domingo, 14 de agosto de 2011

Para Ninguém

A igualdade de todos em obrigações e direitos perante a lei é o principio basilar da República. Nada disso funciona se o Estado não é democrático nem de direito.

Depois de duas décadas de autoritarismo militar, as liberdades públicas e as garantias individuais chutadas para escanteio, o Estado dono de tudo, a exceção predominando, a dissidência silenciada, presa, torturada, exilada ou sumida para nunca mais, pactuamos depois de uma anistia ampla, geral e irrestrita, uma transição para a democracia.

Daí a Constituição da República Federativa do Brasil que todos os agentes públicos, e os cidadãos em geral, deveriam ler todos os dias como os que com fé religiosa leem a Bíblia e, apreendendo seus ensinamentos, os defendem e os praticam.

É Princípio Fundamental do Estado Democrático de Direito, por exemplo, a dignidade da pessoa humana. Entre os Direitos e Garantias Fundamentais está o de que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante.

O tratamento desumano ou degradante é na maioria dos casos um dissimulador da tortura. O tratamento degradante é uma tortura mais requintada, sem arranhões físicos, mas com prolongadas ou intermináveis lesões psicológicas.

E assim compreendendo, a Constituição assegura aos presos o respeito não só à sua integridade física, mas também à sua integridade moral. Adiante diz que a pessoa civilmente identificada não será submetida à identificação criminal.

Isto tudo para acabar com aquelas situações horrorosas a que eram submetidos os presos sendo constrangidos a sujarem os dedos e os esfregarem em fichas e àquelas fotos ridículas, num ambiente e clima de propositais humilhações.

Há exceções, sim, excepcionalíssimas, para identificação criminal do preso que já tenha sido antes identificado civilmente. 

A polícia só pode proceder à nova identificação do preso se o seu documento de identidade apresentar rasura ou indicio de falsificação. Se documento apresentado for insuficiente para identificar cabalmente o indiciado. Se o indiciado portar documentos distintos, com informações conflitantes entre si.

Os presos que foram levados para o Amapá, dentre os quais um ex Deputado Federal e um Secretário Executivo do Ministério do atual Governo da Presidente Dilma, não se enquadravam em nenhuma dessas hipóteses.

As fotos a que foram obrigados, posando seminus, eles próprios segurando cartazes em que se auto - acusam dos delitos que apesar da fase ainda investigatória já lhe são imputados, essas fotos falam por si e carregam forte denúncia de escancarada violação dos direitos constitucionais dessas pessoas.

Os presos que aparecem nessas fotografias policiais, sob o pretexto de que se tratava de identificação criminal, na verdade, foram vítimas do autoritarismo do Estado nacional brasileiro, em claras ofensas à Constituição da República Federativa do Brasil.

Ninguém será submetido a tratamento degradante e eles o foram. É assegurado ao preso o respeito à sua integridade moral. E eles foram ofendidos em sua integridade moral. 

O civilmente identificado não será submetido à identificação criminal. E eles o foram, mesmo sendo público e notório não haver qualquer dúvida quanto à identidade de cada um.

Houvesse alguma duvida quanto à identidade civil de cada um deles como é então que foram cumpridos um a um, em todos os endereços indicados, os mandados de prisão?

Isso vai resultar num festival de ações por danos morais e abusos de poder contra a União Federal e nós, contribuintes, é quem iremos como sempre pagar a conta.

A lei tem que ser para todos, sim. Os abusos em nome da lei, não. Para ninguém.

2 comentários:

Cristian Molina disse...

Senhor Edson Vidigal, o Senhor tem toda a razão, aquelas pessoas, culpadas ou não, foram submetidas a humilhação pública, a tratamento desumano etc etc etc. O que me deixa mais triste ainda é acompanhar todos os dias, nos jornais e na televisão, o mesmo tratamento ser oferecido a pessoas simples, na maioria ladrões de galinha, e nenhum magistrado, político ou professor de direito sequer comentar sobre o assunto. Penso que essas críticas recentes são frutos de uma identificação inconsciente com os acusados. "-O problema era só do povo, como eu não sou parte do povo, sou gente importante, aquilo não me dizia respeito!". Será que constrangimento é sentimento somente de "gente" e não de "povo"?

Anônimo disse...

Dr. Edson, eu senti falta nessa "gente" presa, das algemas.Um juiz corroborado pelo minstério público, seriam muitos irresponsáveis em autorizar prisão de simples suspeitos, sem a devida confirmação de provas. Se assim o foi, não venha falar sobre direitos de cidadãos dados pela Constituição, venha sim lembrar-se das vítimas que somos nós, o povo que paga impostos para os abutres se locupletarem.Mas se nada disso aconteceu, escreva sobre a prisão necessaria do juiz e do representante do ministerio publico que chancelou após as provas apresentadas pela policia.Seja mais justo e menos politico Doutor, sua consciencia o honra.