terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Um novo e positivo cenário

Ao rechaçar extremismos ideológicos e optar por candidaturas de centro, o eleitor deu uma eloquente manifestação de confiança na política

O resultado das eleições de 2020 sinaliza uma mudança significativa do eleitorado em relação às escolhas feitas em 2018. Ao rechaçar extremismos ideológicos e optar por candidaturas de centro, o eleitor deu uma eloquente manifestação de confiança na política. Naturalmente, é ainda muito cedo para traçar prognósticos para o cenário eleitoral de 2022 ou para listar os principais candidatos da próxima disputa presidencial. A importância do pleito de 2020 não reside em suas eventuais consequências sobre as eleições de 2022. Tanto no primeiro turno como no segundo, o que se destacou – e é extremamente positivo para a democracia – foi a maturidade do eleitor.

O resultado das eleições de 2020 revela, de forma contundente, um eleitor capaz de repensar escolhas políticas feitas em um passado recente, em especial, as propostas do bolsonarismo e as do lulopetismo. O eleitorado mostrou-se inclinado a superar a visão da política como terra arrasada pela corrupção, que, de tão difundida por integrantes da Lava Jato, chegou a ganhar nome correspondente: o lavajatismo.

Aos que anunciaram, depois das eleições de 2018, a morte da chamada política tradicional, o pleito deste ano mostrou que velhos partidos políticos podem ainda ter especial força e representação. Quando são capazes de apresentar candidatos e propostas consistentes, legendas há muito conhecidas continuam tendo apelo entre os eleitores. Basta ver que os cinco maiores partidos, em porcentual do eleitorado governado por seus prefeitos, foram PSDB, MDB, DEM, PSD e Progressistas (ex-PP).

O PSDB elegeu 533 prefeitos, que governarão cerca de 17% do eleitorado a partir de 2021. Em seguida está o MDB, cujos prefeitos eleitos governarão cerca de 13% da população. Além de ser campeã em número de prefeituras conquistadas (803 ao todo), a legenda conquistou neste ano cinco capitais: Porto Alegre, Goiânia, Teresina, Boa Vista e Cuiabá.

Outro destaque das eleições de 2020 foi o DEM, partido com maior crescimento em número de prefeitos eleitos. Em 2016, conquistou 277 prefeituras. Agora, foram 476, a representar cerca de 12% do eleitorado. A principal vitória do antigo PFL ocorreu na cidade do Rio de Janeiro. No segundo turno, o ex-prefeito Eduardo Paes ganhou do prefeito Marcelo Crivella, que tentava a reeleição com o apoio do presidente Jair Bolsonaro. O DEM ganhou ainda as prefeituras de Salvador, Curitiba e Florianópolis.

O PSD e Progressistas também cresceram nas eleições deste ano. Junto ao DEM, os três partidos devem governar quase um terço do eleitorado (32%). Em 2016, as prefeituras conquistadas pelas três legendas representavam cerca de 17% do eleitorado.

Esses resultados contrastam com os números do bolsonarismo e do lulopetismo. Ao longo da campanha eleitoral, o presidente Bolsonaro pediu voto para 16 candidatos a prefeito. Apenas quatro se elegeram – Tião Bocalom em Rio Branco (AC), Roberto Naves em Anápolis (GO), Gustavo Nunes em Ipatinga (MG) e Mão Santa em Parnaíba (PI). O PSL elegeu 92 prefeitos (1,3% do eleitorado).

Além da rejeição ao bolsonarismo, houve também o inédito sumiço do PT na gestão das capitais. A partir do ano que vem, nenhuma das 27 capitais do País será governada por um prefeito petista, fato que nunca tinha ocorrido desde a redemocratização. Nos próximos quatro anos, os prefeitos eleitos do PT deverão governar cerca de 3% do eleitorado. Trata-se de uma situação muito diferente da que se viu anos atrás. Nas eleições de 2012, por exemplo, o partido de Lula foi o campeão no ranking de prefeitos por porcentual de eleitorado, com mais de 19%.

As eleições de 2020 confirmam, assim, que para superar um extremismo ideológico não é preciso inventar outro extremo. Não é necessário o bolsonarismo para vencer o lulopetismo ou vice-versa. A política pode e deve oferecer outras soluções, mais viáveis e mais responsáveis. E, como se viu nos resultados dos dois turnos, o eleitor está atento a essas outras opções. Há amplo espaço para a política.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de São Paulo, 01 de dezembro de 2020 

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