terça-feira, 23 de julho de 2019

Porandubas Políticas

Por Gaudêncio Torquato
Abro a coluna com uma historinha de BH.

Cômputo?

Pachequinho e Chico Fulô eram muito populares e vereadores do PTB em Belo Horizonte. Disputavam as mesmas áreas e viviam brigando. Na tribuna, Waldomiro falava de tuber

- Não é computo não, ilustre vereador. É cômputo.

- Eu sei que é cômputo. Mas, falando com Vossa Excelência, eu falo computo.

Foram às vias de fato.

(Quem conta é o impagável amigo Sebastião Nery)

Sístole e diástole

Julho deveria ser na política o mês da diástole, da descontração, eis que é o período de férias escolares, recesso parlamentar, enfim, um tempo dedicado ao relaxamento. Mas não tem sido assim. Os tempos se apresentam bicudos ou, no contraponto à diástole, vivemos momentos de sístole. Uso aqui os conhecidos conceitos da medicina. Sístole e diástole são dois estágios do ciclo cardíaco. Por sístole, entende-se a fase de contração do coração, em que o sangue é bombeado para os vasos sanguíneos, já a diástole é a fase de relaxamento, fazendo com que o sangue entre no coração. Em um adulto normal, a média da pressão sistólica é de 120 milímetros de mercúrio (mmHg), enquanto a diastólica é de 80 mmHg.

Golbery

Em 1980, o general Golbery do Couto e Silva formulava a estratégia de abertura política do governo Geisel usando a imagem de sístole e diástole, explicando que os militares, após o ciclo da contração, se retirariam da política de forma organizada e tutelando a transição democrática. Aliás, o país tem experimentado ciclos sistólicos e diastólicos. As Constituições retratam períodos de centralização e descentralização políticas.

Pedro I

A primeira sístole foi protagonizada por Dom Pedro I, que dissolveu a Constituinte de 1923 e outorgou a nossa primeira Carta Magna, a Constituição de 1824. A grande inovação liberal foi o direito à propriedade privada, transformado num entrave legal a abolição. Toda vez que se falava em acabar com a escravidão, se invocava a dogma liberal. O "Poder Moderador" do imperador estava acima do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. E assim por diante tivemos constituições liberais (como as de 46 e a última, de 88) e autoritárias, como no Estado Novo.

As tensões

Convém explicar, desde já, que empregamos aqui a "terminologia envolvendo coração" não para acentuar o caráter do governo Bolsonaro, mas para realçar o ciclo de tensões vivido por protagonistas da esfera institucional. Há tensão no espaço parlamentar, com os participantes envolvidos na aprovação da reforma da Previdência, há tensão entre o Legislativo e o Executivo, particularmente entre os presidentes Jair Bolsonaro e Rodrigo Maia, tendo como eixo a reforma; há certa tensão entre a esfera política e o ministro Paulo Guedes, que não vê com bons olhos as mudanças que desidratam a Previdência; há tensão sobre a reforma tributária; há muita contrariedade entre Bolsonaro e a classe política, desta feita envolvendo a eventual nomeação do filho do presidente, deputado Eduardo Bolsonaro, para ocupar o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos.

Nomeação esdrúxula

O fato é que o presidente estica a corda para ver se ela se rompe. A nomeação do deputado Bolsonaro para a principal embaixada do país no exterior contraria todas (repetindo) todas as boas normas que regem os estatutos da diplomacia. E do bom senso. Sem experiência no trato da diplomacia, Eduardo teve destacadas pelo pai qualidades que, pasmem, estão mais para arremedo de comédia: fala inglês fluente, fala espanhol, já fritou hambúrgueres no frio do Maine, conhece o trato que os EUA concedem aos imigrantes e é amigo de um filho do presidente. É risível? É. Mas é a pura verdade.

Adequado?

Para piorar esse concerto de notas desafinadas, o presidente arremata com a maior seriedade: se há tantas críticas sobre meu filho, é ele mesmo o nome mais adequado. Novamente risível? É. Mas é a pura verdade. Ou Jair Bolsonaro acha que o governo é "algo para chamar de seu" ou foi levado pela corte de bajuladores ao "mundo da lua".

Agenda própria

O Congresso resgata suas funções. O esforço do presidente Rodrigo Maia, de fazer uma agenda própria na Câmara tem o endosso de Davi Alcolumbre para ser adotada igualmente no Senado. Será a "salvação" no momento em que o presidente Bolsonaro continua a mostrar indisposição para negociar com a classe política. Ocorre que as emendas parlamentares que libera, que se ancoram em polpudos recursos do Orçamento, mostram que a "velha política", que ele tanto vitupera, continua sendo exercida a plena força.



Lava Jato sob pressão

A divulgação de conversas mantidas pelo procurador Deltan Dellagnol com diversos parceiros, incluindo o ex-juiz Sérgio Moro, tem sido um golpe na operação Lava Jato, que perde o ímpeto moralizador. Dellagnol, pelo que se infere, queria juntar recursos com palestras. Vai ter de se explicar. O fato é que a esfera política espera o momento para dar mais tiros na operação. Esse é mais um ponto de tensão. Mais sístole.

Reforma tributária I

Vem aí um longo debate sobre a reforma tributária. Que projeto vai andar? Lembremos: A primeira proposta, a PEC 293/2004, do ex-deputado Luiz Carlos Hauly, contempla a criação de dois tributos: IBS (Imposto com Operações sobre Bens e Serviços) e um imposto seletivo monofásico sobre petróleo, derivados combustíveis, lubrificantes, cigarros, energia elétrica, telecomunicações, bebidas e veículos automotores. Extingue IPI, IOF, CSLL, PIS/Pasep, COFINS, salário-educação, ICMS, Cide-combustíveis e ISS. Incorporaria a CSLL ao IRPJ. Embora possua aspectos positivos como o creditamento amplo, eliminação de tributos cumulativos, simplificação e transparência, a tramitação da iniciativa encontra-se parada desde o ano passado na Câmara dos Deputados.

Reforma tributária II

Já a PEC 45/2019, de autoria do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), aprovada pela CCJ na Câmara dos Deputados no dia 22 de junho, tem como texto-base o projeto elaborado pelo Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e pelo seu diretor, o economista Bernard Appy. A ementa da proposta deixa claro que o objetivo é tão somente a "alteração do sistema tributário" através da substituição de cinco tributos (PIS/COFINS, IPI, ICMS, Pasep e ISS) por um único imposto - IBS.

Reforma tributária III

Quanto à terceira proposta, é patrocinada pelo secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, em combinação com o ministro Paulo Guedes. Prevê a criação de um imposto sobre movimentação financeira (IMF) para substituir alguns tributos Federais reduzindo o custo trabalhista, o que aumentaria a geração de empregos. A adoção deste modelo poderia gerar algumas vantagens como: i) redução do custo de conformidade; ii) facilidade de fiscalização e arrecadação; e iii) diminuição dos custos relativos às contribuições acessórias.

II parte

"Indicação de filho para embaixada é o maior erro de Bolsonaro até agora". (presidente da CCJ, senadora Simone Tebet)

(O entrevero Eduardo Bolsonaro é um convite para fazermos ligeiro passeio pelo mundo da nossa diplomacia)

Ou será que esses nomes não valem nada?

Alexandre de Gusmão

Alexandre de Gusmão (1695 - 1753), o estadista que melhor interpretou a conveniência das regras do uti possidetis (o território pertence a quem tem o controle efetivo sobre ele) e das fronteiras naturais do Brasil.


José Bonifácio de Andrada

José Bonifácio de Andrada e Silva (1763 - 1838), o "Patriarca da Independência" e o "Primeiro Chanceler do Brasil". Entre suas ideias centrais, encontram-se a defesa da abolição dos escravos, a integração das comunidades indígenas e africanas, a reforma do ensino e do uso da terra e a autonomia de atuação externa do país.

Visconde do Rio Branco

José Maria da Silva Paranhos, Visconde do Rio Branco (1819 - 1880), "o mais brilhante diplomata do Império". Além de seu talento para a diplomacia, o Visconde foi também o presidente do Conselho de Ministros mais duradouro do período imperial.


Barão do Rio Branco

José Maria da Silva Paranhos Júnior, Barão do Rio Branco (1845 - 1912), filho de José Maria da Silva Paranhos, acompanhou o pai em missões diplomáticas desde muito jovem. Assim, pôde desenvolver as habilidades que um dia iriam consagrá-lo como herói nacional. Antes de tornar-se o chanceler que permaneceu o maior tempo ininterrupto no comando do Itamaraty, o Barão já servira ao Brasil na Alemanha e em Liverpool, além de ter sido protagonista na resolução da Questão de Palmas, em que Brasil e Argentina disputavam o território que hoje compõe boa parte dos estados de Santa Catarina e Paraná.

Rui Barbosa

Rui Barbosa de Oliveira (1849 - 1923), o nome mais importante do primeiro período republicano brasileiro. Bacharel em Direito, ele atuou como jornalista, advogado, senador, ministro de Estado e diplomata, além de ter sido candidato à presidência em duas ocasiões. Foi um liberal convicto, defensor das liberdades individuais, do modelo federativo e da cidadania, segundo o modelo norte-americano, que lhe serviu de inspiração nos trabalhos de redação da Constituição Republicana de 1891.

Oswaldo Aranha

Oswaldo Euclides de Souza Aranha (1894 - 1960), essencial no processo de transição entre a velha República e a era Vargas, também foi fundamental na história da nossa política externa; representante brasileiro junto à recém-criada Organização das Nações Unidas, Aranha volta, em 1947, a uma posição de prestígio nas relações internacionais do Brasil. O ex-chanceler, além de participar do Conselho de Segurança, que presidiu em fevereiro, chefiou a delegação à I Sessão Extraordinária da Assembleia Geral das Nações Unidas, realizada em abril, da qual foi eleito presidente. Na Segunda Assembleia Geral da ONU, em 1947, Aranha enfrentou a complexa questão da Palestina.

San Tiago Dantas

Francisco Clementino de San Tiago Dantas (1911 - 1964), nome gravado no panteão diplomático brasileiro em razão de um grande feito: contribuir para a renovação e universalização da política externa nacional, até então presa ao paradigma americanista inaugurado pelo Barão, o qual não se adequava mais aos novos tempos e às novas necessidades e potencialidades do Brasil. San Tiago vislumbrou o que ficou conhecido posteriormente como Política Externa Independente, um novo conjunto de princípios de atuação diplomática responsável por ampliar e aprofundar a presença brasileira no mundo.


Araújo Castro

João Augusto de Araújo Castro (1919 - 1975), que desempenhou toda a sua carreira na vida pública como diplomata. Idealista em seus objetivos, mas pragmático em seus métodos, tornou-se um dos expoentes da Política Externa Independente - tradição diplomática que havia sido inaugurada por Afonso Arinos de Melo Franco, quando Jânio Quadros chega à presidência. À frente do Itamaraty a partir de 21 de agosto de 1963, Araújo Castro foi deposto do cargo após o golpe civil-militar de 1964. Em 19 de setembro de 1963, Araújo proferiu, na XVIII Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, o seu famoso discurso dos "Três D's", no qual pugnava pelo desarmamento, pelo desenvolvimento e pela descolonização.


Azeredo da Silveira

Antônio Francisco Azeredo da Silveira (1917 - 1990), competente e inovador o suficiente para deixar sua marca indelével na história da política externa brasileira. Enquanto chanceler durante o governo Geisel, Silveira foi responsável pela execução de uma estratégia de aprofundamento da inserção internacional brasileira que ficou conhecida como Pragmatismo Responsável e Ecumênico, que correspondeu à crescente abertura política no âmbito doméstico.

Gaudêncio Torquato, consultor político, é Professor Titular na USP.
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Um comentário:

João Augusto disse...

Ministro, criticam a política externa de Bolsonaro desde a escolha do seu Ministro das Relações Exteriores, inclusive de que este Ministro seria um tipo de patinho feio entre seus colegas da diplomacia brasileira. Ocorre que de lá para cá tanto a atuação do Ministro quanto a do Deputado Eduardo Bolsonaro só trouxeram vitórias para o Brasil, de aproximação com os EUA, de negociação desta base de Alcântara que até hoje não tinha serventia, de apoio para adentrar na OCDE, de fechar acordo entre União Européia e Mercosul. Oras, acordos entravados por muito tempo foram concretizados rapidamente, vitórias em profusão. Do outro lado tínhamos o Brasil dos sonhos de muitos do Itamaraty, um anão diplomático, refém de parceiros nada fiéis e mesmo complicados, com prejuízos para nosso BNDES, com roubo de propriedade dos brasileiros, prejuízo na renegociação de acordos, como o do gásl que quebrou inúmeras empresas brasileiras enganadas pelo governo que apoiou a tal renegociação, calotes da Venezuela, incluindo fundos de pensão dos funcionários dos Correios, do Banco do Brasil, da Petrobrás, etc. todas estas vergonhosas derrotas e trambiques eram o sonho das grandes autoridades do Itamaraty, os competentíssimos técnicos que de concreto só nos fizeram passar inúmeras vergonhas e prejuízos. Por mim que venha o Bolsonaro, o Eduardo, para mais uma vez nos brindar com gloriosas e benéficas "derrotas" econômicas e diplomáticas e nos afastar das pífias e vergonhosas "vitórias" dos garbosos técnicos do Itamaraty, que inclusive causaram muita suicídios no Brasil, como o do dono de uma cerâmica do Nordeste que se suicidou frente a autoridades estaduais, mais uma vítima dos gases lulistas.