quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

O STF e a democracia inabalada

Covardemente atacado no dia 8, o STF vem sendo vandalizado há anos por ameaças e ataques a seus ministros e à Corte. É preciso reconstruir seu edifício e reafirmar sua autoridade

A sede do Supremo Tribunal Federal (STF) foi o prédio mais atacado pela barbárie de 8 de janeiro. Os golpistas quebraram vidros, móveis e antiguidades, além de terem depredado vários ambientes e instalações. Ao assegurar a imediata reconstrução da sede do STF, a presidente do Supremo, ministra Rosa Weber, lembrou que o edifício é “patrimônio histórico dos brasileiros e da humanidade” e “símbolo do Poder Judiciário, um dos três pilares da democracia constitucional brasileira”.

A resposta do STF aos atos de 8 de janeiro, disse Rosa Weber, “passa também por difundir a mensagem de que esta Suprema Corte, assim como a defesa que a instituição faz da democracia e do Estado de Direito, seguem inabaláveis”. Nesse sentido, o Supremo lançou, no dia 17, a campanha Democracia Inabalada, que inclui vídeos na TV e publicações nas redes sociais. Segundo o tribunal, o objetivo é “chamar a atenção para o lamentável episódio, para que ele nunca seja esquecido e nem se repita, e destacar que a democracia e a Suprema Corte saem fortalecidas desses acontecimentos”.

Trata-se de iniciativa muito oportuna. É preciso comunicar a importância do STF para a democracia brasileira. Não há Estado Democrático de Direito sem uma Corte Constitucional independente. Não há proteção a direitos e garantias individuais sem um Judiciário forte e autônomo.

Covardemente atacado no dia 8 de janeiro, o STF vem sendo vandalizado há anos por ameaças e ataques a seus ministros e à Corte. Vale lembrar que não é apenas quebrando vidraças ou destruindo móveis que se ataca o STF. Nos últimos quatro anos, o bolsonarismo afrontou e enfrentou de forma reiterada a Corte e seus ministros, com ameaças, insinuações e muitíssima desinformação.

Tanto é assim que, em março de 2019, o então presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, se viu obrigado a determinar a abertura de um inquérito, com base no art. 43 do Regimento Interno do STF, a respeito de “notícias fraudulentas (...), denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de ânimo caluniante, difamante e injuriante que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo, de seus membros e de familiares”, precisamente para proteger as prerrogativas do tribunal. Ironicamente, os atos de 8 de janeiro explicitaram, com luzes novas e aterrorizantes, a plena legalidade do inquérito, repetidamente questionada pelos bolsonaristas. Os ataques e ameaças ao Supremo não eram uma invenção, como também não eram um singelo exercício da liberdade de expressão. Eram atos criminosos com o objetivo de vandalizar o STF, deslegitimando-o aos olhos dos cidadãos.

Depois de quatro anos de desinformação contra o Supremo, é necessário reconstruir a imagem pública da Corte Constitucional. É necessário reunir novamente a população em torno da Corte Constitucional, que é aliada, e não inimiga, dos direitos e liberdades individuais. As gravações com os atos de vandalismo dentro da sede do STF podem ajudar nessa tarefa, revelando a grande falácia do bolsonarismo, com sua pretensa defesa da liberdade. Os golpistas atacam o Supremo porque querem impor sua vontade sobre os demais e sobre a própria lei. Não almejam a liberdade, mas a barbárie.

A campanha Democracia Inabalada vem, portanto, em boa hora. Ao explicitar que a reconstrução do STF é muito mais do que reerguer um edifício, ela também é alerta para todos os ministros da Corte. Há um longo trabalho de resgate da legitimidade e do prestígio do STF perante a sociedade, trabalho este que é alicerçado por decisões técnicas e fundamentadas, rigorosamente contidas dentro dos limites de competência da Corte. Essa contenção é fundamental para preservar a autoridade do STF ao longo do tempo. O Judiciário aplica a lei. No caso, o Supremo defende e aplica a Constituição, que é extensa e aborda inúmeros temas. De toda forma, isso não autoriza o STF a tomar o espaço da política ou a abraçar atribuições funcionais que não lhe competem.

O País precisa do Supremo. É urgente reconstruir seu edifício e reafirmar sua autoridade. E que os golpistas, executores e mandantes, sejam punidos.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S. Paulo, em 19.01.23

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