sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Maia diz que vai pedir a Alcolumbre convocação de comissão do Congresso e ataca governo

Presidente da Câmara quer interrupção de recesso para também chamar ministro da Saúde e representantes da Anvisa

 O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que pedirá ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), a convocação da Comissão Representativa do Congresso para tratar da "tragédia que está acontecendo em Manaus" e também da vacinação contra covid-19 no País.

“Queremos retomar os trabalhos no Congresso para convocar Pazuello e Anvisa”, disse Maia, nesta sexta-feira, 16, numa referência ao ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária. “Falta projeto de Brasil e planejamento para a crise. Não podemos tratar vidas com tamanho desprezo”.

Para Maia, impeachment de Bolsonaro é tema que inevitavelmente será debatido no futuro

Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados Foto: Dida Sampaio/Estadão

 A Comissão Representativa do Congresso é um colegiado temporário, previsto na Constituição, para atuar nos períodos de recesso parlamentar, em situações excepcionais e urgentes. Os deputados e senadores estão de férias, com retorno previsto para 1º de fevereiro.

"Vou encaminhar agora à tarde ao presidente do Congresso, Davi Alcolumbre, um pedido de convocação da Comissão Representativa para que possamos discutir a tragédia que está acontecendo em Manaus e também todo processo que envolve a vacinação no País", escreveu Maia no Twitter, antes da entrevista na qual criticou o que chamou de falta de projeto do governo federal. “É mais do que urgente que o Parlamento esteja de portas abertas, trabalhando para encontrar soluções para essa situação tão drástica e urgente. Não podemos nos omitir!”

Composta por sete senadores e 16 deputados representantes de todos os blocos e partidos do Congresso, a Comissão citada por Maia é eleita na última sessão dos trabalhos legislativos. Compete ao grupo, entre outras prerrogativas, exercer as atribuições do Congresso durante o recesso. O colegiado pode, por exemplo, convocar o ministro da Saúde para explicar a situação da pandemia de covid-19 no País e o caso específico de Manaus, que entrou em colapso. Outro assunto que pode ser deliberado pela comissão é a eventual intervenção federal no Amazonas, caso seja solicitada pelo presidente Jair Bolsonaro.

A convocação da Comissão depende do aval de Alcolumbre, que, como presidente do Senado, também comanda o Congresso. Desde o início do recesso parlamentar, porém, ele demonstra oposição a essa medida.

Parlamentares pressionam Bolsonaro a decretar intervenção no Amazonas, mas Congresso se divide

O senador Eduardo Braga (AM), líder da bancada do MDB, encaminhou nesta sexta-feira, 16, ofício ao presidente Jair Bolsonaro pedindo intervenção federal no Amazonas. “Toda a nação brasileira tomou conhecimento de que o atendimento aos pacientes acometidos de covid-19 pelas autoridades sanitárias do Estado do Amazonas não está sendo possível de ser realizado, inclusive pela falta de insumos básicos, como oxigênio, tornando forçosa a transferência de doentes da rede hospitalar de Manaus para outras capitais do país, inclusive Brasília”, afirmou Braga no documento. “Trata-se de situação que exige ação imediata do Governo Federal, guardando semelhança com o quadro de ineficiência do Estado do Rio de Janeiro no combate ao crime e à violência, o que ensejou a intervenção federal naquele Estado “com o objetivo de pôr termo ao grave comprometimento da ordem pública”, acrescentou o senador, lembrando decreto editado no governo de Michel Temer, em fevereiro de 2018.

O Congresso está dividido sobre a possibilidade de o governo  Bolsonaro intervir no Amazonas. A explosão de casos de covid-19 em Manaus levou o sistema de saúde da capital ao colapso. O estoque de oxigênio se esgotou em diversos hospitais e pacientes morreram por asfixia, segundo relato de médicos.

Uma parte dos congressistas considera que a intervenção é essencial para controlar a situação no Estado. Nos bastidores, porém, muitos temem a posição negacionista do governo Bolsonaro e avaliam que a insistência na defesa de medicamentos sem comprovação científica e no fim do isolamento social podem ser ainda pior.

O requerimento pela intervenção federal na área da saúde do Amazonas foi protocolado ontem, 14, pelos deputados Delegado Pablo (PSL-AM), Felício Laterça (PSL-RJ) e Marcelo Freitas (PSL-MG). "O povo não aguenta mais, hoje chegamos no limite, desde abril do ano passado vemos a pandemia crescer a níveis alarmantes", afirmou Pablo, em vídeo divulgado nas redes sociais.

Pablo disse ao Estadão/Broadcat já ter solicitado uma audiência com Bolsonaro para debater a questão, mas ainda aguarda a resposta. "Já fizemos uma intervenção branca, mas o que precisamos agora é de uma intervenção real", disse.

O Palácio do Planalto chegou a cogitar uma intervenção federal no Amazonas em abril, mas, na época, o governador Wilson Lima (PSC) disse que a situação estava sob controle, o que fez o governo recuar.

Decretos de intervenção federal em Estados são editados pelo presidente, mas precisam ser aprovados pelo Congresso. O Legislativo, porém, está em recesso até o início de fevereiro. Uma sessão extraordinária somente seria realizada com a aprovação da maioria absoluta da Câmara e do Senado, ou seja, 257 deputados e 41 senadores. Se houver convocação, a intervenção poderia ser aprovada por maioria simples de votos.

O retorno dos trabalhos do Congresso, a quem cabe a análise do pedido de intervenção, tem sido defendido por vários deputados e senadores. Um manifesto assinado por 37 parlamentares do movimento suprapartidário 'Acredito' – entre os quais eles Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-SP) – também apoia a retomada do Congresso. "O Brasil vive um dos seus piores momentos desde o início da pandemia e discussões importantes acerca do estado de calamidade, do fim do auxílio emergencial e do cronograma de vacinação não podem esperar", diz nota do movimento.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-ES) também apresentou um requerimento para a convocação de uma sessão extraordinária do Congresso para deliberar sobre assuntos de urgência nacional.

Nem todos os parlamentares, no entanto, são favoráveis à intervenção e à convocação do Congresso, que está em campanha para definir os próximos presidentes das duas Casas legislativas. "Não é momento de pedir intervenção federal. É hora de união de todos. Neste momento, não há culpados. Temos que atravessar esse túnel escuro. Quando clarear, e vai clarear, aí então veremos onde erramos e o que é preciso fazer para corrigir", afirmou o senador Plínio Valério (PSDB-AM).

 "Sou contra a intervenção. Tanto o governo do Amazonas como o governo federal têm demonstrado dificuldades para enfrentar a crise. A hora é de uma ação sinérgica entre os governos. Quanto menos trauma e ruptura, mais rápido superaremos esse drama", argumentou o deputado Marcelo Ramos (PL-AM).

Bruno de Castro, Camila Turtelli e Daniel Weterman, O Estado de S.Paulo, em 15 de janeiro de 2021 | 17h44

Em meio a caos na saúde em Manaus, panelaços contra Bolsonaro são registrados em todo o país

Manifestantes protestam contra condução do presidente e do Ministério da Saúde nas medidas de controle da pandemia do novo coronavírus

Panelaço em Copacabana com a presenca de crianças nas janelas Foto: Ana Branco / Agência O Globo

O presidente Jair Bolsonaro foi alvo de "panelaços" na noite desta sexta-feira em cidades espalhadas por todo o país. As manifestações contrárias ao presidente foram  convocadas nas redes sociais em meio ao colapso do sistema de saúde do Amazonas pelo crescimento de casos e mortes causadas pela Covid-19 em todo o estado e a situação da pandemia do novo coronavírus no país.

No Rio de Janeiro, foram registrados panelaçõs em bairros da Zona Sul, como Ipanema, Copacabana, Botafogo, Humaitá, Flamengo e Leme. Há ainda registros de manifestações na Lapa e Santa Tereza, no Centro da cidade, e na Barra da Tijuca, na Zona Oeste.

No dia em que o colapso da saúde em Manaus, capital do Amazonas, ficou evidente diante da transferência de pacientes com Covid-19 para outros estados e o fim do oxigênio para tratar os doentes do estado, brasileiros por todo o Brasil foram às janelas bater panelas e protestar contra o presidente Jair Bolsonaro.

No dia em que o colapso da saúde em Manaus, capital do Amazonas, ficou evidente diante da transferência de pacientes com Covid-19 para outros estados e o fim do oxigênio para tratar os doentes do estado, brasileiros por todo o Brasil foram às janelas bater panelas e protestar contra o presidente Jair Bolsonaro.

Em São Paulo, os panelaços e gritos de "fora Bolsonaro", "genocida" , "impeachment já" e "governo assassino" começaram a ser ouvidos um pouco depois das oito horas da noite em diferentes bairros. O protesto foi intenso em Pinheiros, Vila Madalena, Pompeia, Jardins, Vila Mariana, Higienópolis. Moema e Campo Belo. Em alguns lugares, o primeiro panelaço de 2021 soou como o maior desde a posse de Jair Bolsonaro.

Nas redes sociais, há relatos de na Asa Norte e na Asa Sul de Brasília; Manaus, Recife, Belo Horizonte e Porto Alegre.

Panelaço na Rua General Glicério em Laranjeiras contra o governo Bolsonaro Foto: Luiza Moraes / Agência O Globo

A cidade enfrenta um colapso no atendimento de saúde, segundo o ministro Eduardo Pazuello e o governador chegou a estabelecer um toque de recolher para reduzir a incidência da Covid-19.

Os hospitais da capital amazonense estão sem oxigênio e leitos necessários para o atendimento de todas as pessoas contaminadas por Covid-19 em estado grave. Desde quinta-feira, pacientes passaram a ser transferidos para outros estados em busca de atendiemnto.

O Globo, em 15/01/2021 - 20:40 / Atualizado em 15/01/2021 - 21:58

Brasil tem 1.038 mortes por covid-19 em 24 horas

País registra mais de mil óbitos diários pelo quarto dia consecutivo e 66 mil novos casos, mas números não incluem dados do Amazonas. Total de mortos passa de 208 mil, e infectados já somam 8,39 milhões.

Manaus vive explosão de infecções e mortes, causando superlotação de hospitais e cemitérios

O Brasil registrou nesta sexta-feira (15/01), pelo quarto dia consecutivo, mais de mil mortes diárias ligadas à covid-19. Segundo dados divulgados pelo Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass), foram 1.038 óbitos nas últimas 24 horas.

O país registrou ainda 66.047 novos casos confirmados da doença. Com isso, o total de infecções oficialmente identificadas subiu para 8.390.341, enquanto os óbitos chegaram a 208.133.

Diversas autoridades e instituições de saúde alertam, contudo, que os números reais devem ser ainda maiores, em razão da falta de testagem em larga escala e da subnotificação.

Os números desta sexta-feira também não incluem os dados do Amazonas, que foram mantidos os da véspera devido a problemas técnicos no acesso às bases de dados dos sistemas de informação, indicando que as cifras brasileiras devem ser ainda mais dramáticas. O estado vive atualmente uma explosão de casos, internações e mortes, o que acabou gerando um verdadeiro colapso de seu sistema de saúde. 

Ao todo, 7.339.703 pacientes se recuperaram da doença no país, segundo dados do Ministério da Saúde divulgados na quinta-feira. O Conass não divulga número de recuperados.

A taxa de mortalidade por grupo de 100 mil habitantes está em 99,0 no Brasil, a 22ª mais alta do mundo, quando desconsiderados os países nanicos San Marino, Andorra e Liechtenstein.

Em números absolutos, o Brasil é o terceiro país do mundo com mais infecções, atrás apenas dos Estados Unidos, que somam mais de 23,4 milhões de casos, e da Índia, com 10,5 milhões. Mas é o segundo em número de mortos, já que mais de 390 mil pessoas morreram em território americano.

Em todo o mundo, mais de 93,6 milhões de pessoas já contraíram o coronavírus. O planeta superou ainda a marca de 2 milhões de mortes em decorrência da doença nesta sexta-feira.

Publicado por Deutsche Welle, em 15.01.2021, há 1 hora.

“Há indícios significativos para que autoridades brasileiras, entre elas o presidente, sejam investigadas por genocídio”

A jurista Deisy Ventura, especialista na relação entre pandemias e direito internacional, afirma que há todos os elementos necessários à tipificação de crimes contra a humanidade na resposta do Governo brasileiro à covid-19: intenção, plano e ataque sistemático.

Entrevista a Eliane Brum, de EL PAÍS

Uma indígena yanomami com uma máscara em 30 de junho em Alto Alegre. Segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, há mais de 17.000 indígenas contaminados por covid-19, 547 mortos e 143 povos atingidos.

Desde que Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), relacionou a palavra “genocídio” à atuação do Governo de Jair Bolsonaro diante da covid-19, o debate entrou na pauta pelo andar de cima. Não só no Brasil, mas no mundo. As denúncias de genocídio, tanto dos povos indígenas quanto da população negra, pelo atual Governo, não são novas. Em geral, são tratadas como evocações subalternas, da mesma forma subalterna que essas populações são tratadas historicamente pelas elites brasileiras. Ao desembarcar da boca togada de um ministro do STF, a palavra ganhou outra densidade. E, principalmente, se instalou. Já não é mais uma palavra fantasma, que ao ser dita nada move. Genocídio, pela boca de Gilmar Mendes, deixou de ser uma carta deliberadamente extraviada e chegou ao seu destino.

Em 11 de julho, o ministro afirmou em um debate online: “Não podemos mais tolerar essa situação que se passa no Ministério da Saúde. Não é aceitável que se tenha esse vazio. Pode até se dizer: a estratégia é tirar o protagonismo do Governo federal, é atribuir a responsabilidade a Estados e municípios. Se for essa a intenção é preciso se fazer alguma coisa. Isso é péssimo para a imagem das Forças Armadas. É preciso dizer isso de maneira muito clara: o Exército está se associando a esse genocídio, não é razoável. É preciso pôr fim a isso”.

Generais como o vice-presidente Hamilton Mourão e o ministro da Defesa Fernando Azevedo e Silva, que não só pertencem e representam o Governo Bolsonaro, mas também o sustentam e o legitimam, se alvoroçaram porque sentiram o risco real de, em algum momento do futuro próximo, responderem por crimes contra a humanidade. Mesmo entre os que não apoiam Bolsonaro, termos como “hipérbole”, “exagero” e “banalização” foram usados para reduzir a potência da declaração do ministro. A palavra, porém, finalmente encarnada, permanece ativa.

Exatamente porque o genocídio, assim como os demais crimes contra a humanidade, são da maior gravidade é que se torna preciso debater o tema com a máxima seriedade, impedindo que ele seja capturado pela polarização ou pelas conveniências políticas de ocasião. Exatamente porque se trata da morte de pessoas que, num país que já ultrapassa as 80.000 vítimas por covid-19, mesmo com a reconhecida subnotificação, é urgente debater com responsabilidade: há ou não evidências de que o presidente da República e outras autoridades brasileiras possam ter cometido genocídio na resposta à covid-19?

Para responder a essa pergunta crucial, entrevistei a jurista Deisy Ventura, coordenadora do doutorado em saúde global e sustentabilidade da Universidade de São Paulo (USP). Autora do livro Direito e saúde global – o caso da pandemia de gripe A - H1N1 (Editora Outras Expressões), Ventura é uma das mais respeitadas autoridades no estudo da relação entre pandemias e direito internacional. É também mestre em direito europeu, doutora em direito internacional pela Universidade Paris 1 e foi professora convidada do Instituto de Estudos Políticos de Paris, o prestigiado Sciences-Po.

Desde que iniciou a pandemia, é uma das articuladores do Projeto Direitos na Pandemia, realizado pelo Centro de Pesquisas e Estudos de Direitos Sanitários da USP e a organização Conectas Direitos Humanos. Todos os atos e a legislação brasileiras sobre a covid-19 são coletados e classificados em seu impacto sobre os direitos humanos. Isso impõe à jurista um acompanhamento cotidiano e permanente do Diário Oficial da União, onde muito se passa sem que a maioria dos brasileiros perceba.

Já não estamos no século 20, quando o conceito de genocídio foi criado a partir da necessidade de nomear o crime perpetrado pelo nazismo contra os judeus. O século 21 não é apenas uma convenção temporal, ele trouxe desafios novos, como o enfrentamento das pandemias e da emergência climática. Apenas há alguns anos, Ventura, então professora de direito internacional no Instituto de Relações Internacionais da USP, precisava constantemente explicar por que havia escolhido estudar uma pandemia no contexto do direito internacional. Hoje, já não é mais preciso explicar. O entendimento é imediato.

Nesta entrevista, feita por telefone ao longo de duas horas na última segunda-feira (20/7), Deisy Ventura explica por que há elementos suficientes para investigar o presidente Jair Bolsonaro, assim como outras autoridades do Governo, por crimes contra a humanidade, tanto no Tribunal Penal Internacional como na Justiça brasileira. Ela explica também por que é essencial para o futuro do Brasil que esse debate aconteça.

A jurista Deisy Ventura é uma das mais renomadas especialistas no estudo de pandemias e direito internacionalDIVULGAÇÃO/ARQUIVO PESSOAL

Pergunta. A declaração do ministro do STF Gilmar Mendes, alertando que os militares poderiam estar se associando a um genocídio, referindo-se à forma como a pandemia de covid-19 estava sendo tratada pelo Governo brasileiro, produziu várias reações. Alguns juristas e intelectuais foram rápidos em classificar a declaração como uma “banalização” do conceito de genocídio. Houve banalização?

Resposta. Existe uma banalização da palavra genocídio, mas não é o caso agora. O ministro Gilmar Mendes disse que o Exército estava se associando a um genocídio, referindo-se à resposta brasileira à pandemia. Naquele momento, o número de mortes já estava em 70.000 pessoas. É muito importante que um membro do Supremo Tribunal Federal, que é conhecido como alguém politicamente conservador, utilize essa palavra, porque ele certamente não usou essa palavra por acaso. É alguém que conhece o conceito de genocídio, conhece o direito e não é novato nem no mundo jurídico nem no mundo político. É importante não só por ser ministro, mas também pela percepção internacional dessa fala. A diplomacia brasileira teria recebido desde o ano passado uma orientação clara para frear o uso deste termo. Existe um alerta para não deixar que se difunda no Exterior a ideia de que está ocorrendo um genocídio no Brasil. Assim, cada vez que a palavra é pronunciada em relação ao Brasil, a diplomacia reage. Infelizmente, em geral desqualificando quem fez a declaração e caracterizando-a como banalização. Até então o genocídio era associado à população indígena e não relacionado à pandemia. Agora, com a fala do ministro, chegamos a outro patamar e precisamos discutir com muita serenidade essa questão. Não podemos falar sobre genocídio de uma forma polarizada e vulgar. É chegado o momento de falar do genocídio fora da clivagem da banalização. Não é apenas um grito dos mais fracos para chamar a atenção. Estamos agora diante de indícios muito significativos de que existe um genocídio em curso no Brasil.

P. E quais são esses indícios?

R. Primeiro, preciso dizer que, no que se refere à população em geral, acredito que há o crime de extermínio, artigo sétimo, letra b, do Estatuto de Roma. É também um crime contra a humanidade. E, no caso específico dos povos indígenas, minha opinião é de que pode ser tipificado como genocídio, o mais grave entre os crimes contra a humanidade. O crime de extermínio é a sujeição intencional a condições de vida que podem causar a destruição de uma parte da população. O que chama a atenção, neste caso, é que o exemplo usado no texto do Estatuto de Roma é justamente o da privação ao acesso a alimentos e ao acesso a medicamentos. Desde o início da pandemia, o Governo federal assumiu o comportamento que tem até hoje: de um lado o negacionismo em relação à doença e, de outro, uma ação objetiva contra os governos locais que tentam dar uma resposta efetiva à doença, contra aqueles que tentam controlar a propagação e o avanço da covid-19. E desde o início tenho dito que se trata de uma política de extermínio. Por quê? Porque os estudos têm nos mostrado que as populações mais atingidas são as populações negras, são as populações mais pobres, são os mais vulneráveis, entre eles também os idosos e os que têm comorbidades. E, infelizmente, o que prevíamos aconteceu. Apesar da subnotificação, que é consensual, já que todos estão de acordo que há mais casos no Brasil do que são reconhecidos, ainda assim há um volume impressionante e existe um perfil claríssimo das pessoas que são mais atingidos pela doença. Tanto no genocídio da população indígena quanto no que, na minha opinião, é uma política de extermínio com relação à resposta geral da pandemia, eu vejo claramente uma intencionalidade.

P. A intencionalidade é fundamental para tipificar a autoria tanto do genocídio quanto do extermínio. Mas há juristas experientes defendendo que seria difícil provar a intencionalidade no caso da resposta do Governo brasileiro à pandemia...

R. Existem pessoas por quem tenho o maior respeito e que conhecem o sistema penal internacional e que pensam que não é o caso de um crime de genocídio ou outro crime contra a humanidade porque se trataria de uma política fracassada do Estado brasileiro. Nesta interpretação, o que estaria acontecendo no Brasil é que o Governo fracassou na resposta à pandemia. Seria apenas uma resposta ineficiente. E os tribunais internacionais não julgam políticas, julgam pessoas que cometem crimes. Assim, só poderíamos reclamar junto ao sistema interamericano de direitos humanos ou outras instâncias de controle do respeito aos tratados de direitos humanos. Eu não penso assim. Vejo uma intenção clara.

P. Como essa intenção se expressa, em sua opinião?

R. Faz parte da definição dos crimes contra a humanidade a existência de um ataque generalizado ou sistemático contra a população civil. Estes dois elementos são muito importantes. Algumas pessoas dizem também que o Tribunal Penal Internacional seria para conflitos armados. Isso também não é verdade. O estatuto é claríssimo. Não é preciso haver uma guerra ou conflito armado para que se pratique um crime contra a humanidade. E, mais do que isso, até a tentativa de genocídio é punível pelo estatuto. Sequer é necessário que ele tenha sido consumado. Da mesma forma, se pune também a incitação ao genocídio. A incitação é punida, a tentativa é punida. Precisamos analisar com muita serenidade o que tem acontecido no Brasil. Afirmo que nem de longe se trata de uma política fracassada de resposta à covid-19. Nem de longe. O Governo age de uma maneira claríssima em combate à saúde pública. Ele não só dissemina falsas informações sobre a doença e, portanto, age no plano da comunicação para disseminar o negacionismo, como ele também construiu um conjunto de ações, inclusive por via legislativa, para obstaculizar as medidas de combate e prevenção à covid-19 de iniciativa de outros poderes. Vejo aqui todos os elementos configurados: ataques sistemáticos e a intenção de sujeitar uma parte importante da população brasileira a condições de vida que podem implicar a sua destruição.

R. Por que, então, juristas respeitáveis estão sendo, digamos, tão cautelosos?

P. É evidente que o Tribunal Penal Internacional nunca foi confrontado a uma situação como a que estamos vivendo no Brasil. Então é natural que alguns juristas, por maior que seja a sua experiência e o seu valor, digam que nunca cuidaram de uma questão como esta. Nunca vivemos uma pandemia com esse alcance na contemporaneidade, com a existência de um sistema de saúde pública universal, na qual temos os meios para uma resposta eficiente, e o Governo federal optou por não oferecer essa resposta. Muitas pessoas são grandes estudiosas do direito penal internacional, mas talvez não tenham estudado de forma mais detida o que o Governo brasileiro tem feito com relação à covid-19. Uma coisa é acompanhar as falsas polêmicas, e também as verdadeiras, nesta forma de fazer política do Brasil atual, onde o falso se mistura com o verdadeiro. O presidente da República é um agitador de extrema direita e o movimento que o levou ao poder busca de forma ostensiva aparelhar o Estado brasileiro. Órgãos do Estado, como a própria Secretaria de Comunicação, segundo o Poder Judiciário, tentaram veicular campanhas que insuflam a população contra as autoridades. O presidente da República chegou a sugerir a invasão de hospitais para que seus seguidores os fotografassem, para assim “comprovar” a tese complotista de que a covid-19 não seria tão grave nem teria se propagado nessa dimensão. Nós temos configurada aqui muito mais do que uma omissão. Nós temos uma ação intencional clara e também um caráter sistemático. Mas uma coisa é acompanhar as declarações do Governo por lives e pela imprensa, acompanhar essas ofensas, assim como o descaso com a dor das famílias que perderam pessoas queridas por covid-19. Além desse circo de mentiras e distorções, precisamos também ir lá olhar o Diário Oficial, para entender o que acontece atrás da cortina de fumaça. Quando a gente vai lá ver, vai somando evidências claríssimas dessa intencionalidade. Não são apenas as falas do presidente, mas uma sucessão de atos que demonstram uma intenção clara e uma ataque sistemático às tentativas de controle da propagação da doença. Por isso, em minha opinião, existe uma política de extermínio em curso.

P. Para provar que há genocídio e outros crimes contra a humanidade é necessário também mostrar que há um plano. É possível estabelecer a existência de um plano, no caso da resposta do Governo brasileiro à covid-19?

R. Sim. E também o plano é muito claro para quem acompanha e pesquisa diariamente o que está acontecendo com a covid-19. Aquilo que o presidente da República chamou de “guerra” e de “jogar pesado” contra os governadores constitui claramente um plano para obstruir uma resposta eficiente dos Estados à pandemia, com etapas como o pedido a empresários para que deixassem de financiar campanhas eleitorais de governadores não alinhados, ameaças constantes em declarações públicas e incitação à desobediência civil, entre muitas outras medidas legislativas ou administrativas. O presidente chegou a demitir dois ministros da Saúde que não concordavam com seus planos para a pandemia.

P. Qual é a importância de um debate como este, num momento tão grave como o que o Brasil está vivendo?

R. Quando a gente atribui um crime a alguém é preciso uma investigação, é preciso um processo e é preciso um julgamento. Eu vejo todas estas etapas como extremamente importantes para que possamos entender o que acontece no Brasil em um outro patamar. Seria muito ruim se, ao final desse acontecimento terrível, a versão sobre o que aconteceu fosse a de que esse Governo foi simplesmente incompetente. E seria muito ruim porque isso não é verdade. A discussão sobre a tipificação dos crimes contra a humanidade me parece fundamental, mas ela precisa ser feita de uma forma muito tranquila, porque não se trata de agitação, nem se trata de insuflar pessoas. Se trata, sim, de uma tese muito séria, que tem condições de prosperar na esfera internacional. E não só isso. Tem condições de prosperar também na esfera interna, porque genocídio é um crime tipificado na legislação brasileira. Temos toda uma base também no direito brasileiro para discutir se o que está acontecendo aqui é um genocídio ou não ―e também temos a discussão internacional. Nada disso me parece uma questão sobre políticas públicas, mas sim uma questão sobre responsabilização individual. Precisamos responsabilizar criminalmente as pessoas que estão promovendo genocídio ou outros crimes contra a humanidade, como o de extermínio

P. O que você está dizendo é que, no que se refere à resposta do Governo brasileiro à covid-19, não se trata de incompetência, como alguns querem fazer crer. Você está afirmando que há dolo, há intenção. Além das declarações bem conhecidas do presidente Jair Bolsonaro, quais são os atos, publicados no Diário Oficial, que provam isso?

R. Mesmo naquela famosa declaração de 24 de março, em que o presidente usa a expressão “gripezinha” para se referir à covid-19, há muito mais do ponto de vista jurídico. No mesmo pronunciamento o presidente critica, por exemplo, o fechamento das escolas. Existe o que aparece mais, o mais comentado, mas também existem outros elementos que configuram que não se trata apenas de uma expressão infeliz. Imagine, numa corte internacional, um juiz que se defronta com uma fala de um presidente da República que, em plena pandemia, se pronuncia contra o fechamento das escolas...

P. E quanto aos atos, você poderia citar alguns?

R. Há muitos. Existe um enorme exemplo com relação à população em geral que é a lei 14.019, de 2 de julho, que trata do uso das máscaras. O presidente vetou a obrigação dos estabelecimentos comerciais de informar em cartazes a forma correta de usar as máscaras e vetou a obrigação dos estabelecimentos comerciais de afixar o número máximo de pessoas que deveriam estar lá dentro. Se construiu uma lei sobre o uso de máscaras para conter o avanço da pandemia, e perceba que esta lei é de 2 de julho, quando já estamos com dezenas de milhares de mortos e com a interiorização da doença. O presidente então veta essas obrigações. Entre outros vetos, veta a obrigação do uso da máscara no sistema carcerário, veta nos estabelecimentos de ensino e veta nos templos. Isso sim é banalização do veto. E são vetos contra a saúde pública. Outro exemplo é o atraso na sanção da norma que liberava recursos financeiros para os Estados. Este é um debate que chega a me causar arrepios. Muitos Estados estavam já sem recursos para comprar insumos, como respiradores e até sedativos. Os Estados então pedem essa ajuda, o Congresso aprova a ajuda e o presidente retarda ao máximo a sanção à lei que provê socorro financeiro aos Estados que estão na linha de frente da resposta. O que é isso senão obstaculizar a contenção da propagação da doença? Outra questão evidente. Quando o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), depois de pedir muitas vezes ajuda ao Governo Federal e de tentar muito conseguir insumos, especialmente respiradores, organiza uma compra, é ameaçado e a Receita Federal declara que haveria processo contra ele e todas as pessoas envolvidas. Mais. As ameaças de operações policiais contra os governadores, na tentativa de caracterizar a resposta à pandemia, a compra de insumos, como corrupção, como se gastos com hospitais de campanha e respiradores fossem necessariamente uma forma de enriquecimento ilícito. Há a substituição de quadros experientes do Ministério da Saúde, com grande conhecimento sobre a resposta a doenças infectocontagiosas, por pessoas sem nenhuma experiência. Segue. A tentativa de manipulação de dados da covid-19... Há ainda o uso de cloroquina, inclusive em comunidades indígenas. No começo a própria Organização Mundial da Saúde estava investigando a eficácia ou não. Mas, hoje, não há a menor dúvida. Além de tudo o que significa o uso da cloroquina, ainda se configura a intenção de iludir as pessoas de que existe uma forma de tratar a doença. Você quer mais exemplos? Posso continuar por algumas horas.

P. Acho que está claro.

R. É necessário entender que existem duas grandes vertentes para dizer da pertinência dos crimes contra a humanidade, inclusive o de genocídio. Uma é a vertente da comunicação e a outra é o ataque contra os Governos dos Estados. A comunicação é absolutamente criminosa, porque incita as pessoas a pensarem que a doença não é tão grave, incita a não se protegerem, e existe a obstrução constante por atos, constrangimentos e ameaças aos Governos locais que conduzem a resposta à pandemia.

P. E quanto aos povos indígenas, especificamente?

R. Com relação aos indígenas, duas questões são especialmente relevantes entre muitas. Sem hesitar, eu daria dois exemplos. O primeiro é o debate sobre o contato com os povos isolados. Uma portaria da Fundação Nacional do Índio, a portaria 419, se apresenta como uma portaria que vai coibir o contato com as comunidades isoladas. Só que, no meio, olhando com lupa, essa portaria abre uma exceção: a de que poderia haver o contato com as populações isoladas com autorização da Funai. O Governo tenta, sempre. A intenção é clara. Há então uma resposta muito forte da sociedade civil. Há uma recomendação do Ministério Público Federal, ainda em março, e então essa portaria é modificada. Mas a tentativa está lá. Em fevereiro deste ano, a Victoria Tauli-Corpuz, relatora da ONU para os povos indígenas, ao saber que um líder evangélico poderia chefiar a coordenação de povos isolados da Funai, já tinha apontado o potencial de produzir um genocídio. O genocídio está muito longe, portanto, da banalização. Estamos falando de uma relatora das Nações Unidas para os direitos dos povos indígenas. O segundo ponto ―e é até difícil falar tranquilamente sobre isso― é a lei do plano emergencial de enfrentamento da covid-19 nos territórios indígenas. Para começar a conversa: o plano emergencial é uma lei de 7 de julho ―7 de julho! Ou seja. Em julho nós vamos aprovar o plano emergencial para enfrentar uma emergência que foi declarada pela Organização Mundial da Saúde em 30 de janeiro e, pelo Brasil, em 3 de fevereiro. Aqui mesmo, no Brasil, já se reconhecia a emergência nacional desde fevereiro! E só em julho vão fazer o plano para combater a pandemia nos territórios indígenas. Bem, neste plano, a União precisa garantir um conjunto de medidas para enfrentar o vírus...

P. E Bolsonaro vetou a garantia de acesso à água potável aos povos indígenas...

R. Muita gente ficou chocada com o fato de o presidente da República vetar a garantia de acesso à água potável. Mas, se nós formos ler o conjunto dos vetos, vamos ver que vai muito além de uma suposta crueldade com relação à água. Foi vetada a obrigação de organizar o atendimento de média e alta complexidade nos centros urbanos, foi vetado o acompanhamento diferenciado dos casos que envolvam os indígenas, inclusive foi vetada a oferta emergencial de leitos hospitalares e de UTI. Foi vetada a obrigação de aquisição ou disponibilização de ventiladores de máquinas de oxigenação sanguínea, foi vetada a inclusão dos povos indígenas nos planos emergenciais de atendimento dos pacientes graves das secretarias municipais e estaduais, que inclusive obrigava o SUS a fazer o registro e a notificação da declaração de raça e de cor. Com este veto, se tenta dificultar a identificação dos indígenas atendidos no SUS. Veja como a comunicação é importante... Foi vetada a parte da obrigação de elaboração de materiais informativos sobre os sintomas da covid-19 em formatos diversos e por meios de rádios comunitárias e de redes sociais com tradução e linguagem acessível. Isso foi vetado. Foi vetada a obrigação de explicar para os indígenas a gravidade da doença! Foi vetada a obrigação de oferecer pontos de internet nas aldeia para não ser preciso se deslocar aos centros urbanos. Foi vetada a distribuição de cestas básicas, de sementes e ferramentas agrícolas a famílias indígenas. Por isso, eu afirmo: a questão vai muito além das frases de efeito, vai muito além de tudo aquilo que é promovido pelo Governo Federal para insuflar a sua base de apoio a odiar as instituições, a odiar os partidos de oposição, a odiar a população que é considerada por eles inferior e subalterna, como indígenas e negros, aqueles que atrapalham seus interesses e são considerados por eles um obstáculo do ponto de vista da racionalidade econômica que eles defendem.

P. Que racionalidade econômica é esta?

R. A racionalidade econômica que eles defendem é a do lucro imediato, a dos privilégios para os amigos do rei. E esta é uma racionalidade que sequer é uma preocupação com a economia do país. Não é. É uma preocupação com interesses de determinadas pessoas. A questão econômica é da maior importância na resposta à pandemia. Eu gosto muito do trabalho da (economista) Laura Carvalho, não só pela sua linguagem acessível, mas porque ela diz claramente que o problema da pandemia não são as medidas de contenção, é a pandemia em si. Morrer é muito ruim também para a economia de uma família. Sofrer por uma doença evitável é muito ruim também para a economia. Uma resposta séria para efetivamente conter a propagação da doença seria mais efetiva para a economia do que o negacionismo. O prefeito de Itabuna, na Bahia, falou muito claramente sobre o significado dessa posição, ao anunciar no início de julho que reabriria o comércio. Ele disse: “Morra quem morrer”. E se sabe exatamente quem vai morrer mais. Na elite brasileira vai haver algo que eles provavelmente vão chamar de dano colateral. Mas a regra, quando se observa o que tem acontecido no Brasil desde fevereiro, é que as pessoas que têm acesso principalmente à terapia intensiva têm muito mais chance de sobreviver, mesmo sendo idosas e mesmo tendo comorbidades. Não é possível dizer que os brasileiros, em geral, não têm acesso, porque nós temos o SUS, e em alguns locais o SUS conseguiu oferecer um tratamento de excelência, apesar das dificuldades. Mas o SUS não consegue atuar de forma igual em todos os lugares. Então, se sabe exatamente quem vai morrer mais.

P. No que se refere aos povos indígenas, que outros elementos mostram que pode ter acontecido o crime de genocídio contra eles?

R. A diferença essencial, que facilita a identificação do genocídio nas populações indígenas, é o interesse claro que existe em utilizar as terras, as riquezas naturais, em eliminar o “obstáculo” que estas figuras representam, na medida em que são os grandes guardiões da floresta, do meio ambiente, do patrimônio natural brasileiro. Eliminar esses guardiões facilitaria muito a apropriação de suas terras, basta ver o ritmo de desmatamento e de ocupação ilegal de terras protegidas que está ocorrendo no Brasil. O motivo do crime é evidente. A velha pergunta dos filmes de mistério ―quem ganha com o crime?― tem aqui uma resposta muito evidente.

P. Qual é a história do conceito de genocídio, para podermos entender melhor o que está em disputa nesse debate?

R. Começa com (Winston) Churchill, em outubro de 1943, quando vêm a público as atrocidades cometidas pelos nazistas. Ele diz: “Nós estamos diante de um crime sem nome”. E então um jurista polonês, Raphael Lemkin, publica um artigo, em novembro de 1943, afirmando: “Por genocídio nós entendemos a destruição de uma nação ou grupo étnico”. É ele que usa pela primeira vez essa palavra, combinando “genos”, do grego, que é raça ou tribo, com a palavra latina “cídio”, que significa matar. Nunca deixou de ser um conceito polêmico, em função do negacionismo e, principalmente, por causa do dilema de alguns países, que queriam punir o genocídio praticado por Hitler contra os judeus, mas que estavam fazendo seus genocídios alhures, como os próprios ingleses, os americanos, os franceses, que tinham o genocídio nas suas histórias, algumas até bem recentes. Então, como constituir o conceito de um crime que não fosse depois se voltar contra eles? O debate, portanto, sempre existiu. E o Lemkin já dizia neste artigo: “o genocídio não significa necessariamente a destruição imediata de uma nação, ele significa muito mais um plano coordenado de diferentes ações que visam à destruição dos fundamentos essenciais à vida de grupos, com objetivo de, mais adiante, exterminá-los”.

P. O fato de a palavra se originar com o holocausto judeu perpetrado por Hitler e pelos nazistas, na Segunda Guerra, não é também o que dificulta hoje, mesmo para juristas experientes, entenderem que estamos num outro momento da história? Assim como para alguns é difícil compreender que os golpes hoje nem sempre são com tanques na rua, como foram no séculos 20, não estaria sendo difícil compreender que, no tempo das pandemias e da emergência climática, a interpretação também precisa se atualizar porque os desafios e as ameaças são também outros?

R. Genocídio não é só colocar pessoas num paredão (ou numa câmara de gás) e fuzilar as pessoas. O genocídio se dá também ao suprimir as condições necessárias à vida e às condições à saúde. Eu trabalho há mais de 10 anos no estudo e pesquisa de pandemias e da Organização Mundial da Saúde. As pessoas achavam curioso que alguém do direito internacional se interessasse por esses assuntos. Agora já não precisa mais explicar por que fiz minha livre docência sobre a gripe H1N1. Há algo novo que os sistemas internacionais vão ter que levar em conta. O fato de não haver um precedente significa apenas que, na contemporaneidade, a humanidade não tinha chegado a essa fase da história. Com toda a tecnologia e ciência, é a primeira vez que nos confrontamos com um fenômeno dessa magnitude. A grande maioria dos Estados fez o máximo possível com as condições que tinha para enfrentar essa situação. Não foi esta a decisão do Estado brasileiro.

P. Algumas pessoas confundem o negacionismo como algo equivocado, porém honesto, no sentido de que os negacionistas realmente acreditariam na não existência de algo. Claramente, porém, o negacionismo é uma manipulação e uma estratégia...

R. O negacionismo surge, historicamente, justamente com relação ao holocausto. Essa palavra vai surgir nos ambientes universitários dos anos 70, dos anos 80, para se referir a algumas teses acadêmicas e discursos políticos que diziam que o holocausto judeu ou não foi tão grave assim ou não ocorreu. É muito interessante isso. As extremas direitas europeias, e principalmente a francesa, não tinham condições de se apresentar politicamente com suas ideias diante da monstruosidade do que aconteceu com o povo judeu. Então, como estava claro que essas ideias fascistas necessariamente levam ao extermínio e ao genocídio, para que se tornassem palatáveis de novo era preciso negar o que aconteceu. Do contrário, não haveria como se apresentar de novo no espaço público. Universidades francesas importantes acabaram envolvidas nesse escândalo por permitirem a existência de teses que afirmavam que ou não foi tão grande assim ―a banalização― ou não aconteceu. A coerência não é algo importante para a extrema direita, nunca foi. É aí que surge essa expressão ―negacionismo. Os judeus são obrigados a, periodicamente, provar que o holocausto aconteceu porque os negacionistas jogam com o que se chama ônus da prova. Eles não provam que não aconteceu, mas te obrigam a cada momento a provar que aconteceu.

P. Como acontece, especialmente nesse Governo, com a memória da ditadura militar (1964-1985) no Brasil....

R. Sim. E aí eu quero dizer, muito enfaticamente, que isso vai acontecer conosco com relação à pandemia de covid-19 no Brasil. Periodicamente, nós vamos ter que provar essas dezenas de milhares de mortes. Periodicamente, nós vamos ter que voltar a explicar como aconteceu. Tenho certeza absoluta que essa disputa vai acontecer. Será preciso fazer um memorial para esses mortos. A história terá que ser contada de forma incessante. Da mesma forma que acontece com as vítimas da ditadura militar, haverá desmentidos. Entendo a preocupação de preservar o termo genocídio, mas o fulcro do que estou dizendo desde que começamos a conversar é que não há exagero em falar de crimes contra a humanidade com relação ao que está acontecendo hoje no Brasil referente à covid-19. Por tudo o que já falei e porque essas mortes eram evitáveis.

P. Como fica claro que essas mortes seriam evitáveis?

R. O Brasil não é um país miserável, que não tem sistema de saúde e estava fadado a ter uma evolução trágica da doença. O Brasil é referência internacional de cobertura universal de saúde. Nos países em desenvolvimento, não há nada como o nosso Sistema Único de Saúde. O Brasil tem profissionais de saúde de altíssimo nível, sanitaristas de altíssimo nível, todos ejetados do Ministério da Saúde. O Brasil tinha todos os quesitos para ter uma das melhores respostas do mundo à covid-19. Muitos brasileiros pensavam que o Brasil não tinha dinheiro. E nós descobrimos que o Brasil tem muito dinheiro, que uma parte muito significativa do PIB foi destinada à resposta à covid-19, mas ela não tem chegado onde precisa chegar, por uma série de razões, entre elas as que eu já mencionei. Então, como é possível? Poderíamos ter tido uma realidade em que todas as autoridades alertassem para a doença, pedissem para a população ficar em casa apoiando as medidas e, por alguma razão, o sistema tivesse uma disfunção. Mas não é nem de longe o que estamos vivendo no Brasil. Nós não temos um governo federal que aja no sentido de conter a pandemia mas não tem êxito. Ao contrário. Existe uma obstrução reiterada, com a justificativa de proteger a economia brasileira, uma justificativa pífia, que quem entende de economia diz que não é sequer a melhor forma de proteger a economia. E quero chamar muito enfaticamente a atenção para a comunicação. A comunicação de risco durante a emergência é um dos principais pilares do enfrentamento em todos os manuais. O primeiro ponto é a confiança nas autoridades sanitárias, o segundo ponto é a comunicação clara, inclusive de incertezas científicas sobre o que está ocorrendo. Em nenhum momento podemos subestimar a comunicação como elemento de resposta. Na comunicação, assim como em tantos pontos, a intencionalidade de não deixar a população se proteger como deveria é claríssima.

P. O que diz exatamente a legislação?

R. O conceito de genocídio, na legislação brasileira (Lei 2.889, de 1º de Outubro de 1956), é límpido. Começa referindo-se à intenção de destruir no todo ou em parte um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. Refere-se a matar membros do grupo, causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo, submeter o grupo ou membros do grupo a condições de existência capaz de ocasionar a destruição física total ou parcial, assim como adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo e efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo. Também menciona a incitação direta ou indireta e diz ainda que a pena será agravada em um terço quando o crime for cometido por governante ou funcionário público.

P. Em quais destes casos o Governo brasileiro se enquadraria, no que diz respeito à resposta à covid-19?

R. Causar lesão grave física ou mental a membros do grupo, isso me parece evidente nos argumentos que já mencionei. Submeter o grupo a condições de existência capazes de ocasionar a destruição física parcial ou total, está mais do que claro. Imagina, o Governo vetou até mesmo a obrigação de realizar uma campanha para os indígenas traduzida nos seus idiomas, explicando a gravidade da doença. No Tribunal Penal Internacional, o conceito é semelhante. Me parece que, em relação aos indígenas, existe uma circunscrição geográfica que facilita a configuração da prova da prática desse crime num eventual processo. Essa tipificação do crime entre os indígenas me parece ter um amplo leque de evidências. Ninguém pode, porém, ser condenado previamente. O que estamos dizendo é que é possível que esse crime esteja acontecendo e que isso precisa ser investigado nessa clivagem, como crime de genocídio. O que é muito importante é que não exista mais lugar para o argumento da banalização da palavra genocídio. Que deixe de ser considerado algo distante, denuncista ou absurdo e passe a ser investigado.

P. E quanto aos negros que, segundo pesquisas, são a maioria dos que morrem por covid-19?

R. Na população negra, eu vejo muito mais do que matar ou deixar morrer, o que também é um crime contra humanidade. Quando o Governo faz essa série de ações que obstaculizam a prevenção e o combate à covid-19, ele joga com a evolução natural da doença: se deixar a evolução natural da doença rolar sem intervenções mais efetivas, a tendência é que ela atinja mais as populações vulneráveis e extermine esses atores, cujas vidas consideraria que não importam. Na população em geral, os caminhos do crime contra a humanidade são mais velados do que os crimes contra as populações indígenas.

P. Já ouvi pessoas dizendo que até agora morreram “poucos” indígenas, para se considerar genocídio (cerca de 500, segundo organizações indígenas). É uma afirmação bastante terrível, para dizer o mínimo, mas é importante perguntar, para que todos possam compreender um debate que diz respeito não só aos brasileiros, mas à população global: para ser considerado genocídio ou extermínio é necessário um número elevado de mortes?

R. Do ponto de vista da tipificação do crime, do ponto de vista técnico, é irrelevante o número de pessoas que morreram. Nem na lei brasileira nem na lei internacional existe um número mínimo de pessoas para configurar genocídio. Para a tipificação do crime, a essência é a intenção de destruir total ou parcialmente um grupo. Uma intenção que não necessariamente vai resultar em mortes. É claro que, do ponto de vista ético, o número de mortes é totalmente relevante. Mas, como disse antes, mesmo a tentativa de genocídio é punível.

P. Uma outra pergunta bem óbvia, mas importante. No caso de uma ação de genocídio no Tribunal Penal Internacional, quem é responsabilizado é a pessoa, não o governo, certo? Poderia, por exemplo, no caso brasileiro, serem responsabilizados o presidente Jair Bolsonaro e os generais, assim como outros funcionários com poder de decisão?

R. Sim. O TPI é uma grande conquista da humanidade também porque ele permite responsabilizar pessoas por crime contra a humanidade. Alguém chega ao poder em determinado Estado, mas há limites do que pode fazer ao exercer seu poder contra o próprio povo. Existem gestos que agora têm nome e são tipificados, e o mais grave deles é o genocídio. Há possibilidade de processar chefes de Estado, generais, grandes empresários, grileiros, funcionários públicos com cargos de responsabilidade, pessoas que participaram do crime.

P. Você defende que esse debate precisa ser feito e que precisa ser feito com serenidade, porque é importante para o Brasil. Por que é importante?

R. Só o fato de debater já é importante. Pode levar anos para o TPI decidir se abre a investigação ou não. Mas a construção de denúncias bem fundamentadas tecnicamente é um processo no qual todos ganham. O Brasil ganha, e as instituições brasileiras ganham.

P. Por quê?

R. Processos que são movidos em busca da justiça, para responsabilizar pessoas que atentam contra a vida de populações vulneráveis ou contra grupos específicos, como os indígenas, são processos que fazem emergir a verdade. O processo vai dando voz às vítimas, oportunizando que sejam escutadas nas mais diversas instâncias. A construção, organização e sistematização dessas provas vão despertando a consciência das pessoas. No Brasil, o mais importante é mostrar que o que está acontecendo vai muito além de um debate vulgar sobre questões da maior gravidade, vai muito além da suposta incompetência do Governo federal na resposta à covid-19. Um processo faz com que a verdade apareça na voz das vítimas ou de seus familiares. Vai mostrando que não é só uma forma infeliz de se manifestar, não é só ignorância, não é só incompetência. Existe uma intencionalidade. No caso de uma ação por genocídio ou por outro crime contra a humanidade, como o extermínio, o caminho é mais importante do que o destino.

P. Por que então uma reação tão forte à declaração do ministro Gilmar Mendes, mesmo entre pessoas que se opõem ao Governo Bolsonaro?

R. Acredito que a reação à fala de Gilmar Mendes tem duas causas. Uma delas é de que o presidente estaria supostamente mais calmo. Em função da prisão do (Fabricio) Queiroz, ele modificou suas estratégias de ataque às instituições. Neste momento, em que a tensão supostamente está diminuindo, um ministro do STF usa uma expressão referente ao pior tipo de crime que pode existir. E utiliza uma expressão que tem transcendência internacional imediata, porque o mundo inteiro sabe o que é um genocídio. Fica parecendo então que é um gesto que gera tensão num momento em que supostamente as tensões estariam sendo aliviadas. E eu digo supostamente porque, neste momento de pandemia, temos acompanhado o Diário Oficial todos os dias. Quando a gente vê atos como os vetos ao plano emergencial para os indígenas, a gente vê que a tensão não está baixando de forma alguma. O segundo elemento é a dificuldade de identificar essa sistematicidade no ataque às tentativas de controle da pandemia. No dia a dia, esses elementos vão sendo interpretados como vulgaridade, leviandade, incompetência. Mas esse fio do tempo, com ações concretas, este que demonstra o ataque sistemático à saúde pública, fica menos visível. Acredito que muitas pessoas, com a melhor das intenções, dizem que não vai levar a nada discutir a tipificação como crimes contra a humanidade porque é uma questão política, porque seria um caso para o sistema de controle dos direitos humanos, onde o Estado pode ser responsabilizado. Eu não concordo com isso. Acredito que existem pessoas agindo de uma forma sistemática contra a saúde pública e a vida dos brasileiros. Eu teria muita dificuldade de dizer que relacionar a morte de mais de 80.000 pessoas como crime contra a humanidade seja banalizar a palavra genocídio. E não apenas pelo número de pessoas, mas principalmente, é importante repetir, porque essas mortes seriam evitáveis.

P. Você afirmaria que o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, é um genocida?

R. Eu afirmo que é preciso investigar a acusação de genocídio com relação ao presidente do Brasil. Se queremos dar densidade técnica a esse debate, não podemos condenar antes do julgamento. Devemos denunciar e esperar a decisão. Tanto que, no jornalismo, quando alguém é acusado de um crime, vocês se referem a ele como suspeito. Acho que esse é um valor a se preservar. Acredito que o presidente do Brasil é suspeito de crimes contra a humanidade, entre eles o genocídio. E o caminho pelo qual formulamos essa acusação é um caminho importante para a sociedade brasileira, porque é mais um indicativo da gravidade do que está acontecendo e que algumas pessoas estão encarando de uma forma bastante irresponsável. Permitir que esses comportamentos existam e se repitam é muito grave. Nós precisamos discutir com a tranquilidade e com a seriedade que assuntos desse tipo exigem. E faz parte disso não prejulgar. Não se referir a alguém que ainda não foi condenado como se já o tivesse sido. Mas não tenho nenhum problema em dizer que diversas autoridades brasileiras, entre elas o presidente da República, me parecem suspeitas de crimes contra a humanidade e precisam ser investigadas.

Publicada em EL PAÍS, em 22.07.2020

Movimentos sociais convocam panelaço e ganham adesão de celebridades

Luciano Huck, Daniela Mercury e as deputadas Tabata Amaral e Dayane Pimentel apoiaram a iniciativa, marcada para esta sexta

Na esteira da crise da falta de oxigênio em Manaus e diante da possibilidade de uma escassez nacional do gás, essencial para o tratamento de casos mais graves de covid-19, movimentos sociais passaram a convocar um panelaço anti-bolsonaro para esta sexta-feira, dia 15, às 20h30. A iniciativa ganhou a adesão do apresentador Luciano Huck, além de outras celebrdades e políticos.

Às 11h10, Huck compartilhou em seu perfil no twitter uma imagem com as palavras: "Sem oxigênio, sem vacina, sem governo. Panelaço sexta 15.01 20h30 #BrasilSufocado". Os temos "#ImpeachmentBolsonaroUrgente", "Luciano Huck" e "panelaço"  entraram para os trending topics do Twitter no início da tarde.

A hashtag "#BrasilSufocado" e a convocação do panelaço começaram a ser disseminadas pela Frente Povo Sem Medo – organização que reúne movimentos sociais, centrais sindicais e partidos de esquerda – às 8h55. Desde então, a iniciativa foi abraçada por Huck e outras celebridades, como Daniela Mercury, além de políticos como as deputadas federais Tabata Amaral (PDT-SP) e Professora Dayane Pimentel (PSL-BA). 

A iniciativa ocorre um dia após o agravamento da situação do Amazonas. Com a nova explosão de casos de covid-19 no Estado, o estoque de oxigênio acabou em vários hospitais de Manaus nesta quinta-feira, 14, levando pacientes internados à morte por asfixia, segundo relatos de médicos que trabalham na capital amazonense. O governo federal anunciou que vai transferir pacientes para outros Estados e pediu ajuda aos Estados Unidos com o fornecimento de um avião adequado para levar cilindros a Manaus.

De acordo com o Secretário de Saúde do Amazonas, Marcellus Campêlo, a nova variante do coronavírus que circula em Manaus causou "forte impacto" e "aumento súbito de internações". Ele alertou na quinta para a possibilidade de que, caso o mesmo ocorra em várias regiões do País, pode haver uma escassez nacional de oxigênio.

O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta sexta que o governo já fez a sua parte em relação à crise no Estado. Ele disse ter enviado recursos e outros meios ao Amazonas para o enfrentamento da pandemia. Na quinta, o vice-presidente, Hamilton Mourão, também havia saído em defesa do governo, dizendo que não era possível prever a situação em Manaus.

Redação, O Estado de S.Paulo, em 15 de janeiro de 2021 | 15h35

Mundo ultrapassa marca de 2 milhões de mortos por covid-19, diz universidade

De acordo com a contagem da Universidade Johns Hopkins, 2.000.905 pessoas morreram por causa do coronavírus em mais de 93,4 milhões de casos

O mundo ultrapassou nesta sexta-feira, 15, os 2 milhões de mortos por covid-19, de acordo com a contagem da Universidade Johns Hopkins. Segundo o levantamento, 2.000.905 pessoas morreram por causa do vírus SARS-CoV-2 em mais de 93,4 milhões de casos. A taxa de letalidade da doença atual é de 2,1%. A nova marca é atingida em um momento em que vacinas estão sendo desenvolvidas a uma velocidade atípica e lançadas em todo o mundo em uma grande campanha para tentar vencer a ameaça.

O primeiro milhão de vítimas do coronavírus foi atingido em 29 de setembro, mais de nove meses depois (274 dias) de os primeiros casos terem sido reportados em Wuhan, na China. Este segundo milhão foi atingido em menos da metade do tempo: 108 dias.

Os países com mais mortes contabilizadas são Estados Unidos (389.581 mortes em 23,4 milhões de casos); Brasil (207.095 mortes em 8,3 milhões de casos); Índia (151.918 mortes em 10,5 milhões de casos); México (137.916 mortes em 1,6 milhões de casos); e Reino Unido (87.448 mortes em 3,3 milhões de casos).

Em jantar de Ação de Graças em família, em novembro, Vivian Zayas segura andador que pertencia a sua mãe, Ana Martinez, que morreu por causa da covid-19; vítimas passam de 2 milhões  Foto: John Minchillo/AP

O número de mortos compilados pela universidade é quase igual ao da população de Bruxelas, Meca, Minsk ou Viena. É aproximadamente equivalente à população da área metropolitana de Cleveland ou de todo o Estado de Nebraska.

Embora a contagem seja baseada em números fornecidos por agências governamentais em todo o mundo, acredita-se que a soma real seja significativamente maior, em parte por causa de testes inadequados e a muitas mortes que foram atribuídas imprecisamente a outras causas, especialmente no início do surto.

"Atrás deste número terrível estão nomes e rostos, o sorriso que agora é apenas uma memória, o assento para sempre vazio na mesa de jantar, a sala que ecoa com o silêncio de um ente querido", disse o secretário-geral da ONU, António Guterres. "A ciência teve sucesso, mas a solidariedade falhou."

Em países ricos, incluindo Estados Unidos, Reino Unido, Israel, Canadá e Alemanha, milhões de cidadãos já receberam alguma medida de proteção com pelo menos uma dose de vacina desenvolvida com uma revolucionária velocidade e rapidamente autorizada para uso.

Paciente com covid-19 é tratado em hospital na região da Cidade do Cabo, na África do Sul  Foto: RODGER BOSCH / AFP

Mas em outros lugares, as iniciativas de imunização mal saíram do papel. Muitos especialistas estão prevendo mais um ano de perdas e dificuldades em lugares como Irã, Índia, México e Brasil, que juntos respondem por cerca de um quarto das mortes do mundo./COM AP 

Redação, O Estado de S.Paulo, em 15 de janeiro de 2021 | 15h30

Três semanas antes de colapso, governo elevou imposto de importação sobre cilindros de oxigênio

Câmara de Comércio Exterior (Camex) deve se reunir ainda hoje para reverter aumento após repercussão negativa em meio à crise de coronavírus em Manaus

 Três semanas antes de a rede hospitalar de Manaus entrar em colapso pela falta de oxigênio, o governo elevou o imposto de importação sobre cilindros usados no armazenamento de gases medicinais, que estavam isentos desde março de 2020, para facilitar as medidas de combate à covid-19. Segundo apurou o Broadcast, a Câmara de Comércio Exterior (Camex) deve se reunir ainda hoje para reverter a situação após repercussão negativa frente à crise de coronavírus em Manaus. 

Os cilindros de ferro adquiridos do exterior voltaram a ser taxados em 14%, e os cilindros de alumínio, em 16%, conforme resolução do Comitê-Executivo de Gestão (Gecex) da Camex, de 24 de dezembro de 2020, revogando a isenção de 185 itens que estavam até então na lista de produtos considerados prioritários no combate à covid-19. Na prática, o fim da isenção tornou mais custosa a aquisição desses produtos. 

(Com alta demanda por oxigênio em Manaus, produção não chega a metade do consumo)

Amazonas

Trabalhadores da Universidade Federal do Amazonas carregam tanques de oxigênio vazios no Hospital Getúlio Vargas Foto: Edmar Barros/ AP

A secretaria-executiva da Camex é ligada ao Ministério da Economia. Procurada, a pasta informou que as decisões de redução tarifária para auxiliar no combate à covid-19 são tomadas “com base nas recomendações do Ministério da Saúde, que é autoridade finalística sobre o assunto no âmbito do governo federal”. O Ministério da Saúde ainda não se manifestou sobre o tema.

Manaus sem oxigênio

Com a nova explosão de casos de covid-19 no Amazonas, o estoque de oxigênio acabou em vários hospitais de Manaus na quinta-feira, 14, segundo relatos de médicos. Pacientes morreram por asfixia, e familiares deflagraram uma corrida na tentativa de adquirir cilindros do gás com recursos próprios.

O governo federal anunciou que, nesta sexta-feira, começou a transferir pacientes para outros Estados. O Brasil também pediu ajuda aos Estados Unidos com o fornecimento de um avião adequado para levar cilindros de oxigênio a Manaus.

Isenções para armas e pneus

Apesar de ter elevado o imposto de importação para itens considerados essenciais no combate à covid-19, o governo tem zerado tarifas de importação para setores que têm a simpatia do presidente Jair Bolsonaro.

No início de dezembro, a Camex zerou tarifas de importação para revólveres e pistolas. A medida acabou sendo suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro da Economia, Paulo Guedes, informou à época que a isenção teria impacto de R$ 230 milhões ao ano e considerou o custo “muito baixo”.

Na quinta-feira, 14, no mesmo dia do colapso em Manaus pela falta de oxigênio, Bolsonaro afirmou que o governo deve zerar a tarifa de importação de pneus. “Agora o que eu fiz, espero que esse ministro agora não queira dar uma canetada né. Porque pela Camex são tarifas, não é imposto. A tarifa de importação de pneus, que interessa os caminhoneiros, está em torno de 16%, que interessa os caminhoneiros. Conversei com o Paulo Guedes, vamos zerar", declarou.

Tarifas cheias

Governo retomou tarifas de importação de 185 produtos usados no combate à covid-19

Aparelhos respiratórios

Cilindros de ferro e alumínio para gases medicinais, como oxigênio

Geradores para sistema central de fornecimento de oxigênio de grau médico

Medidores e sensores de fluxo para oxigênio

Compressores medicinais, para fornecimento de ar comprimido

Suportes metálicos para circuitos respiratórios

Aparelhos respiratórios de reanimação

Bombas de ar elétrica para aplicação médica

Aparelhos de oxigenoterapia

Filtros antibacterianos da entrada de oxigênio, para ventiladores médicos

Carcaças e partes plásticas de  ventiladores médicos

Válvulas solenoides para ventiladores pulmonares

Conjunto de acessórios para teste de performance e funcionamento de respiradores médicos

Procedimentos médicos / cirúrgicos

Conectores plásticos para infusão intravenosa

Extensores de catéte

Torniquetes para coleta de sangue

Pastas, gazes, ligaduras e palitos de algodão

Gel lubrificante para procedimentos médicos

Equipamentos de higiene e segurança

Álcool etílico com teor de 70% ou mais

Sabão medicinal

Desinfetantes para dispositivos médicos

Presilhas plásticas para máscaras de proteção individual

Cortinas estéreis e coberturas de plástico para salas cirúrgicas

Vestuário de proteção de borracha

Capacete de proteção para uso em medicina

Sacos de eliminação de resíduos de risco biológico

Toalhas com gluconato de clorexidina para higiene de pacientes em isolamento

Idiana Tomazelli, Eduardo Rodrigues e Mateus Vargas, O Estado de S.Paulo, em 15 de janeiro de 2021 | 16h12

Manaus vai transferir bebês prematuros para outros Estados

Sistema de saúde do Amazonas vive colapso com recordes de internação devido ao alto contágio do novo coronavírus e falta de oxigênio. Secretário da Saúde de SP disse que contatou o governo do Amazonas para saber quantos bebês e grávidas precisam de atendimento.

Bebês recém-nascidos em UTI da Santa Casa de São José dos Campos, em São Paulo. — Foto: Divulgação/Santa Casa SJC

A Secretaria de Estado da Saúde do Amazonas informou nesta sexta-feira (15) que vai transferir para outros estados brasileiros bebês prematuros internados em maternidades públicas amazonenses, por conta da falta de oxigênio dos hospitais. O sistema de saúde amazonense entrou em colapso após as internações por Covid-19 no estado baterem recorde (veja mais abaixo).

Segundo a secretaria, os recém-nascidos serão transferidos a partir da autorização dos pais e serão acompanhados pelas mães nos voos que estão sendo preparados pelas autoridades locais.

O governo amazonense não informou a quantidade de bebês que serão transferidos, mas disse que “técnicos da secretaria estão trabalhando no planejamento da logística de transferência” e a os recém-nascidos "passarão por avaliação clínica" para saber se têm condições de transferência.

Os estados que receberão os bebês transferidos ainda não foram divulgados pelas autoridades amazonenses, mas nesta sexta o governo de São Paulo anunciou que vai disponibilizar leitos e assistência médica para bebês e gestantes internados em Manaus e que correm o risco de ficar sem oxigênio.

O governo do Paraná também ofereceu leitos de UTI neonatal para pacientes do Amazonas nesta sexta (15). De acordo com a secretaria estadual do Paraná, há a necessidade de transferência de 61 pacientes recém-nascidos.


Projeção no centro da cidade de São Paulo, SP, com os dizeres ¨Oxigênio pra Manaus¨, nesta quinta feira, 14. — Foto: ALLISON SALES/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

O secretário da Saúde de SP, Jean Gorinchteyn, disse em coletiva de imprensa que tomou conhecimento da necessidade de leitos por meio da imprensa e prontamente entrou em contato com a secretaria da Saúde do Amazonas para oferecer suporte.

"Imediatamente já fizemos contato com o secretário da Saúde do Estado do Amazonas, o doutor Marcellus. Ele está fazendo um levantamento porque vários estados, de forma humanitária, estão acolhendo esses bebês. E não são apenas bebês, mas são também mulheres grávidas. São essas gestantes que também foram comprometidas pelo Covid e que necessitam de assistência. Então desta forma nós queremos saber quantas ainda precisam da nossa assistência e prontamente estaremos acolhendo aqui em SP", disse Gorinchteyn.

Jean Gorinchteyn — Foto: Reprodução/GloboNews

Durante a coletiva de imprensa, o governador João Doria demonstrou irritação com a falta de oxigênio para bebês em Manaus.

"Acabo de falar com o secretário de Saúde e São Paulo atenderá integralmente esses 60 bebês. Eu já pedi a ele, ao término da coletiva, para falar com o secretário de estado do Amazonas. Nós acolheremos todos os bebês que puderem ser transportados aqui pra SP. É o fim do mundo isso. Pra quem é pai e quem é mãe, não tem oxigênio pra bebê? A irresponsabilidade do governo Bolsonaro, me choca isso, como brasileiro", disse Doria.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou nesta sexta-feira, 15, durante coletiva de imprensa no Palácio dos Bandeirantes, na zona sul da capital paulista, o endurecimento das regras de quarentena no Estado a fim de conter o avanço da covid-19. — Foto: VINICIUS NUNES/AGÊNCIA F8/ESTADÃO CONTEÚDO

Paraná oferece leitos

O Paraná ofereceu 25 leitos de UTI neonatal para pacientes do Amazonas, segundo a Secretaria Estadual da Saúde (Sesa). O pedido de ajuda foi feito pelo Ministério da Saúde.

Não há confirmação de que o Paraná vá receber de fato os bebês. Segundo a Sesa, se a transferência acontecer, o transporte deve ser realizado pelo Ministério da Saúde.

Os leitos oferecidos ficam em Campo Largo, na Região Metropolitana de Curitiba. São 15 leitos de UTI neonatal no Hospital do Rocio e outros 10 no Hospital Infantil Waldemar Monastier, em Campo Largo.

Paraná ofereceu 25 leitos de UTI neonatal para pacientes do Amazonas — Foto: Divulgação/Sesa

Envio de respiradores

O governador de SP anunciou também que irá enviar quarenta respiradores a cidade de Manaus. Segundo João Doria (PSDB), os respiradores que serão enviados são desenvolvidos pela Universidade de São Paulo (USP). O governador disse ainda que o estado vai oferecer leitos em hospitais públicos e privados para pacientes do Amazonas que puderem ser transportados até São Paulo.

"Solicitei à USP para encaminharmos imediatamente para o Amazonas quarenta respiradores. Quarenta respiradores produzidos na Universidade de São Paulo, demonstrando a capacidade tecnológica desta grande universidade para o atendimento emergencial àqueles que estão sofrendo com a Covid-19 no estado do Amazonas.", disse Doria.

"Orientei também o nosso secretário da saúde em SP a disponibilizar leitos nos hospitais públicos e a gerenciar leitos em hospitais privados para aqueles que puderem ser transportados até São Paulo para o atendimento prioritário", completou.

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), apresenta o respirador produzido pela Universidade de São Paulo (SP) que será enviado para Manaus, durante coletiva de imprensa no Palácio dos Bandeirantes, na zona sul da capital paulista, nesta sexta-feira, 15 de janeiro de 2021. — Foto: VINICIUS NUNES/AGÊNCIA F8/ESTADÃO CONTEÚDO

Durante coletiva de imprensa nesta sexta, Doria voltou a fazer críticas ao governo federal e responsabilizou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pela crise no Amazonas.

"Tenho a sensação de que o governo Bolsonaro gosta do cheiro da morte, e não de celebrar a vida, pois se quisesse celebrar a vida já teria contribuído com o estado do Amazonas para oferecer condições mínimas de atendimento aos brasileiros que lá vivem. Não teríamos assistido às cenas dramáticas que vimos ontem na televisão", afirmou o governador.

Segundo Marcelo Zuffo, professor da USP e responsável pelos equipamentos de suporte à respiração, os primeiros respiradores devem ser enviados ainda nesta sexta (15) para cinco hospitais da cidade. A previsão é a de que todos eles cheguem à região de Manaus até a próxima terça-feira (19).

"Há praticamente dez dias nós estamos em forte interação com cinco hospitais de Manaus: Santa Júlia, Santa Alberta, Delfina, Hospital Adventista e o Beneficência, e foi constituída uma comunidade para receber esses ventiladores e hoje nós começamos a embarcar os primeiros lotes. Até terça da semana que vem nós teremos 40 ventiladores em pleno uso na região de Manaus", disse Zuffo.

De acordo com o governador, uma companhia aérea vai fazer o transporte dos equipamentos até Manaus.

"Conseguimos a solidariedade da Latam para encaminhar, transportar e entregar imediatamente à Secretaria da Saúde do Estado do Amazonas esses 40 respiradores. É uma pequena ajuda, mas é um sentimento solidário do estado de SP aos seus irmãos do estado do Amazonas", disse Doria.

Colapso em Manaus

Amazonas está sob toque de recolher por 10 dias

Sobrecarregados, os hospitais de Manaus ficaram sem oxigênios para pacientes. Médicos transportando cilindros nos próprios carros para levar ao hospital e familiares tentando comprar o insumo foram algumas das cenas registradas pelo G1 nesta quinta. Doentes começaram a ser levados para outros estados. Cemitérios estão lotados e instalaram câmaras frigoríficas.

Dois aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) carregados com cilindros de oxigênio chegaram a Manaus no início da madrugada desta sexta-feira (15). Eles foram enviados de Guarulhos para ajudar na crise de saúde que assola o estado do Amazonas.

No total, 386 cilindros de oxigênio foram transportados, com mais de 18 toneladas. Eles serão utilizados pelos hospitais no atendimento aos pacientes da Covid-19 no estado.

Nesta quinta (15), (ontem),  durante transmissão ao vivo por uma rede social ao lado do presidente Jair Bolsonaro, Pazuello havia dito que há um "colapso" no sistema de saúde de Manaus.

No último domingo, o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), enviou um pedido de ajuda aos governadores do país por conta da "iminência de sofrer desabastecimento" de oxigênio.

A partir desta sexta-feira (15), o estado iniciou toque de recolher por 10 dias. Ninguém pode sair de casa entre 19h e 6h. A medida é uma tentativa de conter a propagação do vírus.

Mais ajuda

A empresa White Martins, principal fornecedora de oxigênio do governo do Amazonas, também conseguiu disponibilizar cilindros para o estado. A Polícia Militar da Ronda Ostensiva Cândido Mariano (Rocam) realizou, na tarde de quinta-feira (14), a escolta de cilindros de oxigênio destinados a pacientes internados com Covid-19.

Policiais militares levam cilindros de oxigênio para Manaus — Foto: Divulgação/PMAM

Os cilindros chegaram pelo Aeroporto Internacional Eduardo Gomes e foram entregues à Central de Medicamentos do Amazonas (Cema), no bairro Praça 14, zona sul de Manaus, segundo nota da PM.

Ao todo, foram 150 cilindros, sendo 80 destinados ao interior do estado e os outros 70 para unidades hospitalares da capital.

De acordo com a Polícia Militar, duas viaturas com oito policiais realizaram a escolta dos cilindros de oxigênio para agilizar a chegada do material, principalmente em razão do tráfego e da necessidade de dar celeridade à entrega.A empresa também informou ter identificado a disponibilidade do produto em suas operações na Venezuela e que "neste momento está atuando para viabilizar a importação do produto para a região".

Recorde de casos

Nesta quinta-feira, o estado do Amazonas registrou 3.816 novos casos de Covid-19, sendo 2.516 somente em Manaus. Foi o maior número de novos casos registrados no estado e na capital amazonense desde o início da pandemia, em março de 2020.

Com os números desta quinta, o total de casos confirmados da doença chega a 223.360 em todo o estado, segundo dados do boletim divulgado pela Fundação de Vigilância em Saúde (FVS).

O número de mortes subiu para 5.930, com mais 51 mortes causadas pela doença. Do total, 44 óbitos ocorreram nas últimas 24 horas e outros sete foram registrados em dias anteriores, mas confirmados agora. Além disso, foram 254 novas hospitalizações apenas na capital.

Manaus voltou a bater o recorde de internações diárias. Foram 254 novas hospitalizações na capital, número mais alto registrado no estado desde o início da pandemia, mesmo com o colapso na rede de saúde vivido entre abril e maio de 2020. Outras quatro internações foram registradas no interior do estado, fazendo o total de casos chegar a 258 no estado.

Maior pronto-socorro de Manaus pede que famílias levem cilindros de oxigênio

Médicos cobram Conselho Federal de Medicina por atuação na pandemiaCaos em Manaus faz governo reavaliar cerimônia de vacinação e Pazuello é criticado.

Publicado por G1, em 15.01.2021

Biden anuncia pacote de estímulo de quase US$ 2 trilhões

Para revitalizar a maior economia do mundo em meio à pandemia, "Plano de resgate americano" apresentado pelo presidente eleito inclui auxílio a desempregados e escolas e investimento na vacinação.

"Não há tempo a perder, temos que agir agora", disse Biden

O presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou nesta quinta-feira (15/01) que vai propor ao Congresso um pacote de estímulo econômico no valor de 1,9 trilhão de dólares para acelerar a vacinação contra a covid-19 e auxiliar financeiramente indivíduos, estados, governos locais e empresas que sofrem os efeitos da pandemia.

Chamado de "Plano de resgate americano", o pacote de ajuda inclui 415 bilhões de dólares para impulsionar a resposta ao coronavírus e a vacinação contra a covid-19, cerca de 1 trilhão de dólares em alívio direto às famílias, e cerca de 440 bilhões de dólares para pequenas empresas e comunidades particularmente atingidas pela pandemia.

O plano foi apresentado num momento em que o país, politicamente dividido, enfrenta a mais perigosa onda da covid-19 até agora. Até o momento, mais de 388 mil pessoas morreram da doença nos EUA. Mais de 965 mil se registraram como desempregados na última semana, sinalizando que a alta das infecções tem forçado empresas a demitir.

Durante a campanha eleitoral, Biden prometeu levar a pandemia mais a sério do que o presidente Donald Trump, e o pacote apresentado tem como objetivo transformar a promessa em ação e revitalizar a maior economia do mundo.

"Uma crise de sofrimento humano profundo está à vista de todos, e não há tempo a perder", disse Biden ao apresentar a proposta nesta quinta. "Temos que agir e temos que agir agora."

Empresas, desempregados, escolas

A proposta de Biden inclui pagamentos diretos de 1.400 dólares para grande parte do americanos, que se somariam aos 600 dólares pagos como parte do pacote anti-covid de 900 bilhões de dólares aprovado pelo Congresso no mês passado – totalizando 2 mil dólares, valor defendido tanto por Biden quanto por Trump, que classificou o pacote aprovado pelos legisladores de uma desgraça.

Com quase 11 milhões de pessoas desempregadas em todo o país, os benefícios suplementares para desempregados também aumentariam, dos 300 dólares por semana atuais para 400 dólares, e seriam estendidos até setembro.

A moratória para despejos e execuções hipotecárias também seria estendida até setembro, e seria concedido auxílio para aluguel. Biden também quer que o Congresso aprove um aumento do salário mínimo para 15 dólares a hora.

Biden pretende ainda garantir a reabertura de escolas. Seu plano prevê 50 bilhões de dólares para expandir os testes de covid-19, o que é visto como chave para reabrir a maioria das escolas até o final dos primeiros 100 dias do novo governo. Cerca de 130 bilhões de dólares seriam alocados para ajudar as escolas a reabrir sem correr o risco de contágio.

Vacinação

Biden pretende ainda alocar 20 bilhões de dólares adicionais para a vacinação contra a covid-19, incluindo a instalação de centros de vacinação em massa e o envio de unidades móveis para áreas remotas. A verba se somaria aos 8 bilhões de dólares já aprovados pelo Congresso.

"As vacinas oferecem tanta esperança.... mas o início da vacinação nos Estados unidos tem sido um fracasso desolador até agora", disse Biden, acrescentando que, na sexta-feira, ele apresentaria seu plano para vacinar 100 milhões de americanos em 100 dias após sua posse.

"Este será um dos esforços operacionais mais desafiadores que já empreendemos como uma nação. Teremos que mover o céu e a terra para que mais pessoas sejam vacinadas", disse.

Boas chances no Congresso

Com os democratas no controle tanto da Câmara dos Representantes quanto do Senado, o novo presidente, que assume o cargo em 20 de janeiro, terá boas chances de que seu plano seja aprovado. Seria o terceiro grande pacote de estímulo aprovado em meio à pandemia nos EUA.

O líder democrata no Senado, Chuck Schumer, e a presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, abraçaram o plano de Biden, prometendo leva-lo à votação.

"Iniciaremos os trabalhos imediatamente para transformar a visão do presidente eleito Biden em uma legislação aprovada em ambas as casas e transformada em lei", disseram numa declaração conjunta.

Membros da equipe de transição da Casa Branca afirmaram que Biden pretende apresentar mais um pacote de recuperação nas próximas semanas.

Publicado por Deutsche Welle, em 15.01.2021

Turquia aplica mais de 500 mil doses de Coronavac em dois dias

Presidente turco recebeu primeira dose na quinta-feira. Imunizante é o mesmo que está sendo desenvolvido pelo Instituto Butantan em parceria com a Sinovac. Vacinação avança nos EUA, Israel e vários países europeus

Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, recebeu vacina no primeiro dia da campanha no país

A Turquia vacinou mais de 500 mil cidadãos contra a covid-19 em apenas dois dias, mostram dados divulgados nesta sexta-feira (15/01) pelo Ministério da Saúde turco. O país está aplicando o imunizante Coronavac, produzido pela farmacêutica chinesa Sinovac e que no Brasil é desenvolvido em parceria com o Instituto Butantan, ligado ao governo de São Paulo.

A campanha de vacinação começou na Turquia na quinta-feira com a imunização de trabalhadores de área da saúde. Até o meio-dia desta sexta-feira, 523.338 pessoas já haviam sido vacinadas. Entre elas está o presidente Recep Tayyip Erdogan.

"Recebi a vacina nesta tarde. Em 28 dias, receberei a segunda dose da vacina", declarou Erdogan na quinta-feira a repórteres após deixar o Hospital Municipal de Ancara. "Tenho um pedido: todos os líderes políticos, deputados devem ser vacinados para promover a vacinação", acrescentou Erdogan, que garantiu que o objetivo é vacinar toda a população.

Com mais de 83 milhões de habitantes, a Turquia assinou um acordo com a Sinovac para obter 50 milhões de doses da Coronavac, das quais 3 milhões chegaram recentemente. A distribuição das doses na semana passada por todo o país contribuiu para o elevado número de vacinados nos primeiros dois dias de campanha, afirmou o governo.

"Somos um país experiente na implementação em âmbito nacional de programas de vacinação. Nossa infraestrutura é mais do que capaz de conduzir este programa controladamente. Vamos ganhar a batalha contra a pandemia juntos", escreveu o ministro turco da Saúde, Fahrettin Koca, em sua conta no Twitter.

Além da Turquia, a Indonésia iniciou nesta semana a campanha de vacinação contra a covid-19. Desde de quinta-feira, 15.301 pessoas receberam a primeira dose do imunizante Coronavac. Na primeira fase, o país asiático prioriza trabalhadores de área de saúde e do setor público. O presidente do país, Joko Widodo, também foi vacinado.

A Coronavac teve verificada eficácia de 91% em ensaios clínicos realizados na Turquia, enquanto o Butantan apontou um percentual bem mais baixo, de 50,38%, com 78% de redução dos casos leves e 100% dos casos graves.

Além de China, Turquia e Indonésia, o Brasil, o Chile e a Hungria também pretendem utilizar a vacina da Sinovac em seus programas. 

Vacinação pelo mundo

Na frente da corrida de desenvolvimento de uma vacina contra o coronavírus, a China foi um dos primeiros países do mundo a iniciar a imunização, mesmo antes da aprovação da vacina. Desde julho do ano passado, estão sendo vacinados grupos de alto risco e profissionais de saúde. Em dezembro, o programa foi ampliado a outras camadas da população.

O país asiático já vacinou 10 milhões de habitantes, segundo o levantamento do site Our World in Data, ligado à Universidade de Oxford. Até o feriado do Ano Novo chinês, em meados de fevereiro, a expectativa do governo é imunizar 50 milhões de pessoas.

A Rússia, que, em agosto, foi o primeiro país do mundo a aprovar uma vacina contra a covid-19 antes mesmo do final dos testes, começou a aplicar em larga escala a Sputnik V no início de dezembro, e até agora já vacinou cerca de 1,5 milhão de pessoas.

Os Estados Unidos, Reino Unido e Israel estão na liderança entre as nações que já aplicaram o maior número de doses de vacinas contra a covid-19 no mundo. Esses países estão sendo aplicados os imunizantes da Biontech-Pfizer e da Moderna.

Desde dezembro, os EUA já vacinaram mais 11,1 milhões de americanos, o que corresponde a 3% da população do país. Por dia, cerca de 800 mil doses de imunizantes são aplicadas.

O Reino Unido, que também iniciou a vacinação em dezembro, já imunizou cerca de 4,3% de sua população, ou seja, 2,9 milhões de habitantes, de acordo com Our World in Data.

Ao vacinar mais de 2 milhões de pessoas, Israel lidera em disparada no ranking de imunização proporcional à população. Mais de 23% dos habitantes do país já receberam pelo menos uma dose da vacina contra a covid-19. Em segundo lugar ficam os Emirados Árabes Unidos, com 12,9%, e terceiro Bahrain, com 6,44% da população imunizada.

Na Europa continental, a Suíça foi o primeiro país iniciar uma campanha vacinação, com o imunizante da Biontech-Pfizer em 23 de dezembro. Ao todo, 66 mil suíços já foram vacinados desde então.

Os 27 países-membros da União Europeia também já estão vacinando seus habitantes com imunizante da Biontech-Pfizer. A Dinamarca lidera o ranking proporcional à população entre as nações do bloco, já tendo vacinado 2,2% de seus 5,8 milhões de habitantes. Em seguida estão Itália, Irlanda, Lituânia, Espanha e Eslovênia.

Na América Latina, Argentina, México, Costa Rica e Chile também iniciaram suas campanhas de imunização.

Até esta quinta-feira, (ontem), 32,94 milhões de pessoas no mundo já foram vacinadas contra a covid-19, segundo o Our World in Data. Esse número corresponde a 0,42% da população mundial.

Publicado por Deutsche Welle, em 15.01.2021.