terça-feira, 13 de julho de 2021

Bolsonaro pode ser incriminado por prevaricação, dizem especialistas

Alvo de inquérito da PF no caso Covaxin, presidente insinuou haver distinção na esfera penal entre o chefe do Executivo e demais servidores públicos. Para juristas ouvidos pela DW Brasil, interpretação é equivocada.

Bolsonaro passou a ser alvo de inquérito por suspeita de acobertar corrupção na compra da Covaxin

O presidente Jair Bolsonaro reagiu com incredulidade à abertura de um inquérito pela Polícia Federal para investigar se ele prevaricou no caso das supostas irregularidades na negociação da vacina indiana Covaxin. "O que eu entendo que é prevaricação se aplica a servidor público e não se aplicaria a mim", afirmou ele nesta segunda-feira (12/07).

Na declaração, Bolsonaro pressupõe a existência de uma distinção entre o chefe do poder Executivo e demais funcionários públicos. Amparados em artigos do Código Penal e da Constituição Federal, juristas ouvidos pela DW Brasil afirmam consensualmente que a interpretação é equivocada.

Bruno Seligman de Menezes, professor de Direito Penal na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), lembra que o direito administrativo conceitua os agentes públicos em um sentido amplo. Entre eles está o agente político, que se investe em um cargo público por meio de uma eleição, designação ou competência constitucional.

"É o caso dos chefes do poder Executivo, membros do Legislativo, Judiciário e ministérios públicos. Ou seja, não há dúvida que a chefia do poder Executivo federal é um agente político. A Lei 8.429, de improbidade administrativa, deixa isso claro", diz.

Pelo artigo 2º da referida lei, é considerado agente público todo aquele que exerce cargo ou função pública nos poderes da União, dos estados ou municípios, "ainda que transitoriamente ou sem remuneração".

A definição do Código Penal

O Código Penal brasileiro, de 1940, é muito anterior à Constituição Federal de 1988. Portanto, certos conceitos não estão moldados à estrutura constitucional vigente. Ainda assim, no artigo 327, o texto deixa claro que políticos em cargos eletivos estão sujeitos às mesmas condições penais dos demais servidores.

"Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública", diz o Código.

Fazendo referência ao artigo do Código Penal em questão, o advogado criminalista Augusto de Arruda Botelho afirma que a interpretação de Bolsonaro está equivocada. "É importante dizer que isso diz muito sobre a gestão do governo atual, em que o presidente da República não se considera funcionário público", critica.

Antonio Santoro, professor de Direito Processual Penal na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), enxerga uma manifestação do autoritarismo de Bolsonaro por trás de sua declaração.

"O autoritarismo é precisamente a compreensão de que quem exerce o poder não se submete às regras, e só têm direito aqueles a quem o exercente do poder concede esse benefício. Bolsonaro tem exatamente essa visão. Nesse sentido, ele entende que as regras de direito não se aplicam a ele, inclusive as de direito penal", afirma.

O inquérito da PF

A abertura de inquérito pela Polícia Federal nesta segunda-feira partiu de um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), feito no dia 2 de julho, com autorização do Supremo Tribunal Federal (STF).

O inquérito será conduzido pelo Serviço de Inquéritos Especiais (Sinq) da PF, porque Bolsonaro tem foro privilegiado. O prazo inicial para conclusão das investigações é de 90 dias, mas pode ser prorrogado.

A investigação é motivada pelo depoimento do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, chefe de importação do Departamento de Logística, e seu irmão, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), à CPI da Pandemia no dia 25 de junho. Na ocasião, eles afirmaram ter informado Bolsonaro, em março, sobre suspeitas de corrupção na negociação da vacina indiana Covaxin.

Nesta segunda-feira, o presidente quebrou o silêncio sobre o caso e confirmou que foi alertado pelos irmãos Miranda, tendo repassado as informações ao então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.

"Falei com Pazuello, foi visto que tinha inconsistências no pedido e passei para frente os papéis que ele [Miranda] deixou lá", disse o presidente em coletiva de imprensa.

O crime de prevaricação, pelo qual o presidente é investigado, consiste em "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal". Bruno Seligman de Menezes explica tratar-se de um crime contra a administração pública, de menor potencial ofensivo, que só pode ser praticado por um funcionário público.

"Todo crime com pena inferior a dois anos se processa segundo os juizados especiais criminais, o que garante ao autor do fato uma série de benefícios para que o processo não chegue ao fim", comenta.

Finalidade do ato é determinante

Embora contraponha-se à narrativa de Bolsonaro sobre a distinção entre o presidente da República e demais servidores públicos, Seligman é cauteloso ao analisar supostos indícios de prevaricação por parte do presidente da República no caso Covaxin.

O professor da UFSM ressalta que tal caracterização só pode ser confirmada se houver o "especial fim de agir", nos termos do direito penal. Ou seja, a clara demonstração de que o cometimento do ato, ou a omissão de sua realização, teve a intenção de satisfazer um sentimento ou interesse pessoal.

"Se essa finalidade não for demonstrada, a prevaricação está descaracterizada. Não há crime. A simples ocorrência de um fato, por si, não nos autoriza a concluir se houve ou não prevaricação", explica.

Na mesma linha, Augusto de Arruda Botelho afirma não dispor de elementos suficientes no momento para avaliar se Bolsonaro incorreu no crime pelo qual é investigado.

"É preciso que haja uma investigação, que deve acontecer, a colheita de depoimentos e demais provas, para então se chegar eventualmente a uma conclusão. Os elementos divulgados pela imprensa até agora não me permitem confirmar ou negar essa possibilidade", afirma.

Antonio Santoro, por sua vez, destaca que a eventual vantagem recebida por Bolsonaro pode não ter sido financeira, mas política, como a garantia de apoio do Centrão no Congresso.

"O que eu não tenho certeza é se ele de fato prevaricou ou se ele praticou corrupção. A meu ver, receber uma informação de que um crime esteja sendo cometido e não tomar providências pode ser prevaricação, mas pode ser corrupção passiva em várias formas", diz o professor da UFRJ.

Deutsche Welle Brasil, em 13.07.21

Porandubas Políticas

Por Torquato Gaudêncio

A paixão de Cristo

O que vou narrar deu-se na encenação da Paixão de Cristo numa cidadezinha da Paraíba. O dono do circo, em passagem pela cidade, resolveu encenar a Paixão de Cristo na Sexta-Feira santa. Elenco escolhido dentre os moradores e no papel de Cristo, o cara mais gato da cidade. Ensaios de vento em popa. Às vésperas do evento, o dono do circo soube que 'Jesus' estava de caso com sua mulher. Furioso, deu-se conta que não podia fazer escândalo sob pena de perder o investimento. Bolou uma maneira. Comunicou ao elenco que iria participar fazendo o papel do 'centurião'.

- Como? - reclamaram - Você não ensaiou!

- Não é preciso ensaiar, porque centurião não fala!

O elenco teve de aceitar. Dono é dono. Chegou o grande dia. Cidade em peso compareceu. No momento mais solene, a plateia chorosa em profundo silêncio. Jesus carregando a cruz ... e o 'centurião' começa a dar-lhe chicotadas.

- Oxente, cabra, tá machucando! Reclamou Jesus, em voz baixa.

- É pra dar mais veracidade à cena, devolveu o centurião.

E tome mais chicotada. Chicote comendo solto no lombo do infeliz. Até que Jesus enfureceu-se, largou a cruz no chão, puxou uma peixeira e partiu pra cima do centurião:

- Vem, desgraçado! Vem cá que eu vou te ensinar a não bater num indefeso!

O centurião correndo, Jesus com a peixeira correndo atrás, e a plateia em delírio gritando:

- É isso aí! Fura ele, Jesus! Fura, que aqui é a Paraíba, não é Jerusalém, não!

Panorama visto da sacada

Nesses tempos de reclusão, é agradável contemplar o panorama da sacada. Melhor que tentar ver as cores da paisagem na solidão do escritório. Daqui dá para enxergar que o comandante em chefe das Forças Armadas se vale da sua condição de militar para continuar a se referir ao "meu Exército", continuar a dizer que só perderá em outubro de 2022 se houver "fraude", fustigar a CPI da Covid-19 e até a dar estocadas no STF.

Delfim Netto

Daqui, dá para refletir sobre uma entrevista de Delfim Netto, o ex-todo poderoso ministro da Fazenda dos tempos de chumbo, ver que ele acredita na vitória de Lula no primeiro turno das eleições do próximo ano e mais: que Bolsonaro não contaria com apoio das Forças para alguma ação golpista, devendo ir tranquilamente para a casa depois de derrotado democraticamente nas urnas eletrônicas. Derrota que acontecerá mesmo que o PIB chegue a 5% este ano. Este analista, com todo respeito e interlocução que mantém com Delfim, um amigo, não é fiador dessa hipótese.

PIB da felicidade

Se o PIB jogar dinheiro no bolso do consumidor e tivermos uma vacinação em massa, como tenho repetido em minhas análises, o capitão deverá manter seu assento no Palácio do Planalto. A não ser que essas hipóteses não se realizem, Bolsonaro poderá resgatar a força e a condição de favorito. O PT no poder reabriria o passado de lodo. Não será simples uma volta de Lula por cima de todo o contencioso que cobre a imagem do lulopetismo. A decisão do STF de anular as sentenças do ex-juiz Sergio Moro, condenando Lula, não será suficiente para apagar sua trajetória, eis que os casos continuarão a infestar os espaços midiáticos. A conferir.

PIB infeliz

O Sul (SC, RS e PR) e o Centro-Oeste são as regiões onde o PIB da Felicidade é maior. O Nordeste lidera o PIB da Infelicidade. O índice acaba de sair.

Semipresidencialismo

Juristas, como Gilmar Mendes e Luís Barroso, políticos e perfis de prestígio, como o ex-presidente Michel Temer, apontam para o semipresidencialismo, maneira de atenuar os perigos da governabilidade sob as asas de Bolsonaro e de Lula. Ou seja, não haveria de ter receio da vitória de um ou outro, na medida em que um novo sistema de governo passaria o poder de governar a um primeiro-ministro, cabendo ao presidente chefiar o Estado, fazer as honras da Casa em matéria de relações internacionais, deixando a rotina com um ministério organizado pelas forças legislativas. Este analista acredita que esta mudança encontrará imensos desafios. Vejamos.

A cultura presidencialista

A semente presidencialista viceja em todos os espaços, dos mais simples e modestos aos mais elevados. Por estas plagas, o termo presidente faz ecoar significados de grandeza, forma associação com a aura do Todo-Poderoso, com as vestes do monarca, com a caneta do governante que tem influência, poder de mandar e desmandar. Até no futebol o presidente é o manda-chuva. O chiste é conhecido: como o ato mais importante da partida de futebol, o pênalti deveria ser cobrado pelo presidente do clube.

De presidente para presidente

Em 1980, no final do Campeonato Brasileiro, o Flamengo ganhou por 3 a 2 do Atlético Mineiro, em polêmica partida disputada no Maracanã. O árbitro expulsou três jogadores do Atlético, a bagunça tomou o campo e agitou os nervos. No fim, transtornado com o "resultado roubado", Elias Kalil, presidente do Atlético, exclamou aos berros: "Vou apelar para o presidente da República, João Figueiredo! Vou falar pra ele de presidente para presidente!" O culto à figura do presidente e, por extensão, a outros atores com forte poder de mando faz parte da glorificação em torno do Poder Executivo.

Aparato milenar

Tarefa impossível essa de pegar um machado para cortar o tronco do patrimonialismo ibérico. Herdamos da monarquia portuguesa os ritos da Corte: admiração, bajulação, respeito e mesuras, incluindo o beija-mão. O sociólogo francês Maurice Duverger defende a tese de que o gosto latino-americano pelo sistema presidencialista tem de ver com o aparato monárquico na região. O vasto e milenar Império Inca, com seus grandes caciques, e depois o poderio espanhol, com seus reis, vice-reis, conquistadores, aventureiros e corregedores, plasmaram a inclinação por regimes de caráter autocrático. O presidencialismo por estas plagas agregaria forte dose de autocracia.

Coronelismo

Lembremos que a semente do presidencialismo tem sido plantada na mesma terra da semente do "coronelismo", vetor que até hoje impera na política brasileira, definido por Vitor Nunes Leal em Coronelismo, Enxada e Voto como compromisso, "troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência dos chefes locais, notadamente os senhores de terras". Portanto, a política nacional tem seu desdobramento no espaço da estrutura agrária, onde residem as manifestações do poder privado que se apropria da esfera pública, fenômeno visível e presente ainda hoje no interior do País. Como lembra Nunes Leal, o sistema coronelista gerou filhotes, como o mandonismo, o filhotismo, o falseamento do voto, a desorganização dos serviços públicos locais. Seu lema era: "para os amigos, pão; para os inimigos, pau". Ou, em outros termos: "para os amigos, tudo; para os inimigos, a lei".

Parlamentarismo

Já o parlamentarismo que vicejou na Europa teria se inspirado na ideologia liberal da Revolução Francesa, cujo alvo era a derrubada do soberano. Isso explicaria a frieza europeia ante o modelo presidencialista. A disposição monocrática de exercer o poder vem, no Brasil, desde 1824, quando a Constituição atribuiu a chefia do Executivo ao imperador. A adoção do presidencialismo, na Carta de 1891 - que absorveu princípios da Carta americana de 1787 -, só foi interrompida no interregno de 1961 a 1963, quando o País passou por ligeira experiência parlamentarista. Eliminar os galhos da árvore presidencialista é missão para algumas gerações.

A estadania

Outra faceta que se conecta ao presidencialismo é a estadania. Expliquemos. Entre nós, a cultura do Estado prevalece sobre a cultura do cidadão. No Brasil houve uma inversão da lógica descrita por Thomas Marshall, em Cidadania, Classe Social e Status. José Murilo de Carvalho lembra que as nações democráticas, a partir da Inglaterra, implantaram, primeiro, as liberdades civis, a seguir, os direitos políticos e, por último, os direitos sociais. Por aqui, estes vieram primeiro. O Poder Executivo, operando as ações públicas, eleva-se no conceito das pessoas por simbolizar o distribuidor de 'benesses'. Direitos são vistos como concessões, e não como prerrogativas da sociedade, criando uma 'estadania' que sufoca a cidadania. Getúlio Vargas, ao fomentar as leis sindicais (CLT) e o sindicalismo na década de 30, criou um processo de tutela, amortecendo o ânimo social e dificultando a emancipação política da sociedade. Não por acaso, critica-se a força avassaladora do presidencialismo de cunho imperial.

A dependência do Estado

Desde o final do século XIX, o Brasil tenta construir, lenta e gradualmente, o altar da Cidadania de sua gente. Em 1881, tinha 12 milhões de habitantes, dos quais poucos eram imunes à manipulação dos governos. Ainda hoje, traços de uma população amorfa impregnam nossa identidade, reflexo da carga negativa que paira sobre a fisionomia nacional: a pobreza educacional das massas; a perversa disparidade de renda entre classes; o sistema político resistente às mudanças; o hiperpresidencialismo de cunho imperial etc. Não é à toa que o assistencialismo, como dádiva, corre nos desvãos das três esferas da administração pública. O adjutório que os governos criam e ampliam é o anzol para "pescar" os peixes em mares escassos de alimentos.

Anomia

Outra faceta bem transparente é a anomia que se espraia no país, um território que parece desconhecer as leis. Corruptos e facínoras, se condenados, ganham o mesmo status perante a lei. Esse estado anômico vem de longe. Desde os idos da colônia e do Império, fomos afeitos ao regime de permissividade, apesar da rigidez dos códigos. Tomé de Souza, primeiro governador-geral, chegou botando banca. Os crimes proliferavam. Avocou a si a imposição da lei, tirando o poder das capitanias. Um índio que assassinara um colono foi amarrado na boca de um canhão. Ordenou o tiro para tupinambás e colonos entrarem nos eixos.

As ordenações

Mas em 1553 uma borracha foi passada na criminalidade, com exceção dos crimes de heresia, sodomia, traição e moeda falsa. Depois vieram as Ordenações do Reino (Afonsinas, Manuelinas e Filipinas), que vigoraram até 1830. De tão severas, a ponto de estabelecerem a pena de morte para a maioria das infrações, espantaram até Frederico, o Grande, da Prússia, que ao ler Livro das Ordenações, chegou a indagar: "Há ainda gente viva no reino de Portugal?" Mas os castigos acabavam perdoados. A regra era impor uma dialética do terror e do perdão para fazer do rei um homem justiceiro e bondoso, como relata Luís Francisco Carvalho Filho em ensaio sobre a impunidade no Brasil.

Poranrápidas

1. Voto impresso? Não passa

O voto impresso é uma expressão recorrente na boca do nosso presidente. Pois bem, a MP do voto impresso não passa.

2. Cinturão apertado

O cinturão do governo está mais apertado. Continua a cair a avaliação positiva do bolsonarismo. Não a ponto de tirar o fôlego da máquina.

3. Impeachment

Só mesmo com povo na rua. Este analista não divisa condições de pressão. Por enquanto. Pandemia e economia complementam os fatores desta equação.

4. Tebet

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) seria um bom nome para entrar no páreo presidencial.

5. Segundo semestre

Quanto mais demorar a CPI, pior para o governo. Se for prolongada em mais 90 dias, governo chegará ensanguentado às portas do Ano Novo.

Fecho a coluna com Diógenes

Patrimônio histórico

Teremos o nosso Forte dos Reis Magos inserido no patrimônio nacional? Esta é a crença deste escriba com a nomeação do professor, escritor, poeta e advogado Diógenes da Cunha Lima como o primeiro potiguar a ocupar o cargo de conselheiro no Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, órgão que integra o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Diógenes cumprirá um mandato de 4 anos. E o Iphan é o órgão que trata das questões relativas ao patrimônio cultural brasileiro. Já integraram a entidade intelectuais como Carlos Drummond de Andrade, Edgar Roquete Pinto e Afonso Arinos de Melo Franco, entre outros grandes perfis.

Torquato Gaudêncio, cientista político, é Professor Titular na Universidade de São Paulo e consultor de Marketing Político.

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A população já entendeu

No ano passado, Bolsonaro disse que acabou com a Lava Jato porque não havia mais corrupção. A realidade é diferente.

Não é o impeachment que desestabiliza a política. No caso, o impeachment é para tirar quem vem desestabilizando não apenas a política, mas as próprias eleições de 2022, com ameaças e chantagens.

Desde que assumiu a Presidência da República, Jair Bolsonaro tem feito afirmações contundentes a respeito da inexistência de corrupção no governo federal. Diz não apenas que extinguiu os malfeitos, mas que a alegada probidade deu folga para os órgãos de controle. “Eu acabei com a Lava Jato, porque não tem mais corrupção no governo”, disse Bolsonaro em outubro do ano passado.

Parece, no entanto, que as afirmações de Jair Bolsonaro não contavam com o sistema de freios e contrapesos, próprio de um Estado Democrático de Direito. Com três meses de CPI da Pandemia, apareceram escândalos envolvendo a negociação e a compra de vacinas contra a covid. E a população já entendeu que a realidade é um pouco diferente daquela defendida repetidamente por Jair Bolsonaro.

Segundo pesquisa do Instituto Datafolha, 70% dos brasileiros acreditam que há corrupção no governo Bolsonaro. Questionados sobre o Ministério da Saúde – aquele no qual o presidente Jair Bolsonaro trocou duas vezes a chefia até encontrar alguém que o obedecesse cegamente –, 63% dos entrevistados afirmaram acreditar que existe corrupção na pasta.

Além disso, a percepção da maioria da população não é a de que o presidente da República estava alheio à corrupção. Para 64% dos entrevistados, Jair Bolsonaro sabia dos malfeitos praticados dentro do Ministério da Saúde. Apenas 25% disseram acreditar na tese, também utilizada por Luiz Inácio Lula da Silva, de que o presidente da República não sabia de nada. 

O assunto está sendo agora investigado oficialmente. Após notícia-crime apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) por três senadores, o Ministério Público Federal (MPF) solicitou e a Polícia Federal abriu inquérito para investigar se o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de prevaricação no episódio escandaloso da compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde.

É estranho, no entanto, que, a despeito do discurso sobre a inexistência de mau uso de verbas públicas em seu governo, Jair Bolsonaro reitere os motivos para duvidar da alegada lisura. No sábado passado, por exemplo, o presidente Bolsonaro foi a Porto Alegre participar de uma motociata em defesa de sua reeleição. Obviamente, a movimentação de Jair Bolsonaro para sua campanha de 2022 tem custos, que não podem ser financiados com recursos da Presidência da República.

Desde que Lula tentou usar a máquina pública para a reeleição, a Justiça Eleitoral tem afirmado que gastos de campanha devem ser financiados pelo partido do candidato, e não pelos cofres públicos. Por exemplo, se o presidente da República vai a um evento de campanha, o combustível da aeronave deve ser pago por quem financia sua campanha, e não pelos recursos federais. Quem pagou a viagem de Jair Bolsonaro a Porto Alegre e todos os demais gastos envolvidos?

Com a ajuda da CPI da Pandemia, a cada dia que passa é mais fácil entender por que o governo federal se opôs o quanto pôde à sua instauração. E mais de dois terços da população entenderam que o discurso sobre corrupção é um e a realidade, outra. Quem não entendeu até agora o que se passa foi o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL).

Depois da divulgação de pesquisa do Instituto Datafolha indicando que a maioria dos brasileiros é favorável ao impeachment de Jair Bolsonaro, Arthur Lira reiterou sua posição de aliado do Palácio do Planalto. “Não temos condição de um impeachment para esse momento. O Brasil não deve se acostumar a desestabilizar a política em cada eleição”, disse o presidente da Câmara no sábado passado.

Não é o impeachment que desestabiliza a política. No caso, o impeachment é para tirar quem vem desestabilizando não apenas a política, mas as próprias eleições de 2022, com ameaças e chantagens. Antes, alguém podia pensar que toda a confusão do bolsonarismo era para esconder a incompetência de Jair Bolsonaro ou para consagrar alguma estranha ideologia, que tenta de todos os modos atrapalhar o próprio governo. Agora, no entanto, a maioria da população já entendeu que existem outros motivos para ameaçar as eleições.

Editorial de O Estado de São Paulo, em 13.07.21

"Acuadas, redes bolsonaristas estão mais extremistas"

Pesquisador que acompanha grupos de extrema direita nas redes sociais no Brasil afirma que eles estão propagando teorias cada vez mais fantasiosas e mais odiosas. Narrativas para 2022, diz, já estão preparadas.

Na rotina do pesquisador brasileiro David Nemer está ler, todos os dias, a atividade de dezenas de comunidades bolsonaristas. Em 2017, quando começou esse trabalho, eram apenas quatro grupos, todos de Whatsapp. Com o passar do tempo, ele acabou se inscrevendo também no Telegram

"Hoje estou em 73 grupos, já que de um acaba saindo outro. Eles meio que se implodem [com o passar do tempo], e colocam convites de grupos nos próprios grupos. Uma bola de neve", conta ele.

Só a leitura desse material consome até duas horas diárias de Nemer, que tem um celular usado especificamente para o "trabalho de campo". Então ele se debruça sobre os temas abordados e produz análises acadêmicas que mostram a evolução e as transformações desses discursos da direita brasileira.

Para o pesquisador, o cenário vai além da desinformação, "que sempre existiu na política”. Naquilo que ele vem chamando de um comportamento de "milícias digitais", há o uso indiscriminado de plataformas sociais, baseadas em algoritmos, para induzir escolhas e reduzir debates e liberdade de pensamento — um modus operandi financiado por grupos de empresários e verbas que seriam de gabinetes parlamentares, conforme ele aponta, em entrevista à DW Brasil.

Graduado em ciências da computação e administração, Nemer é professor no departamento de Estudos de Mídia da Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos. 

DW Brasil: Como você faz para monitorar esses grupos bolsonaristas?

David Nemer: Tenho um celular específico para isso. Desde o fim de 2017, estou em grupos que são políticos, bolsonaristas. Principalmente Whatsapp mas, devido a um movimento recente, também Telegram. Muita gente fala que sou infiltrado, mas não, eu recebi esses convites para ingressar, o link para fazer parte dos grupos. Comecei em quatro, hoje estou em 73, já que de um acaba saindo outro. Eles meio que se implodem [com o passar do tempo], e colocam convites de grupos nos próprios grupos. Uma bola de neve. Passo de 1h a 2h por dia lendo os comentários desses grupos, vou tentando identificar temas e tento entender um pouco a cultura da desinformação, das milícias digitais, como eles se organizam e como funciona a difusão da desinformação. É minha abordagem teórica.

Considerando o cenário atual, de CPI e baixa popularidade do governo Bolsonaro, como você tem avaliado o comportamento dessas redes?

As redes bolsonaristas estão acuadas e na defensiva. Isso não quer dizer que não estão atacando, [mas sim que, por conta do cenário] elas ficam mais extremistas, com teorias mais fantasiosas, mais odiosas e com narrativas que não fazem muito sentido. Também há a questão da central da desinformação, o chamado gabinete do ódio, que parece não estar enviando mais ordens para as redes ou para os grupos de Whatsapp. Isso faz com que os grupos fiquem desalinhados, cada um falando uma coisa. Até meados de 2020, eles ficavam alinhados, hoje não mais. Orquestrações tenho visto em poucas oportunidades desde o fim de 2020, o que mostra que esses gabinetes centrais ou estão perdidos ou perderam o financiamento.

Você já percebe discursos preparados para as eleições do ano que vem?

Desde 2018, as redes bolsonaristas, as milícias digitais, têm a esquerda como um alvo — o Lula, o PT, o comunismo. Não é de surpreender que, hoje, com o Lula liderando as pesquisas de intenção de voto, eles dobrem a aposta nesses alvos. Esse discurso já estava pronto, é um ataque que nunca saiu das redes. O ataque novo que a gente vê recentemente é o ataque ao processo eleitoral e às urnas eletrônicas. Bolsonaro já fala insistentemente que não vai aceitar as eleições se não tiver voto impresso, embora já esteja mais que explicado que o voto é auditável, é seguro, que as eleições são seguras. É irônico falar isso, já que Bolsonaro, todas as vezes que concorreu pelas urnas eletrônicas, ele ganhou. Não teve uma eleição em que perdeu. As narrativas para 2022 já estão preparadas: dobrar a aposta no ataque ao Lula e ao PT e continuar ainda mais essa guerra contra o sistema eleitoral, o TSE e as urnas eletrônicas.

Em seu livro Favela Digital, você mostra como o acesso à internet é uma ferramenta transformadora para comunidades marginalizadas. Trazendo essa discussão para os tempos de covid-19 e de ensino à distância, como você enxerga a situação atual do Brasil?

A internet tem a potencialidade de ser transformadora, mas isso depende muito de quem a usa. Na favela, a internet acaba sendo uma ferramenta transformadora porque os moradores usam a tecnologia para esse fim. E quando a gente tem esse entendimento e contrasta isso com os números de acessos à internet no Brasil, a gente vê o quanto essas áreas continuam sendo marginalizadas. No Brasil, uma a cada quatro pessoas não tem acesso à internet. Mas nas classes D e E, apenas 57% das pessoas têm acesso à internet. Não basta só olhar esse número, porque ele conta, por exemplo, utilização por telefone, por wi-fi. A gente sabe que para ter uma experiência no mínimo aceitável de ensino à distância, a criança precisa ter um laptop ou um desktop. O tablet pode resolver um pouco. Essa não é a realidade.

A maioria do acesso nessas classes D e E é por celular e o celular não é o ideal para o ensino à distância, o que acentua ainda mais as desigualdades no Brasil e não propõe uma educação de qualidade para essas pessoas. A precariedade do ensino público brasileiro é acentuada pelas condições em que esses moradores utilizam e acessam o ensino à distância.

Como você avança essa discussão em seu novo livro, Tecnologia do Oprimido, com lançamento previsto para outubro?

Trago a abordagem de Paulo Freire [educador e filósofo brasileiro, autor de Pedagogia do Oprimido] para o livro. É resultado de pesquisas que faço nas favelas de Vitória [no Espírito Santo, terra natal de Nemer] desde 2012. É baseado na minha etnografia nas favelas de Vitória, onde mostro que os moradores de favela, que são oprimidos e resistem o tempo todo às forças de expressão, se apropriam de tecnologias que são desenvolvidas sob a premissa do opressor para achar uma certa libertação de algumas opressões.

Eu mostro que a tecnologia pode trazer mais opressão, mas também essa apropriação pode trazer uma certa libertação para os moradores de favela. A selfie, por exemplo, usada de forma supérflua nas redes sociais, é usada por eles para se comunicar, um morador com outro, sem dizer palavras explícitas, seja por medo de retaliação do tráfico de drogas, seja para até mesmo passar pela barreira do analfabetismo.

Meu livro tem o exemplo de uma pessoa que não sabia ler nem escrever mas usava selfie, postava no Facebook, para poder comunicar com a mãe que estava bem — e a mãe checava no trabalho. O livro fala sobre como eles se apropriaram de espaços tecnológicos para achar uma certa segurança, uma certa paz. Falo também sobre a tecnologia do opressor, que é justamente essa pesquisa das fake news, como o opressor também utiliza a tecnologia para trazer apoio a governos de extrema direita. Termino o livro com um capítulo chamado Tecnologia da Esperança, em referência ao livro Pedagogia da Esperança do Paulo Freire. Falo sobre a esperança de um futuro melhor, depois desse estado pandêmico e de extrema direita. Falo sobre a luta dos moradores de favela.

Deutsche Welle Brasil, em 12.07.21

domingo, 11 de julho de 2021

A que o Senado deve estar atento

A discussão sobre a religião do futuro ministro do Supremo não tem relevância

Em reunião no dia 6 de julho com ministros de Estado, o presidente Jair Bolsonaro informou que vai indicar para o Supremo Tribunal Federal (STF) o advogado-geral da União, André Mendonça. O ministro Marco Aurélio Mello se aposentará no dia 12 de julho.

No dia anterior, dia 5, o presidente Jair Bolsonaro já havia tratado do assunto. “Vou indicar (para o STF) um evangélico agora”, disse Bolsonaro a apoiadores, na frente do Palácio da Alvorada. André Mendonça é pastor da Igreja Presbiteriana Esperança de Brasília.

Em conformidade com o caráter laico do Estado, a Constituição de 1988 não estabelece nenhuma condição a respeito da religião dos integrantes do Supremo, bem como de nenhum outro cargo público. Todos são iguais perante a lei, com os mesmos direitos e os mesmos deveres.

A Constituição fixa, isso sim, outras condições para os ministros do Supremo. “O STF compõe-se de 11 ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.”

Essas duas últimas condições não são requisitos abstratos ou de difícil aferição. É preciso que não haja nenhuma dúvida sobre o notável saber jurídico e a reputação ilibada do indicado. Se houver alguma inquietação a respeito de algum dos dois pontos, a exigência constitucional não está preenchida – e o Senado deve barrar a indicação.

Sob a perspectiva constitucional, a discussão sobre a religião do futuro ministro do Supremo não tem nenhuma relevância. Observa-se, assim, mais uma tentativa do presidente Jair Bolsonaro de confundir o debate público.

No processo de nomeação de um novo ministro do STF, o decisivo é avaliar se a trajetória da pessoa indicada revela a independência necessária para defender a Constituição, especialmente nos casos que exijam contrariar aliados políticos, irmãos de fé ou parceiros de família.

Esse aspecto deve ser avaliado pelo Senado em todas as indicações para o Supremo. Mas, no caso de Jair Bolsonaro, o assunto ganha especial gravidade, em razão das próprias declarações do presidente.

No ano passado, Jair Bolsonaro explicou sua escolha para o STF da seguinte maneira: “Kassio Nunes já tomou muita tubaína comigo. (...) A questão de amizade é importante, né?”. Diante desses critérios, sem nenhuma aderência aos princípios republicanos, o Senado tem de estar especialmente atento para o comportamento do indicado ao Supremo na sabatina que fará. 

Ressalta-se que tal avaliação não consiste em exercício de futurologia, como se os senadores tivessem de adivinhar quais serão as futuras atitudes da pessoa indicada, uma vez ocupando uma cadeira no Supremo. O exame é outro. Trata-se de verificar qual é o grau de compromisso com a Constituição que o histórico do candidato revela.

Adverte-se, desde já, que a atuação pública do atual advogado-geral da União tem deixado a desejar precisamente no quesito mais essencial para o cargo de ministro do STF: o respeito à Constituição deve ter precedência sobre lealdades políticas ou relações pessoais. Nos últimos meses, especialmente durante o período em que esteve à frente do Ministério da Justiça, André Mendonça notabilizou-se por sujeitar os mandamentos constitucionais aos interesses de Jair Bolsonaro.

Enquanto esteve no Ministério da Justiça, André Mendonça pôs o aparato estatal para perseguir opositores do governo Bolsonaro. Por exemplo, instou os órgãos de investigação a atuar contra um professor que instalou, no Tocantins, dois outdoors críticos a Jair Bolsonaro. Um Estado Democrático de Direito demanda outro tipo de compromisso com as garantias individuais. Não se pode esquecer de tal forma a Constituição para agradar ao presidente da República e sua turba. 

O Senado não tem de olhar para a religião de André Mendonça. Sua condição de pastor evangélico não o qualifica nem o desqualifica para o cargo. A função de ministro do Supremo é essencialmente laica e diz respeito a todos os brasileiros. Trata-se de verificar se, no exercício de suas funções públicas, o indicado tem inegáveis condições de manifestar respeito incondicional à Constituição.

Editorial / Notas&Informações, O Estado de S.Paulo, em 11 de julho de 2021 

Polícia Federal abre inquérito para investigar Bolsonaro

Presidente vai ser investigado por suspeita de acobertar corrupção na compra de vacina indiana. Caso tem origem na denúncia dos irmãos Miranda.

Apuração tentará esclarecer se Bolsonaro tomou providências após ser alertado sobre supostas irregularidades

A Polícia Federal instaurou nesta segunda-feira (12/07) inquérito para investigar se o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de prevaricação em relação à negociação do governo para a compra da vacina Covaxin.

A apuração foi aberta a pedido da Procuradoria-Geral da República e autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ela é originada das acusações do deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que afirma ter alertado o presidente sobre irregularidades nas tratativas e pressões sofridas por seu irmão, que é servidor do Ministério da Saúde.

Segundo a lei, a prevaricação ocorre quando um agente público deixa de agir ou retarda ação "contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal". No caso do presidente, a investigação tentará esclarecer se ele foi mesmo informado e se tomou medidas em relação ao caso.

O contrato para a compra da Covaxin está no centro de um escândalo que envolve o presidente Jair Bolsonaro, o líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), o ex-diretor de logística do Ministério da Saúde Roberto Dias, e o ex-secretário-executivo da pasta coronel Élcio Franco, entre outros personagens.

"Pressão atípica"

O deputado Luis Miranda e seu irmão, o servidor da Saúde Luis Ricardo Miranda, disseram à CPI da Pandemia do Senado que houve uma pressão atípica dentro do Ministério da Saúde para agilizar o processo de liberação para compra do imunizante indiano Covaxin.

Os irmãos afirmaram que alertaram Bolsonaro em 20 de março sobre problemas no contrato, e que o presidente teria prometido acionar a Polícia Federal. Entretanto, nenhum inquérito foi aberto após a conversa.

O deputado Miranda também afirmou em seu depoimento que Bolsonaro teria dito na ocasião que a Covaxin era um "rolo" do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros.

No sábado, Bolsonaro admitiu o encontro com Miranda e deu uma resposta vaga sobre sua atitude em relação ao caso. "Eu não posso simplesmente, ao chegar qualquer coisa pra mim, tomar providência"

OBolsonaro reagiu de maneira agressiva e vulgar na noite de quinta-feira a um pedido de esclarecimentos enviado pela cúpula da CPI da Pandemia sobre as acusações dos irmãos Miranda. "Sabe qual a minha resposta? Caguei. Caguei para a CPI. Não vou responder nada!", disse Bolsonaro durante sua live semanal.

Questionamentos

Mesmo antes de entrar no radar da CPI, a vacina indiana já provocava questionamentos por causa do seu preço (15 dólares, a mais cara de todas as vacinas compradas pelo Brasil), a velocidade com que o governo fechou o negócio (em contraste com tratativas realizadas com outros laboratórios, como a Pfizer), a falta de aval da Anvisa (Bolsonaro afirmou em 2020 que não compraria vacinas não autorizadas pela agência) e pelo fato de a compra não ter sido feita diretamente com a fabricante, mas com uma empresa intermediária, a Precisa.

O pedido da PGR foi apresentado após a ministra do STF Rosa Weber rejeitar uma solicitação da Procuradoria para aguardar a conclusão da CPI antes de abrir uma eventual investigação contra Bolsonaro no âmbito do caso Covaxin.

Na decisão, Weber criticou a postura da PGR e determinou que a equipe do procurador-geral Augusto Aras se manifestasse de maneira direta sobre a abertura ou não da investigação. "No desenho das atribuições do Ministério Público, não se vislumbra o papel de espectador das ações dos Poderes da República", escreveu a magistrada.

Deutsche Welle Brasil, 12.07.21

sábado, 10 de julho de 2021

Ameaça de Bolsonaro contra eleições gera reação de chefes do Senado e do TSE: retrocesso e crime de responsabilidade

Presidente volta a questionar, sem provas, confiabilidade do sistema de voto e ameaçar não realizar pleito. Pacheco descarta “frustração às eleições” e ministro Barroso divulga nota em que associa especulações a violação do regime democrático que poderia levar a impeachment do mandatário

Bandeira do Brasil estendida na Esplanada dos Ministérios por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, nesta sexta. (ERALDO PERES / AP)

A campanha aberta do presidente Jair Bolsonaro contra as eleições em urnas eletrônicas subiu de tom nesta sexta, 9, e elevou a temperatura da tempestade política em Brasília. Bolsonaro vem repetindo diariamente que há fraude no sistema eleitoral do Brasil, mas nesta sexta ameaçou que as eleições do ano que vem podem não acontecer. “Não tenho medo de eleições, entrego a faixa para quem ganhar no voto auditável e confiável. Dessa forma [como é hoje], corremos o risco de não termo eleições no ano que vem”, disse Bolsonaro a eleitores que o esperavam na saída do Palácio da Alvorada. O mandatário ainda xingou o ministro do Supremo, Luis Roberto Barroso, que preside o Tribunal Superior Eleitoral, chamando-o de “imbecil”, acusando sem provas que existe fraude nas eleições desde 2014, quando a ex-presidenta Dilma Rousseff derrotou o candidato do PSDB, Aécio Neves. É a segunda vez que Bolsonaro faz essa ameaça. Nesta quinta, ele já havia afirmado a apoiadores que “sem eleições limpas não haverá eleições”.

Os ataques, porém, tiveram reações enérgicas na tarde desta sexta. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, convocou uma coletiva para garantir que a democracia está consolidada no Brasil, “assimilada pela nossa sociedade, as instituições assim também assim compreendem, embora especulações possam acontecer”. Pacheco afirmou que o Estado de direito e a democracia são inegociáveis e garantiu que as eleições estão preservadas. “Tudo quanto houver de especulações em relação a retrocesso a democracia, como a frustração de eleições de 2022, é algo com que o Congresso Nacional além de não concordar, repudia”, disse ele. “Não podemos admitir fala, ato, menção que seja atentatória a democracia, ou que estabeleça um retrocesso naquilo que a geração antes da minha conquistou e a nossa geração tem obrigação de manter, que é a nossa democracia”. Sem citar o nome do presidente, o presidente do Senado afirmou que quem pretende trazer algum retrocesso ao Brasil “será apontado pela povo brasileiro e pela história como inimigo da nação”.

O ministro Luís Roberto Barroso, também reagiu, por meio de uma nota nesta sexta em que afirma que a tentativa de impedir as eleições “viola princípios constitucionais e configura crime de responsabilidade”. Barroso ser referiu às declarações do presidente desta manhã como “lamentáveis quanto à forma e ao conteúdo”. No texto divulgado pelo TSE, Barroso afirma que desde a implantação das urnas eletrônicas, em 1996, jamais se documentou qualquer episódio de fraude e que, em relação ao pleito de 2014, o PSDB realizou auditoria no sistema de votação e reconheceu a legitimidade dos resultados. “Nesse sistema, foram eleitos os presidentes Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro. Como se constata singelamente, o sistema não só é íntegro como permitiu a alternância no poder”, diz o magistrado. Ele também afirmou que a “acusação leviana” feita por Bolsonaro é ofensiva a todos os ministros do Supremo que ocuparam a chefia do tribunal eleitoral.

O ministro também informou o tribunal já oficiou a Bolsonaro para que apresente as supostas provas de fraude que ele afirma terem ocorrido nas eleições de 2018, mas que nunca houve resposta. “A realização de eleições, na data prevista na Constituição, é pressuposto do regime democrático. Qualquer atuação no sentido de impedir a sua ocorrência viola princípios constitucionais e configura crime de responsabilidade”, concluiu o ministro.

O ministro do STF Alexandre de Moraes, que assume a presidência do TSE no ano que vem, também decidiu se manifestar defendendo a segurança e credibilidade do sistema eleitoral brasileiro em mensagem nas redes sociais. Assim como Barroso, o ministro falou em possibilidade de crime de responsabilidade, o que poderia embasar um pedido de impeachment de Bolsonaro. “Os brasileiros podem confiar nas Instituições, na certeza de que, soberanamente, escolherão seus dirigentes nas eleições de 2022, com liberdade e sigilo do voto. Não serão admitidos atos contra a Democracia e o Estado de Direito, por configurar crimes comum e de responsabilidade”, declarou Moraes. Em reunião com presidentes de 11 partidos no final de junho, incluindo legendas da base de Bolsonaro, Moraes advertiu que a falta de consenso sobre o assunto iria levar à judicialização e à contestação de eleições em todas as instâncias.

Até mesmo o perdedor de 2014, o agora deputado Aécio Neves, rejeitou as ilações do presidente. “Eu não acredito que tenha havido fraudes nas urnas em 2014”, afirmou em nota. O destempero de Bolsonaro mostra que ele está incomodado pelas pesquisas divulgadas nesta semana que apontam uma alta de rejeição à administração Bolsonaro, e uma eventual vitória do ex-presidente Lula da Silva em caso de eleições. A última pesquisa Datafolha, divulgada nesta sexta, mostra que Lula teria 58% dos votos contra 31% de Bolsonaro. O presidente brasileiro vem emulando a campanha que Donald Trump fez contra o sistema eleitoral dos Estados Unidos, que insuflaram seus eleitores a protestar contra o resultado. O ápice foi a invasão do Capitólio no dia 6 de janeiro.

Bolsonaro vive também a pressão das investigações na CPI da Pandemia do Senado, que chegou a suspeitas de corrupção na compra das vacinas contra a covid-19. A pesquisa Datafolha mostra que 56% dos entrevistados reprovam a gestão da pandemia e que 59% não votaria em Bolsonaro de jeito nenhum no ano que vem.

CARLA JIMÉNEZ e DANIELA MERCIER, de S. Paulo para o EL PAÍS, em 09.07.21 

Polícia do Haiti diz que comando colombiano matou presidente

Grupo suspeito de estar por trás do assassinato de Jovenel Moïse era formado por 28 pessoas, incluindo 26 colombianos e dois americanos de origem haitiana, e 17 foram detidas, afirma a polícia.

Mural do presidente Jovenel Moïse em Porto Príncipe

Policiais caminham em frente a um mural do presidente assassinado

A polícia do Haiti afirmou nesta quinta-feira (08/07) ter identificado 28 pessoas que são suspeitas de participar do assassinato do presidente Jovenel Moïse, ocorrido na véspera. Elas são 26 colombianos e dois americanos de origem haitiana.

Dezessete suspeitos, incluindo 15 colombianos e os dois americanos, já foram detidos, e oito continuam sendo procurados. Os demais suspeitos morreram em trocas de tiros com as forças de segurança, disse o diretor-geral da polícia, Leon Charles.

Inicialmente a polícia afirmara que quatro suspeitos haviam sido mortos, mas mais tarde o número foi reduzido para três, sem mais explicações.

Segundo as autoridades, seis suspeitos foram detidos nas horas seguintes ao atentado, e outros 11 foram presos na embaixada de Taiwan, cujo pátio haviam invadido na manhã desta quinta-feira.

A polícia haitiana afirmou que o comando que matou o presidente era composto sobretudo por soldados colombianos aposentados. O governo da Colômbia confirmou que ao menos seis suspeitos aparentam ser militares aposentados do país e acrescentou que vai colaborar com as investigações.

Ainda não está claro quem ordenou o assassinato e nem por que motivos.

Plano seria sequestro e não morte

Um dos detidos revelou que os colombianos que participaram do assassinato chegaram ao país há três meses.

A informação foi repassada ao jornal Le Nouvelliste pelo juiz Clément Noël, que interrogou os dois americanos, James Solages e Joseph Vincent, ambos de origem haitiana.

Ambos disseram ao juiz que foram contratados como intérpretes e que viram a vaga na internet. A missão do grupo, segundo eles, seria "prender o presidente como parte da execução de um mandado judicial" e não matá-lo.

Solages afirmou que havia chegado ao Haiti há um mês, e Vincent contou que estava no país há seis meses.

O presidente do Haiti foi morto a tiros por um grupo armado que invadiu a residência dele em Porto Príncipe no início da madrugada desta quarta-feira. A primeira dama Martine Moïse sobreviveu ao atentado e foi levada para tratamento na Flórida.

Deutsche Welle Brasil, em 10.07.2021

Mundo tem 11 mortes por fome por minuto, estima Oxfam

Taxa supera atual mortalidade por covid-19. Número de pessoas afetadas pela fome aumentou cinco vezes desde que a pandemia começou, e o pior está por vir, alerta ONG. Brasil está entre países onde situação se agravou.

Mulher africana ao lado de seus dois filhos segura uma tigela em Madagascar. 

Alta dos alimentos agravou ainda mais a fome no mundo, afirma Oxfam

Um ano e meio após o início da pandemia de covid-19, o número de pessoas que morrem de fome está ultrapassando o de vítimas do coronavírus, afirmou nesta sexta-feira (09/07) a organização humanitária Oxfam.

Segundo relatório elaborado pela ONG internacional, estima-se que atualmente 11 pessoas morram de fome por minuto. "Esse número supera a atual taxa de mortalidade pandêmica, que é de sete pessoas por minuto", aponta a ONG.

Cerca de 155 milhões de indivíduos vivem atualmente sob níveis extremos de insegurança alimentar, 20 milhões a mais do que no ano passado, aponta o relatório, intitulado "O vírus da fome se multiplica". O número de pessoas que vivem em condições de fome estrutural aumentou cinco vezes desde que a pandemia começou, para mais de 520 mil.

A ONG calcula ainda que, até o final de 2021, cerca de 12 mil pessoas poderão morrer diariamente de fome associada à pandemia, potencialmente mais do que os óbitos pela própria covid-19.

"O pior ainda está por vir, a menos que governos enfrentem com urgência a insegurança alimentar e suas raízes", alertou a organização em comunicado.

"As estatísticas são chocantes, mas devemos lembrar que esses números são compostos por indivíduos enfrentando sofrimentos inimagináveis. Uma única pessoa já seria demais", disse a presidente e diretora executiva da Oxfam America, Abby Maxman.

Eixos da fome

A Oxfam listou os países que considera serem mais vulneráveis à fome no mundo e onde a crise alimentar já existente foi agravada pela pandemia do coronavírus. Afeganistão, Etiópia, Sudão do Sul, Síria e Iêmen – todos dilacerados por conflitos – viram aumentar os níveis extremos de fome desde o ano passado, diz o relatório.

Drama nas favelas do Brasil: morrer de fome ou de covid-19

Venezuela, República Centro-Africana e Sahel também estavam na lista de polos da fome da Oxfam, assim como Índia e Brasil, que atualmente amargam altos índices de infecção e morte por covid-19.

No Brasil, o percentual da população que vive em extrema pobreza quase triplicou desde o início da pandemia, passando de 4,5% para 12,8%, aponta a Oxfam. "No final de 2020, mais da metade da população – 116 milhões de pessoas – enfrentava algum nível de insegurança alimentar, das quais quase 20 milhões passavam fome", diz o relatório.

As causas da crise

Segundo a Oxfam atribuiu o aumento a uma combinação de três fatores: conflitos armados em curso em diversas partes do mundo, o impacto econômico da atual pandemia e à crise climática global. Tal combinação de fatores teria aprofundado a pobreza e a insegurança alimentar nos locais já afetados pelo problema, além de criar novos epicentros da fome pelo mundo.

Cerca de dois terços das 155 milhões de pessoas que enfrentam níveis extremos de insegurança alimentar vivem em países com conflitos militares.

A Oxfam aponta que, apesar da pandemia, os gastos militares globais aumentaram no ano passado em 51 bilhões de dólares – seis vezes mais do que a ONU afirma ser necessário para acabar com a fome no mundo.

De acordo com o relatório, os efeitos econômicos da pandemia, combinados com o aquecimento global, causaram um aumento de 40% nos preços globais dos alimentos – o maior em mais de uma década.

"Os governos devem se concentrar no financiamento de programas urgentes de resposta à fome e proteção social para salvar vidas agora, em vez de fechar negócios no setor armamentista que só perpetuam os conflitos, a guerra e a fome", apelou a ONG. "Precisamos de mais ação para criar formas mais justas, resilientes e sustentáveis de alimentar o mundo."

Deutsche Welle Brasil, em 10.07.2021

sexta-feira, 9 de julho de 2021

Número acumulado de mortes passa de 530 mil.

 Total de casos notificados da doença se aproxima da marca de 19 milhões.

O Brasil registrou oficialmente nesta quinta-feira (08/07) 1.639 mortes ligadas à covid-19, segundo dados divulgados pelo Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass).

Também foram confirmados  53.725 novos casos da doença. Com isso, o total de infecções reportadas no país chega a 18.962.762, e os óbitos oficialmente identificados somam 530.179.

Diversas autoridades e instituições de saúde alertam, contudo, que os números reais devem ser ainda maiores, em razão da falta de testagem em larga escala e da subnotificação.

O Conass não divulga o número de recuperados. Segundo o Ministério da Saúde, 17.352.670 pacientes haviam se recuperado da doença até esta quinta-feira, mas o número não aponta quantos ficaram com sequelas.

Em números absolutos, o Brasil é o segundo país do mundo com mais mortes, atrás apenas dos Estados Unidos, que somam mais de 606 mil óbitos. É ainda o terceiro país com mais casos confirmados, depois de EUA (33,7 milhões) e Índia (30,7 milhões).

Já a taxa de mortalidade por grupo de 100 mil habitantes subiu para 252,3 no Brasil, a 8ª mais alta do mundo, atrás apenas de alguns pequenos países europeus e do Peru.

Ao todo, mais de 185 milhões de pessoas contraíram oficia

Deutsche Welle Brasil, em 08.07.2021

quinta-feira, 8 de julho de 2021

Reprovação a Bolsonaro bate novo recorde

Após escândalos de corrupção que vem sacudindo governo, Datafolha aponta que 51% dos brasileiros avaliam gestão de Bolsonaro como ruim ou péssima - pior índice desde a posse. Aprovação se mantém estável em 24%.

Bolsonaro é um dos presidentes em primeiro mandato mais impopulares desde a década de 80

Pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta-feira (08/07) aponta que a reprovação ao governo do presidente Jair Bolsonaro atingiu a marca de 51%, o índice mais alto entre todos os levantamentos realizados pelo instituto desde a posse, em janeiro de 2019.

Segundo o Datafolha, a pesquisa foi realizada entre os dias 7 e 8 de julho e já mede o impacto dos casos de corrupção que vem pressionando o governo, entre eles compras suspeitas de vacinas, que levaram a abertura de um inquérito para investigar Bolsonaro por prevaricação.

Os resultados da pesquisa:

Ótimo/bom: 24%

Regular: 24%

Ruim/péssimo: 51%

Não sabe: 1%

Na última pesquisa Datafolha, divulgada em 12 de maio, a reprovação do governo Bolsonaro era de 45%. Já o percentual que avalia o governo como ótimo ou bom se manteve estável, no mesmo nível de 24% detectado em maio. Já o percentual daqueles que avaliam o governo como regular teve uma queda de seis pontos percentuais, passando de 30% para 24%.

A aprovação ao governo está em queda desde o início de dezembro do ano passado, quando alcançou o maior patamar (37%). A satisfação com a gestão de Bolsonaro passou a cair com o agravamento da epidemia de covid-19 no país, o colapso do sistema hospitalar em diversos estados e a lentidão da campanha de vacinação.

A gestão de Bolsonaro na pandemia é atualmente alvo de uma CPI no Senado, que investiga as ações e omissões do governo federal no combate à covid-19. Desde o registro dos primeiros casos no país, o presidente vem negando a gravidade da doença, que já deixou mais de 528 mil mortos, e ignorando medidas sanitárias reconhecidas cientifica e internacionalmente como necessárias para conter a propagação do coronavírus.

A pesquisa Datafolha ouviu 2.074 pessoas acima de 16 anos em 146 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou menos.

Bolsonaro é o segundo presidente com a pior avaliação desde a redemocratização de 1985, quando considerados os eleitos pelas urnas e que cumprem seu primeiro mandato. Ele só ganha de Fernando Collor (1990-1992), que era rejeitado por 68% do eleitorado e aprovado por apenas 9% na mesma altura do mandato.

Deutsche Welle Brasil, em 08.07.2021

"Caguei para a CPI. Não vou responder nada", diz Bolsonaro

Presidente afirma que não vai responder à carta encaminhada por senadores com questionamentos sobre suspeitas na compra da Covaxin. Presidente é investigado por suspeitas de acobertar corrupção no negócio.

Negociações para aquisição da Covaxin são investigadas pelo MPF, PF e TCU

O presidente Jair Bolsonaro reagiu de maneira agressiva e vulgar na noite de quinta-feira (09/07) ao pedido de esclarecimentos enviado pela cúpula da CPI. ""Sabe qual a minha resposta? Caguei. Caguei para a CPI. Não vou responder nada!", disse Bolsonaro durante sua live semanal.

Em uma carta endereçada ao Planalto mais cedo, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), o vice-presidente, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), e o relator Renan Calheiros (MDB-AL) pediram que o presidente a se manifestasse sobre o depoimento do deputado Luis Miranda (DEM-DF) a respeito do caso Covaxin.

Durante a live, Bolsonaro ao se refeir à cúpula da CPI, usou xingamentos como "imbecil", "hipócrita", "analfabeto" e "saltitante".

Há duas semanas, o deputado Luis Miranda e seu irmão, o servidor da Saúde Luis Ricardo Miranda, disseram à CPI relataram que havia pressão dentro do Ministério da Saúde  para agilizar o processo de liberação da vacina indiana Covaxin. Os irmãos ainda afirmaram que alertaram o presidente Jair Bolsonaro sobre problemas no contrato e que o presidente teria afirmado que acionaria a Polícia Federal, mas nenhum inquérito foi aberto após a conversa.

O deputado Miranda também afirmou em seu depoimento que Bolsonaro teria dito na ocasião que a Covaxin era um "rolo" do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).

Mesmo antes de entrar no radar da CPI, a vacina indiana já levantava questionamentos por causa do seu preço (15 dólares, a mais cara de todas as vacinas compradas pelo Brasil), a velocidade com que o governo fechou o negócio (em contraste com outros laboratórios, como a Pfizer), a falta de aval da Anvisa (Bolsonaro afirmou em 2020 que não compraria vacinas não autorizadas pela agência) e pelo fato de a compra não ter sido feita diretamente com a fabricante, mas com uma empresa intermediária, a Precisa.

Além de estarem no alvo da CPI, as negociações para aquisição da Covaxin são investigadas pelo Ministério Público Federal, pela Polícia Federal e pelo Tribunal de Contas da União. Na sexta-feira, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), ordenou ainda a abertura de um inquérito contra Bolsonaro para investigar se ele cometeu o crime de prevaricação ao ignorar denúncias sobre as negociações de compra da vacina indiana Covaxin.

Nos últimos dias, diante do aumento da pressão exercida pela CPI e sucessivos escândalos na gestão da pandemia, Bolsonaro tem lançado mão de factoides e outras táticas diversionistas para manter sua base mobilizada e tirar o foco dos problemas na Saúde. Nesta quarta-feira, por exemplo, ele fez novos ataques ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas e disse "ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições".

Deutsche Welle Brasil, em 08.07.2021

À CPI, ex-coordenadora critica postura de Bolsonaro

Responsável pelo Programa Nacional de Imunizações afirma que deixou cargo por causa da "politização" da vacinação e que seu departamento sofreu com falta de doses. CPI cobra Bolsonaro sobre acusações dos irmãos Miranda.


A servidora Francieli Fantinato comandava o PNI até esta semana. Aos senadores ela afirmou que seu departamento sofreu com falta de vacinas

Em depoimento à CPI da Pandemia nesta quinta-feira (08/07), a ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI) Francieli Fontana Fantinato criticou a falta de vacinas e de campanhas publicitárias sobre vacinação e disse que deixou o cargo por causa da "politização" em relação à vacinação "por meio do líder da nação", em uma referência ao presidente Jair Bolsonaro, que regularmente divulga falas que desencorajam o uso de vacinas ou alimenta paranoia sobre os imunizantes.

Aos senadores, Fantinato descreveu que seu departamento não era ouvido sobre decisões como a adesão ao consórcio Covax, e que sugestões sobre a organização dos grupos prioritários eram ignoradas pela cúpula da pasta, dominada por militares.

"Trabalhei incansavelmente 24 horas por dia, sete dias por semana para vacinar a população brasileira. Bem, senhoras e senhores, para um programa de vacinação ter sucesso, é simples. É necessário ter vacinas, e é necessário ter campanha publicitária efetiva. Eu não tive nenhum dos dois", disse. "Pela politização do assunto em relação à vacinação, decidi seguir meus planos pessoais", disse a ex-coordenadora sobre sua saída do PNI, que foi oficializada na quarta-feira.

Fantinato também indicou que falas do presidente Jair Bolsonaro contra vacinas atrapalharam a efetividade da campanha de vacinação. "É uma opinião pessoal, eu enquanto coordenadora preciso de apoio que seja favorável a fala. Quando ele [Jair Bolsonaro] não fala favorável isso pode trazer prejuízo", disse. "Eu não saí pela pressão da CPI. Eu saí por todo o cenário."

A ex-coordenadora se negou a prestar juramento de que falaria a verdade na comissão durante o início dos trabalhos, por orientação de seu advogado – provavelmente como reflexo da decisão do presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), de dar voz de prisão ao ex-diretor de Logística da Saúde Roberto Dias, no dia anterior. Apesar desse início tortuoso, Fantinato arrancou elogios dos senadores independentes e da oposição por suas falas e a descrição de suas atividades. Servidora de carreira, ela trabalha no Ministério da Saúde desde 2014 e passou a ocupar o cargo de coordenadora do PNI em outubro de 2019.

O papel do coronel Elcio Franco

Fantinato também lançou luz sobre o papel do coronel Elcio Franco, ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde e que atuava como braço direito do ex-ministro Eduardo Pazuello. Franco, um coronel que permaneceu no Exército até 2019 e que, assim como o general Pazuello, tinha experiência mínima em assuntos de saúde, está no centro de vários escândalos na gestão da pasta, incluindo transações suspeitas para a compra de imunizantes e a promoção da cloroquina.

Fantinato relatou, por exemplo, que seu departamento não foi ouvido nas negociações para a adesão do Brasil ao consórcio de vacinas Covax Facility, organizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O governo Jair Bolsonaro aderiu apenas à cobertura mínima de vacinas oferecidas pelo consórcio, suficiente para atender somente 10% da população, quando as regras do grupo permitiam até 50%.


Coronel Elcio Franco atuava como braço direito de Pazuello

Ela contou que o coronel Franco justificou a decisão pela cobertura mínima afirmando que "não poderia colocar todos os ovos na mesma cesta". No seu depoimento à CPI em 9 de junho, Franco afirmou que as decisões sobre a Covax foram tomadas em conjunto com a área técnica do ministério – uma declaração que entra em choque com o que foi relatado pela ex-coordenadora Fantinato.

"A CPI descobre que a gestão era mais Elcio que Pazuello. Ele deve ser o primeiro indiciado. A mando de quem estava matando gente?", afirmou o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Ele também disse que Franco parece ser uma espécie de "Eichmann" brasileiro, em referência ao nazista Adolf Eichmann (1906-1962), que se tornou uma espécie de síntese do burocrata que comete atrocidades e é incapaz de reconhecer o impacto de seus atos.

Fantinato ainda relatou que pressões da cúpula da pasta para incluir cada vez mais grupos prioritários no plano atrapalharam a campanha de vacinação. "Sofrer pressão de todos os segmentos para entrada de grupos trouxe dificuldades para a campanha. Se tivesse vacina suficiente, não precisaria dessa fragmentação", disse.

Fantinato relatou que o próprio coronel Franco exigiu a retirada da população carcerária dos grupos prioritários da lista. Ela disse ter sido contra, e que se o coronel fosse em frente, teria que fazer isso sem o apoio do PNI. Fantinato contou que a inclusão de presos nos grupos prioritários levava em conta a superpopulação de présidios e o ambiente propício à disseminação de doenças. "Quem pediu para tirar o grupo de população privada de liberdade foi o coronel Elcio. (...) Eu me neguei. Se vocês quiserem, vão tirar sem o aval do programa [PNI]", disse Fantinato.

Nesse momento, o senador bolsonarista Marcos do Val (Podemos-ES) fez uma provocação para tumultuar a sessão. "Mas não tem que ter prioridade. O preso já está em isolamento", disse. O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), reagiu: "Não acredito que eu estou ouvindo uma asneira dessa." Os dois bateram boca.

Covaxin

Fantinato também falou sobre a aquisição da Covaxin. Ela contou que seu departamento também não participou das negociações, mas que ela avaliou que seria vantajoso comprar a vacina indiana, diante da falta crônica de imunizantes no Brasil. No entanto, durante o depoimento ela leu uma nota técnica do Ministério da Saúde que alertava ser necessário que o fabricante enviasse mais dados sobre segurança, eficácia, e potencial contra novas variantes. O documento foi encaminhado em 17 de fevereiro. O governo fechou o contrato oito dias depois, apenas com dados preliminares sobre eficácia e segurança.

A compra da Covaxin é um dos principais alvos da CPI. Ao colegiado, os irmãos Miranda – o deputado Luis Miranda (DEM-DF) e o servidor da Saúde Luis Ricardo Miranda – descreveram que houve pressão do alto escalão da pasta para que o negócio fosse aprovado. Os irmãos também relataram que alertaram o presidente Jair Bolsonaro sobre aspectos suspeitos do negócio. O presidente, segundo o relato, disse que mandaria investigar o assunto, mas nada foi feito.

Mesmo antes de entrar no radar da CPI, a vacina indiana já levantava questionamentos por causa do seu preço (15 dólares, a mais cara de todas as vacinas compradas pelo Brasil), a velocidade com que o governo fechou o negócio (em contraste com outros laboratórios, como a Pfizer), a falta de aval da Anvisa (Bolsonaro afirmou em 2020 que não compraria vacinas não autorizadas pela agência) e pelo fato de a compra não ter sido feita diretamente com a fabricante, mas com uma empresa intermediária, a Precisa.

As negociações para aquisição da Covaxin também são investigadas pelo Ministério Público Federal, pela Polícia Federal e pelo Tribunal de Contas da União. Na sexta-feira passada, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), ordenou ainda a abertura de um inquérito contra Bolsonaro para investigar se ele cometeu o crime de prevaricação ao ignorar denúncias sobre as negociações de compra da Covaxin.

No meio da sessão, diante das falas de Fantinato, os senadores da CPI decidiram retirar a ex-coordenadora da condição de investigada perante o colegiado. Ela passou a ser testemunha.

Aziz reage a ataques de Bolsonaro

Durante a sessão, o presidente da CPI da Pandemia, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que a cúpula da comissão vai enviar uma carta a Jair Bolsonaro, questionando se o deputado Luis Miranda estava falando a verdade quando mencionou ter relatado ao presidente irregularidades. O deputado Miranda também afirmou em seu depoimento que Bolsonaro teria dito na ocasião que a Covaxin era um "rolo" do líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).

"É só uma resposta, senhor presidente. Por favor, diga para a gente que o deputado Luís Miranda é mentiroso, diga para a nação brasileira que seu líder na Câmara é um homem honesto", disse Aziz.

Durante a sessão, Aziz também respondeu a ataques que o presidente fez nesta manhã ao presidente da CPI durante um encontro com apoiadores na entrada do Palácio da Alvorada. Na ocasião, Bolsonaro afirmou que Aziz "desviou 260 milhões de reais".

"Eu nunca te chamei de genocida, nunca o chamei de ladrão, nunca disse que o senhor fazia rachadinha no seu gabinete", disse Aziz em reposta a Bolsonaro. "E o senhor vai para o cercadinho onde devem ficar pessoas que não têm conteúdo para debater a crise nacional", completou.

Na quarta-feira, Aziz já havia sido alvo de uma nota agressiva divulgada pelo Ministério da Defesa e a cúpula das Forças Armadas por ter mencionado "membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua".

Nos últimos dias, diante do aumento da pressão exercida pela CPI e sucessivos escândalos na gestão da pandemia, Bolsonaro tem lançado mão de factoides e outras táticas diversionistas para manter sua base mobilizada e tirar o foco dos problemas na Saúde. Nesta quarta-feira, por exemplo, ele fez novos ataques ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas e disse "ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições".

Deutsche Welle Brasil, em 08.07.2021

Diretor que teria autorizado reverendo a negociar vacina é exonerado

Laurício Cruz, diretor de Imunização do Ministério da Saúde, teria dado aval para um reverendo evangélico negociar com a empresa Davati 

Negociações suspeitas para a compra de 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca nunca foram concretizadas

O governo federal exonerou o diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Laurício Monteiro Cruz. Ele teria dado aval para que um reverendo negociasse doses de vacina em nome do governo.

A exoneração foi publicada nesta quinta-feira (08/07) no Diário Oficial da União e assinada pelo ministro da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos. Ele é mais um servidor a deixar o cargo no âmbito do caso que envolve negociações suspeitas para a compra de 400 milhões de doses extras da vacina contra a covid-19 produzida pela AstraZeneca.

Cruz foi citado por Luiz Paulo Dominghetti Pereira, policial militar em Minas Gerais que também atuava como representante da empresa Davati Medical Supply. As acusações contra o agora ex-diretor também foram reveladas em e-mails aos quais a TV Globo teve acesso.

Em seu depoimento à CPI da Pandemia, Dominguetti disse que três diretores do Ministério da Saúde sabiam sobre a proposta de compra de 400 milhões de doses que seria intermediada pela Davati: além de Cruz, também o então secretário-executivo Élcio Franco, braço direito do ex-ministro Eduardo Pazuello, e Roberto Ferreira Dias, então diretor de Logística da pasta.

Dominguetti afirmou, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo e, depois, em depoimento à CPI da Pandemia, que Dias cobrou propina de 1 dólar por dose para que a pasta fechasse a compra. Dias foi exonerado do cargo no mesmo dia em que a reportagem foi publicada, em 29 de junho. Nesta quarta-feira, o ex-servidor prestou depoimento à CPI e acabou preso pela Polícia Legislativa, acusado de ter mentido durante a oitiva.

Desde o início, a história tinha elementos suspeitos. A Davati, sediada nos Estados Unidos, foi formada em 2020 e tem apenas três funcionários. A AstraZeneca declarou que não negocia vacinas com entes privados, negou ter trabalhado com a Davati e afirmou que todas as vendas no Brasil foram tratadas com a Fiocruz.

Suposto envolvimento de reverendo

Se as circunstâncias da negociação detalhadas por Dominguetti já eram inusitadas, elas ficaram ainda mais estranhas com novas revelações feitas pelo Jornal Nacional, da TV Globo, no último fim de semana.

Laurício Cruz, exonerado nesta quinta-feira, teria dado aval formal, em 9 de março, a um reverendo evangélico, Amilton Gomes, para que este negociasse com a Davati, em nome do governo brasileiro, a compra dos supostos 400 milhões de doses.

Gomes é fundador e presidente da Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), uma organização privada. Ele já havia sido mencionado no depoimento de Dominguetti como alguém que o ajudou a agendar uma reunião com Élcio Franco. Nessa reunião, Dominguetti teria apresentado novamente a proposta de venda de vacinas ao ministério.

Em 10 de março, a tratativa entre Gomes e Cruz já estava formalizada no sistema eletrônico do Ministério da Saúde, e foi em seguida enviada para a Secretaria Executiva da pasta.

Cruz também enviou e-mails a Herman Cardenas, presidente da Davati, confirmando que a Senah tinha aval do Ministério da Saúde para negociar a compra de vacinas. Nesse contato, o reverendo pede que a oferta de venda seja corrigida para o valor de 17,50 dólares por dose – três vezes mais do que o próprio governo pagou por doses da AstraZeneca em janeiro, comprada de um laboratório na Índia.

Segundo a TV Globo, a Senah informou à Davati o nome de duas empresas nos Estados Unidos onde poderia ser feito o pagamento de comissão, caso a compra fosse finalizada, ambas associadas ao reverendo. Uma delas também tem como diretor Daniel Fernandes Rojo Filho, que em 2015 chegou a ser preso nos EUA por fraude.

Cruz, por sua vez, disse ter sido designado para negociar com Gomes, confirmou ter se reunido com ele e que deu andamento às tratativas, e afirmou que a pasta não conferia a idoneidade das pessoas que ofereciam vacinas.

Deutsche Welle Brasil, em 08.07.2021

quarta-feira, 7 de julho de 2021

Defesa diz que CPI ‘desrespeita’ militares; presidente de comissão se diz ‘intimidado’

Senador Omar Aziz criticou o ‘lado podre’ das Forças Armadas por envolvimento em ‘falcatrua’ no governo Jair Bolsonaro; nota de resposta foi articulada pelo ministro Braga Netto

        O senador Omar Aziz, presidente da CPI da Covid no Senado Foto: Dida Sampaio/Estadão

O Ministério da Defesa e a cúpula das Forças Armadas entraram em colisão política com a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid. Os militares reagiram nesta quarta-feira, dia 7, ao presidente da CPI, senador Omar Aziz, que criticou o "lado podre" das Forças Armadas por envolvimento em "falcatura" no governo Jair Bolsonaro. Os comandantes e o ministro da Defesa acusaram Aziz de desrespeitar as Forças Armadas e generalizar "esquemas de corrupção" na CPI. Aziz retrucou no plenário do Senado, dizendo-se "intimidado" pela primeira ofensiva sobre o Congresso realizada em conjunto pelos novos comandantes militares nomeados por Bolsonaro.

As investigações da CPI levantaram suspeitas de envolvimento de uma série de oficiais, da ativa e da reserva, em irregularidades durante a pandemia do novo coronavírus. Parte deles foi levada para o Ministério da Saúde durante a gestão do general de Divisão Eduardo Pazuello, ex-ministro alvo da CPI, enquanto outros estariam ligados a tentativas de venda de vacinas ao governo.

Nesta quarta-feira, Aziz determinou a prisão em flagrante por falso testemunho do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, que foi controlador de voo da Força Aérea Brasileira (FAB). Ele depôs à CPI na condição de testemunha depois de ser acusado de cobrar propina para fechar um contrato de vacinas com a empresa Davati. Segundo Aziz, Dias mentiu aos senadores reiteradamente.

Em determinado momento, o presidente da CPI desabafou: "As Forças Armadas, os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia, porque fazia muito tempo, fazia muitos anos que o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo. Fazia muitos anos. Aliás, eu não tenho nem notícia disso na época da exceção que houve no Brasil, porque o Figueiredo morreu pobre, porque o Geisel morreu pobre, porque a gente conhecia... E eu estava, naquele momento, do outro lado, contra eles. Uma coisa de que a gente não os acusava era de corrupção, mas, agora, Força Aérea Brasileira, Coronel Guerra, Coronel Elcio, General Pazuello e haja envolvimento de militares das Forças Armadas".

A manifestação de Aziz irritou os governistas. O senador bolsonarista Marcos do Val (Podemos-ES) disse que o presidente da CPI se desfez das Forças Armadas. Aziz voltou a reiterar a crítica: "O que eu quero explicar é que, infelizmente, o que nós temos ouvido aqui nos relatos do depoente é que geralmente tem alguém das Forças Armadas. Isso não é bom para o Brasil. Não é bom".

A nota de resposta foi articulada pelo ministro Braga Netto, general de Exército da reserva escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro como interventor na Defesa. Ele foi o responsável por coordenar a troca inédita de toda a cúpula da Defesa, no fim de março, quando o presidente cobrava alinhamento político ao seu governo. A nota pública foi assinada também pelos comandantes da Marinha, almirante Almir Garnier Santos, da Aeronáutica, brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, e do Exército, general Paulo Sergio Nogueira de Oliveira."Essa narrativa, afastada dos fatos, atinge as Forças Armadas de forma vil e leviana, tratando-se de uma acusação grave, infundada e, sobretudo, irresponsável", rebateram os militares. "As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às Instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro."

Leia a íntegra da nota do Ministério da Defesa e da cúpula das Forças Armadas

O Ministro de Estado da Defesa e os Comandantes da Marinha do Brasil, do Exército Brasileiro e da Força Aérea Brasileira repudiam veementemente as declarações do Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, Senador Omar Aziz, no dia 07 de julho de 2021, desrespeitando as Forças Armadas e generalizando esquemas de corrupção.

Essa narrativa, afastada dos fatos, atinge as Forças Armadas de forma vil e leviana, tratando-se de uma acusação grave, infundada e, sobretudo, irresponsável.

A Marinha do Brasil, o Exército Brasileiro e a Força Aérea Brasileira são instituições pertencentes ao povo brasileiro e que gozam de elevada credibilidade junto à nossa sociedade conquistada ao longo dos séculos.

Por fim, as Forças Armadas do Brasil, ciosas de se constituírem fator essencial da estabilidade do País, pautam-se pela fiel observância da Lei e, acima de tudo, pelo equilíbrio, ponderação e comprometidas, desde o início da pandemia Covid-19, em preservar e salvar vidas.

As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às Instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro.

Walter Souza Braga Netto, Ministro de Estado da Defesa

Alte Esq Almir Garnier Santos, Comandante da Marinha

Gen Ex Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, Comandante do Exército

Ten Brig Ar Carlos de Almeida Baptista Junior, Comandante da Aeronáutica

Felipe Frazão, O Estado de S.Paulo, em 07 de julho de 2021 | 21h15

"Temos provas cabais no caso Covaxin", diz Simone Tebet

Líder da bancada feminina no Senado afirma que só falta CPI juntar todas as peças para comprovar irregularidades envolvendo a vacina indiana. Ela diz que antes de abrir processo de impeachment é preciso "pensar no país".

"Não tenho dúvidas de que o centro pode sim estar com Lula no segundo turno", afirma Simone Tebet

Líder da bancada feminina no Senado, Simone Tebet (MDB-MS) se projetou nacionalmente quando, em  2019, brigou dentro de seu partido para ser um nome alternativo à presidência da Casa. A investida não prosperou. Em 2020 ela voltou à carga e disputou com Rodrigo Pacheco (DEM-MG), na primeira candidatura de uma mulher à presidência do Senado. Foi derrotada e nem seu próprio partido ficou ao seu lado integralmente.

Agora, à frente da bancada feminina, atuou para assegurar a participação das mulheres na CPI da Pandemia. Em um colegiado exclusivamente masculino, Tebet foi a parlamentar que arrancou, no depoimento do deputado federal bolsonarista Luis Miranda (DEM-DF), o envolvimento do líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR), em suposto esquema de corrupção na aquisição da vacina indiana Covaxin contra a covid-19.

Nesta terça-feira (06/07), a senadora afirmou durante sessão da CPI que documentos apresentados pelo governo para rebater acusações de irregularidades nas negociações para compra da Covaxin foram fraudados, incluindo erros de grafia em inglês e indícios de montagem.

Em entrevista à DW Brasil, ela afirma já haver "provas cabais" no caso Covaxin e que "só falta juntar todas as peças e ouvir todas as testemunhas". Ao mesmo tempo, afirma que, antes de abrir um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro, é preciso "pensar no país".

Filha de Ramez Tebet, que presidiu o Senado no início dos anos 2000, Simone agita discretamente os bastidores do MDB como uma opção de nome para a terceira via em 2022. A senadora diz acreditar que essa terceira via possa tirar Bolsonaro do segundo turno e se recusa a repetir o gesto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que deixou clara a intenção de votar no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva caso ocorra a disputa do petista com Bolsonaro em 2022.

"Quem é do centro democrático não pode responder a essa pergunta. O centro democrático, se quiser, tem todas as condições de estar no segundo turno. Pelo andar da carruagem, não tenho dúvidas de que o centro pode sim estar com Lula no segundo turno. Então não é escolha de Sophia", afirma.

DW Brasil: Tem sido marcante sua atuação na CPI da Covid. A senhora conseguiu arrancar o nome do líder do governo, Ricardo Barros (PP), no depoimento do deputado Luis Miranda [que denunciou suposto esquema de corrupção na compra de vacinas]. Foi sorte, intuição feminina, ou habilidade?

Simone Tebet: A política não pode mais viver sem as mulheres, não porque somos melhores, mas porque somos diferentes. Na CPI nós [a bancada feminina] somos mais detalhistas, ficamos mais atentas a certos tipos de sinais corporais, o tom emocional. Meu pai, que era criminalista, falava sempre que o depoente, quando entra numa fase de cansaço, e fica abalado, precisa de acolhimento e de se sentir protegido. Minha fala inicial ao deputado [que prestava depoimento] era invocar o espírito público. Fiz o processo reverso, disse que entendia a posição dele, porque ele não queria falar. Aí na primeira tentativa ele já soltou. Foi um conjunto de situações que levou a isso. Teve um pouco de tudo: destino, estar no lugar certo na hora certa, ter lembrado do que meu pai ensinou. Tive sorte.

Qual a importância da bancada feminina hoje, sobretudo num país cujo presidente com posturas misóginas?

A minha candidatura à presidência do Senado foi fundamental para que o presidente [do Senado] Rodrigo Pacheco [DEM-MG] fizesse um compromisso com as senadoras, e muitas não votaram em mim, de criar a liderança da bancada feminina. Essa liderança permitiu às senadoras ter espaço no colégio de líderes. Com isso, nós emplacamos toda semana um projeto de interesse da mulher brasileira. Ou na igualdade salarial, como aprovado e que agora está na Câmara, ou no combate à violência à mulher. São projetos que fazem a diferença. Votamos nesta semana [passada] a criação de um tipo penal importante que é a violência psicológica, que não era tipificada.

A bancada feminina está surpreendendo positivamente o Senado. Para alguns têm até gerado algum incômodo. Quando pulamos para dentro da CPI, num gesto generoso do presidente do colegiado, senador Omar Aziz, isso mudou o rumo da comissão. Porque passou a ter uma voz da sensibilidade, do detalhe. A CPI já cumpriu uma missão que é comprovar a conduta errática, equivocada, negligente, negacionista do governo do presidente Bolsonaro em relação à pandemia e todas as consequências nefastas deste negacionismo, a ponto de hoje termos muito mais mortes do que teríamos se eles tivessem feito o dever de casa.

Isso vai constar no relatório e está comprovado. Quando a CPI já estava exaurindo seu objeto, tivemos outra denúncia bombástica, feita por um deputado bolsonarista, acusando outro deputado em rede nacional de corrupção. Coisa que eu nunca vi em meus 20 anos de vida pública. Começa agora uma nova fase da CPI. Sorte ou não, instinto, feeling, destino, foi feito por alguém da bancada feminina. Só homens teriam chegado a isso? Não sabemos dizer. Mas a participação feminina na CPI tem sido no mínimo a cereja do bolo.

A senhora diz que a CPI comprovou o negacionismo, a negligência e a omissão que levaram milhares de pessoas à morte. Mas a corrupção, que passa a ser investigada agora, parece erodir mais a base bolsonarista. Por quê?

Grande parte da sociedade se distanciou deste governo no momento em que se deu conta de que ele realmente foi omisso, negligente, agiu contra a ciência, contra a vida, a favor de uma tese obscura de imunidade de rebanho, uso de medicamentos ineficazes [tratamento precoce] e atrasando a compra de vacinas.

Uma parte significativa da população brasileira, e as pesquisas mostram isso, passou a não acreditar mais no governo e até a culpá-lo pelas mortes de familiares e amigos. Só que isso aconteceu e houve estagnação.

O presidente ainda tem um segmento muito firme com ele. Veio agora essa denúncia gravíssima, – crime de corrupção ativa e passiva, prevaricação, peculato, tráfico de influência – não de um único contrato, mas em relação a pelo menos três, e já se fala em "propinoduto", "vacinoduto".

O governo era tido como não conivente com a corrupção. Estamos hoje diante de uma travessia, em cima de uma ponte, e não sabemos para onde esse eleitor, que ainda confiava no governo, vai. Na minha modesta opinião, o eleitor vai atravessar essa ponte e abandonar essa base do governo. Não só fora, a opinião pública, mas também dentro do Congresso Nacional.

Começo a ver alguns congressistas do Centrão, que não são da cúpula, abandonando esse barco. Não estou dizendo que estamos caminhando para o impeachment. Estou dizendo que estamos caminhando para um governo que não vai ter mais a quantidade de congressistas o defendendo. Podem até continuar votando com o governo em pautas importantes para o país, como eu faço, mas não mais defendendo esse governo, como eu não faço.

A CPI passa agora a investigar denúncias referentes a três contratos de compra de vacinas?

Sim. No caso da Covaxin já temos provas e documentos. O contrato foi assinado antes da Medida Provisória que permitiria essa assinatura. Contrato é um ato administrativo. Você não pode fazer nada no direito público sem lei anterior que permita. Como o contrato [da Covaxin] seria de uso emergencial, não tinha ainda autorização por lei.

Isso dependeria de uma lei que permitiria a compra de vacinas autorizadas por uma autoridade sanitária indiana, e no Brasil não tínhamos essa lei ainda. Temos nota de empenho, contrato assinado, fax e documentos comprovando a tentativa de venda e um funcionário público que se recusou a assinar [a liberação de recursos] e foi pressionado. No caso da Covaxin só falta juntar todas as peças e ouvir todas as testemunhas.

E surgiu no meio do caminho outra denúncia, em relação a uma negociação para compra de doses vacina da AstraZeneca, com cobrança de propina.

Embora neste caso não tenhamos nenhuma materialidade, essa denúncia não foi negada pelo governo. O depoimento [do policial militar Luiz Paulo Dominguetti] ajudou a comprovar a autoria [do suposto esquema de propina]. Os autores e personagens envolvidos são os mesmos da Covaxin, onde, aí sim, temos provas cabais.

E, por fim, há um contrato maior ainda, que não se efetivou porque foram com muita sede ao pote, mas que é com o mesmo personagem. É o laboratório CanSino [Biologics], a vacina Convidecia. O contrato seria de R$ 5 bilhões.

Agora, acho que precisamos focar na Covaxin. Temos já a comprovação de que o negacionismo e a conduta errática do governo, sem contratação de vacinas no tempo devido, caracterizam crime contra a saúde pública e, inclusive, crime de responsabilidade aí.

Se a Câmara vai abrir impeachment é outra história. Mas já há elementos para o Ministério Público acionar os personagens na área cível e criminal. E, agora, temos também fortes indícios e elementos claros de crime de corrupção. A dúvida é quando a CPI vai tratar, e isso é um terceiro ponto, de prevaricação. Quem é que prevaricou?

Como parlamentar e com formação em direito, a senhora não considera que todos esses casos que citou justificam um pedido de impeachment?

Aí é uma decisão política. CPIs dão embasamento para um processo de impeachment, mas o objetivo principal é ter trazer elementos para encaminhar ao Ministério Público os indícios de irregularidades. O que se extrai de uma CPI são sim elementos que comprovam crime de responsabilidade. Mas é decisão política da Câmara dos Deputados acionar [o presidente] por crime de responsabilidade.

A CPI precisa ser concluída. Vamos precisar de pelo menos mais três semanas para amarrar as pontas. Vejo no dia a dia o governo perdendo apoio dentro do Congresso, vejo a economia combalida e vejo criando corpo a rejeição ao governo do presidente Bolsonaro. Talvez o que possa levar sim a se pensar na abertura de um processo de impeachment seja efetivamente essas três próximas semanas comprovando crime de corrupção dentro do Ministério da Saúde. Temos que aguardar.

Mas a senhora é a favor de um impeachment?

É preciso que os indícios se transformem em elementos de prova, e não só prova testemunhal, que é a mais frágil das provas. Precisamos amarrar as provas testemunhais com análises de vídeos, áudios, provas documentais, periciais. Isso leva duas, três semanas. É um momento delicado, de polarização nas redes sociais, de radicalismo.

Temos que pensar no país. Para abrir um processo de impeachment, antes de mais nada, é preciso saber se vai dar certo. A gente não sabe sequer se tem número, na Câmara, para abrir o processo e mandar ao Senado, que apura. Temos que ter equilíbrio emocional agora, usar a razão, além da emoção, para sentir tudo isso. É fundamental a CPI cumprir essa primeira fase, cumprir o tempo normal de jogo, antes da prorrogação, que ainda não terminou. Eu aguardaria.

Já há assinaturas necessárias para prorrogar a CPI, a senhora assinou, mas o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), não sinalizou abertamente que acatará.

Acho que ele pode estar sendo pressionado pela base governista para aguardar o término da CPI [o período oficial de 90 dias de funcionamento, que só se encerra ao final de julho], numa tentativa frustrada do governo de retirar assinaturas [a favor da prorrogação]. O governo não consegue retirar. Há um apelo popular.

A senhora sempre defendeu a terceira via em 2022. Pelas pesquisas atuais, está claro que o ex-presidente Lula é um candidato fortíssimo, e poderia vencer Bolsonaro. Há mesmo espaço para essa terceira via?

Sem a menor dúvida, mais do que nunca. E acho que essa terceira via poderia, inclusive, tirar Bolsonaro do segundo turno. Sessenta porcento não querem olhar para o retrovisor, para o passado, e não estão satisfeitos com o presente. Querem um nome novo para o futuro. Advogo que os partidos têm que lançar seus candidatos e, no final do ano, testados esses nomes, sentamos numa mesa para decidir quem pode representar a cara do Brasil que queremos. Não se pode, agora, sacar um nome da manga.

O seu nome está em algumas rodas. A senhora teria essa disposição?  O MDB bancaria seu nome?

A única certeza que eu tenho é que o MDB vai ser peça fundamental como foi, no passado, para unir o centro. O que não significa unir o centro com nome próprio. O ideal seria que tivéssemos alguém do MDB com envergadura e condições. Pode ser que tenha. Mas o que eu advogo é: o partido que uniu lá atrás, no momento mais delicado da história, hoje continua sendo o maior partido de centro.

O MDB em matéria de votos é fundamental nesse processo. E tem hoje um presidente muito equilibrado, que é o Baleia Rossi. O MDB vai ter um encontro, em 30 dias, para entender o seu papel exato. Vamos lançar candidato agora? Isso o partido ainda não definiu. Mas defendo que o MDB deve estar no centro da conversa. O que converge esse centro é a defesa das instituições democráticas que dia a dia são abaladas por esse governo. O país está sendo comandado por um governo tão à direita que conseguiu a façanha de colocar na mesma mesa todas as matrizes ideológicas.

A senhora quer tentar a reeleição ou colocará seu nome nesse projeto nacional?

Nunca fugi de responsabilidades, ainda que isso tenha custos políticos. Fui para a linha de frente na defesa intransigente da democracia, contra um governo que quer ditar regras contra minorias, num retrocesso humanitário, e tentando combater uma pauta tão conservadora a ponto de me jogar na oposição. Quando esse governo viola direitos sagrados, civis, as liberdades públicas, eu coloco esse projeto de defesa das instituições democráticas acima do meu projeto político. A princípio eu sou candidata à reeleição, mas não fujo do que o destino reservar para mim. Em política a gente não escolhe missão, ainda mais agora.

No início do governo Bolsonaro a senhora tinha muita interlocução, sobretudo com a equipe econômica. Hoje é oposição?

Sou independente, porque, de alguma forma, voto com o governo em tudo o que acho que é importante para o país. O que está me tirando desta independência é o fato de ver que nem mais pauta econômica o governo tem. Tem uma pauta eleitoreira. Apresentou uma reforma administrativa que de reforma não tem nada e jogou no colo do Congresso. Entrega uma reforma tributária que não é reforma, ali só tem aumento disfarçado de imposto para um segmento muito importante, que é o setor de serviços. Vão usar dinheiro público com fins eleitoreiros.

Eles estão brincando com a economia brasileira. Não consigo entender como o mercado ainda não visualizou isso. Eles podem quebrar o país, como a Dilma fez lá atrás. Os gastos públicos crescem, a receita caiu, vai ter aumento de inflação. Eles se recusam a cortar gastos, porque querem a agenda populista. A dúvida é se o Congresso vai cair nessa e se o Centrão vai se submeter a isso. O MDB se posicionou radicalmente contra esse engodo de reforma tributária.

Se houver segundo turno entre Lula em Bolsonaro em 2022, em quem a senhora vai votar?

Não respondo a essa questão porque é um erro de quem busca a terceira via responder. Quem é do centro democrático não pode responder a essa pergunta, a meu ver. Porque só divide quem está sentado numa mesma mesa. O centro democrático, se quiser, tem todas as condições de estar no segundo turno. Pelo andar da carruagem, como o santo é, sim, de barro, não tenho dúvidas de que o centro pode sim estar com Lula no segundo turno. Então não é escolha de Sophia. Por tudo o que eu já disse, acho que a resposta está dada. Mas o externar isso enfraquece a construção de uma alternativa de poder. A terceira via é melhor, e eu acredito nela.

Deutsche Welle Brasil, em 07.07.2021