domingo, 6 de março de 2011

Futuca Por Baixo

É assim mesmo, não há como estanca-la, mudar o seu feitio, o seu rumo. Você olha a nuvem agora ela está de um jeito, daqui a pouco olha de novo e já não é a mesma.

Assim também são as coisas por aqui, volateis, voluveis, nas cumeadas e nas planícies. As pessoas também. Hoje as coisas parecem inertes, imutáveis, mesmas. As pessoas que estão de cima pensam que o pódio é para sempre.

Os Imperadores da invencível Roma, que o populacho considerava descendentes diretos das divindades, e daí tanto medo deles, idolatria e até respeito por eles, os doze Césares caíram, um a um, imagine esses mequetrefes larápios da nossa boa fé em nossas paragens tupiniquins.

Toda estrela tem a sua hora de subir, de brilhar e sua hora cadente. Se as estrelas que inspiram e são belas em seus fragmentos de luz na escuridão dos céus se apagam e despencam no espaço até se juntarem aos grãos de areia nas orilhas do mar, imagine essa gentalha que se acha intocável, impermeável a tudo.

O mundo para as bandas das arábias parecia arquipélagos de sossegos às sombras dos medos espraiados por seus déspotas. Quem era doido de empinar o nariz e encarar com o mínimo de inconformismo um Mubarak, um Bem Ali, um Kadafi?

Agora eles estão aí no chão sem poderem tocar a mão na dinheirama furtada dos cofres publicos escondida nos cofres dos bancos da Suiça.

O ferro enferruja, as facas ficam cegas, os serrotes numa hora não serram mais, as correntes se quebram, o fogo se exaure em cinzas.

Assim também as pessoas se cansam umas das outras, já não as querem mais dominando os espaços, sufocando com suas mentiras os sonhos nascentes de realidades novas, das mudanças que já deveriam ter começado a mais tempo.

Os mandacarus enganam a paisagem se mostrando verdes, mas se você for chegar mais perto verá que perdem a força dos seus espinhos quando a inclemência do sol é mais prolongada. Como tiranos duram. Como os tiranos, secam e morrem.

Os bacuris verdes não saem da casca. Mas tem o tempo de despencarem no chão. Assim também os tiranetes do poder publico, do dinheiro público, os aproveitadores da fé pública, os grãos mamíferos da República. Está chegando a sua hora.

O primeiro carnaval que meus olhos de menino descortinaram foi um bloco de sujos.

Ver as pessoas normais na pobreza do bairro se esparramando cada uma a seu modo naquela alegria suja, gente até com a cara melada de preto de fundo de panela, me pareceu estranho.

Daquele cenário o que ficou até hoje em mim foi o refrão que muito decididamente aquelas pessoas cantavam. Coisa madura se não cai, oi futuca por baixo que ela cai, ôba. Eu não entendia bem o que aquela proposição queria dizer.  

Com o tempo fui compreendendo melhor o alcance daquele cantar tão animado da pobreza da minha rua, das pessoas simples do meu bairro, daquela alegria barata espargindo versos tão vigorosos num tom uníssono tão decidido.

Pela árvore conhecereis os frutos e pelos frutos conhecereis a arvore. Não adianta ficar dizendo que os frutos não têm nada a ver com a árvore e que a árvore já deu o que tinha que dar e não tem nada a ver com os seus frutos. Problema são as sementes.

Agora é nos guardarmos para quando o carnaval chegar. Os frutos da arvore do mal estão podres, mas não caem. Não tem problema. Vamos ensaiar para o dia da virada definitiva que virá, tenho certeza, logo, logo. Cantemos em coro, gente. Coisa madura se não cai, oi futuca por baixo que ela cai, ôba. 

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