sábado, 13 de fevereiro de 2021

No menu de militares, dinheiro público pagou de lombo de bacalhau a uísque 12 anos

Em representação à PGR, deputados detalham gastos de militares com alimentação e bebida

O cardápio de iguarias consumidas pelas Forças Armadas não se limitou à aquisição de milhares de quilos de picanha e garrafas de cerveja ao longo de 2020. Os dados oficiais mostram que a dieta verde oliva também incluiu, no ano passado, a compra de itens como milhares de quilos de lombo de bacalhau – lombo, não o peixe desfiado, que é bem mais em conta –, além de uísques 12 anos e garrafas de conhaque.

As novas informações reunidas pelos deputados do PSB serão anexadas à representação que o partido fez à Procuradoria-Geral da República (PGR), para pedir esclarecimentos sobre os gastos alimentares das Forças Armadas, os quais incluíram a compra de mais de 700 mil quilos de picanha e 80 mil cervejas.

Os dados oficiais, obtidos a partir de informações que são repassadas pelos próprios militares ao Painel de Preços do Ministério da Economia, mostram que, no ano passado, foram aprovados processos de compra de 140 mil quilos de lombo de bacalhau, além de outros 9,7 mil quilos de filé do peixe salgado.

Em uma das compras registradas pelos militares, consta um pedido homologado pelo Comando da Aeronáutica, para aquisição de 500 quilos de lombo de bacalhau, em que o preço de referência usado pelo órgão público foi de nada menos que R$ 150 o quilo. Esses pedidos, uma vez homologados, ficam à disposição dos órgãos, para que façam suas compras com os fornecedores aprovados.

Muitos copos de uísques e conhaques também foram brindados com o uso do dinheiro público. O 38.º Batalhão de Infantaria, por exemplo, comprou dez garrafas do uísque Ballantine’s, mas desde que fosse com 12 anos de envelhecimento. O preço da garrafa proposto foi de R$ 144,13.

Já o Comando da Marinha preferiu adquirir 15 garrafas de Johnnie Walker, também com 12 anos de envelhecimento, o chamado “Black Label”. O valor que se dispôs a pagar para cada unidade foi de R$ 164,18.

Conhaques mais populares também entraram na lista do Batalhão Naval da Marinha. Em setembro do ano passado, o órgão aprovou o registro para compra de até 660 garrafas de conhaque das marcas “Presidente” e “Palhinha”, com preço unitário proposto de R$ 27,06.

“É um poço sem fundo. Quanto mais investigamos, mais absurdos e irregularidades encontramos. Se não bastasse o governo comprar picanha e cerveja, ainda tem o corte mais caro do bacalhau, uísque e conhaque e com indícios de superfaturamento”, diz o deputado Elias Vaz de Andrade (PSB-GO), que está entre aqueles que assinam a representação enviada ao procurador-geral da República, Augusto Aras, para que investigue os gastos militares. “Além da PGR, eu e mais nove deputados do PSB vamos levar essas informações ao Tribunal de Contas da União. Também estamos discutindo propor a instalação da CPI das compras do governo na Câmara Federal.”

Defesa

A reportagem questionou o Ministério da Defesa sobre cada uma das novas informações. A pasta, no entanto, não se manifestou sobre esses dados até a conclusão desta reportagem. Na quinta-feira, por meio de nota, o ministério afirmou que “reitera seu compromisso com a transparência e a seriedade com o interesse e a administração dos bens públicos” e que “eventuais irregularidades são apuradas com rigor”.

Segundo o Ministério da Defesa, “existe sempre uma significativa diferença entre processos de licitação e a compra efetivamente realizada, cuja efetiva aquisição é concretizada conforme a real necessidade da administração”.

Assim, “é imprescindível que se faça essa segmentação adequada, quando se faz a totalização dos valores, interpretação e principalmente a divulgação pública destes dados, de modo a evitar a desinformação”, afirma o ministério.

De acordo com a pasta, “apresentar valores totais de processos licitatórios homologados como sendo valores efetivamente gastos constitui grave equívoco”, afirma a nota, referindo-se aos dados incluídos na representação. No documento apresentado à PGR, entretanto, os deputados exibem dados detalhados com a identificação da compra realizada e seu referido fornecedor.

Elias Vaz afirmou que se trata de processos já concluídos e com fornecedores escolhidos pelos militares. “Estamos denunciando esses processos licitatórios. Essas empresas tiveram suas propostas aprovadas, por esses valores. Há processos de compra concluídos e, inclusive, já efetivamente pagos. Todos eles foram homologados pelas Forças Armadas”, disse o deputado.

André Borges, O Estado de São Paulo, em 13 de fevereiro de 2021 

Brasil tem que 'livrar-se da Coronavirus-19 e do Bolsonavirus-22', diz Augusto de Campos, que completa 90 anos


Avesso a entrevistas, Augusto de Campos, único remanescente do trio que criou a poesia concreta em São Paulo, critica Bolsonaro e se diz cansado. (CRÉDITO: DIVULGAÇÃO)

Para muitos, ele é o maior poeta brasileiro vivo. Único remanescente do trio original de poetas que, chamado de Noigandres, criou em 1952 a poesia concreta em São Paulo, Augusto de Campos completa 90 anos neste domingo e se diz cansado.

Pelo menos oficialmente. "Agradeço muitíssimo a você o convite, mas diante dos inúmeros pedidos de entrevista que tenho recebido, e solicitações as mais diversas, impossibilitado de responder a todos, e de ter que repetir-me, em face de minha avançada idade, cansado, esgotado mesmo, decidi optar, e resumir depoimento ao seguinte", foi a gentil resposta que a reportagem recebeu dele.

Em seu texto pronto enviado à guisa de depoimento, ele poetiza sua crítica ao governo Jair Bolsonaro. "Tudo o que tem o Brasil a fazer hoje é livrar-se da Coronavirus-19 e do Bolsonavirus-22 (e por este último entendo toda a corja que acompanha o nosso "presidemente"). Um vírus mata. O outro imbeciliza", escreveu. "Et tout le rest est littérature."

Mas, de seu apartamento no bairro das Perdizes, o agora nonagenário segue em plena ebulição intelectual. Encontrou no Instagram (@poetamenos) uma plataforma para suas experimentações verbivocovisuais — é seguido por quase 23 mil leitores. Está lançando, pelo Selo Demônio Negro, ExtraPound, antologia de traduções de poemas do americano Ezra Pound (1885-1972). E será homenageado, pelo aniversário, por eventos no Brasil e no exterior.

Em 2020, recluso pela pandemia, gravou com o filho Cid Campos sua tradução de Up From The Skies, de Jimi Hendrix (1942-1970). Batizada de Visitante dos Céus, a música foi produzida, interpretada e arranjada por Cid — voz, guitarra e baixo. Augusto toca gaita. Segundo o poeta, foi "para fugir à depressão" que gravou "a canção que traduzi do Jimi Hendrix, de quem sou grande admirador".

O poeta E. M de Melo e Castro, o editor Vanderley Mendonça e o poeta Augusto de Campos, em 2012. (CRÉDITO: VANDERLEY MENDONÇA)

Concreto

O paulistano Augusto Luís Browne de Campos começou a conquistar seu espaço no cânone literário brasileiro nos anos 1950. Seu primeiro livro, O Rei Menos o Reino, foi lançado quando ele tinha 20 anos e cursava Direito na Faculdade do Largo São Francisco. No ano seguinte, com o irmão Haroldo de Campos (1929-2003) e o amigo Décio Pignatari (1927-2012), criou a revista Noigandres — e a poesia concreta.

Era uma reação ao formalismo academicista da chamada geração de 1945. E, ao mesmo tempo, um resgate do espírito revolucionário dos poetas de 1922. Antenados com experiências europeias, como as que vinham sendo realizadas pelo poeta boliviano naturalizado suíço Eugen Gomringer (1925-), o trio buscava uma poesia que ultrapassasse os limites do verso.

Conforme explica o poeta e professor de literatura Frederico Barbosa, para tanto eles precisavam lançar mão de um arcabouço cultural "descomunal" — e, assim, realizar "a proeza sonhada pelo 'antropófago' Oswald de Andrade" (1890-1954), ou seja, "produzir, no Brasil, uma literatura de teor, qualidade e importância universais".

Em uma de suas raras entrevistas. concedida em 2010 e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, o poeta concordou que São Paulo era o berço necessário para o nascimento do concretismo.

"Como o Movimento de 22, tinha de nascer em São Paulo. Nos anos 50, aqui se concentraram os museus de arte moderna, a cinemateca, as bienais, as importadoras de livros e discos estrangeiros. O Rio, maior rival, sempre encantador, não era tão avançado e multi-informativo e era mais sentimental e francês (leia-se: surrealizante)", afirmou Augusto.

Em 1953, o lançamento do livro Poetamenos garantiu a Augusto um lugar na história da literatura brasileira. Mas sua vasta produção não se limitaria ao fazer poético. O paulistano tornou-se um reconhecido ensaísta e tradutor — principalmente de autores como o inglês John Keats (1795-1821), o francês Paul Valéry (1871-1945), o russo Vladimir Maiakovski (1893-1930), o americano E. E. Cummings (1894-1962) e o irlandês James Joyce (1882-1941), além do já citado PounReprodução da capa do novo livro de Augusto de Campos

                                                    

Reclusão

Enquanto produz, contudo, Augusto costuma ser avesso a aparições públicas. Neste aspecto, sua reclusão é bem anterior à pandemia. Na entrevista publicada em 2010, ele disse passar "a maior parte do tempo no computador".

"Dentro ou fora do universo digital, leio, ouço e vejo muito mais do que escrevo", comentou. "O meu fazer poético é, antes, como disse, um 'a-fazer' e a minha criação propriamente dita, um acidente de percurso."

Na época, dizendo-se "quase-oitenta", enfatizou: "fico muito em casa". "Não vou mais a livrarias e casas de disco. Compro tudo na internet. Cinema, não dá mais: sou da geração pré-'pipococa'. Prefiro zapear a TV, onde, a par de futebol e noticiário, entrevejo, com atraso, os filmes da moda, de preferência sob a forma de montagem (dois ou três ao mesmo tempo)", contou. "Melhor ainda: o meu Mac e o YouTube, onde assisto a coisas que nunca imaginei rever."

Segundo o editor Vanderley Mendonça, que além de ExtraPound também reeditou três obras de Augusto (ColidouEecapo, Reduchamp e Poemóbiles), a aparente reclusão de Augusto é "coerente com seu discurso poético".

"Ele se interessa por quem trilha as mesmas sendas da invenção, como leitor, tradutor e poeta. E, muito particularmente, como homem, em suas amizades", assinala o editor.

"Augusto transita entre duas tradições: o amor e a política. Fazer poemas políticos sem ser maniqueísta ou mesmo discursivo é o mais difícil desafio do poeta. Augusto, assim como Maiakovski, vai muito além do discurso político, inventa novas formas de versificação, de composição tipográfica ou agregam elementos novos no poema — cartaz, som, movimento."

"Augusto, para quem não sabe, não apenas recusa entrevistas — há anos, acredita que 'não tem nada a dizer, tudo está dito'. Recusa homenagens — embora seus leitores as façam. Recusa prêmios — como recusou o Prêmio Camões [edição de 2019], pois jamais o aceitaria vindo de um governo com fortes sintomas autoritários [a premiação é instituída pelos governos de Brasil e Portugal]", prossegue Mendonça.

"Assim, ao contrário do que parece, Augusto está mais interessado na obra do que no eu. Um poeta como ele jamais faria parte de uma Academia Brasileira de Letras, ou de qualquer academia. É o mais crítico e refinado teórico da poesia sem ser acadêmico. Sua obra é sua voz."


São icônicos os livros-objetos criados por ele. Do encontro de Augusto com o artista espanhol Julio Plaza (1938-2003) nasceu Poemóbiles.

"Sublinhou um novo aspecto visual às palavras impressas num livro, coloridas, fazendo com que se descolem da sintaxe tradicional numa configuração tridimensional para o texto, que se move e multiplica os sentidos", avalia o editor Mendonça. "Uma das mais inovadoras parcerias e de fundamental importância para as relações entre artes gráficas e poesia no Brasil."

Frederico Barbosa ressalta a importância da inovação das plataformas na obra de Augusto.

"Após escrever os primeiros poemas concretos do mundo, a série de poemas de amor baseados na música de Anton Webern, Poetamenos, ele experimentou novas formas de suporte para a poesia, em obras da década de 1970, como a Caixa Preta, literalmente uma caixa contendo diversos poemas soltos e os Poemóbiles série de poemas tridimensionais e coloridos", recorda.

"Nos anos 1980 e 1990 continuou a dedicar-se a investigar novos meios para a poesia, como a holografia e a computação gráfica e lançou, em parceria com seu filho, o músico Cid Campos, um CD com leituras criativas de seus poemas e traduções, 'Poesia é Risco'."

"No livro 'Não', de 2005, já apresenta poemas escritos diretamente na linguagem [de programação] flash e recentemente Augusto tem publicado seus poemas na internet, principalmente por meio do Instagram", completa Barbosa. "Ou seja, trata-se de um jovem de 90 anos que não para de experimentar e inventar."

"Não há nada mais fascinante do que conviver com Augusto durante o processo de produção de um livro seu. Não apenas por que ele conhece profundamente artes gráficas — repare que esse aspecto é comum nos poetas inventores, como Apollinaire, Mallarmé, Maiakovski, que conheciam muito tipologia e composição tipográfica —, mas porque cada livro dele é um desafio para editores, artistas gráficos e também leitores", conta Mendonça.

"Augusto, certa vez, me disse: 'a grande poesia não nos dá nada, só nos tira'. Talvez seja mesmo a poesia o último bastião da arte para resistir ao mercado. É um código e como tal precisa ser decifrada."

"Aprendi mais com Augusto fazendo seus livros do que com todos os livros de crítica já escritos", acrescenta. "Augusto é muito reservado, como se sabe. Sua retidão intelectual, suas atitudes e afirmações não se contradizem. Ele não tem essas características de intelectuais de terceiro mundo, ufanistas, que vivem em completa contradição, como era o caso do Ferreira Gullar. É um internacionalista."

Para Frederico Barbosa, "a importância para a poesia mundial" de Augusto "jamais pode ser ignorada".

"Campos é o último remanescente vivo de um trio que criou a poesia concreta, o último dos movimentos poéticos de vanguarda surgidos no século 20", afirma ele.

"Assim, pode ser considerado o único poeta vivo do mundo que corresponde àquela definição de Ezra Pound de 'poeta inventor': aquele que criou uma nova forma de escrever poesia, novos processos poéticos."

Marcelino Freire e Augusto de Campos (CRÉDITO: VANDERLEY MENDONÇA)

Reconhecimento internacional

Mas mesmo que ele diga não gostar, Augusto será celebrado pelos 90 anos. A Casa das Rosas, em São Paulo, tem uma programação dedicada a obra dele neste mês de fevereiro.

Organizada pelo escritor Marcelino Freire, a Balada Literária também terá edição online para homenagear o poeta — será no dia 27, no canal do Youtube do evento.

No dia 20, a celebração será internacional. Via Zoom, críticos e acadêmicos internacionais irão debater a obra de Augusto — evento das universidades de Yale, Zurique e Lausanne.

O reconhecimento internacional não é novidade. Augusto já teve sua obra exposta em museus como o Guggenheim de Nova York e a Galeria Maddox de Londres, além de ter integrado a Bienal de Lyon. Boa parte dos seus trabalhos foi traduzida para o francês e o espanhol. Em 2015, tornou-se o primeiro brasileiro a ganhar o Prêmio Latinoamericano de Poesia Pablo Neruda, oferecido pelo Chile.

"Ele é considerado um dos maiores poetas brasileiros por causa de sua longa devoção à poesia, sempre em busca do rigor formal aliado ao conteúdo inventivo", avalia Kenneth David Jackson, professor de Literatura e Cultura Luso-Brasileira na Universidade de Yale.

Ele enfatiza o fato de que a carreira de Augusto já soma sete décadas de produção ininterrupta. "Isso é mais longo do que qualquer outro poeta latino-americano que conheço", diz.

O professor conheceu Augusto em 1968, nos Estados Unidos. Desde então, nunca perderam contato. "Ele é importante porque sabe o que está fazendo e por quê. [Augusto] tornou a poesia brasileira relevante em perspectiva mundial", completa Jackson, lembrando que aos 90 anos, Augusto usa o computador para criar seus poemas, o que faz dele um poeta consumado, intimamente ligado com sua época.

"Para mim, Augusto de Campos é o poeta da contemporaneidade. Sua obra mantém-se atual por que a matéria-prima de sua criação é a forma — que, para ele, é também criação", define Mendonça.

"O domínio da arte e tecnologia gráfica é elemento predominante na composição de seus poemas. Das composições em Letraset, nos anos 50, às atuais incursões nas mídias sociais — Instagram —, passando por móbiles que compõem livros-objeto, ou mesmo holografia, seu domínio sobre a língua, a versificação e as tecnologias gráficas é impressionantemente moderno, atual. No século 20, nenhum poeta chegou tão longe. Eu diria que Augusto é o único poeta concreto, ou do que se chama concretismo."

Professora emérita da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, a crítica literária Marjorie Perloff diz que "Augusto de Campos conferiu à poesia um novo alcance, muito mais amplo, ao mostrar como o poético pode se transformar em obras de arte e performance e ao fazer da tradução parte integrante do universo da poesia concreta".

"Seus dons linguísticos são notáveis. Ele é capaz de pegar uma única palavra e fazê-la ressoar. Criou um novo universo de palavras e frases por 'semelhança familiar', transformando-as em parte de um discurso mais amplo", contextualiza ela. "Pense em 'Viva Vaia' ou 'Luxo/Lixo'. A obra de arte que valoriza a poesia é linda."

Professor de literatura brasileira na Universidade de Zurique, Eduardo Jorge de Oliveira acredita que os dois grandes legados de Augusto, "pelo menos para os poetas", são "a recusa e a margem".

"Ele soube articular como ninguém esses dois pontos. O primeiro porque os poetas têm uma grande capacidade de dizer não das mais variadas maneiras, declinando este termo: 'não', o que só enriquece a linguagem através da arte da subtração. Não à toa, Augusto de Campos adota o termo 'poetamenos', em referência a uma série dele de 1953", explica ele.

"Sobre o segundo ponto, pela arte de criar margens, dizer não implica em criar tempo para dedicar-se à arte da palavra, ainda que dela emane cores, visualidades, ritmos diversos. Augusto de Campos é um grande mestre nesse sentido."


Poema Tensão de 1956, de Augusto de Campos

Oliveira frisa também a importância das traduções realizadas por Augusto.

"Nesse sentido, a contribuição dele para a língua portuguesa, como a de Haroldo de Campos, seu irmão, e Décio Pignatari, foram enormes. No caso preciso do Augusto, ele continua a nos oferecer novas traduções, seja do russo, do espanhol, do inglês, do francês, do italiano, do latim ou do provençal", enumera.

"Ele é um poeta-arqueólogo dos sentidos. Ele é o maior para o menor, ou seja, para buscar nos sentidos mais ínfimos, desapercebidos, um tipo de elaboração verbal que não vem unicamente dele, mas dos outros poetas de sua eleição. Além disso, ele contribui para a crítica literária e musical. O Balanço da Bossa e os dois volumes de Música de Invenção são livros para ler com o Youtube. São livros para ler e escutar", comenta.

"Assim, pela dimensão musical e/ou sonora, táctil e/ou visual e dentro do grande leque da arte verbal, Augusto de Campos alia conhecimento e técnica. É curioso, pois ao mesmo tempo em que ele pode ser considerado um poeta dos poetas no âmbito experimental, ele também é um dos que mais contribuem para a língua portuguesa, o que chega a ultrapassar o caráter puramente nacional. Espero que ele continue assim pelos próximos 90 anos como já foi dito em um dos eventos que celebram seu aniversário no próximo dia 14."

O alcance cultural internacional de Augusto de Campos não se resume às rodas literárias.

O médico e historiador Vincent Barras, diretor do Instituto de Humanidades em Medicina da Universidade de Lausanne é grande admirador da obra do brasileiro.

"Augusto de Campos é definitivamente um dos maiores poetas do nosso mundo contemporâneo", afirma ele.

"Como escritor, teórico, tradutor e intérprete, ele nos dá toda a gama do que deve ser considerado poesia: não contente com o sentido usual e clássico do termo, ele abre as dimensões da poesia a todos os sentidos: verbivocovisual, como ele mesmo diz."

Para o escritor Marcelino Freire, Augusto é um poeta necessário aos dias atuais.

"A gente deve muito a esse eterno poeta inquieto", comenta.

"Note o Instagram do Augusto e veja que ele não parou: está no enfrentamento ao desgoverno que aí está. Augusto, com 90 anos, é mais jovem do que todos nós. Só gratidão ao autor que não para de pulsar."

Edison Veiga, de Bled (Eslovênia) para a BBC News Brasil, em 12 fevereiro 2021

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Cantanhede: Militares podem até lucrar com Bolsonaro, mas o ônus para as Forças Armadas é imenso

No caso do ministro Eduardo Pazuello, todo atrapalhado e respondendo à PF, ao MP e ao Congresso, o risco é um general da ativa no foco de uma CPI da Pandemia  

A conta do mergulho na política e da adesão ao candidato e agora presidente Jair Bolsonaro começa a chegar para as Forças Armadas, obrigadas a explicar milhões de reais em chiclete e leite condensado e agora a defender seus churrascos em 2020, com 700 mil quilos de picanha e, como ninguém é de ferro, 80 mil cervejas puro malte. O preço foi bem salgado, R$84,14 o quilo da carne, R$ 9,80 cada cervejinha.

Também é desanimador os hospitais do Exército e da Aeronáutica bloquearem só para militares e deixarem vazios 72% (84 de 116) dos seus leitos no Amazonas, segundo o UOL, enquanto 276 pacientes de Covid aguardavam vagas ontem e 529 tiveram de ser “exportados” para outros Estados e o DF desde 15 de janeiro. Leito vazio? Pago com dinheiro público, mas só para militares? Coisa feia!

Militares brasileiros na Base Aérea de Brasília embarcando para o Haiti em 2004  Foto: Sergio Dutti/AE

O vice Hamilton Mourão anunciou que a Operação Verde Brasil 2, prevista para até 2022, vai acabar em 30 de abril, com a retirada de militares das ações contra queimadas e desmatamentos na Amazônia. Com a volta desses contingentes às suas bases, serão mantidas as montanhas de chiclete e leite condensado? E as carnes nobres e o puro malte são para quem?

A sensação é de que a retirada foi uma puxada de tapete em Mourão. Indagado se foi um pedido (ou retaliação?) de Bolsonaro, Defesa e ou Comando do Exército, ele respondeu à coluna: “Fim da missão, apenas isso”. E, assim, após pisoteados pela “boiada” do ministro Ricardo Salles, o Ibama e o ICMBio, atualmente cheios de militares, vão retomar a dianteira na proteção da Amazônia, com Inpe, Polícia Federal e Polícia Rodoviária.

Não é exclusivo do Meio Ambiente, porque o capitão Bolsonaro levou generais para a Vice e todos os cargos relevantes do Planalto, expôs um general da ativa a vexame público na Saúde numa pandemia e encheu diferentes pastas – até a pobre Secretaria de Cultura – com militares. Toma lá, dá cá de cargos com político não podia, mas com militar e agora com Centrão é uma festa.

O resultado nem sempre é engrandecedor para as FA, particularmente para o Exército, como no caso do ministro Eduardo Pazuello, todo atrapalhado e respondendo à PF, ao MP e ao Congresso por falta de oxigênio e vacinas, excesso de cloroquina inútil, descaso com seringas, agulhas e testes de Covid. O risco é um general da ativa no foco de uma CPI da Pandemia (que pode chegar até aos 73 mil militares que receberam ilegalmente o auxílio emergencial).

Pazuello gosta de cantar de galo e o secretário-geral da Saúde, coronel Elcio Franco, entrou de mau jeito na guerra política de Bolsonaro com João Doria. Quando o governador anunciou a vacinação em janeiro, o militar chamou de “devaneio” e o acusou de “estar sonhando acordado”. E ainda ensinou: “Não será com discursos de ódio ou tendenciosos que serão encontradas soluções”. Pois é...

Em meio à confusão, vem aí um livro-entrevista em que o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Boas confirma que o Alto Comando participou diretamente da advertência (ou ameaça) que ele fez ao Supremo, em 2018, na véspera do julgamento de um habeas corpus contra a prisão do ex-presidente Lula.

Por essas e outras, as Forças Armadas são suspeitas de atuar politicamente para tirar Lula do páreo e dar a vitória a um capitão que dá poder a generais e empregos e reformas (previdenciária e administrativa) diferenciadas para militares, enquanto discursa num ato golpista com o QG do Exército ao fundo e sobrevoa outro em helicóptero militar e com o ministro da Defesa, general de quatro estrelas.

Bolsonaro lucra muito com essa parceria, mas o ônus de médio e longo prazos para as Forças Armadas, inclusive para sua imagem, tende a ser muito maior do que o bônus fugaz para dez, cem ou milhares de seus integrantes. A História dirá.

Eliane Cantanhêde é colunista do jornal O Estado de São Paulo. Este artigo foi publicado originalmente na edição de 12 de fevereiro de 2021.

Oposição autofágica

Os partidos com potencial para construir uma alternativa ao mesmo tempo viável e responsável para derrotar Jair Bolsonaro parecem perdidos

A confortável vitória dos candidatos governistas ao comando do Congresso parece ter tido o condão de pôr a nu as profundas divergências internas em partidos que teoricamente serviriam de oposição ao presidente Jair Bolsonaro. Nem é preciso dizer o mal que essa autofagia oposicionista faz ao País, justamente no momento em que se faz mais necessário um obstáculo político sólido à razia bolsonarista.

O mais recente entrevero se deu no PSDB, protagonizado pelo governador de São Paulo, João Doria, e pelo deputado federal Aécio Neves. O parlamentar, ex-presidente da sigla, acusa o governador de oportunismo e autoritarismo por, segundo ele, tentar impor sua candidatura à Presidência na eleição de 2022.

Em nota duríssima, Aécio Neves não deixou dúvida sobre o mal-estar: “Se o senhor João Doria, por estratégia eleitoral, quer vestir um novo figurino oposicionista para tentar apagar a lembrança de que se apropriou do nome de Bolsonaro para vencer as eleições em São Paulo, através do inesquecível Bolsodoria, que o faça, sem utilizar indevidamente e de forma oportunista outros membros do partido”.

O governador Doria respondeu no mesmo tom, lembrando que o deputado é suspeito de corrupção no escândalo estrelado pelo empresário Joesley Batista, em 2017: “O deputado Aécio Neves precisa entender que o novo PSDB não pode se subordinar a projetos pessoais, que se perderam pela conduta inapropriada em relação à ética pública”.

O fulcro da querela é o papel do PSDB ante o governo Bolsonaro. O governador paulista trabalha para isolar os focos bolsonaristas no partido e identificou no deputado Aécio Neves um dos tucanos que operaram pela candidatura vitoriosa do deputado Arthur Lira, apoiado por Bolsonaro, à presidência da Câmara. Doria quer a presidência do PSDB para consolidar sua candidatura à Presidência da República, que seria, em sua visão, a vanguarda da oposição de centro a Bolsonaro.

A acrimônia do atrito entre os tucanos já havia se verificado, em igual medida, na implosão do DEM, provocada pelo dissídio entre o presidente do partido, ACM Neto, e o deputado Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara. Rodrigo Maia acusou ACM Neto de “traição” por ter entregado o DEM “de bandeja” a Bolsonaro, trabalhando para que o partido fosse “anexado” ao governo. Em resposta, ACM Neto chamou Maia de “descontrolado”.

A exemplo dos tucanos, o busílis é a atitude que o DEM deveria adotar em relação ao governo Bolsonaro. Enquanto Rodrigo Maia presidia a Câmara e, nessa função, parecia ter grande influência no partido, o DEM era tido como pilar de uma possível frente de centro, junto com o PSDB, para desafiar Bolsonaro em 2022. Derrotado fragorosamente em sua sucessão, Maia foi atropelado – e o DEM retomou um papel que parecia esquecido no passado.

No que diz respeito aos interesses maiores do País, é ocioso discutir quem tem razão no meio desse banzé. O que importa é que os partidos com potencial para construir uma alternativa ao mesmo tempo viável para derrotar Bolsonaro e responsável o bastante para construir um projeto civilizado de País parecem perdidos. Nessa toada, o eleitor pode se ver novamente diante da terrível tarefa de escolher entre a delinquência bolsonarista e o embuste lulopetista.

Rusgas internas não são necessariamente sintomas de fragilidade de um partido. Ao contrário, partidos dignos do nome costumam consolidar suas bandeiras a partir de francos debates internos. Mas o que está acontecendo no DEM e no PSDB é de outra natureza: trata-se do desdobramento natural da crise de identidade que tomou de assalto o centro democrático desde a ascensão irresistível do imoral populismo lulopetista e de seu congênere, a demagogia brucutu bolsonarista.

Pode até ser que, em meio a essa depuração a céu aberto, as forças que deveriam estar na oposição consigam se reorganizar em bases mais firmes e coerentes que as atuais. Hoje, contudo, é preciso candura excessiva para apostar nisso; o mais provável é que a maior oposição a Bolsonaro continue a ser seu próprio desgoverno.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de São Paulo, em 12 de fevereiro de 2021

Bolsonaro nomeia deputado João Roma, do Republicanos, como novo ministro da Cidadania

Onyx Lorenzoni foi deslocado para a Secretaria Geral da Presidência na primeira fase da reforma ministerial
 
O deputado João Roma (Republicanos-BA) foi escolhido como novo ministro da Cidadania do governo Jair Bolsonaro. O parlamentar assume a vaga deixada por Onyx Lorenzoni (DEM-RS), que foi deslocado para a Secretaria Geral da Presidência, numa primeira fase da reforma ministerial. A nomeação foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União nesta sexta-feira, 12.

Roma, de 48 anos, venceu uma espécie de corrida interna no partido, que também avaliava para o Ministério da Cidadania os deputados Márcio Marinho (RJ) e Jhonatan de Jesus (RR). Ele foi escolhido por ter maior experiência em gestão pública e pela capacidade de articulação nos bastidores. Nos anos 1990 e 2000, passou por cargos de confiança nos governos de Pernambuco, Ministério da Administração, Ministério da Cultura e Agência Nacional de Petróleo (ANP).


João Roma é o novo ministro da Cidadania Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados - 2/7/2020

Antes de ser deputado, João Roma foi chefe de gabinete na prefeitura de Salvador, durante a administração de ACM Neto, presidente do Democratas. Em cinco anos no cargo, era considerado um dos homens fortes da gestão de ACM Neto e teve seu apoio para disputar o primeiro mandato de deputado federal, eleito em 2018. Por causa da crise no DEM, o ex-prefeito apelou para que Roma não aceitasse a indicação, mas o deputado ponderou que tinha aspirações pessoais e que sua indicação fazia parte de um acordo partidário do Republicanos com o Palácio do Planalto.

Em uma conversa recente com a cúpula de seu partido, Roma foi aconselhado a “cortar o cordão umbilical” com ACM Neto. A direção do Republicanos estava incomodada e via na tentativa de barrar Roma uma questão de vaidade do ex-prefeito de Salvador, que veria o “pupilo” assumir um cargo que nunca ele mesmo ocupou e em voo próprio, sem ser pelas suas mãos. Bolsonaro já havia definido a escolha. O ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, chegou a telefonar ao presidente do Republicanos, Marcos Pereira (SP), para relatar sobre a interferência do presidente do DEM.

Roma é católico, embora o partido seja um dos mais fortes na bancada evangélica e tenha vínculos com a Igreja Universal do Reino de Deus. O deputado é formado em Direito. Nascido em Recife (PE), é casado e tem dois filhos. Ele foi filiado ao antigo PFL, no qual militou na juventude. É neto do ex-deputado federal por três mandatos João Roma (PE), de quem herdou o nome. Nos anos 1960, o avô foi filiado ao PSD e à Arena, partido de sustentação do regime militar - ele deixaria a secretaria-geral da Arena em 1968, em discordância com o Ato Institucional Número 5 (AI-5). 

O ingresso do Republicanos no primeiro escalão de Bolsonaro é a primeira “entrega” a partidos do bloco do Centrão que apoiaram a eleição de Arthur Lira (Progressistas-AL) como presidente da Câmara dos Deputados. A costura foi realizada por Pereira, presidente nacional do Republicanos, que deixou o grupo do ex-presidente da Casa Rodrigo Maia (DEM-RJ), em que era um dos nomes cotados para a disputa, para aderir à campanha do candidato do Palácio do Planalto. 

O movimento do Republicanos e de outras siglas em favor de Lira ocorreu após o governo distribuir recursos e cargos para que deputados apoiassem seus candidatos ao comando do Congresso. O Estadão revelou que apenas do Ministério do Desenvolvimento Social foram repassados R$ 3 bilhões.

Pereira se reuniu com Bolsonaro na terça-feira, dia 9, para tratar da autonomia do Banco Central, pauta conduzida por outro deputado da bancada, Silvio Costa Filho (PE).

O acordo para dar mais espaço ao Republicanos, partido conservador, vinha sendo construído numa aproximação desde o ano passado. Dois filhos do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (RJ) e o vereador no Rio Carlos Bolsonaro ingressaram no partido. O partido também indicou, no ano passado, o presidente da CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento) José Samuel de Miranda Melo Júnior.

Fundado com apoio de bispos da Igreja Universal do Reino de Deus, o Republicanos nasceu durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva e apoiou os governos Dilma Rousseff e Michel Temer. Políticos filiados ao partido foram ministros da Pesca, do Esporte e da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.

Tia Eron

O licenciamento de Roma para assumir o ministério da Cidadania abrirá uma nova vaga ao Republicanos na Câmara. A suplente imediata é a ex-deputada Tia Eron (BA). Ela foi secretária nacional de Políticas para as Mulheres em 2019, tendo sido demitida pela ministra Damares Alves, da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

Tia Eron foi secretária de Promoção Social e Combate à Pobreza na prefeitura de Salvador, durante a gestão de ACM Neto. Na Câmara, notabilizou-se em 2016 por dar um voto, no Conselho de Ética, que abriu caminho para a cassação do ex-deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ). O ex-presidente da Câmara foi preso e condenado na Operação Lava Jato.

Felipe Frazão, O Estado de São Paulo, em 12 de fevereiro de 2021, Atualizado 12 de fevereiro de 2021 | 19h46

Após DEM indicar apoio a Bolsonaro, Mandetta pede reunião com cúpula do partido

Ex-ministro da Saúde deixou governo após atritos com o presidente na condução da pandemia de covid-19

O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta se reunirá nos próximos dias com o presidente do DEM, ACM Neto, para decidir se continua ou não na sigla. O encontro está marcado para a última semana de fevereiro.

O médico sul-mato-grossense se irritou com ACM Neto depois que o ex-prefeito de Salvador incluiu o atual presidente da República, Jair Bolsonaro, entre as opções do partido para 2022.

“A base do partido virou uma geleia. ‘Posso estar com Doria, Bolsonaro, Mandetta, Huck ou Ciro’. Daqui a pouco até Lula vai aparecer como cotado para receber o apoio”, disse Mandetta no começo da semana.

O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta; médico é cotado como presidenciável em 2022 Foto: Dida Sampaio/Estadão

Primeiro ministro da Saúde de Bolsonaro, Mandetta deixou o governo em abril de 2020 depois de um mês de atritos com o presidente da República sobre como enfrentar a pandemia da covid-19. 

Meses depois de deixar o ministério, o médico disse que o comportamento de Bolsonaro durante a pandemia contribuiu para elevar o número de mortes no país. Até agora, mais de 230 mil brasileiros foram vitimados pela doença, segundo dados oficiais.

“Nós ainda não confirmamos quando vai acontecer, mas já sinalizamos uma conversa. Sem ser essa semana, a partir da outra. Ainda sem local ou data, mas ainda este mês, para tratar sobre o presente e o futuro”, disse ACM Neto ao Estadão.

“É natural que aconteça esse papo aí nos próximos dias, ainda este mês. Mas não é uma reunião formal do partido. É um bate-papo dele comigo e algumas pessoas (do DEM)”, afirmou o ex-prefeito de Salvador. 

A reportagem apurou que devem estar presentes o ex-governador do Rio Grande do Norte José Agripino Maia e o ex-ministro da Educação Mendonça Filho, entre outros. 

O Estadão questionou ACM Neto e Mendonça Filho sobre qual caminho deverá ser seguido por Mandetta, mas ambos evitaram comentar. A possibilidade de o ex-ministro deixar o DEM, acompanhando a provável saída do ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), é debatida nos bastidores. No caminho inverso, uma outra hipótese em discussão é a da sigla lançar Mandetta como pré-candidato à presidência da República. 

Maia e Mandetta reclamaram publicamente da aproximação do DEM com o governo Bolsonaro durante a eleição para a presidência da Câmara, quando o partido abandonou a aliança de Baleia Rossi (MDB-SP), favorecendo o candidato do Palácio do Planalto, Arthur Lira (Progressistas-AL).

Depois de deixar o cargo de ministro, Mandetta passou a ver seu nome incluído em pesquisas de intenção de voto para 2022. No fim de janeiro, pesquisa Atlas mostrou o médico com 3,4% das intenções de voto, porcentual próximo daquele obtido pelo governador tucano de São Paulo, João Doria (3,6%), e maior que o apresentador Luciano Huck (1,9%). 

Bancada do DEM não tem disposição de seguir Maia, diz ACM Neto

O ex-prefeito de Salvador também comentou o levantamento do Estadão com a bancada do DEM na Câmara. A reportagem mostrou que dos 22 deputados que responderam às perguntas, só dois – Alexandre Leite (SP) e Kim Kataguiri (SP) – descartaram apoiar Bolsonaro em 2022. Um discurso que contraria o que Neto teria dito a Doria nesta semana, quando garantiu ao tucano que o DEM não estará com o atual ocupante do Planalto na próxima disputa presidencial.

André Shalders, O Estado de São Paulo, em 12 de fevereiro de 2021

Brasil registra 1.204 mortes por Covid em 24 horas; total vai a 237,6 mil

País contabilizou 9.765.694 casos e 237.601 óbitos por Covid-19 desde o início da pandemia, segundo balanço do consórcio de veículos de imprensa. Já são 23 dias com a média móvel de mortes acima da marca de 1 mil.

O consórcio de veículos de imprensa divulgou novo levantamento da situação da pandemia de coronavírus no Brasil a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde, consolidados às 20h desta sexta-feira (12).

O país registrou 1.204 mortes pela Covid-19 nas últimas 24 horas, chegando ao total de 237.601 óbitos desde o começo da pandemia. Com isso, a média móvel de mortes no Brasil nos últimos 7 dias foi de 1.068. Já são 23 dias com essa média acima da marca de 1 mil. A variação foi de 0% em comparação à média de 14 dias atrás, indicando tendência de estabilidade nos óbitos pela doença.

Em casos confirmados, desde o começo da pandemia 9.765.694 brasileiros já tiveram ou têm o novo coronavírus, com 49.396 desses confirmados no último dia. A média móvel nos últimos 7 dias foi de 45.229 novos diagnósticos por dia. Isso representa uma variação de -12% em relação aos casos registrados em duas semanas, o que indica tendência de estabilidade nos diagnósticos.

Dez estados estão com alta nas mortes: MG, GO, AC, PA, RO, RR, TO, BA, MA e RN.

O estado do Ceará não divulgou novos dados até as 20h desta sexta-feira.


Brasil, 12 de fevereiro

Total de mortes: 237.601

Registro de mortes em 24 horas: 1.204

Média de novas mortes nos últimos 7 dias: 1.068 (variação em 14 dias: 0%)

Total de casos confirmados: 9.765.694

Registro de casos confirmados em 24 horas: 49.396

Média de novos casos nos últimos 7 dias: 45.229 por dia (variação em 14 dias: -12%)

(Antes do balanço das 20h, o consórcio divulgou um boletim parcial às 13h, com 236.638 mortes e 9.725.231 casos confirmados.)


Estados

Subindo (10 estados): MG, GO, AC, PA, RO, RR, TO, BA, MA e RN

Em estabilidade (10 estados e o Distrito Federal): RS, SC, SP, DF, MS, MT, AM, AL PE, PB e PI

Em queda (5 estados): PR, ES, RJ, AP e SE

Não divulgou (1 estado): CE

Essa comparação leva em conta a média de mortes nos últimos 7 dias até a publicação deste balanço em relação à média registrada duas semanas atrás (entenda os critérios usados pelo G1 para analisar as tendências da pandemia).

Vale ressaltar que há estados em que o baixo número médio de óbitos pode levar a grandes variações percentuais. Os dados de médias móveis são, em geral, em números decimais e arredondados para facilitar a apresentação dos dados.

G1, em 12.02.2021.

Fuga de eleitores e planos de cisão: o dramático final de Trump abre uma fissura no Partido Republicano

Agremiação perdeu filiados, enquanto ex-dirigentes debatem a criação de um novo partido de centro-direita.


A senadora republicana Susan Collins fala com membros da Guarda Nacional no Capitólio. Foto deJIM LO SCALZO / EFE

Mais de 33.000 eleitores registrados como republicanos na Califórnia deixaram o partido nas três semanas seguintes ao ataque do Capitólio. Na Pensilvânia, foram mais de 12.000 deserções no último mês. Arizona, Flórida... o padrão se repete em todos os Estados que divulgaram dados. São números pequenos em escala nacional, mas a tendência preocupa os dirigentes partidários.

As assustadoras imagens do ataque ao Capitólio por parte de seguidores do ex-presidente Donald Trump, que os democratas vêm há três dias exibindo no julgamento do seu impeachment, dificilmente servirão para alterar a postura dos senadores republicanos. Mas talvez o destinatário real dessas imagens não sejam eles, e sim os eleitores conservadores tradicionais, cuja fuga colocaria o Partido Republicano em sérias dificuldades.

Segundo um levantamento do The New York Times, quase 140.000 republicanos deixaram o partido desde 6 de janeiro nos 25 Estados que divulgaram os dados. É o dobro das deserções democratas no mesmo período. Sempre há movimentos nos registros depois das eleições, em alguns casos porque os Estados atualizam as bases de dados e retiram os falecidos ou quem mudou de domicílio. Mas os especialistas concordam que, depois do ataque ao Capitólio, os republicanos sofreram um abandono maior que o habitual.

A tendência preocupa os quadros atuais e antigos do Grand Old Party. E também entre eles se nota o descontentamento. Dezenas de ex-dirigentes, conforme publicou a Reuters na quarta-feira, estão conversando para formalizar uma ruptura e criar um partido de centro-direita. Entre participantes desse debate inicial, segundo essa mesma notícia, haveria ex-altos-funcionários dos Governos Reagan, Bush pai e Bush filho, assim como diplomatas e marqueteiros do partido.

Mais de 120 deles participaram na semana passada de uma teleconferência para debater a cisão. A ideia, sempre segundo a Reuters, é apresentar candidatos próprios em algumas circunscrições e, em outras, apoiar candidatos centristas de qualquer filiação política. Debateu-se sobre formar um partido ou uma corrente, dentro ou fora da formação republicana. E se cogitam os nomes de Partido da Integridade e Partido de Centro-Direita, segundo a Reuters.

A iniciativa ilustra a que ponto os acontecimentos do final do mandato de Trump aprofundaram a fissura na formação. O trumpismo continua sendo uma força dominante no Partido Republicano. Segundo uma pesquisa da ABC News e The Washington Post feita entre 10 e 13 de janeiro, 69% dos norte-americanos consideram que os republicanos deveriam levar o partido para outra direção. Entre os republicanos, 60% insistem em seguir o rumo determinado por Trump. Esse percentual era de 83% em 2018.

O traumático final do mandato de Trump torna mais difícil a tolerância passiva de seus excessos, o que terminou por alienar uma parte do setor moderado. Os republicanos ampliaram sua presença na Câmara de Representantes depois das eleições de novembro, e entre os novos integrantes entraram perfis em sintonia com as bases mais extremistas do trumpismo. Até 139 membros da Câmara Baixa e oito senadores votaram a favor de bloquear a certificação da vitória eleitoral de Joe Biden horas antes do ataque ao Capitólio. Mas exatamente uma semana depois da violenta insurreição, 10 congressistas republicanos votaram pelo impeachment de Trump. Não é uma proporção grande entre os 211 deputados do partido, mas é o número mais elevado na história de votos dados por deputados pela destituir um presidente do seu próprio partido.

Na cabeça dos deputados, e também na dos senadores que terão que condenar ou absolver o ex-presidente, há outros cálculos. Neste momento, a força mobilizadora de Trump nas bases republicanas continua sendo grande, por isso a vontade de enfrentá-lo tende a ser proporcional à distância temporal que separa os atuais parlamentares da disputa por um novo mandato.

PABLO GUIMÓN, de Washington DC,  para o EL PAÍS, em 12 FEV 2021.

Com DEM em crise, Huck se aproxima do PSB: veja os cenários para 2022

Articulações para eventual candidatura à Presidência incluem fusões de legendas e a construção de proposta de um centro liberal e democrático; apresentador conversa com João Campos

A vitória de Arthur Lira (Progressistas-AL) na Câmara dos Deputados reforçou a percepção no grupo mais próximo a Luciano Huck de que é necessário construir uma estrutura partidária consistente para viabilizar o projeto presidencial do apresentador e empresário. No cálculo para uma eventual candidatura ao Palácio do Planalto são levadas em conta fusões de legendas e um arranjo que sustente a proposta de um centro liberal e democrático, capaz de se contrapor à polarização entre bolsonaristas e petistas. Desde o ano passado, ao menos quatro partidos já sondaram Huck.

Com o DEM fragmentado e mais governista, uma opção que passou a ser avaliada com atenção extra por aliados do apresentador é o PSB. As conversas ocorrem desde o ano passado e têm sido estimuladas pelo prefeito do Recife, João Campos (PSB), e por sua namorada, a deputada federal Tabata Amaral (SP), que está rompida com seu partido, o PDT. Tabata tem relação próxima com Huck e foi a ponte entre ele e Campos. Os dois jovens políticos integram o RenovaBR, grupo de renovação e formação política que tem o apoio do apresentador.

O empresário e apresentador Luciano Huck é apontado como possível candidato à Presidência em 2022 Foto: Renato Bueno/Divulgação

O filho do ex-governador e ex-presidenciável Eduardo Campos (que morreu em um acidente aéreo na campanha de 2014) e Huck também estreitaram a relação quando o pessebista assumiu, aos 27 anos, o mandato de deputado federal e adotou uma agenda ambientalista e progressista. No Congresso, o atual prefeito da capital pernambucana foi relator da CPI do Óleo e também presidiu a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Renda Básica.

O DEM, que flertava com o apresentador, mergulhou em uma crise interna após a eleição da presidência da Câmara, quando a bancada liberou seus deputados para votarem em Lira - candidato do presidente Jair Bolsonaro.  A aproximação da legenda com o Palácio do Planalto e a iminente saída de Rodrigo Maia (RJ) tem o potencial de esfriar as conversas do DEM com Huck.


A alternativa PSB tem como pano de fundo uma possível fusão entre a sigla socialista e o PCdoB, o que resultaria na criação de uma nova legenda de centro-esquerda. Apesar de ainda embrionária, a tese tem sido bem recebida por quadros dos dois partidos. Segundo interlocutores de Campos, há consenso de que é preciso construir pontes no campo da esquerda além do PT.

"A fusão do PSB com o PCdoB  é uma possibilidade. Há conversas entre os líderes dos dois partidos", disse o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP). "Assim como em 2018, a eleição de 2022 também não será convencional. A ideia é buscar uma pessoa da sociedade e acima dos partidos, mas ainda não aconteceu nenhuma conversa da direção do PSB com o Huck", afirmou o presidente do PSB, Carlos Siqueira.

Huck tem revelado em conversas reservadas ter admiração pelo governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), com quem também tem mantido conversas regulares nos últimos dois anos. O governador fez duas visitas ao apresentador no Rio de Janeiro antes da pandemia de covid-19. Durante a pandemia, organizaram ao menos cinco reuniões virtuais fechadas com públicos diferentes: empresários, políticos e ativistas. Dino vê em Huck um quadro "liberal progressista", que, uma vez eleito, não adotaria uma agenda de esquerda “puro sangue”, mas faria um governo associado à pauta de proteção social e ambiental. Em uma das conversas que tiveram, Huck chegou a perguntar a Dino sobre sua experiência de deixar um “porto seguro” (ele era juiz) para se aventurar na política.

Uma outra hipótese de união partidária - entre Cidadania, PV e Rede - poderia servir de guarida a uma candidatura de Huck. A ex-ministra Marina Silva mantém interlocução com o apresentador, mas a Rede resiste à ideia de fusão. "Essa conversa já foi feita com eles (Rede) e a decisão que tomaram foi negativa. Não tenho informação de que isso tenha mudado", afirmou Roberto Freire, presidente nacional do Cidadania. Ele reconhece que há um alinhamento com o PV e que, no futuro, isso pode caminhar para uma proposta formal. "Mas não é pauta ainda." O Cidadania era considerado um destino confortável para o apresentador e abrigou diversos quadros dos movimentos de renovação política. Mas a avaliação corrente entre aliados de Huck é que o partido ainda carece de capilaridade e recursos para uma disputa presidencial.

Cláusula de barreira

Fusões partidárias estão no radar de legendas médias ou pequenas por causa da cláusula de desempenho (conhecida também como cláusula de barreira). Criada em 2017, ela funciona como uma espécie de filtro e usa como base de cálculo as eleições gerais – quando são escolhidos o presidente da República, governadores, deputados federais e senadores. Na disputa de 2018, a exigência foi para que os partidos somassem ao menos 1,5% dos votos válidos em nove Estados, com 1% dos votos em cada um deles. O porcentual aumenta de forma progressiva e no próximo ano será de 2%.

Na articulação político-partidária, o projeto de Huck concorre com o do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que também tenta formar uma rede de apoios com partidos da centro-direita e passou a fazer acenos à centro-esquerda na busca por uma frente anti-Bolsonaro.

O apresentador abriu um leque amplo de interlocutores. Nas conversas, porém, é econômico e geralmente escuta mais do que fala. Segundo aliados, entre os partidos que já lhe sondaram ou fizeram convites, está o Podemos, que costuma ser identificado com a defesa da Lava Jato. Huck se reuniu com o ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro no fim de outubro do ano passado. O encontro não foi bem recebido por boa parte dos seus apoiadores. A avaliação é que o ex-magistrado de Curitiba contamina o seu projeto, trazendo para dentro dele a polarização PT x Bolsonaro. Alérm disso, Moro afasta da articulação de Huck as forças políticas da esquerda.

Uma possível filiação de Huck é algo tratado num horizonte ainda distante. Conforme a legislação, a data-limite é o início de abril do ano que vem, seis meses antes das eleições. Por enquanto, o apresentador continuará se colocando “à disposição” do País em manifestações pontuais. Aos poucos, pretende definir sua questão profissional na TV Globo (ele ainda é cotado como um possível substituto de Fausto Silva nas tardes de domingo em 2022) e fazer a transição de celebridade para o político. 

Procurados, Huck, Campos, Tábata Amaral e Renata Abreu, presidente do Podemos, não quiseram se manifestar./ COLABORARAM EDUARDO KATTAH e ADRIANA FERRAZ

Pedro Venceslau, O Estado de São Paulo, em 12 de fevereiro de 2021 | 11h07


quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Democratas concluem acusação e pedem condenação de Trump para evitar violência no futuro

Ao relacionar os atos e falas de Trump ao ataque ao Capitólio em 6 de janeiro, democratas argumentaram que o republicano pode incitar novamente à violência civil no país se não for punido 

 Depois de duas tardes de argumentação, deputados democratas concluíram a acusação contra Donald Trump no Senado americano, com pedido de condenação do ex-presidente para evitar episódios de violência no futuro. Ao relacionar os atos e falas de Trump ao ataque ao Capitólio em 6 de janeiro, democratas argumentaram que o republicano pode incitar novamente à violência civil no país se não for punido. 

"Não tenho medo de Donald Trump concorrer novamente em quatro anos. Tenho medo de que ele concorra de novo e perca, porque ele poderá fazer isso de novo", disse o deputado democrata Ted Lieu. "Impeachment não é para punir, mas para prevenir", disse  a democrata Diana DeGette. "Não estamos aqui para punir Trump. Estamos aqui para evitar que as sementes do ódio que ele plantou produzam mais frutos”, afirmou a deputada.

O apelo é também uma forma de dizer aos senadores republicanos, que não estão dispostos a condenar o ex-presidente de seu partido, que eles terão responsabilidade se episódios violentos de extremismo político voltarem a ocorrer.

Vídeo de discurso de Donald Trump é apresentado durante processo de impeachment no Senado  Foto: Erin Schaff/The New York Times

Os democratas concluíram os argumentos de acusação por volta das 16h20 (18h20 no horário de Brasília) desta quinta-feira. Os advogados de Trump terão oito horas -- ou dois dias -- para fazer a defesa do ex-presidente. A equipe de defesa de Trump já avisou que não pretende levar mais de um dia para a sustentação e a votação final do impeachment poderá ocorrer no fim de semana. 

Os advogados de Trump já apresentaram as linhas prévias de defesa e devem argumentar que, fora do cargo, ele não pode ser condenado no processo de impeachment. Hoje, no entanto, democratas anteciparam parte dos argumentos da defesa e desconstruíram a ideia de que a previsão de impeachment serve essencialmente para remover um presidente. Segundo eles, o impeachment não deve ser usado para punir, mas para evitar que novos atos de violência ocorram. 

"Pedimos humildemente que condenem o presidente Trump pelo crime pelo qual ele é totalmente culpado. Se vocês não fizerem isso, se fingirmos que isso não aconteceu, ou pior, se deixarmos ficar sem resposta, quem pode dizer que não vai acontecer de novo?", disse o deputado Joe Neguse.

“Meus queridos colegas, há algum líder político nesta sala que acredita que se o Senado permitir que ele volte ao Salão Oval, Donald Trump pararia de incitar a violência para conseguir o que quer?", questionou o líder da acusação, Jamie Raskin. “Você apostaria a vida de mais policiais nisso? Você apostaria a segurança de sua família nisso? Você apostaria o futuro da sua democracia nisso?", disse o deputado.

Democratas lembraram outros momentos em que Trump consentiu e estimulou atos violentos, como quando disse haver pessoas boas "dos dois lados" durante o ataque de supremacistas brancos em Charlottesville, em 2017. Mais recentemente, lembraram os deputados, Trump mostrou apoio em um tuíte à invasão do legislativo de Michigan por extremistas armados contrários à quarentena imposta pela governadora como medida de contenção do coronavírus. Segundo a acusação, a violência e o estímulo ao ataque do dia 6 de janeiro não foi algo fora da rota no governo Trump, mas um "estado de espírito" estimulado pelo republicano.

Beatriz Bulla / Correspondente, O Estado de São Paulo, em 11 de fevereiro de 2021 | 19h22

‘O Brasil não se resume a São Paulo’, diz Leite sobre disputa no PSDB

Governador gaúcho é alçado a pré-candidato à Presidência em 2022 por ala do partido que se rebelou contra chefe do Executivo paulista

Alçado a pré-candidato à Presidência por uma ala do PSDB que se rebelou contra o governador João Doria (SP), o governador gaúcho, Eduardo Leite, afirmou nesta quinta-feira, 11, que “o Brasil não se resume a São Paulo”. A declaração foi dada em um encontro realizado no Palácio Piratini, sede do governo do Rio Grande do Sul, com presença de 11 deputados federais e um senador – nenhum paulista.

“O governador Doria exerce uma liderança que respeitamos, assim como o PSDB de São Paulo, que também respeitamos. Mas o Brasil não se resume a São Paulo”, afirmou Leite.

A articulação desse grupo é uma resposta à ofensiva de Doria para que a bancada do PSDB adote uma postura mais incisiva de oposição ao presidente Jair Bolsonaro e à movimentação de aliados para que o governador paulista assuma a presidência do partido em maio. “Com todas as diferenças que temos com o governo Bolsonaro, não podemos boicotar o País para ter uma facilidade eleitoral”, disse Leite.

O governador gaúcho, Eduardo Leite (PSDB) Foto: Felipe Dalla Valle/ Palácio Piratini

Esse grupo de parlamentares quer que o governador gaúcho assuma protagonismo no cenário nacional. “O Eduardo Leite é aquele que mais agrada à bancada federal”, disse o deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG). “Não faz sentido o PSDB ter a relatoria da Reforma da Previdência e suas lideranças criticarem sistematicamente o governo federal”, afirmou Abi-Ackel, que vê Leite como pré-candidato do partido em 2022.

“O brasileiro está farto desse radicalismo, deste perfil de político mais áspero. O governador tem um estilo firme e habilidoso para resolver os problemas. Ele (Eduardo Leite) pode se apresentar e se colocar como um pré-candidato à Presidência.”

O deputado Cunha Lima (PB), filho do senador Cássio Cunha Lima, adotou um discurso conciliador. “Tudo que o Brasil menos precisa é de mais briga, e muito menos o PSDB precisa de mais briga.”

Questionado se era pré-candidato ao Planalto em 2022, Leite e os demais parlamentares evitarem responder. “Todos nós que estamos na política temos a intenção de ocupar espaços. Evidentemente a presidência da República é uma aspiração política. Mas ela é muito mais destino do que resultado de uma aspiração pessoal”, disse. Na quarta, em entrevista à Coluna do Estadão, o governador gaúcho havia dito que é “precipitado definir candidatura, seja de quem for” para 2022.

O senador Rodrigo Cunha (AL) ressaltou as qualidades do governador e traçou paralelos com outros políticos. “O governador Eduardo Leite não tem o perfil de querer ser herói, nem salvador da pátria, nem mito”.

Miro Teixeira: 'Não é odiando que se derrota o Bolsonaro'

Ex-deputado está de volta ao PDT para coordenar campanha de Ciro Gomes à Presidência em 2022

Político cuja trajetória se confunde com a da Nova República surgida com o fim da ditadura em 1985, o ex-deputado Miro Teixeira está de volta ao PDT após passagens curtas pelos nanicos Rede e PROS. Convidado pelo presidente nacional pedetista, Carlos Lupi, para coordenar a campanha de Ciro Gomes à Presidência em 2022, o carioca de 75 anos topou o desafio. Ressalta, porém, que é sempre o candidato quem assume, na prática, a coordenação da empreitada eleitoral.

Para vencer o presidente Jair Bolsonaro, o ex-constituinte, ex-deputado federal por 11 mandatos e ex-ministro das Comunicações no primeiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva prega que a campanha retome símbolos nacionais que considera “sequestrados” pelo bolsonarismo. Também propõe que tenha como mote “o dever da esperança”, expressão retirada do título de um livro lançado recentemente por Ciro.

Miro afirma ainda ser contra o impeachment do presidente. Nos próximos meses e na campanha, segundo ele, o foco deve ser mostrar à população que há um “desgoverno” no País.

Ex-deputado constituinte Miro Teixeira volta ao PDT 

O ex-deputado Miro Teixera, que volta ao PDT para coordenar campanha de Ciro Gomes à Presidência em 2022, durante entrevista ao Estadão em seu escritório no centro do Rio. Foto: Wilton Júnior/ Estadão

“Não se vai derrotar o Bolsonaro odiando o Bolsonaro. É analisando, mostrando isso às pessoas, não caindo nesses factoides que ele cria. O que precisa ser cobrado do Bolsonaro é governo. É preciso racionalizar esse desgoverno”, diz o experiente político. Ele foi deputado federal pela primeira vez em 1970, pelo MDB comandado na então Guanabara por Chagas Freitas, e passou pelo PMDB no início dos anos 80, antes de se filiar ao PDT de Leonel Brizola.

Deputado na Assembleia Nacional Constituinte, quando começou a ser formado o grupo que hoje é chamado de Centrão, Miro diz que seria hipocrisia censurar Bolsonaro por se aliar ao bloco execrado como fisiológico por seu apetite por verbas e cargos. “O Centrão serviria para votar o impeachment do Bolsonaro, não é? Então você vai censurar o Bolsonaro por ter levado o Centrão para apoiá-lo?”.


Confira abaixo a entrevista ao Estadão:


Por que essa volta ao PDT e qual é o projeto que será tocado?

Tudo atrasou um pouco por causa da pandemia. Todos os grupos de que participo têm sido sobre isso, e as discussões foram sendo travadas. Um dia, o Lupi participou de um desses grupos e começou a dizer que minhas ideias eram muito parecidas com as que o Ciro vinha travando, e falou para eu voltar ao PDT. Alguns deputados e o próprio Ciro começaram a me escrever, mas foi o Lupi quem comandou o processo. Eles usaram, tanto o Lupi quanto o Ciro, a história de coordenar a campanha.

E vai coordenar?

Olha, eu vi todas as campanhas presidenciais desde o fim da ditadura. Quem coordena a campanha à Presidência da República é o candidato, não outra pessoa. Se outra pessoa ficar imaginando que vai coordenar, vai virar um problema.

Então o que acaba sendo na prática?

A função é coordenar programa de governo. O Ciro tem isso aqui, ó (mostra um exemplar do livro “Projeto Nacional: O Dever da Esperança”, de autoria do presidenciável). Acho que “dever da esperança” tem que ser o mote da campanha, em cima de outra discussão que tenho travado: temos de gostar do Brasil. O Bolsonaro está dizendo que ele é quem gosta do Brasil, usa o verde e o amarelo. Nós é que gostamos do Brasil.

O senhor então acha que houve um sequestro de símbolos nacionais por parte do presidente Bolsonaro?

Acho que sim. Eu frequento o Maracanã e, em jogo da seleção, escuto “Sou brasileiro com muito orgulho, com muito amor”. Vamos cantar isso aí. O Exército não é do Bolsonaro, é da Pátria. “A Polícia Militar atende ao que o Bolsonaro mandar”. Não, atende ao que a lei manda. Temos que acabar com essas coisas, estão nos dividindo. Estão acabando com a possibilidade de se ter discussões racionais.

Qual será o Ciro de 2022? Mais à esquerda ou o Ciro “terceira via”?

Não acho que vá haver unidade dos partidos. Essa conversa de “No segundo turno todo mundo se junta”... Vamos parar com essa conversa. Isso aí é para quem não é do ramo. É no primeiro turno que se elegem deputados e senadores. Os partidos se juntam ou não se juntam por causa dos fundos partidário e eleitoral. Isso gerou no Brasil empresas partidárias, não partidos políticos. Então acredito que, tirando um ou outro, não vai haver grandes alianças. Vamos correr o Brasil, falar com as pessoas. E vamos de verde e amarelo.

Mas para que lado Ciro deve ir mais?

Não estou falando do Ciro, e sim do meu pensamento. O Ciro tem as ideias dele publicadas. Acho que essa divisão esquerda-direita atualmente é muito criada por uma extrema-direita que se organizou no mundo todo para separar as pessoas, dividi-las, e criar uma radicalização que afasta a racionalidade. O cidadão está desesperado pensando em emprego, em comida. Essa questão toda (de ódio) foi criada por grupos que não são de uma direita democrática.

Nessa linha, o senhor acha que Bolsonaro configura uma ameaça à democracia?

Ameaça à democracia acho que não existe. A democracia está garantida aqui (mostra um exemplar da Constituição). Essa história de dizer que a democracia é o que as Forças Armadas querem… Não. Elas estão submetidas à Constituição. Pode ser que passe pela cabeça do Bolsonaro (ameaçar a democracia), mas não podemos normalizar isso como realidade. Acho que alimentar a exceção é um erro brutal. A democracia veio para ficar, e isso é uma virtude da Constituição.


Pode ser que passe pela cabeça do Bolsonaro (ameaçar a democracia), mas não podemos normalizar isso como realidade.

'Pode ser que passe pela cabeça do Bolsonaro ameaçar a democracia), mas não podemos normalizar isso como realidade', diz Miro Teixeira. Foto: Wilton Júnior/ Estadão

Mas vê movimentos nesse sentido por parte do presidente Bolsonaro?

Acho que o Bolsonaro cria factoides. A oposição não cria problemas para o Bolsonaro, então ele cria problemas para ficar debatendo com ele mesmo. Cria o problema, tem a repercussão na mídia, ele responde a mídia, depois volta atrás. É deliberado. Não vamos achar que estamos diante de um idiota. Não estamos diante de um idiota. É uma pessoa preparada para viver na adversidade física.

Como o senhor analisa eleitoralmente o presidente para 2022?

Ele é, muito provavelmente, o único garantido no segundo turno. Tem público. Não se vai derrotar o Bolsonaro odiando o Bolsonaro. É analisando, mostrando isso às pessoas, não caindo nesses factoides que ele cria. O que precisa ser cobrado do Bolsonaro é governo. É preciso racionalizar esse desgoverno. O que está sendo feito para gerar emprego? E para desatar os nós do desenvolvimento brasileiro? Por que, com nossa capacidade industrial, estamos registrando perdas enormes?

Quanto à composição política, como o senhor avalia essa aproximação dele com o Centrão?

O Centrão serviria para votar o impeachment do Bolsonaro, não é? Então você vai censurar o Bolsonaro por ter levado o Centrão para apoiá-lo? O Centrão é algo que precisa ser mais bem explicado. Existia um centro, ali na Constituinte, que todo mundo procurava de alguma forma convencer - porque, se convencesse, ganharia. Teve um dia que o Roberto Cardoso Alves chegou ao microfone e deu um grito: “É dando que se recebe, o presidente da República precisa entender isso.” Aquilo gerou uma perplexidade. Ali começa a surgir essa organização que virou o Centrão como se conhece hoje. Censurar o Bolsonaro por causa do Centrão, que estaria sendo aplaudido se aprovasse um impeachment, é hipocrisia.

Do ponto de vista dos crimes de responsabilidade, acha que Rodrigo Maia devia ter aberto um processo de impeachment?

Eu fui contra no início (cita um debate do qual participou em 2020, antes dos acontecimentos mais recentes). Hoje, você pode encontrar razões para requerer o impeachment do presidente, em função da pandemia. Aquela ordem, por exemplo, que deu a aliados para invadirem hospitais. Estava violentando a Constituição, expondo a vida das pessoas, violando o Código Penal. Mas acho que o objetivo não pode ser buscar o impeachment do Bolsonaro nem de qualquer um. O impeachment, ou existe na sua face ou não existe. No momento, as pessoas não estão clamando pelo impeachment.

Então para o senhor o foco é derrotá-lo nas urnas?

Sim. Analisando o desgoverno dele. O fundamental é mostrar que ele não está governando, que não tem governo. É perder o ódio e analisar. Eu não assinaria o impeachment do Bolsonaro.

Mas, na prática, como derrotá-lo? Como o senhor defende que o Ciro chegue para 2022?

Com as propostas que ele tem. Mostrando como o Brasil é rico, tem potencial.


Teixeira defende derrota de Bolsonaro nas urnas: 

Teixeira defende derrota de Bolsonaro nas urnas: 'O fundamental é mostrar que ele não está governando, que não tem governo'. Foto: Wilton Júnior/ Estadão

E quem buscar para formar uma aliança?

Isso vai surgir no curso do processo. Eu acredito que ele conseguirá um apoio da população para que candidaturas sejam retiradas ainda no primeiro turno. Essa história de combinar segundo turno é para quem não conhece o processo eleitoral. Creio que o Ciro vai empolgar no primeiro turno.

Acha que alguma das forças que já estão colocadas poderiam se unir a ele?


Acho difícil. O PT, por exemplo, não renuncia a uma candidatura própria.

O episódio envolvendo o segundo turno de 2018, quando Ciro foi para Paris, não atrapalha ele no eleitorado de esquerda e com o PT?

Acho que não. Eu nem me lembrava disso até você falar. No segundo turno, as pessoas dizem que vão apoiar uma pessoa ou outra, mas o eleitorado não fica esperando quem o seu candidato vai apoiar. Já se decide logo para onde vai quando acaba o primeiro turno.

Caio Sartori, O Estado de São Paulo, em 11 de fevereiro de 2021 | 11h00


Bolsonaro diz que auxílio emergencial deve voltar em março e por até quatro meses

Segundo o presidente, essa é a alternativa que está sendo discutida com o Congresso; ele disse que não sabe qual seria o valor do benefício

O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta quinta-feira, 11, que uma nova rodada do auxílio emergencial deve ser paga a partir de março e por um período de até quatro meses. O chefe do Executivo afirmou que essa é a alternativa discutida atualmente entre o Executivo e o Congresso. Ele disse, contudo, que não sabe qual seria o valor do benefício.

"Está quase certo, ainda não sabemos o valor. Com toda certeza - pode não ser - a partir de março, (por) três, quatro meses", disse em conversa com jornalistas ao final de evento do governo em Alcântara (MA). "Isso que está sendo acertado com o Executivo e com o Parlamento também porque temos que ter responsabilidade fiscal", acrescentou.

O presidente não deu detalhes de quantas pessoas vão ser contempladas com essa nova rodada do auxílio. O ministro da Economia, Paulo Guedes, já disse que a ideia é atender à metade dos 64 milhões de beneficiários que receberam no ano passado. Nem o presidente nem o ministro disse como vão ser os critérios de seleção. 

O presidente Jair Bolsonaro em cerimônia de entrega de títulos de propriedade rural em Alcântara (MA). Foto: Alan Santos/PR

Mais cedo, durante evento de entrega de títulos de propriedade rural, Bolsonaro já havia sinalizado que o governo estuda conceder novas parcelas do auxílio emergencial "por alguns meses". Em janeiro, o presidente disse que a retomada do auxílio "quebraria" o Brasil. Agora, contudo, ele diz que vai ter uma nova rodada, mas que a retomada do benefício "representa  um endividamento muito grande do nosso País".

Na conversa com jornalistas após a cerimônia, repetiu que o auxílio custa "caro" para o País. "Eterno é aposentadoria, o BPC (Benefício de Prestação Continuada), tá? E é uma questão emergencial, porque custa caro para o Brasil", disse.

 Bolsonaro reforçou sua defesa pela retomada das atividades normais do comércio, sem restrições por conta da pandemia da covid-19. “Agora, não basta apenas conceder mais um período de auxílio emergencial, o comércio tem que voltar a funcionar, tem que acabar com essa história de ‘fecha tudo’”, disse.

“Devemos cuidar dos mais idosos e quem tem comorbidade, o resto tem que trabalhar, caso contrário, se nos endividarmos muito o Brasil pode perder crédito e daí a inflação vem, a dívida já está em R$ 5 trilhões, daí vem o caos. Ninguém quer isso aí”, declarou.

Nesta quinta-feira, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), cobrou o ministro da Economia, Paulo Guedes, por uma nova rodada do auxílio emergencial com "uma alternativa viável" para o benefício ser concedido. 

Como mostrou o Estadão, Guedes aceita mais três parcelas de R$ 200, mas condiciona a aprovação de uma nova rodada à aprovação de medidas de ajuste fiscal, como cortes de gastos com servidores, e uma base jurídica (que poderia ser uma cláusula de calamidade ou uma nova versão da PEC do orçamento de guerra para permitir ao governo ampliar os gastos fora de amarras fiscais).

Emilly Behnke, O Estado de São Paulo, em 11 de fevereiro de 2021 | 14h44

Militares usam verba pública para bancar 700 mil quilos de picanha e 80 mil cervejas

Representação de deputados à PGR aponta despesas suspeitas em compras de carne nobre e cervejas especiais; para Ministério da Defesa, denúncia se baseia em 'informações absolutamente equivocadas'

Picanha de R$ 84,14 o quilo. Cervejas especiais, de puro malte, a R$ 9,80 cada. Em tempos de extrema restrição de orçamento, as Forças Armadas brasileiras usaram dinheiro público, ao longo de 2020, para bancar a compra de mais de 700 mil quilos de picanha e 80 mil cervejas. E não se trata de itens quaisquer. Para um dos cortes de carne mais nobres do País, foram escolhidas como referência peças das mais caras. Entre as cervejas, privilegiou-se o puro malte, entre outras.

As despesas com bebidas alcoólicas e carne de churrasco foram tema de uma representação que deputados do PSB enviaram na terça-feira, 9, ao procurador-geral da República, Augusto Aras, para que investigue os gastos militares. O levantamento foi feito diretamente pela equipe dos parlamentares. A representação levada à PGR foi divulgada pelo site Congresso em Foco. Os questionamentos não se limitam ao tipo de item que foi comprado. Há fortes indícios, de acordo com os parlamentares, de superfaturamento nas aquisições.

Cerveja

Forças Armadas do Brasil compraram mais de 80 mil cervejas, segundo Painel de Gastos do Ministério da Economia; deputados apontam superfaturamento Foto: Pixabay

O levantamento utilizou informações do Painel de Preços do Ministério da Economia, a mesma ferramenta pública que revelou as compras milionárias de leite condensado. Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro justificou que se tratava de um item “necessário” aos militares, dado seu alto teor energético e calórico.

A reportagem questionou as Forças Armadas sobre quais seriam as justificativas e motivações para a compra dos 714.700 quilos de picanha e 80.016 garrafas e latas de cerveja em pleno ano de pandemia. Em nota, o Ministério da Defesa (MD) informou que aguarda a notificação da Procuradoria Geral da República. "O Ministério da Defesa e as Forças Armadas reiteram seu compromisso com a transparência e a seriedade com o interesse e a administração dos bens públicos. Eventuais irregularidades são apuradas com rigor", diz a pasta.

O ministério sustenta que a representação do PSB se baseia em “informações absolutamente equivocadas” e que o tema foi objeto de nota de esclarecimento, mas o órgão não explicou as razões que levaram à aquisição de cervejas e de picanha: “Ficou claro que as quantidades adquiridas e os valores efetivamente gastos com os determinados produtos eram de 10 a 20 vezes menores do que foi divulgado”.

O deputado Elias Vaz de Andrade (PSB-GO), que está entre aqueles que assinam a representação, afirma que os dados são oficiais e que se trata de preços devidamente registrados e aprovados pelas Forças Armadas, para que possa solicitar os alimentos. “Estamos denunciando esses processos licitatórios. Essas empresas tiveram suas propostas aprovadas, por esses valores. Há processos de compra concluídos e, inclusive, já efetivamente pagos. Todos eles foram homologados pelas Forças Armadas”, disse o deputado. “Falam que fazem uma alimentação balanceada, mas não explicam por que essa alimentação deve incluir itens como picanha e cerveja.”

Marcas famosas

Na relação detalhada de compras de cervejas anexada à denúncia dos deputados estão, por exemplo, 500 garrafas da bebida, da marca Stella Artois, ao preço unitário de R$ 9,05. Há ainda a aquisição de 3 mil garrafas de Heineken, a R$ 9,80 cada.

O comando da 23ª Brigada de Infantaria de Selva preferiu 3.050 garrafas de Eisenbahn, ao custo de R$ 5,99. Já a Brigada de Infantaria Motorizada do Rio de Janeiro optou por 1.008 latas de Bohemia Puro Malte, pelo valor de R$ 4,33 cada. Em supermercados, aponta a representação, o preço médio desse item é de R$ 2,59.

A lista de cervejas inclui ainda 2 mil garrafas de 600 ML de Bohemia Puro Malte, pelo valor de R$ 7,29, quando essas garrafas são encontradas por R$ 5,79. Para comprar mais 1.600 latas de Skol Puro Malte, de 350 ML, os militares pagaram R$ 4,00 pela unidade, item que é encontrado a R$ 2,69 em redes de varejo.

“O superfaturamento é evidente. Além disso, a grande quantidade que os órgãos solicitaram via processo licitatório deveria favorecer a negociação e proporcionar preços muito menores que os oferecidos no varejo. A realidade, todavia, demonstra que os preços contratados são superiores aos praticados pelos supermercados”, afirmam os deputados, na representação.

As informações revelam ainda que Marinha, Aeronáutica, Exército, Indústria de Material Bélico do Brasil (IMBEL) e a administração interna do Ministério da Defesa são grandes consumidores de picanha. Só em 2020, foram concluídos 76 processos de compra do corte, somando 714.700 quilos da carne nobre.

O Comando do Exército Brasileiro é o campeão em processos de compras do produto, tendo consumido 569.215 quilos do total.

Exército

Só em 2020, Marinha, Aeronáutica, Exército, Indústria de Material Bélico do Brasil (IMBEL) e a administração interna do Ministério da Defesa fizeram 76 processos de compra de picanha, somando 714.700 quilos da carne nobre. Foto: Sérgio Dutti/Estadão

Os dados revelam uma licitação de 13.670 quilos, na qual o valor de cada quilo pago foi de R$ 84,14. A se basear no preço que os militares estavam dispostos a pagar pela carne, até que saiu barato. O valor médio estimado pela equipe que conduziu a fase interna da licitação, de acordo com os documentos do certame, foi de R$ 118,25 o quilo. 

“Sinceramente, é preciso investigar qual foi o corte de carne usado para se chegar a esse preço médio irreal”, informa a representação.

“Em um ano de pandemia, com crise sanitária, econômica e social devastando nosso país, é inacreditável que os cofres públicos tenham custeado gastos com cerveja”, declaram os deputados. “Enquanto nosso povo padece por falta de recursos para sobrevivência, nossos militares usaram dinheiro público para custear bebidas alcoólicas. Tal conduta fere de morte o Princípio Constitucional da Moralidade Pública.”

Não se quer afirmar que os militares "não podem comer carne", argumentam os parlamentares, mas, sim, questionar “o grau de sofisticação empregado” nas compras de cortes nobres e específicos. “O episódio narrado nesse item revela que houve ostentação e os privilégios direcionados para alguns, conduta que destoa do discurso de humildade e simplicidade usado pelo Presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais.”

Diferenças

Segundo a nota do Ministério da Defesa, “existe sempre uma significativa diferença entre processos de licitação e a compra efetivamente realizada, cuja efetiva aquisição é concretizada conforme a real necessidade da administração”. Assim, “é imprescindível que se faça essa segmentação adequada, quando se faz a totalização dos valores, interpretação e principalmente a divulgação pública destes dados, de modo a evitar a desinformação”. De acordo com a pasta, “apresentar valores totais de processos licitatórios homologados como sendo valores efetivamente gastos constitui grave equívoco”, afirma a nota, referindo-se aos dados incluídos na representação. No documento apresentado à PGR, entretanto, os deputados trazem os dados detalhados com a identificação da compra realizada e seu referido fornecedor.

André Borges, O Estado de São Paulo, em 11 de fevereiro de 2021 | 11h09

Atualizado 11 de fevereiro de 2021 | 16h37


Brasil registra 1.351 mortes por covid-19 em 24 horas

Com mais de 54 mil novos casos confirmados em 24 horas, total de infectados passa de 9,7 milhões. Ao todo, 236 mil pessoas morreram no país em decorrência do coronavírus.    

Professora distribui álcool gel para aluno em escola de São Paulo

O Brasil registrou oficialmente 54.742 casos confirmados de covid-19 e 1.351 mortes ligadas à doença nesta quinta-feira (11/02), segundo dados divulgados pelo Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass).

Com isso, o total de infecções identificadas no país subiu para 9.713.909, enquanto os óbitos chegam a 236.201.

Diversas autoridades e instituições de saúde alertam, contudo, que os números reais devem ser ainda maiores, em razão da falta de testagem em larga escala e da subnotificação.

O Conass  não divulga número de recuperados. Segundo o Ministério da Saúde, 8.596.130 pacientes haviam se recuperaram da doença até quarta-feira.

A taxa de mortalidade por grupo de 100 mil habitantes subiu para 112,4 no Brasil, a 22ª mais alta do mundo, quando desconsiderados os países nanicos San Marino, Liechtenstein e Andorra.

Em números absolutos, o Brasil é o terceiro país do mundo com mais infecções, atrás apenas dos Estados Unidos, que somam mais de 27,3 milhões de casos, e da Índia, com 10,8 milhões. Mas é o segundo em número absoluto de mortos, já que mais de 474 mil pessoas morreram nos EU

Ao todo, mais de 107,6 milhões de pessoas já contraíram o coronavírus no mundo, e 2,3 milhões de pacientes morreram.

Deutsche Welle Brasil, em 11.02.2021, há 10 minutos