quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Pois é, pra que?

E esse prédio cinzento? É o Parlamento. Ainda nem é meio dia. Aponto as portas e as janelas totalmente fechadas. Além do que a semana ainda está no meio.
O taxista não disfarça o desdém.
Eles trabalham muito. Devem ter saído para o almoço.
E eu cá falando em silencio o meu português de Portugal me ponho a imaginar.
Apenas concordar com Churchill para quem a democracia é o pior dos regimes do mundo, à exceção dos demais, não é o suficiente.
Precisamos estar atentos para que a democracia possa resistir às contaminações dos que lentamente a conspurcam e a banalizam e com o oportunismo dos discursos e das ações populistas acabam empurrando o Povo à vala comum das turbas ignoras e o Estado à demagogia, enfim à desordem constitucionalizada e à tirania.
O Parlamento inventado para ser a representação popular verdadeira, por conseguinte qualificada, tem sido desfigurado em sua razão de ser, e não é de hoje.
Nas primeiras décadas do ultimo século na Europa, por exemplo, os Parlamentos já não detinham pela maioria dos que os integravam os conteúdos que os justificassem.
Não perguntem como se fazem as leis. Nem as salsichas. Disse Bismarck, o maior estadista do seu tempo.
E assim voltamos, nós no Brasil, ao que há de mais deplorável e já faz tempo. A péssima qualidade da representação popular tem atenazado, em muito, a República empurrando o Executivo a esse presidencialismo de ocasos e de ocasiões.
Estou em Roma, a antiga capital do mundo, que não se envergonha do Império dos seus Césares, que se orgulha da sua história e das lições que por seus exemplos, bons ou maus, tem dado em contributo à civilização.
O Povo demonstrava sossego quando, para entretê-lo, Vespasiano levou a sério a fórmula – pane et circenses. Pão e circo que muitos ainda teimam copiar no Brasil.
No Coliseu romano matavam os opositores à vista.
No coliseu invisível do atraso político e da pobreza social o poder da incúria no Maranhão mata a doses homeopáticas, de várias formas, a perder de vista.
Berlusconi, o multimilionário que controla a maior parte da mídia e parte do parlamento porque ainda tem sob seu cabresto deputados submissos, foi afinal condenado por suas falcatruas e desmandos e proibido de ocupar cargos públicos.
Isso só não basta. O Parlamento quando se reúne produz discursos que não dizem diretamente nada à vida das pessoas. São falas que não interagem, que não produzem resultados – e no mais ou são louvaminhas escancaradas ou ofensas exacerbadas aos membros do Governo, tudo no mesmo figurino da velha politicalha.
Até ontem eram trinta e dois partidos políticos na Itália e também nisso estamos iguais no Brasil. Quem é que pode administrar um País numa República democrática tendo que se acertar todo dia com os donos de trinta e dois partidos?
A vantagem aqui é o parlamentarismo. A qualquer momento o Presidente Napolitano, um senhor de 82 anos de idade, respeitado e querido no País, pode dissolver o Parlamento e convocar novas eleições. A cada nova eleição a qualidade da representação tem melhorado um pouco. Só um pouco, mas tem melhorado. Admite o taxista.
Quanto a nós, não basta trocarmos os nomes que apenas guardam identidade com o mesmo conteúdo. Ainda vamos ter que progredir muito em educação e cidadania.

Parlamento sem identificação com o Povo em geral e sem compromissos com o progresso e a paz social não tem legitimidade alguma para se impor em representação política em qualquer País. 

Ah, temos democracia porque temos um Parlamento com as portas abertas. Pois é, pra que? 

A democracia não se afirma apenas porque tenha instituições políticas funcionando formalmente, sem engajamento independente.

A democracia custa caro e dá trabalho. Não apenas aos que são eleitos.

Não é só pagar os impostos ou simplesmente votar, certo ou errado, achando que à parte isso não tem mais nada a fazer. Tem, sim. 

Tem que participar intensamente. Acompanhando, sugerindo, criticando, cobrando.
Se não for assim, a democracia não se realiza. 

E caímos todos nos fossos da irresponsabilidade populista e da demagogia que só conhece uma trilha - a da devastação dos bons costumes que leva à pobreza moral, que leva à pobreza política que leva à pobreza social que leva à dependência às migalhas do poder que consagra as camarilhas e as oligarquias que consolidam a tirania.

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