sábado, 5 de janeiro de 2019

Porandubas Políticas

Por Torquato Gaudêncio

Uma leitura sobre a abertura de portas da era bolsonariana.

A era bolsonariana

A era Bolsonariana tem início sob uma teia de interrogações, a partir da observação de alguns comentaristas: o presidente não desceu do palanque eleitoral. Ora, como poderia ter descido se seu eleitorado põe fé no ideário que tanto propagou ao correr da campanha eleitoral? Não é possível uma distância enorme entre o candidato e o presidente eleito. Afinal, trata-se de confirmar uma identidade construída ao longo de anos de jornada política. É evidente que a realidade impõe freios ao tom contundente do discurso eleitoral, principalmente em frentes como a da articulação com o Congresso. Como se verá mais adiante, não será possível administrar sem ouvir as preces das bases parlamentares no Senado e Câmara.

Os riscos

Com seu discurso no Parlatório, o presidente confirmou sua marca e estilo, particularmente em relação ao combate ao vermelho petista e à simbologia que representa - socialismo/comunismo, Venezuela, Cuba, Nicarágua, etc. É o que seu eleitorado espera no primeiro momento. E é também o que o lulopetismo espera. Afinal de contas, o PT (e seus satélites) pretende agir sob a linha divisória que ele mesmo desenhou ao longo de três décadas: "Nós e Eles". Desvios na rota bolsonariana – insucesso na economia, estado crescente de violência, desemprego massacrante – seriam o passaporte para a ressurreição do petismo.

Governar para todos

Uma questão fica no ar: não há ainda um pensamento homogêneo na equipe governamental? A promessa de Bolsonaro de que "nossa bandeira jamais será vermelha" começou a ser contornada com discurso ameno do novo chefe da Casa Civil, Ônix Lorenzoni. Ele fez convite ao PT e ao PSOL para integrarem um "pacto político", sob a linha argumentativa de que o momento aconselha que partidos deixem de lado a batalha eleitoral para pensarem no país. O pacto seria um ato de elegância política, um abraço suprapartidário que está a exigir esforço coletivo. Uma trégua, portanto, faria bem a todos. Lorenzoni deve ter acertado essa abordagem com o presidente. De qualquer maneira, emerge a impressão de que os discursos do chefe do Governo e de seu subordinado não fazem parte da mesma trilha sonora.

Economia puxando o trem

A economia é a locomotiva que puxa os carros do trem. Sob essa simbologia, o ministro Paulo Guedes será a estrela ascendente do governo. Diz-se que quer anunciar medidas a rodo, algo como um pacote a cada dois dias, a começar por sete medidas baixadas pelo ex-presidente Michel Temer, que seriam revisadas. A Câmara de Comércio Exterior deve começar a abrir a economia com a redução de tributação para bens de capital, informática e telecomunicações. Assim, o animus animandi de setores produtivos ficaria aquecido, garantindo investimentos e resgatando a confiança. Sob um ritmo que tende a ser continuamente acelerado, a locomotiva puxaria a economia e, sob esse arranque, o discurso ideológico tende, até, a ser esmaecido. Com os eixos da engrenagem econômica encaixados, o pulmão nacional respiraria oxigênio novo.

O tom social

Comenta-se, ainda, que o presidente não se referiu à meta de reduzir as desigualdades. Ou teria deixado de dar ênfase ao cobertor social. Como se sabe, este manto cobriu toda a era do lulopetismo. Bolsonaro preferiu não entrar na semântica de proteção das margens; de um lado, para evitar comparações com a linguagem do petismo, de outro, para economizar palavras numa frente que tem servido ao palavrório populista, hoje desgastado. A impressão é a de que o novo governo quer mostrar ações, evitando a verborragia das promessas. Se foi esta a ideia, temos de convir que o presidente agiu corretamente. O dicionário político está locupletado de adjetivos sobre a desigualdade de classes, combate à pobreza, etc. Se o novo governo enfrentar para valer as carências sociais - saúde, educação, segurança – certamente estará respondendo com fatos aos anseios das bases da pirâmide. Bolsonaro se referiu a essas demandas.

A base do equilíbrio

Continua forte o tom, com certa dose crítica, à presença de muitos militares no governo. Mais uma vez, analistas parecem esquecer a fonte de onde Jair Bolsonaro tira a água para beber: o poço militar. Foi na vida militar que o capitão construiu sua identidade. Ao entrar na política, já estava moldado ao ideário militar, com seus valores, linguagem e modos de agir. É previsível que um militar, guindado à presidência, tenha a seu lado perfis e quadros de confiança. Inclusive, militares que viveram e compartilharam, juntos, da vida da caserna. Desse modo, explica-se a base militar que se posta ao lado do presidente, que traz princípios que poderão ser úteis ao país: o dever de cumprir a missão, a objetividade, o respeito, a hierarquia, a ordem. Em suma, os assessores militares conferem certa segurança ao novo governo, um aviso do tipo: o presidente está bem resguardado.

Isolacionismo

Aos aspectos que podem ser considerados positivos, apresentam-se ângulos com possibilidades de trazer ameaça à imagem do país. Entre eles, o alinhamento automático aos Estados Unidos, o que já se traduz na manifestação de transferência da Embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém; a ruptura do Brasil com o concerto das Nações comprometidas com a questão do clima e preservação ambiental; certo viés ultraconservador no desenho das relações internacionais do país, que pode nos cobrir com uma veste de viés "fundamentalista". Tal percepção pode não se confirmar, até porque o Brasil, no momento certo, poderá tomar decisões que se ajustem ao figurino internacional.

Articulação política

Na esfera interna, mais cedo ou mais tarde, a real politik acabará prevalecendo. O presidente está certo em desejar eliminar mazelas que circundam o presidencialismo de coalizão: feudalismo, grupismo, mandonismo, nepotismo, fisiologismo, frutos da árvore patrimonialista. Maneira de perfurar alguns tumores que afetam o corpo político seria a articulação com as bancadas temáticas. Evitar o toma lá, dá cá que faz parte do cotidiano da política. Em seu início, sob a grande força que o sustenta, o novo governo até pode se valer dessa modalidade de articulação. Mais adiante, porém, a realidade política se imporá. Nesse caso, ele pode perder um ou outro dedo para salvar as mãos: atender a pedidos de partidos para cargos no segundo e terceiro escalões. Deixaria de fora, porém, os quadros do primeiro escalão. O que já seria um avanço.

Imagem simpática

A primeira dama é um show de simpatia. Quebrou o protocolo, discursando antes de seu marido, para fazer um bem recebido discurso em favor dos deficientes auditivos e em defesa dos valores da família. De maneira inédita, apresentou sua mensagem na linguagem de Libras, tendo sua gesticulação sido traduzida. Michelle Bolsonaro abre uma porta de simpatia nos Palácios frios de Brasília.

Corrupção e segurança

A alta visibilidade do novo governo terá em Sérgio Moro, o ministro da Justiça, uma das luzes. Moro deve gerar impacto em duas áreas: combate à corrupção e segurança pública. Vai ser duro contra corruptos. Passará a limpo todos os cantos e recantos da administração pública. Já a segurança pública deverá ser outro pilar da imagem governamental. Prevê-se controle maior das fronteiras e políticas mais duras contra a bandidagem. O governo poderá ter bons resultados no médio prazo.

Gaudêncio Torquato, cientista político e Professor Titular na USP, é consultor de marketing político.

Brasil, mostra tua cara!

A nova logomarca do Governo Federal foi apresentada ao País pelo Presidente Bolsonaro em sua conta no twitter
Não houve agência de publicidade, nem marqueteiro no meio. 

Foi trabalho direto da Secretaria Especial de Comunicação, a SECOM, sem status de Ministério, agora vinculada à Secretaria de Governo, sob a direção do General Carlos Alberto Santa Cruz.
Orgulhosamente, Bolsonaro disse que a parte mais importante nisso tudo é que divulgação, via internet, está sendo feita a custo zero, gerando uma economia aos cofres públicos de alguns milhões de reais, se para isso tivesse que recorrer aos sistemas tradicionais de rádio e TV.
A mensagem da nova logomarca remete à ideia de resgate da coesão social, lembrando as sempre aplaudidas peças da antiga AERP/Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência da República, então liderada pelo talentoso General Octávio Costa.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Carga tributária ideal é de 20%, diz Paulo Guedes


O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu uma “enxurrada” de medidas nos próximos dias. “Não faltará notícia”, avisou. Segundo ele, nos primeiros 30 dias de governo serão tomadas medidas que não precisam mexer na Constituição, conforme antecipou o Estadão/Broadcast.

Paulo Guedes, novo ministro da Economia: classe política tem de assumir responsabilidades por Orçamento Foto: Gabriela Biló/Estadão.

As reformas estruturantes serão enviadas após o novo Congresso Nacional tomar posse, em 1.º de fevereiro. “Vamos na direção da liberal democracia, vamos abrir a economia, simplificar impostos, privatizar, descentralizar recursos para Estados e municípios.” Confira os principais pontos do discurso.

Reforma tributária

Guedes defendeu a criação de um imposto único, que simplificará o pagamento de tributos. O ministro disse que a carga tributária ideal para o Brasil é de 20%, bem abaixo dos atuais 36%. “Acima de 20% é o quinto dos infernos. Tiradentes morreu por isso.” Segundo o secretário da Receita, Marcos Cintra, há uma série de alternativas para a criação do imposto único – ele disse preferir a tributação sobre as movimentações financeiras, mas ressaltou que é possível também criar um imposto sobre valor agregado (IVA) ou sobre o faturamento das empresas. Antes do envio da proposta de reforma, porém, haverá medidas de simplificação – uma das avaliadas será o projeto de simplificação do PIS/Cofins que o governo Michel Temer deixou pronto. No Imposto de Renda, o secretário defendeu poucas alíquotas e uma alíquota adicional, maior, para altas rendas.

Privatizações

Guedes disse que as privatizações serão o segundo pilar do governo, depois da reforma da Previdência. Ele lembrou que corrupção e venda de favores em empresas públicas estiveram no centro de escândalos nos últimos anos. “Mensalão, petrolão, ocorreram em empresas públicas”, disse o ministro. Na cerimônia de transmissão de cargo, o novo presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, disse também que o banco começará a abrir o capital de suas subsidiárias e que pelo menos duas ofertas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) serão feitas ainda este ano. Na sua gestão, segundo Guimarães, serão ofertadas ao mercado as áreas de seguros, cartões e loterias.

Abertura comercial

Guedes disse que a abertura do comércio será feita “de maneira sincronizada” com reformas estruturais, como a da Previdência e a tributária. “Se abrir a economia sem reforma, tem de falar ‘corre que o chinês vai te pegar’”, brincou o ministro. Segundo ele, o processo de abertura inclui comércio, bens e serviços, novas tecnologias e investimento estrangeiro direto, que deve ser desregulamentado.

Bancos públicos

Guedes mudará a atuação dos bancos públicos e afirmou querer desestatizar o mercado de crédito. No discurso, disse que quer de volta os R$ 200 bilhões que faltam de recursos que foram emprestados pela União ao BNDES. “Queremos despedalar, o BNDES não vai ser o samba do crioulo doido, será mais importante qualitativamente.” O ministro afirmou que há hoje dois mercados de crédito no Brasil, o de crédito livre “com juro lá em cima” e o “dos amigos”, com juro baixo (ele se referia ao crédito direcionado, que engloba justamente os empréstimos concedidos pelo BNDES, rural e imobiliário). “A vida ficará um pouco mais difícil para quem vivia à sombra do governo”, afirmou.

CLT

O ministro afirmou que o governo de Jair Bolsonaro vai “inovar e abandonar a legislação fascista” da CLT, em referência à criação da carteira de trabalho verde e amarela, uma das promessas de campanha. Segundo ele, o objetivo é absorver pessoas que hoje estão no mercado informal de trabalho e “libertar” os trabalhadores do sistema de repartição da Previdência, pelo qual os ativos contribuem e bancam o pagamento de benefícios de aposentados.

Tesourada em cargos

O Ministério da Economia será a pasta com o maior número de cortes em cargos comissionados, 3,1 mil. Segundo o secretário-adjunto de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Gleisson Rubin, serão cortados 600 DAS (funções comissionadas para quem não é servidor de carreira) e Função Comissionada do Pode Executivo (FCPEX) e mais 2.500 funções gratificadas de menor valor. As mudanças na estrutura vão exigir um decreto que ainda não está pronto e que tem mais de 158 páginas.

Corte de gastos

Guedes disse que o primeiro diagnóstico de sua equipe é que é necessário controlar a expansão dos gastos públicos, que chamou de “mal maior”. “Não precisa cortar dramaticamente, sangrar, é não deixar crescer no ritmo que crescia”, disse. Ele defendeu o teto de gastos, que limita o crescimento da despesa pública, mas disse que é necessário fazer as reformas para que ele se sustente. “O teto sem parede de sustentação cai. Temos de aprofundar as reformas, que são as paredes.”(Reprodução de O Estado de São Paulo, edição de 03.01.19).

quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Vestido de noiva

Por Edson Vidigal

Cidadã americana, Mary Cecilia, com certeza não é este o seu verdadeiro nome, apaixonou-se por Pedro Ernesto, um brasileiro que nunca esteve nos Estados Unidos.
A coisa foi ficando tórrida, mas nada presencialmente, até que ele, Pedro Ernesto, e com certeza não é este o seu verdadeiro nome, sacando que ela, Mary Cecilia, estava disposta a tudo, pediu-a em casamento.

Estamos sabendo sobre uma história até aqui em nada surpreendente, de quando Marshal MacLuhan, há mais de meio século, anteviu a sintetização do planeta terra a uma mera aldeia global. 
Parecia coisa de louco. Como então esse mundo, mundo, vasto mundo e, de um certo ponto de vista, inclusive imundo, haveria de se estreitar em extensões incríveis, a partir de extensões tecnológicas tão fáceis de se explicar.

Em seu livro “Understanding Média”, publicado em 1964, depois traduzido no Brasil como “Os meios de comunicação como extensões do homem”, MacLuhan previu que uma rede mundial de computadores tornaria acessível, em alguns minutos, todo tipo de informação ao mundo inteiro.

Trinta anos depois, surgiria a internet. E com ela, essas novas tecnologias, desmantelamentos gradativos de antigos antros de poderes de manipulações coletivas, essas mídias antigas, latifúndios de verdades únicas sob coronelismos eletrônicos, agora antiquados por força das redes sociais na orbita da nova galáxia de Gutemberg.

Mary Cecilia e Pedro Ernesto no mundo de hoje são apenas um casal de apaixonados que seriam antiquados se não tivessem se conhecido numa conexão dessa nova galáxia.

O certo mesmo é que ela, Mary Cecília, decidida a viver o seu novo começo, casando-se com Pedro Ernesto, consultou a mãe, o pai, as amigas, talvez o professor e o treinador do seu time na escola sobre o mais apropriado modelo de vestido de noiva para o seu casamento no Brasil.

Mary Cecilia quase nem dormiu de tanto sonhar acordada. Ah, o Pedro Ernesto. O príncipe encantado que lhe chegou encantando-a na telinha do smartphone.

Poderia, quem sabe, mas a sua formação e cultura não são dessas coisas, omitir à Receita Federal antes da aterrisagem em Guarulhos, São Paulo, Brasil, o que trazia de mais valioso e importante na sua bagagem – vestido de noiva.

Mary Cecilia foi detida pelo agente do fisco federal, constrangida a abrir as malas e exibir seus vestuários íntimos, calcinhas e também a camisola escolhida para a primeira noite. Multada por trazer o vestido de noiva em cinco mil dólares.

O agente da Receita, a serviço de um Estado que se renova cada vez mais totalitário, não gosta de noivas americanas. Ou, quem sabe, algum trauma a lhe impingir eterno horror a vestidos de noiva.

Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho de Justiça Federal.

O legado de Michel

Por Gaudêncio Torquato

Michel Temer deixa o comando do governo sob alta taxa de desaprovação. Retrato de um Brasil que costuma surfar na onda de versões fantasiosas. Pois qualquer analista responsável, ao colocar a lupa sobre o país de tempos atrás e o de hoje, enxergará a abissal diferença entre os dois entes: o de ontem, destroçado, sob a maior recessão econômica da história, e o da atualidade, com juros e inflação controlada, resgatando a confiança perdida, fazendo voltar investidores, as contas do Estado sob controle e um conjunto de reformas, dentre as quais a trabalhista, a do Ensino Médio e a PEC limitando gastos públicos.

O que explica a imagem negativa da administração Temer? O drible que parte da mídia patrocinou na versão de um diálogo gravado no Palácio do Jaburu. O bumbo do grupo midiático mais poderoso do país bateu no arremate da interlocução mantida pelo presidente com um empresário. “Tem que manter isso, viu”? A fala anterior do figurante referia-se ao fato de “estar bem” com o então presidente da Câmara. E o que se viu, meses a fio, foi a inferência:  Temer se referia à entrega de dinheiro, coisa que “deveria ser mantida”. Com essa ilação, o Brasil perdeu a chance de caminhar mais célere na rota dos avanços. A reforma da Previdência, por exemplo, teria sido aprovada.

A lama que a Operação Lava Jato jogou no manto da política, com denúncias sobre empresários, executivos e políticos, acabou convergindo para a figura do presidente. Que não se dobrou ao claro objetivo do tiroteio midiático: tirar Michel do assento presidencial.

O fato é que o país, mesmo sob o fardo de 13 milhões de desempregados, caminha lentamente, registrando avanços aqui e ali; aprovando pautas de relevo; alargando o acesso às privatizações; promovendo entendimentos com a União Européia; assumindo compromissos junto ao G-20, grupo das 20 maiores economias mundiais; participando de encontros com parceiros dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul); reforçando vínculos comerciais com a União Econômica Euroasiática; debatendo as mudanças climáticas com as Nações envolvidas no Acordo de Paris. Com os vizinhos, o Brasil tem se esforçado para fortalecer parcerias, sob o compromisso de dar força ao Mercosul.

O Brasil a ser comandado pelo presidente Jair Bolsonaro sai das profundezas do buraco onde foi deixado pela administração petista. Não navega em águas tranquilas, eis que grandes carências ainda corroem o corpo nacional. Milhões de brasileiros ainda não têm acesso ao pão sobre a mesa. Os programas sociais, mesmo ampliados, como o Bolsa Família, não conseguem eliminar bolsões de pobreza que habitam o piso da pirâmide social. A violência se espalha pelo território, a denotar a organização de gangues e quadrilhas.

Mas os fundamentos que inspiram a retomada da economia foram lançados. O empresariado retoma o fôlego, reconhecendo que foram lançadas as condições para um empuxo mais forte na frente dos investimentos. A área de trabalho viu-se desafogada com a redução de cerca de 40% nas reclamações judiciais, graças à reforma trabalhista.

Parlamentar desde os idos de 80, presidente da Câmara por três vezes, Michel Temer colocou em prática sua visão parlamentarista, ao abrir intensa articulação com o Congresso Nacional. Pode-se dizer que governou por meio de um semipresidencialismo. Esteve todo tempo promovendo encontros com parlamentares e lideranças partidárias. Assim conseguiu aprovar o programa de reformas que marca sua passagem pelo Planalto.

Constitucionalista, Michel Temer também deixa um legado ao Congresso. Trata-se de sua interpretação sistêmica à questão de trancamento de pauta por Medidas Provisórias. Quando presidia a Câmara em 2009, propôs esta solução ímpar na história constitucional: “Na verdade, o constituinte não quis sobrestar absolutamente todas as deliberações legislativas, mas apenas aquelas que também são previstas para Medida Provisória, ou seja, as demais espécies normativas não estão abrangidas na disposição do art. 62, § 6º, CRFB/88”. A tese deu mais autonomia ao Poder Legislativo na sua função primária, a atividade legislativa.

Michel deixará o Palácio do Planalto pela porta da frente.

Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de comunicação - Twitter@gaudtorquato

sábado, 22 de dezembro de 2018

A lua no deserto

Por Edson Vidigal

Entre a eleição e a posse há um governante, que mesmo em estado de reeleição, executa acordes finais.

A fadiga do primeiro mandato não parece inspirar acenos às esperanças que vistas hoje, de um certo ponto de vista, renegam o verde que o tempo por estas bandas sangrou.

As esperanças de muito antes de anteontem que pousaram nos corações de outrora agora se ensaiam em desertos de verdes como que em busca de uma nova cor, o branco das pombas, talvez, certamente um símbolo de paz.

A esperança é incansável, não desiste, é imortal. É a última que morre, até porque, dizem, quando o nojo chega ao mais insuportável ela é a primeira a dar o fora.

Assim como há cordeiros que não são cordeiros porque por dentro são lobos vorazes, advertem os evangelhos, há também as esperanças não são esperanças porque são as que no voo despencam o verde da ilusão e então picam com violência porque em verdade são marimbondos vorazes.

Entre o resultado da eleição e a data da posse há dois governantes. Há o que vai sair daqui a pouco - ou porque a maioria, uma vez esclarecida, preferiu dar logo um basta nos avanços da sua jornada ou porque não se candidatando a nada preferiu a quietude da hora de ir embora sozinho.

Há o que, eleito pela primeira vez, é rodeado de bajuladores, de oportunistas, de alpinistas e até de esperanças das verdes, também conhecidas como esperanças populares. Onde chegam. Ou por onde passam.

Esse tempo, que é só de espera da data da posse, inebria encantamento como um éter fortíssimo de um enorme frasco quebrado.

É preciso equilíbrio, quero dizer, muito juízo, para não achar que tudo que se refere ao poder é por demais passageiro.

O poder, seja o político, o econômico, ou aquele outro difuso conhecido como o da glória, podem viciar.

Felizmente, como tudo nesta vida feita de antes, durante e depois, o poder, qualquer que seja, tem prazo de validade e um dia acaba. Só os idiotas se iludem e confundem achando que o estado transitório do poder, qualquer que seja, é coisa de posse pessoal.

O poder político é institucional. Resulta da legitimação legal, mas perde densidade até não valer mais nada ao perder a autoridade moral. Os cargos e funções não honram, mas os que os ocupam e os exercem é que tem o dever moral de honrá-los.

O eleito pela primeira vez, que está só na espera da hora da posse, já governa. Governa expectativas. Seu governo prévio tem o acorde de uma canção. Das que não enxotam esperanças. Talvez como na “Canção da Expectativa” do poeta José Chagas.

Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

As chances da lava-toga

Transparência total. Não só como princípio. Mas como regra absoluta a nortear todas as ações dos agentes do poder público. O poder de cada um em todos os Poderes - Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público - é delegação da sociedade para legitimar as ações de autoridade cumprindo e fazendo cumprir a Constituição e as Leis do País. A pessoa no exercício de qualquer função do poder público perde o respeito da sociedade quando perde a moral. Perde também, por conseguinte, a legitimidade indissociável à validade dos seus atos. Por isso, há sempre em prontidão os que convocam a injúria, a difamação, como armas nunca certeiras, sem os resultados finais pretendidos, quando a verdade desponta, a tempo, abatendo os mísseis da crueldade. Daí que não basta, em especial, no serviço público, fazer as coisas certas, mas fazê-las sempre com a certeza de que todos os olhos do mundo estão a enxergar tudo o que se passa, ainda que o fazer imponha absoluta concentração e total solidão. Nas quase duas décadas em que estive Juiz com imenso poder de autoridade na República ate me ofendia com as insinuações e dossiês anônimos que eu lia ou me chegavam. Conhecendo as pessoas como imaginava que as conhecia, tendo mais o que fazer no meu trabalho, não vendo indícios suficientes nem provas, lançava tudo na lixeira do tempo. Para não atulhar com lixo as gavetas da memória. Hoje, depois que voltei ao outro lado dos cancelos, fronteiras sempre intransponíveis, o olhar de advogado no desfilar das coisas me inquieta como sementes de dúvidas. Dúvidas hoje ainda me são poucas. Surpreendentes, mas poucas. Como no poema de Pessoa, não tenho, nunca tive, irmandade nenhuma com essas coisas. Luz, mais luz! Peticionou Ghoethe. Mais vale acender uma vela que amaldiçoar a escuridão! Proclamou Confúcio. Transparência total, luz absoluta, também sobre os labirintos, e ainda são muitos, do Judiciário no Brasil. É para ler e meditar com calma a matéria do Crusoé desta semana. Abra o link copiando o endereço abaixo: https://crusoe.com.br/edicoes/34/a-chance-da-lava-toga

quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Porandubas Políticas

Por Torquato Gaudêncio

Abro a coluna com o verbo da Bahia.

Cosme de Farias foi um grande advogado dos pobres da Bahia. Enveredou também pela política. Vereador e deputado estadual por muito tempo. Vejam a historinha.

Um ladrão entrou na Igreja do Senhor do Bonfim e roubou as esmolas. Cosme de Farias foi para o júri:

– Senhores jurados, não houve crime. Houve foi um milagre. Senhor do Bonfim, que não precisa de dinheiro, é que ficou com pena da miséria dele, com mulher e filhos em casa com fome e lhe deu o dinheiro, dizendo assim:

– Meu filho, este dinheiro não é meu. Eu não preciso de dinheiro. Este dinheiro foi o povo que trouxe. É do povo com fome. Pode levar o dinheiro.

E ele levou. Que crime ele cometeu? Se houve um criminoso, o criminoso é o Senhor do Bonfim, que distribuiu o dinheiro da Igreja. Então vão buscá-lo agora lá e o ponham aqui no banco dos réus. E ainda tem mais. Senhor do Bonfim é Deus, não é? Deus pode tudo. Se ele não quisesse que o acusado levasse o dinheiro, tinha impedido. Se não impediu, é porque deixou. Se deixou, não há crime.

Cosme de Farias ganhou no verbo. O réu foi absolvido.

A quebra de paradigmas I

O ano chega ao final sob inacreditável queda de paradigmas na esfera da política e de processos em seu entorno. O mais evidente foi o rompimento das teias de vetores que sustentam (ou não mais) o marketing político. A visibilidade de candidatos, até então fruto da comunicação eleitoral – tempos de TV e rádio – garantida aos partidos, não foi elemento decisivo na campanha. Quem esperava alta visibilidade e, por conseguinte, melhor condição para convencer o eleitor a lhe dar o voto, quebrou a cara. Quem teve maior tempo de TV, entre os candidatos presidenciais, foi Geraldo Alckmin, que teve votação menor que a do cabo Daciolo.

A quebra de paradigmas II

O Fundo Partidário chegou a R$ 1,7 bilhão. A ideia dos caciques foi a de aumentar os recursos do Fundo como forma de fazer uma repartição que viesse a beneficiar os candidatos mais poderosos e tradicionais dos partidos. Ou seja, as cúpulas partidárias. E isso foi feito. Sem resultados. Pelo menos um grupo dos mais endinheirados acabou na rua da amargura. Perdeu feio. E candidatos que quase não puseram a mão no bolso ganharam assento no Parlamento e nos Executivos estaduais. Ou na cadeira principal do país, caso de Jair Bolsonaro.

A quebra de paradigmas III

Praticamente o eleitor deu costas aos costumes da velha política. Não se encantou com os abraços, apertos de mão, pedidos de voto, feitos de maneira tradicional. Muitos perfis nem tiveram tempo de burilar suas imagens. Foram surpreendidos com extraordinária votação, caso dos eleitos governadores Zema, de Minas Gerais, Witzel, do Rio de Janeiro e outros. Os ventos sopraram na direção de figuras que incorporaram as prementes demandas sociais. O eleitor deu um tchau ao déjà vu.

Reconstrução

Nos Estados, forma-se um novo batalhão de protagonistas da política que deverão fincar estacas para garantir suas posições. Os antigos vão acompanhar as operações dos novos com um olho no próximo pleito municipal, em 2020. Será a luta da vanguarda contra a retaguarda.

Lição ficará

As lições dadas pelo eleitor no pleito deste ano permanecerão nas páginas da história. É evidente que os velhos políticos tomaram susto. Muitos vão mudar, outros tentarão voltar ao cenário envergando a velha vestimenta. Mas o eleitor descobriu mesmo a força de sua vontade. A urna será sua arma letal doravante. O país abre um novo ciclo. Os partidos também levaram uma surra, com exceção de pequenas siglas – PSL, Novo – que apareceram bem na fita eleitoral. O PSL fez a segunda maior bancada na Câmara, 52 deputados. Se souber aproveitar seu cacife, será fortalecido. Mas sua direção precisa de oxigênio. O Novo tende a crescer.

Fazendo a reforma

A tão propalada reforma política continuará no rol de promessas. Verdade é que alguns passos já foram dados. Proibição de doação de recursos por parte de empresas, adoção da cláusula de barreira, proibição de coligações proporcionais integram o acervo de algumas decisões já tomadas. Mas há muito mais a fazer. A novidade é que o eleitor está fazendo a reforma, a seu modo. Se os políticos não querem fazê-la por completo, o eleitor continuará mudando aqui e ali, sob a égide de seu poder, o voto.

Estilo

O estilo bolsonaro se revela. Na gestão, força para a descentralização. Na estética, reforço à identidade militar. A continência, maneira de homenagear o interlocutor. Um ministério cheio de militares. Na semântica, frases incompletas, onomatopeias, certos cacoetes o aproximam do homem comum.

Ênfases

Ênfases ficam por conta de expressões em defesa da família e, em matéria de relações externas, alinhamento incondicional com os Estados Unidos; afastamento do Brasil de Nações comprometidas com o ideário dos direitos humanos, compreendendo, entre outras coisas, acolhimento sem restrições a imigrantes que vivem em estado de carências em seus países. Sinalização com a promessa do chanceler escolhido, Ernesto Araújo, de tirar o Brasil do Pacto Global de Migração, assinado por 164 países. Identidade conservadora nos costumes e nas relações internacionais vem sendo burilada com estridência.

A fama e a lama

Tenho lembrado que o patamar da fama fica a um milímetro do patamar da lama. João de Deus sai de um para outro. Ninguém é considerado culpado até o trânsito em julgado – diz nossa Constituição. O médium, que teria feito centenas de curas, padece agora no banco dos acusados. A Justiça tem de apurar as denúncias que se multiplicam contra ele. Já são mais de 400. E os relatos são muito contundentes. E plenos de fatos sequenciados. Seria tudo isso "armação", como ele alega? Contra um sujeito idolatrado? Trata-se de um caso emblemático. Uma personalidade glorificada cai no despenhadeiro da má fama.

Cesare Battisti

O italiano, que recebeu de Lula o passaporte da liberdade, no último dia de seu governo, está foragido depois de receber do presidente Michel a extradição para a Itália. Foi condenado na Itália por crimes perpetrados no passado. A PF está em seu encalço. Será que já escapuliu? Temos quase 17 mil km de fronteiras com dez países na América do Sul.

A faca no sistema S

O futuro ministro da Economia Paulo Guedes afirma ser necessário "meter a faca no Sistema S também. Estão achando que a CUT perde o sindicato, mas aqui fica tudo igual? Como vamos pedir sacrifício para os outros e não contribuir com o nosso"? CNI e FIESP deverão liderar as batalhas para manutenção do sistema. Promete que empresários parceiros sofrerão menos cortes. Reitera necessidade de formar um pacto federativo envolvendo políticos das esferas estaduais e municipais. Garante que "o toma lá dá cá" acabou.

Onde está Skaf?

Paulo Skaf, que mais uma vez perdeu as eleições, está recôndito. Não tem aparecido, como é seu feitio, no cenário político-institucional. Por onde andará? Até que seria um bom nome para disputar o pleito municipal de São Paulo em 2020. Skaf, não desista. Na política, a menor distância entre dois pontos nem sempre é uma reta como na geometria euclidiana. É uma curva. Lembrete: FHC perdeu um pleito para a prefeitura paulistana. Ganhou, mais adiante, as eleições presidenciais.

Dória e seu ministério

O governador eleito de São Paulo, João Dória, compõe um Secretariado de nível ministerial. Do governo Temer, traz 7 ministros. Um feito. Henrique Meirelles é o perfil de maior evidência. João começa a ler, hoje, as páginas do amanhã. É um obstinado. Vai adiante em sua meta.

Afif

Guilherme Afif é um dos mais qualificados homens públicos do país. Empresário, liderou por muito tempo a esfera dos micro e pequenos empresários. Foi presidente da Associação Comercial de São Paulo (duas vezes) e da Federação das Associações Comerciais; foi candidato à presidência da República e ao Senado Federal; foi vice governador de SP e deputado Federal constituinte. Acaba de deixar o comando do Conselho do SEBRAE nacional. Como se vê, Afif é um tocador de muitos instrumentos. Com essa imensa bagagem, dará suporte a Paulo Guedes no "board" que o ministro da Economia está criando. Ambos são velhos amigos, desde a campanha presidencial de Guilherme. Um gol de placa no campo liberal de Bolsonaro.

A ambição pelo poder

Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará, constantemente, os que os que a apoiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder".

E Hartung, hein?

Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo, é considerado um dos melhores quadros do país. Sua performance na administração capixaba é muito elogiada. Teria passaporte para integrar qualquer governo.

E Arthur?

E para onde irá o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio? Fundador do PSDB, ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República no governo de Fernando Henrique Cardoso e líder da oposição no Senado ao governo do ex-presidente Lula, o prefeito afirma que o resultado das eleições no primeiro turno pôs sua legenda num papel secundário e que está pouco esperançoso com o futuro do partido. Virgílio avalia abandoná-lo após quase 30 anos e pensa em formar um novo partido.

Promotor

Participando de uma solenidade na cidade de Jardim de Piranhas, no Seridó/CE, o senador Dinarte Mariz é ovacionado por dezenas de pessoas. Uma festa de popularidade. Integrando o evento, um jovem promotor público é apresentado ao "Velho Dida", apelido carinhoso dado ao senador. O cumprimento passa da formalidade.

– Senador, eu soube que o senhor teve pouco estudo. Imagino se tivesse estudado, o que o senhor não seria, hein? – comenda o promotor, sem qualquer má-fé.

Com seu jeito espontâneo e inteligência na produção de frases lapidares, instantaneamente Dinarte emenda:

– Seria promotor em Jardim de Piranhas...

(Carlos Santos – "Só Rindo 2")

Gaudêncio Torquato, cientista político e consultor em marketing político, é Professor Titular na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Dória diz ou manda dizer a Bolsonaro que Tasso não é confiável para ser Presidente do Senado

Imagine o Dória dizer ao Bolsonaro que o Tasso não pode ser Presidente do Senado porque não é confiável.

Imagine o que diria o Alckmin ao Povo em geral, caso lhe fosse possível lhe falar em off, nesse quesito confiabilidade, sobre o Dória, o dito cujo que ele, Geraldinho Alckmin, na sua habitual maior boa fé, inventou.

Claro que o Tasso não é confiável.

O Tasso Jereissati não é confiável, registre-se, aos que não são confiáveis aos que não tem como bússola a decência no agir político, a lealdade aos princípios que pregam e não os  praticam, enfim, o Tasso não tem sido confiável, em toda sua trajetória política, aos que antes de tudo só agem e pensam nos seus próprios interesses, embora dissimulando sempre que agem e pensam nos interesses do País.

Tudo de araque.

A trajetória do Tasso não o confunde, em nenhum momento, com a dos carreiristas, aqueles que geralmente de voz empostada, querendo imitar o timbre da voz do Lacerda, ante as dificuldades do País buscam falar grosso como se fossem deles as vozes da decência e da moralidade políticas.

A fala grossa do Lacerda se resumiu na História aos trinados do corvo, ave agourenta que lhe emprestou o apelido.

A quebra da mesmice política na Presidência do Senado

Experiência, seriedade, compromisso com o Brasil.

Conheço de perto e o acompanho nas idéias e ações, desde o movimento dos jovens empresários que liderou levando à derrocada as oligarquias do Ceará.

O reconhecimento popular daquele movimento levou o Tasso à vitória eleitoral para Governador. Cargo no qual empreendeu mudanças, muitas quase impossíveis, que a sua gestão viabilizou a partir da primeira delas - a mudança da mentalidade política.

Depois de Governar o seu Estado por três mandatos muito bem avaliados pela população, cumpre agora o seu segundo mandato de Senador da República,

Tasso desponta como mais preparado para presidir o Senado neste biênio de transição difícil para a afirmação da vontade soberana da maioria do Povo,explicitada nas urnas, de um novo presidencialismo sem a cooptação politica do tenebroso toma-lá-dá-cá.

O nome de Tasso está posto ao exame dos eleitores que comporão o novo Senado. Ele sabe também que O Mal só Triunfa Quando os Bons se Omitem!

Bolsonaro e a democracia digital

Por Gaudêncio Torquato

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, dá sinais de que vai instalar a era da "democracia digital". Os quadros de seu ministério foram anunciados pelas redes sociais. Não se sabe até quando essa disposição terá duração, mas o fato é que, à maneira do presidente Donald Trump, o capitão reformado se inclina a construir um processo de comunicação com a sociedade a partir da internet.

Trata-se de uma estratégia que revela as restrições que o grupo vitorioso faz à mídia clássica, assim retratada pelo vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão: "aquele processo antigo de comunicação, via filmetes, propagandas tradicionais, será abandonado... a mídia digital é o método fundamental para conseguirmos nos comunicar, muito mais que essas propagandas que gastam rios de dinheiro".

A gastança com publicidade governamental pode ter seus dias mais controlados. Os governos têm despendido cifras gigantescas para propagar feitos das empresas estatais, a começar por três pilares de visibilidade: Banco do Brasil, Caixa Econômica e Petrobras.

A par dos produtos para consumo de massa, esses baluartes da comunicação fornecem apoio a empreendimentos nos campos dos esportes, das artes e do entretenimento, além de campanhas de utilidade pública. O próprio governo central faz campanhas propagando seus méritos.

Poderia o governo acabar com a comunicação no rádio, TV e mídia impressa? Não. Poderia, isso sim, diminuir a publicidade de suas empresas. Isso sim. Não extingui-la. Vamos às razões. Primeiro, lembre-se que, apesar das 116 milhões de pessoas conectadas à internet --64,7% de toda a população, segundo dados do IBGE de 2016--, as margens continuam distanciadas da tecnologia da informação.

Interessa a qualquer governo inserir as massas no circuito de comunicação, mais ainda pelo fato de que é a grande mídia --TV e rádio-- que chega aos fundões. Deixá-las fora do processo seria um erro. Não se quer diminuir a importância da mídia digital, que encarna o escopo de inovação e tende a ser cada vez mais acessada por usuários. A ideia é a de usar todos os meios de comunicação disponíveis, sob uma equação que combine conteúdos, públicos-alvo e horários de audiência.

A disposição do presidente eleito de adotar a democracia digital é saudável. Mas não pode fazer isso por "indignação", "raiva" acumulada por acidentes na campanha, particularmente no campo das fake news.

Visões contrárias fazem bem às democracias e não devem motivar retaliação. A lei de visibilidade recomenda que produtos, bens, valores, instituições sejam divulgados a seus públicos-alvo sob critérios de razoabilidade, oportunidade e relação custo-benefício.

Nos EUA, Trump usa o Twitter para manifestar sua visão. Mas destila ódio aos meios de comunicação. A exceção é para uma rede de comunicação que apoia o governo. Será ruim para sua imagem esticar a querela com a mídia.

Esses aspectos devem ser avaliados por Bolsonaro e seu entorno. Eliminar bolsões da grande mídia poderá custar caro ao novo governo. Controlar as máquinas publicitárias das estatais e pôr um freio aos exageros da comunicação institucional, esses são os caminhos a seguir. Nem lá, nem cá. O importante é adotar transparência, atender às legítimas demandas das mídias --principalmente pedidos de entrevistas--, e não negar os princípios da comunicação nas democracias: o culto à verdade, o respeito à liberdade da imprensa, o convívio com os contrários.

Gaudêncio Torquato, cientista político e consultor de marketing político, é Professor Titular na Escola de Comunicações e Artes da USP. Este artigo foi publicado originalmente na Folha de S. Paulo, edição de 17.12.18.

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Porandubas Políticas

Por Torquato Gaudêncio

Abro a coluna com uma historinha que revela uma faceta da malandragem em nossos Trópicos.
Retrato do Brasil
O advogado viajava de carro por uma BR quando um tatu atravessou na frente do carro. O motorista não teve dúvidas. Parou e pegou o bichinho, colocando-o no porta-malas. Adiante, defrontou-se com uma blitz da Polícia Federal. Pediram os documentos. Os policiais mandaram o advogado descer do carro e abrir o porta-malas.
O policial viu o tatu.
- Cara, você é louco? Esse é um animal selvagem; isso vai te dar cana. Você tá frito!
O advogado entristeceu a cara:
- Bem, amigo, esse tatu é meu. Meu bichinho de estimação. Tá comigo desde novinho. Se você soltá-lo, ele corre, mas volta ao ouvir o meu chamado. Dou dois assobios e ele vem correndo pro meu lado. É treinado.
O policial:
- ah, ah, ah, duvido!
- Quer ver? Solta ele pra você ver que não estou mentindo, respondeu o advogado.
O policial pegou o tatu, soltou-o no chão e o tatu correu pro mato.
- Agora, chama o tatu de volta.
E o advogado:
- Que tatu?
Panorama geral
A direita no poder
É fato. A direita ganhou as eleições e vai ocupar o centro do poder. Não se trata de observação que leva em conta apenas a índole militar do presidente eleito, Jair Bolsonaro, que se mostra por inteiro na escolha dos generais reformados que estarão ao seu redor. Na verdade, desta feita houve uma clara narrativa de direita durante a campanha, mesmo que o capitão não tenha exposto todo o seu discurso em função do atentado que sofreu. Mas foi recorrente o escopo que abriga a defesa de valores tradicionais da nossa cultura, o culto à família, a Escola sem Partido, mudanças na lei do desarmamento (com a clara defesa de armas para os proprietários rurais), a visão polêmica sobre questões de gênero (incluindo a desigualdade que recai sobre a mulher), etc. A par do endurecimento no combate à violência. Esse discurso recebeu o endosso de quase 58 milhões de eleitores.
Rodízio democrático
Na verdade, o que estamos presenciando no país é a transferência do bastão de comando, de um grupo que, desde o princípio da redemocratização, dava as cartas, para outro, considerado retrógrado e, não raras vezes, associado aos tempos pesados da intervenção militar no país. Pois bem, esse grupo que recebe o selo de "conservador" (conceito infelizmente atrofiado em nosso meio, eis que é borrado com viés negativo), chega ao "centro do poder" para jogar uma partida que tende a ter uma vida não tão curta.
"Centro do poder"
Quando me refiro ao "centro do poder", claro que estou jogando as fichas na cadeira do Palácio do Planalto. Temos de entender que o poder ainda se distribui por muitos núcleos na sociedade, a partir dos Estados comandados pelo PT e estruturas (em todas as instâncias) que abrigam o petismo e seus satélites.
Social-liberalismo?
Quando se procura carimbar a identidade do futuro governo de "liberal", principalmente no que tange aos domínios da economia, algo permanece cercado de interrogações. Primeiro, porque os chamados "Chicago oldies" (como os ex-alunos brasileiros da escola monetarista fundada por Milton Friedman se refere o futuro superministro Paulo Guedes, que os convoca para sua assessoria), reciclaram suas ideias ao longo das últimas décadas.
Contraponto à social-democracia
Claro que continuam a defender a disciplina monetária e fiscal, mas entendem que os conceitos de liberdade econômica e liberdade política hão de se ancorar nas realidades de cada Estado, a par do reconhecimento de que uma forte faceta social - com foco na distribuição de riqueza, no combate à pobreza - passou a incorporar o acervo do próprio liberalismo. É assim que se chega a uma nova nomenclatura, como o "liberalismo social", uma espécie de alternativa à "democracia social", que, nos últimos anos, tem descido o despenhadeiro do prestígio.
Intervenção do Estado
O fato é que, por mais liberal que seja a face econômica da política de um governo, o Estado não poderá abdicar de sua tarefa de intervir, quando assim se fizer necessário, para ajustar os eixos da economia. Foi o que vimos nos Estados Unidos, matriz mais prestigiada do liberalismo econômico, por ocasião da crise de 2008. Obama recebeu uma economia em queda livre, perto de atingir uma depressão plena durante a crise.
Os Estados Unidos
O presidente norte-americano foi à frente de batalha. Implementou uma série de medidas orçamentárias importantes, nomeadamente a Lei de Recuperação e Reinvestimento de 2009. Ofereceu forte apoio moral à Reserva Federal (incluindo a renomeação de Ben Bernanke, que havia sido nomeado pelo presidente Bush). O governo ainda restaurou o setor financeiro mais rapidamente do que o esperado, operando um resgate bem-sucedido da indústria automobilística.
O modelo brasileiro
Portanto, o liberalismo à brasileira, que Paulo Guedes se esforçará para implantar, deverá abrigar um componente nacionalista, nos moldes que defendem os militares, significando certa precaução na política de privatizações das empresas estatais. A ideia é a do Estado se desfazer de ativos que não estejam no core business das empresas, principalmente aquelas que estejam na faixa do prejuízo. O nosso liberalismo haverá, ainda, de continuar e, alguns casos, até reforçar as frentes sociais, particularmente em regiões carentes, como o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste.
O assistencialismo
Programas como Bolsa Família, que serão passados pela lupa de rígidos controles, continuarão. Não há como deixar de reconhecer as desigualdades sociais. Ainda mais pelo fato de que a ascensão social das margens durante o ciclo Lula - com sua política de incremento ao consumo - foi torpedeada pelo governo Dilma. Milhões de brasileiros que chegaram ao meio da pirâmide voltaram ao seu habitat na base da pirâmide. Empobreceram.
Problemas na área política
Serão inevitáveis conflitos e tensões entre o novo governo e a área política. A estratégia do presidente eleito, de se ancorar nas estacas que estão sendo oferecidas pelas bancadas temáticas (bala-armamento, boi-agronegócio e bíblia-evangélica), não se sustentará no longo prazo. Nos primeiros instantes, a resistência será menor, na esteira da grande força que os governos iniciantes exibem. Mas o presidencialismo de coalizão não cederá a apelos para aprovar, mais adiante, projetos de interesse do Executivo. Delegar essa tarefa a algumas bancadas não funcionará. Infelizmente, esse "presidencialismo de delegação" não resistirá.
O papel dos militares
Não se vê na escolha de quatro generais reformados para compor o quadro ministerial como "a militarização do governo". Entendamos: a formação militar de Bolsonaro o empurra para o lado dos amigos de confiança que teve na caserna. Ele conhece a índole de seus pares. E certamente quer se cercar de pessoas de alta confiança. Com seus 28 anos de mandato, deve ter aprendido que o político age sob a mão do pragmatismo. É dando que se recebe. Bolsonaro gostaria de mudar essa moeda de troca. Não será fácil. Quanto aos militares, pelo que se percebe, são quadros que exibem uma base de altos conhecimentos, com alguns tendo exercido funções de relevância ao país. P.S. Cerca de 100 militares (incluindo quadros das polícias militares) tiveram o endosso das urnas para entrar na política.
General Mourão
O vice-presidente eleito, general Mourão, está se mostrando ser um quadro de muito bom senso. Ao contrário da primeira impressão que passou. Ponderado, alerta para eventuais brigas com a China, com os países árabes e com os vizinhos do MERCOSUL.
Escola sem partido?
Não será um mero decreto que imprimirá o selo "Escola sem Partido". Trata-se de uma questão que não pode ser resolvida por decisões de Justiça (STF) ou via Parlamento. A questão é cultural. Envolve um debate permanente com a sociedade organizada. Enquanto exércitos de ambos os lados azeitam seus armamentos, o foco das modalidades educacionais acaba sumindo na algaravia da Torre de Babel que se criou.
Refinamento
O presidente eleito dá mostras de estar mais contido. Cumpre a liturgia do poder. Visita autoridades. Anuncia, via Twitter, escolha de ministros. E tem escapado das "cascas de banana" que a mídia frequentemente joga com algumas perguntas mais polêmicas.
Lula na pior fase
Fernando Haddad visitou Lula nos últimos dias e anunciou: Lula está na pior fase de sua prisão. Isolado. Preocupado. O pior é que continua a ser alvo da Justiça. Denúncias aparecem quase todas as semanas. O PT está atravessando seu "corredor polonês".
Rodrigo Maia
Há alguns nomes que postulam a presidência da Câmara, inclusive deputados do PSL, partido de Bolsonaro. Mas Rodrigo Maia desponta como o mais forte. Trata-se de um grande articulador. Tem gente fazendo intriga contra ele. Para o governo Bolsonaro, seria a voz da experiência no comando da Câmara.
No Senado
No Senado, Renan Calheiros reúne uma boa bancada em torno de seu nome. Mas pode haver um acordo para guindar o senador Tasso Jereissati à presidência.
Governadores do NE
Os governadores do Nordeste fizeram mal em boicotar a reunião de governadores com o presidente eleito, Jair Bolsonaro. Dias depois, apareceram em Brasília, sem marcar audiência, e não foram recebidos pelo presidente eleito. Que falta de compostura. Estados falidos e os governadores oposicionistas querendo botar banca? Que coisa imperdoável.
O que é tática?
No futebol, quando o atacante joga a bola para trás, recuando-a para seu próprio campo de defesa, parece realizar um movimento covarde. Às vezes, é apupado. Muitos acham que a jogada não tem lógica. Mas essa bola recuada pode abrir espaços, deslocar o adversário, obrigá-lo a avançar de maneira descuidada e abrir a defesa. Pois bem, tal manobra pode gerar uma sequência de ações que culminarão com um gol. Essa é uma operação clássica. Um gol assim é uma tática de caráter terminal. E é construído por jogadas intermediárias. A tática é ferramenta de vitória.
Gaudêncio Torquato, Professor Titular na USP, é Jornalista e Consultor em Marketing Político.
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quinta-feira, 22 de novembro de 2018

O leão no seu quadrado

Por Edson Vidigal

Cabelos e barba encarapinhados e aquele olhar discretamente esbugalhado de Imperador da Etiópia, o garçom espera que os mais apressados, afinal, escolham as mesas onde vão ficar.

Na escala em Frankfurt rumo a Moscou, vi a fúria de fome com que uns brasileiros encararam repetidas porções de linguicinhas e canecões de cervejas variadas.

Agora, na escala de volta ao Brasil, estamos aqui, Eurídice e eu, neste pequeno e acolhedor recanto pedindo sugestões de pratos e de vinho ao nosso cover de Leão de Judá.

Só nos restam agora menos de duas horas.

O Imperador da Etiópia, Hailé Selasié, conhecido como Leão de Judá, fez história também na Jamaica e até no Brasil.

Celebridade global à época viajou de Adis Abeba, a Capital do seu Império, a convite do Presidente Juscelino para a inauguração de Brasília.

No Palácio da Alvorada, em plenos festejos, o Imperador recebeu a má noticia de que fora deposto numa reviravolta militar. Sem o poder do Trono, não tinha dinheiro para voltar.

Juscelino pediu a Walter Moreira Sales, dono do Unibanco, 500 mil cruzeiros para financiar a viagem e o retorno do Imperador ao Trono. Em lá chegando, Selasiê fui bem sucedido.

Na Jamaica, Marcus Garvey, um ativista pelos direitos dos negros, em tom profético, recitou um dia – “olhem para a África, onde um rei negro vai ser coroado, anunciando que o dia da libertação estará próximo”.

Isso virou um dogma para descendentes dos escravos. Afinal, a abolição em 1833 não melhorou em quase nada a vida do povo negro.

A assunção ao Trono etíope de um Príncipe negro, em 1930, atiçou ainda mais as esperanças na Jamaica soando como uma confirmação da profecia de Garvey.

Haile Selassié era o “Ras Tafári” prometido e esperado. Nada a ver, portanto, com o cabelão trançado de Robert Nesta Marley, conhecido no mundo como Bob Marley.

Rastafáris entre os jamaicanos são os seguidores da crença que se mantém inabalável de que após a assunção de um rei negro a um trono na África a libertação verdadeira estaria próxima a partir do êxodo à origem de todos.

O avental do nosso gentil garçom tem bolsos para tudo do seu trabalho – telefone celular, maquininha para cartão de crédito, saca rolhas, cardápio, carta de vinhos, bloco para anotar os pedidos, sei lá que mais.

Transita sua magreza quase imperial em passos leves como se o quadrado do restaurante fosse sua privilegiada passarela.

Com o indicador aponto o mostrador do meu relógio como a lembrar-lhe que temos pressa. Ele faz a interlocução com o olhar e segue o seu script imperturbavelmente.

Agora é a nossa vez nas linguicinhas. Mas nada de canecões com cerveja. Ainda há tempo para um tempranillo de La Rioja, Espanha. A União Europeia faz muito também com essas coisas.

Edson Vidigal, advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal. Fez escala em Frankfurt, Alemanha, na viagem de volta de Moscou para o Brasil.

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Um civil na volta à ativa

Nas audiências a que sou levado por conta do meu exercício profissional de advogado costumo chegar bem antes da hora marcada. Às vezes, sou recebido imediatamente. Outras vezes há um compreensível atraso na agenda da autoridade e aproveito a folga e o sossego da sala de espera para revisitar na mente os fundamentos da causa de pedir. Quando não, retomo a leitura de algum livro no kindle ou vou me adiantando nas outras pendencias do meu oficio que ainda terei pela frente.

No Conselho Nacional de Justiça, em Brasília, onde fui para audiência com o Presidente Dias Toffoli, fui recebido à entrada da ante sala por um Assessor, o qual, ainda novato na praia do judiciário,  eu não o conhecia pessoalmente. Fernando Azevedo e Silva, 64 anos, General da Reserva, arquiteto da conciliação, praticante da tolerância, construtor de pontes entre os Três Poderes da República, à qual serviu como soldado e ainda serve agora no centro estratégico da chefia e da governabilidade do Judiciário nacional.

Tudo graças à sua ilibada reputação profissional.

Já agora conhecido nos meandros judiciários como o General do Toffoli, o Assessor Especial da Presidência do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça é um 4 (quatro) estrelas que até chegar a essa constelação galgou importantes postos, comandos e funções das quais se desincumbiu com o louvor dos superiores e a admiração e o respeito dos seus iguais e subordinados. Quem o vê num terno escuro, bem cortado, nó da gravata no capricho, modos simples, respeitoso e atento na interlocução, pode até ceder à dúvida - é ele mesmo? Mas não tem nada de milico...

Agora, os que por dever de oficio vão em audiencias ao gabinete do Ministro Dias Toffoli na Presidência do STF ou do CNJ, começam a perceber a grande lacuna a ser deixada pelo General Fernando Azevedo e Silva quando ele assumir o Ministério da Defesa do próximo Governo do Presidente Jair Bolsonaro.

À Folha de São Paulo de hoje, 15 de novembro, ele disse que a imagem do Exército brasileiro não está "colada" à de Bolsonaro, que é um Capitão reformado e tem um General da reserva (Mourão)  como Vice.

A Folha perguntou assim:

- O Alto Comando do Exército tem defendido descolar a imagem das Forças Armadas do governo Bolsonaro. Como fazer isso?

O General Fernando respondeu:

- Não existe descolar porque não está colado. As Forças Armadas estão vacinadas em relação à política. Estamos muito vocacionados para nossa atividade-fim, que é cumprir o Artigo 142 (defesa da Pátria, garantia dos podere constitucionais e da lei e da ordem).

A Folha de novo:

- Com um Capitão reformado na Presidência e um general da reserva na vice, há como os militares não se enxergarem no Planalto?

O General Fernando, futuro Ministro da Defesa, respondeu:

- Esse Governo foi eleito pelas regras democrátricas. Eles tem origem e formação militar, que é boa. Pregamos valores de companheirismo, disciplina, hierarquia. Estão aí legitimados pelo voto, não pela origem.

Sem aquele inesperado

Por Edson Vidigal

Daqui a pouco a menos de quatro horas, o irreversível.

Sem adiamentos ou eventuais atrasos, imaginar que o inesperado traga uma surpresa e então o avião da Lufthansa não decole, nem pensar.

É confiar o invisível da bagagem a um baú da memória e ir se plugando nas realidades novas e nas antigas que se misturam e se enfileiram enquanto outras muitas, mas muitas mesmo, são atiradas aos lodos do esquecimento pelos filtros da história.

O olhar da mente transborda lucidez quando sem saudade alguma, na calmaria da distância, um sentimento, misto, talvez, de afeição e de responsabilidade, se transmuda em lucubração sobre o alcance das maledicências, incertezas e bobagens insistentes com quais os mais espertos se aproveitam generalizando a mediocridade e atazanando o País.

Sei que aqui, na Alemanha onde estou por estas poucas horas, houve um tempo em que a insensatez delirante anuviando realidades e por incrível obnubilação levou a maioria das pessoas a excitações coletivas até que enfraquecida, a memória perdeu a razão.

Coletivo sem pensar aquiesce sempre que um só pense, ou nem pense. E decida tudo sozinho. A história repete sempre a mesma lição de que nada acontece de repente. Tudo resulta de longa maturação.

O Czar Alexandre II acabou com o regime de servidão que mantinha sob os grilhões do trabalho escravo mais de 22,5 milhões de camponeses, mas isso não acalmou as novas gerações animadas pelos eflúvios crescentes das ideias libertárias que já se espraiavam da França pela Europa inteira.

A devastação da 1ª Grande Guerra Mundial, cujo fim há exatos 100 anos, impôs humilhações terríveis à Alemanha derrotada, sem meios de produção, economia no chão, instituições políticas no fracasso, a população sob o desespero do desemprego, da inflação galopante e da fome, isso tudo serviu de adubo para florescerem a violência das intolerâncias ideológicas e racistas e da radicalização entre comunistas e nazistas.

A poucos metros à minha frente, nesta quase avenida, num dos maiores e mais movimentados aeroportos do mundo, este de Frankfurt, um monumento a Ghoete (1749-1832) atrai atenções. Advogado, filosofo, estadista alemão do Sacro-Império Romano-Germânico. Importantíssimo na literatura alemã e no romantismo europeu.

Adiante desponta algo como que um grito parado no ar, a logomarca da Bayer conhecida no mundo todo. Poucos sabem que se trata de uma das maiores financiadoras das campanhas politicas de Hitler estando entre as dez que mais cresceram e lucraram sob o regime nazista.

A Alemanha destruída pela fúria da insensatez nazista levando o mundo à 2ª Grande Guerra ressuscitou das cinzas e quanto ao mais, dispensável dizer que a Alemanha reunificada é hoje um grande exemplo de democracia e prosperidade para a raça humana no planeta terra.

Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal. Fez escala em Frankfurt, Alemanha, na viagem de volta de Moscou para o Brasil.

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Porandubas Políticas

Por Gaudêncio Torquato

Abro a coluna com a sabedoria do padre Elesbão.

No confessionário

Numa cidadezinha de Minas, Padre Elesbão estava esgotado de tanto ouvir pecados, ou, como dizia, besteiras. Decidiu moralizar o confessionário. Afixou um papelão na porta da Igreja, dizendo: O vigário só confessará:

2ª feira - As casadas que namoram.

3ª feira - As viúvas desonestas.

4ª feira - As donzelas levianas.

5ª feira - As adúlteras.

6ª feira - As falsas virgens.

Sábado - As "mulheres da vida".

Domingo - As velhas mexeriqueiras.

O confessionário ficou vazio. Padre Elesbão só assim pode levar vida folgada. Gabava-se:

- Freguesia boa é a minha... mulher lá só se confessa na hora da morte!

(Leonardo Mota em seu livro Sertão Alegre)

Acertos

Os primeiros movimentos do presidente eleito Jair Bolsonaro no tabuleiro do poder mostram alguns acertos e recuos. Há uma preocupação em escolher perfis com bom conhecimento dos objetos e ações que deverão cuidar. Mesmo polêmica, a escolha do juiz Sérgio Moro foi bem aceita pela sociedade. Os do andar mais alto da pirâmide - incluindo os pares - podem ter achado precipitada a aceitação. Mas, para o presidente, foi um gol de placa. A ideia de grupos de transição - com boa interlocução com equipes do atual governo - é a garantia de que a nova administração pisará na realidade dos números e situações, sem invenções.

Cautela

Bolsonaro tem sido mais cauteloso no uso da expressão. E garantindo cumprir rigorosamente o livrinho de nossa Lei Maior. O presidente recuou da ideia de fundir os Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente. Está de ouvidos abertos.

Guedes, precavido

Depois que pediu a "prensa" sobre o Congresso, Paulo Guedes também tomou cautela. Os parlamentares são ciosos de suas funções e não gostam de ser censurados ou monitorados. Será difícil, portanto, passar a reforma da Previdência. Guedes, chamado à atenção pelo presidente eleito, ficou mais precavido. Previdência entrará em pauta este ano? A não ser que o presidente eleito, do alto de sua força, use a lábia para convencer deputados e senadores. Qualquer decisão - idade, regras de transição - poderia ajudar, aliviando o ônus a ser enfrentado pelo novo governo em 2019.

Time de primeira

Paulo Guedes está formando uma equipe de primeira para suprir as áreas-chave do Ministério da Fazenda. Mansueto deverá continuar no Tesouro; Ivan Monteiro continuará na presidência da Petrobras e Joaquim Levy deve vir do Banco Mundial para assumir o BNDES. Guedes deve escolher outros quadros importantes para comandar as áreas da Indústria e Comércio, do Trabalho e do Turismo, que ficarão em sua Pasta. Para o Turismo, há um forte lobby pela continuidade de Vinícius Lummertz, que teria o apoio do trade.

Cícero

"É preferível um remédio que cure as partes defeituosas da democracia do que um que as ampute". (Cartas a Ático, II, 1,7)

Descentralização

Pelo andar da carruagem e sabendo que a índole do capitão Bolsonaro sinaliza gosto por trabalho em equipe, é razoável apostar no conceito de descentralização da gestão, ou seja, os comandantes de áreas e setores deverão ter liberdade de gerir, claro, dentro da visão governamental, e serão cobrados por resultados. Aquele que não der respostas satisfatórias será expurgado.

Desmonte da máquina

Barreira imensa a ser escalada: o desmonte da máquina. Até hoje, o governo Temer não conseguiu afastar grupos de petistas que, ao longo de 13 anos, se imiscuíram nas malhas do poder. Houve muita sabotagem nos últimos tempos. Ordens que não foram cumpridas, desleixo, incúria, indisciplina são os resultados que se observam em algumas estruturas. Pois bem, o governo Bolsonaro deve fazer uma limpeza geral. Não será fácil. Os malabaristas se escondem, desaparecem, se fazem de mortos. Muitos continuarão na mamata. A conferir.

Barbárie

Montesquieu em "Meus pensamentos".

A barbárie pertence a todas as épocas e a todos os países...

Não sei como, aconteceu que um turco se encontrou um dia com um canibal.

- Sois muito cruéis, disse o maometano, comeis os cativos que fazeis na guerra.

-E o que fazeis dos vossos?, replicou o canibal. Ah! Nós os matamos. Mas, depois que estão mortos, não os comemos.

"Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular".

Mourão e Heleno

Os generais Mourão e Heleno terão forte presença no governo. Mourão não é de ficar na moita. Fala abertamente, tem vontade de palpitar, quer ser um grande cogestor. Terá sala ao lado do presidente. Já o general Heleno, em vez da Defesa, assumirá o GSI, o Gabinete de Segurança Institucional. Assim, ficará no Palácio do Planalto, ao lado do presidente, formando o "núcleo duro". Parece perfil centrado, moderado. Será um conselheiro-mor do presidente. Os nomes-chave da administração passarão sob seus olhos.

Os filhos

Os filhos do presidente serão alvo da mídia, que buscarão sua expressão para abrir polêmica. Tudo que disserem abrirá espaço midiático. O pai já deve ter feito o alerta. Mas tanto o senador quanto o deputado, em Brasília, não resistirão a declarações polêmicas. Poderão causar dores de cabeça. Os bastiões do radicalismo têm neles duas grandes fontes.

Centro radical

Fernando Henrique, vez por outra, expressa tiradas que ganham força na mídia. Fala agora do "centro radical", que juntaria alguns protagonistas do tradicional centro, formando uma frente dura, crítica, forte, capaz de liderar o discurso político. Seria formado por quadros de boa visibilidade e influência, como Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Paulo Hartung, ele mesmo, FHC, e outros que poderiam sair do PSDB. Luciano Huck, o animador, também estaria nesse grupo. Esses nomes seriam o imã para a formação de um grande partido. A vitória de Doria, em São Paulo, praticamente lhe confere domínio do tucanato. Os tucanos antigos querem migrar de ninho.

Fusão

Dos 14 partidos que não conseguiram passar pelo teste da Cláusula de Barreira, cinco estudam a possibilidade de fusão ou incorporação a outros. Querem garantir recursos partidários e tempo de mídia a que os partidos têm direito. São eles: Rede, PC do B, Patriota, PPL e PHS. Mas PTC, PMN, PMB, PSTU, PCB pensam em ir adiante, apoiando-se apenas nas contribuições e doações de seus filiados, sob a esperança de obterem melhor desempenho em 2022.

Doria, a boa costura

Não se duvide de João Doria. Aplicado, determinado, lendo ainda os resultados das urnas, João começa a formar uma equipe de secretários de primeira grandeza. Puxa ministros do governo Temer (o da Educação e o da Cultura), traz o médico que já dirigiu os hospitais Einstein e Sírio-Libanês e ensaia um convite na direção de Henrique Meirelles para assumir a Secretaria da Fazenda. O governador eleito promete uma gestão inovadora. João tem reunido em São Paulo alguns governadores eleitos, antecipando a criação de um Fórum de governadores. Será importante protagonista no cenário político nos próximos tempos. A conferir.

Juntando os cacos

O PT está quebrando a cabeça para decidir o que fazer nos próximos tempos. Continuará ou não a defender o lema "Lula Livre"? Qual será o papel de Fernando Haddad no jogo petista? As alas do partido brigarão pela presidência? Lula continuará a centralizar todas as decisões do partido? E caso seja novamente condenado, o que fazer? São perguntas que atordoam a cuca dos dirigentes partidários.

Villas Bôas

O comandante do Exército, general Villas Bôas, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo do último domingo enfatizou que a eleição de Bolsonaro não quer significar a volta dos militares ao poder. Interessante é que no mesmo dia, no blog do Noblat, na Veja, defendi em meu artigo semanal ponto de vista contrário. Explico: a eleição do capitão reformado significa o fechamento do ciclo da redemocratização que teve início em meados dos anos 80.

Nova era

A eleição de um militar sinaliza novos ventos ao puxar para o cotidiano da política o maior grupo de militares que já participou de pleitos democráticos, a par da convocação inusitada de generais da reserva para formar o núcleo governamental. Um feito e tanto, quando se leva em consideração a índole militar: agir com discrição, cumprir o rito hierárquico, colaborar com governos em postos-chave de comando das Forças Armadas, enfim, evitar a intromissão exacerbada no dia a dia da política. Assim é a cultura militar.

Pelo voto

Os militares ascendem na política cotidiana não por intromissão indevida, mas em função do redesenho institucional, onde se contabilizam o desprestígio da classe política, a indignação social contra o modus operandi dos nossos representantes, a intensa vontade popular de dar um passo adiante. Entram nos salões do poder pela força do voto. Os quase 58 milhões de eleitores credenciam Bolsonaro como a expressão da vontade da maioria.

Outros sinais

Outros sinais de fim de ciclo aparecem na própria engenharia da campanha, em que paradigmas do chamado marketing político foram derrubados, como tempo de rádio e TV (duração maior não ajudando candidatos), dinheiro (não elegendo aqueles com maiores recursos), escolha de representantes na cola do candidato presidencial (PSL fazendo uma bancada de 52 nomes), entre outros aspectos.

Sêneca

"Não é curto o tempo que temos, mas dele muito perdemos. A vida é suficientemente longa e com generosidade nos foi dada, para a realização das maiores coisas, se a empregamos bem. Mas, quando ela se esvai no luxo e na indiferença, quando não a empregamos em nada de bom, então, finalmente constrangidos pela fatalidade, sentimos que ela já passou por nós sem que tivéssemos percebido".

Fecho a coluna com mais humor.

Zeca I

Zeca Boca de Bacia fazia a alegria do povo em Campina Grande/PB. Personagem folclórico, amigo de políticos. Dava assessoria informal a Ronaldo Cunha Lima e a seu filho Cássio, prestes a ganhar o mandato de senador. Quando Zeca abria a boca, a galera caía na risada. Certa vez, numa de suas internações na clínica Santa Clara, em Campina Grande, a enfermeira foi logo perguntando:

- Zeca, qual o seu plano (de saúde)?

E ele:

- Ficar bom!

Zeca II

Outra vez, Zeca pegou um táxi em Brasília para ir à casa de Ronaldo Cunha Lima. Em frente à casa do poeta, o taxista cobrou R$ 15. Zeca só tinha R$ 10. Sem acordo, disparou:

- Então, amigo, dê cinco reais de ré!

Torquato Gaudêncio, cientista politico e Professor Titular na USP, é Jornalista e Consultor de Marketing Político.
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Livro Porandubas Políticas

A partir das colunas recheadas de humor para uma obra consagrada com a experiência do jornalista Gaudêncio Torquato.

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quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Tereza Cristina , da bancada do boi, é a 1ª mulher para o futuro Ministério

“Boa noite! Informo a todos a indicação da senhora Tereza Cristina da Costa Dias, Presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, ao posto de Ministra da Agricultura”.

Assim, pelo Twitter, o Presidente eleito Jair Bolsonaro anunciou a primeira mulher a compor o seu futuro Ministério.Tereza Cristina é Deputada Federal pelo Democratas (DEM) de Mato Grosso do Sul.

Porandubas Políticas

Por Gaudêncio Torquato

Abro a coluna lembrando momentos cômicos de tempos pesados.

Ditador de plantão

Humberto Castelo Branco, presidente, encontra Carlos Castelo Branco, jornalista:

- Você leu a notícia de um jornal do Uruguai dizendo que é filho do presidente do Brasil?

- Não, presidente. Li uma notícia dizendo que sou filho do ditador de plantão.

O anjo no alto

Entrevista coletiva no Palácio do Planalto. Carlos Castelo Branco pergunta ao presidente Humberto Castelo Branco:

- Como V. Exa. se sentiu ao ler a declaração de Carlos Lacerda chamando-o de Anjo da Rua Conde Laje?

- O anjo fica na parede, no alto, de onde contempla o desfile das prostitutas.

(Da verve de Sebastião Nery)

Primeiros movimentos

Os primeiros movimentos do presidente eleito começam a mostrar seu estilo de jogo. Trata-se de um protagonista que joga avançado, no ataque, evitando a retaguarda. Sua ideia de enxugar a Esplanada dos Ministérios para 15 ou 16 Pastas ganha aplausos na opinião pública. E por escolha de pessoas com bom trânsito, a partir do juiz Sérgio Moro, o perfil mais admirado e elogiado na praça. A amplitude que deseja dar ao Ministério da Justiça significará que o foco no combate à corrupção continuará aceso.

Moro na Justiça

A aceitação do juiz Sérgio Moro, de aceitar o encargo do Ministério da Justiça, com escopo ampliado, foi um gol de placa de Bolsonaro, mesmo sob críticas de patamares da intelectualidade e da mídia. Moro sinaliza ímpeto em sua gestão moralizadora. O juiz, ao aceitar de pronto a missão, abandona a carreira. Para muitos, principalmente petistas e opositores ao novo governo, sua escolha sinaliza um viés antilulista, dando margem às especulações de que não teria sido justo e imparcial na condenação de Lula. Daí a onda que se forma, de que o juiz ajudou Bolsonaro a se eleger e, agora, é recompensado. A campanha de "Lula livre" ganhará força.

STF na mira

Especula-se que o juiz Moro, na verdade, está de olho no STF, para onde seria guindado dentro de dois anos, tempo em que a Corte abrirá vaga com a aposentadoria do decano Celso de Mello, que chegará aos 75 anos. Bolsonaro já sinalizou nessa direção. Tirar um juiz de 1ª instância e jogá-lo na Corte Suprema seria uma decisão de muita polêmica. Coisa diferente de puxar para a Corte um ministro da Justiça. A nomeação seria algo mais corriqueiro. Quanto à decisão de Moro, alguns acham que deveria passar um tempo antes de ingressar na política. Ele acaba de dizer que jamais concorrerá a cargo eletivo. O fato de ingressar no Poder Executivo, para alguns intérpretes, não significa ingresso na política.

Juiz e política

Juízes italianos, que trabalharam na Mani Pulite, a operação Lava Jato da Itália, até defendem a entrada de magistrados na política, mas não de maneira abrupta, durante o tempo em que ainda operam nas frentes de combate à corrupção. Lá, o juiz Giovanni Falcone, apontado por Sergio Moro como sua inspiração para deixar a toga e assumir cargo no governo, foi um dos responsáveis por deflagrar a operação Mãos Limpas no país, tendo, antes, trabalhado contra a máfia siciliana Cosa Nostra.

Inspiração

Diz Moro: "Lembrei-me do juiz Falcone, muito melhor do que eu, que depois dos sucessos em romper a impunidade da Cosa Nostra, decidiu trocar Palermo por Roma, deixou a toga e assumiu o cargo de Diretor de Assuntos Penais no Ministério da Justiça, onde fez grande diferença mesmo em pouco tempo. Se tiver sorte, poderei fazer algo também importante".

Falcone no governo

Falcone construiu sua trajetória em Palermo, na Sicília. Em 1991 aceitou um cargo no Ministério da Justiça no governo de Giulio Andreotti. Naquele momento, o governo italiano estava pressionado pela opinião pública a investigar a máfia na Sicília. A pressão foi causada, sobretudo, após a morte de Salvo Lima, político do partido Democracia Cristã e aliado de Andreotti. No Ministério da Justiça, o juiz assumiu o cargo de Diretor-Geral de Investigação Criminal, sendo bem-sucedido. Amigos de Falcone acreditavam que o convite era uma armadilha para afastá-lo das investigações locais. "Foi a decisão correta porque a luta contra a máfia começava em Palermo, mas só poderia ser vencida em Roma", disse seu amigo, o juiz Ignazio de Francisci. Foi morto após a Suprema Corte italiana confirmar as condenações de mafiosos feitas por ele em Palermo.

O atentado

Em 23 de maio de 1992, foi vítima de um atentado, uma carga de 400 quilos de TNT enterrados sob o asfalto da estrada para o aeroporto de Palermo. Além do juiz, morreram também a sua mulher e três guarda-costas. Seis meses depois, foi morto o procurador Paolo Borsellino, em um atentado com um carro bomba, carregado com 100 quilogramas de dinamite, numa autoestrada em Palermo.

O astronauta

O astronauta Marcos Pontes, escolhido para comandar o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação, também é objeto de polêmica. Trata-se de uma pessoa simpática, sempre sorridente, mas pairam dúvidas sobre as condições que preenche para administrar uma área que exige conhecimento. Um leitor me lembra: ele é formado pelo ITA, uma exemplar escola de engenharia e está no métier há décadas. O Ministério poderá abrigar as universidades públicas. O astronauta está cheio de boas intenções, mas a comunidade acadêmica está com um pé atrás.

Guedes, o arquiteto da economia

Paulo Guedes, que dará forma à economia, compõe sua equipe, abre conversas a torto e a direito, ganha poder à medida que entra nos domínios do amplo ministério que comandará. Guedes está cercado de expectativas, com o mercado apostando forte em sua visão liberal-privatista. Gostaria ele de ver parte da reforma da Previdência aprovada ainda este ano, pelo menos a que abriga a questão da idade para aposentadoria. Não será fácil. O presidente eleito tem dúvidas sobre o modelo de capitalização que Guedes quer imprimir na Previdência Social.

Lorenzoni

Como deputado, Onyx Lorenzoni não era confinado, como dizem alguns comentaristas, no grupo menos qualificado da Câmara. Falou alto no microfone. Foi um dos mais destacados atacantes do petismo/lulismo, levando adiante a bandeira liberal do DEM. Liderou grupos e teve importante desempenho como relator das 10 Medidas contra a Corrupção. Graças a suas habilidades culinárias, aprovadas pelo pequeno grupo que frequentava seu apartamento em Brasília, liderou o projeto Bolsonaro. Assim atesta seu amigo, o eleito senador Major Olímpio. O pequeno grupo fez germinar a seara que acabou se alastrando pelo país.

Major Olímpio

O senador eleito será uma das extensões mais firmes do governo Bolsonaro no Congresso. Com mais de nove milhões de votos obtidos em São Paulo, deverá ser um perfil de forte expressão na Câmara Alta, com possibilidade de vir a ser líder do governo ou líder da bancada do PSL. Tem boa expressão e coordenou uma campanha bolsonarista bem-sucedida no maior colégio eleitoral do país, onde desbancou o candidato Eduardo Suplicy.

Articulação direta

Entremos, agora, no modus operandi do governo Bolsonaro. Lê-se que, ao invés de fazer uma ampla coligação partidária, o capitão teria inclinação para fazer uma articulação direta, olho no olho, palavra na palavra, com cada parlamentar. Ou seja, o presidencialismo de coalizão daria lugar ao bolsonarismo, expressão que mostra a nova modelagem a ser posta em prática. Para tanto, ele poderia contar com a simpatia dos integrantes da bancada da bala (segurança), da bíblia (evangélicos) e do boi (agronegócio). Essas bancadas somariam cerca de 250 parlamentares na Câmara. A ideia seria a de atender demandas setoriais das bancadas e, por conseguinte, cooptar seu apoio. Essa modelagem resistirá ao tempo?

Pragmatismo

Esse é o busílis. Os parlamentares são afeitos ao jogo de recompensas. E o jogo pressupõe não apenas atendimento de demandas temáticas, mas espaços na estrutura governamental. A justificativa é simples: a política visa a conquista do poder. E a conquista do poder, por sua vez, implica ganhos na máquina administrativa. Com esses espaços e nomeações, o parlamentar aumenta seu cacife e obtém mais prestígio nas bases. Essa corrente forma o presidencialismo de coalizão. É possível, até, fazer-se uma articulação direta, mão na mão; depois de algum tempo, o toma lá, dá cá vai aparecer. Em suma, a base de apoios do governo Bolsonaro retomaria, mais cedo ou mais tarde, o modelo tradicional. Passaria um tempinho na articulação direta até se deparar com a real politik.

Mensalão

Urge lembrar que o mensalão, composto nos tempos de Lula, começou com a "compra" isolada de parlamentares. Em vez de se firmar no apoio de grandes partidos, Luiz Inácio teria orientado o então ministro José Dirceu a cooptar isoladamente cada parlamentar. Deu no que deu.

Afastamento

O presidente eleito não deve desconsiderar os fundamentos da nossa tradição e posicionamento no cenário das relações internacionais. Tensões colocam o país em situação desconfortável com as declarações do presidente eleito sobre as relações com o Mercosul (Argentina, Paraguai, Uruguai), União Europeia, China (nosso principal parceiro comercial), países árabes e muçulmanos, desprezando três bilhões de consumidores, um quarto do mercado mundial. Acende-se sinal amarelo.

Peça-chave

O ministro das Relações Exteriores, a ser escolhido, será peça-chave para garantir portas abertas com os países que se surpreenderam com a sinalização diplomática feita pelo presidente Bolsonaro. A conferir.

Estética simples

As fotos não poderiam ser mais reveladoras. O presidente eleito falando atrás de uma mesa simples, sob um fundo onde se via uma bandeira do Brasil pregada na parede com durex. Ao lado, a tradutora de sinais. Noutra cena, o capitão toma café da manhã, cortando o pão e jogando nele leite condensado. A mesa está sem toalha. Tudo muito rústico. Simples. Natural. A produtora de campanha está numa garagem nos fundos da casa do empresário Paulo Marinho. Sem sofisticação tecnológica. Sem grandes equipamentos. Coisa rudimentar. O métier dos tradicionais marqueteiros virou de cabeça para baixo. Ufa!

A expressão bolsonarista

O presidente eleito não procura esconder cacoetes linguísticos. Ancora-se em uma linguagem coloquial, cheia de oks, "mandando ver", "botar pra quebrar", "cortar a cabeça", sem querer parecer alguém que escolhe o melhor termo para se expressar. É assim com todos, jornalistas ou assessores. Transmite impressão de ser sincero em suas convicções. Mas os exageros causam medo, mesmo sob desculpa de que, em certos casos, usa figuras de linguagem: "fuzilar a petralhada", por exemplo.

Gaudêncio Torquato, Jornalista e Cientista Político, é Professor Titular na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

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