (União Brasil-RJ).

Após o discurso inicial de Lula e do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que atacou o uso da máquina pública por Bolsonaro para tentar a reeleição e agradeceu os votos recebidos pela chapa, a reunião foi fechada.

Alinhamento

Depois de assistir à exposição de divergências entre integrantes da equipe, Lula aproveita a primeira reunião para impor um “freio de arrumação” na Esplanada. O encontro, com 37 ministros, servirá para Lula enquadrar seus aliados, que já produziram três situações de desgaste em menos de uma semana.

Na lista está a declaração do ministro da Previdência, Carlos Lupi (PDT), de que pretende fazer uma revisão da reforma previdenciária promovida pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, em 2019. Lupi acabou desautorizado pelo chefe da Casa Civil, Rui Costa, que atribuiu a Lula a palavra final sobre anúncios de políticas estudadas nos ministérios.

Houve, ainda, mais um bate-cabeça entre ministros. Desta vez, entre o titular da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB), e o da Defesa, José Múcio. Dino tem classificado os protestos de aliados de Bolsonaro em frente aos quartéis como “incubadoras de terroristas” e cobra o fim desses acampamentos. Múcio, por sua vez, diz que se trata de manifestações da democracia, quando pacíficas. O ministro contou que tem parentes acampados nesses locais.

O Estadão apurou que episódios como o de Lupi, Dino e Múcio devem fazer com que Lula cobre o alinhamento do discurso da equipe. A primeira semana da volta do petista ao Planalto foi marcada por reações duras do mercado financeiro a declarações dos ministros.

O futuro presidente da Petrobras, Jean Paul Prates (PT), também provocou polêmica ao defender a revisão da política de preço de paridade de importação (PPI), que condiciona as mudanças nos preços dos combustíveis às movimentações internacionais.

Recados e agronegócio

Lula prometeu punição a crimes ambientais. O presidente deu um claro recado ao agronegócio, setor econômico em que o ex-presidente e adversário eleitoral Jair Bolsonaro (PL) tinha um pilar de seu eleitorado. O petista afirmou que “pessoas sérias”, “homens de negócio” e “empresários de verdade” do agro, que sabem produzir sem ofender e adentrar biomas como Amazônia e Pantanal, serão respeitados e bem tratados. A fala foi feita enquanto Lula elogiava do ministro da Agricultura Carlos Fávaro (PSD) por ser um elo do governo com os produtores rurais.

“Aqueles que teimarem em continuar desrespeitando a lei, invadindo o que não pode se invadido, usando agrotóxico que não pode ser usado, esse a força da lei imperará sobre eles. Nesse País tudo vale, a única coisa que não vale é cidadão bandido achar que pode desrespeitar a boa vontade da sociedade brasileira, a nossa Constituição e a nossa legislação”, disse Lula.

O petista ainda citou nominalmente os ministros da Educação, Camilo Santana (PT), da Saúde, Nísia Trindade, e da Cultura, Margareth Menezes. Ao ex-governador petista Camilo, Lula disse que deverá se reunir com ele na semana que vem para fazer um levantamento das mais de 4 mil obras paradas no setor educacional. Ao se destinar à Margareth, o presidente disse ser necessário fazer uma “revolução cultural” no País. À Nísia o petista relembrou a responsabilidade da ministra na área da Saúde e disse compreender que ela terá dificuldades em atingir os objetivos.

Weslley Galzo e Felipe Frazão para O Estado de S. Paulo, em 06.01.23

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