domingo, 11 de março de 2012

Desmoralização

Ferramenta do Executivo para, nas questões urgentes, não deixar cair a governabilidade, a Medida Provisória só pode ter eficácia de lei, após o prazo de sua edição, se aprovada, primeiro por uma Comissão Mista de Deputados e Senadores, e depois pela maioria de cada uma das duas Casas do Congresso Nacional.

Este é o processo legislativo, prescrito pela Constituição, mas não obstante vinham sendo aprovadas sem o juízo de admissibilidade das Comissões Mistas. Daí serem inconstitucionais todas que não passaram pelo crivo das Comissões Mistas.

Agora ficou bem claro que nada será como antes em se tratando de Medidas Provisórias. Se não houver uma Comissão Mista para examiná-las previamente logo perderão eficácia e nunca poderão ser votadas, não podendo mais ter eficácia de leis.

Levantamento feito pelo O Globo, do Rio de Janeiro, indica que 560 Medidas Provisórias teriam sido anuladas por inconstitucionalidade caso o Supremo Tribunal Federal não tivesse resolvido que sua decisão só valerá daqui para frente.

- Seriam atingidas MPs de todos os governos, desde o de José Sarney, anota o O Globo, em editorial hoje.

- Da administração Fernando Henrique, por exemplo, a que fixou o salário mínimo de 2002. Na Era Lula, o Bolsa Família poderia ser revogado, e o mesmo aconteceria com Minha Casa, Minha Vida. Embora espantoso, o recuo do Supremo tem respaldo em lei federal (9.868, de 1999), cujo artigo 27 faculta a Corte a "restringir efeitos" de declarações de inconstitucionalidade caso haja "razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social". É o caso.

- Passado o susto, é tratar de aproveitá-lo para se moralizar o uso de MPs. Filho legítimo do decreto-lei da ditadura militar, o instrumento surgiu na Constituição de 1988 para o Executivo não perder agilidade administrativa na redemocratização.

- A intenção foi desvirtuada, e a medida provisória se converteu em instrumento de uso excessivo e também descabido, como são as MPs "árvore de Natal", cheias de penduricalhos diversos, sobre vários assuntos sem relação entre si, uma indiscutível ilegalidade. No plano político mais amplo, a MP passou a servir para o Executivo avançar sobre espaços institucionais do Congresso.

- O Planalto começou também a legislar, de baixo para cima, sem pruridos. Lula, que na oposição abria fogo contra a emissão de MPs por Fernando Henrique Cardoso, editou 419 delas, nos dois mandatos, contra 365 nos também oito anos de poder do adversário tucano. A tentação de governar sem o Congresso é grande no Brasil. E o próprio Legislativo ajuda, na sua leniência.

- Até os generais demonstraram mais pudor no manejo de decretos-lei do que governos civis nas medidas provisórias. A culpa é democratizada nesta crise, como declarou o ex-ministro e ex-presidente do STF Nelson Jobim: presidentes do Senado, líderes de governos no Congresso e ministros de articulação política.

-Tem-se de aproveitar o momento e trabalhar para o Congresso deixar de ser cartório carimbador de decisões do Executivo. Já aprovada no Senado, está na Câmara proposta de emenda constitucional do senador José Sarney, com algum disciplinamento na apreciação de MPs no Congresso. É preciso recolocá-la em discussão. Congresso tem de deixar de ser simples cartório avalizador do Executivo.

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