sexta-feira, 10 de julho de 2020

Brasil tem 70 mil mortes por coronavírus e mais de 1,8 milhão de infectados,

País registrou 1.270 óbitos em 24 horas e 1.804.338 infectados; foram mais de 45 mil novos casos registrados em um dia.

O consórcio de veículos de imprensa divulgou novo levantamento da situação da epidemia de coronavírus no Brasil a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde, consolidados às 20h desta sexta-feira (10).

O país registrou 1.270 mortes pela Covid-19 nas últimas 24 horas, chegando ao total de 70.524 óbitos. Com isso, a média móvel de novas mortes no Brasil na última semana foi de 1.039 por dia, uma variação de 3% em relação aos óbitos registrados em 14 dias. Em casos confirmados foram 45.235 registrados no último dia, com o total de 1.804.338 de brasileiros infectados pelo novo coronavírus.

Ao comparar a curva do Brasil com outros países também duramente afetados pela doença, especialistas apontam que a pandemia no país não chegou a um pico e uma queda na sequência. Em vez desse comportamento, visto em países da Europa como Reino Unido, Itália e França, os dados mostram que as mortes seguem estáveis em um platô, com patamar alto na média de mortes.

Veja a seguir:

Brasil, em 10 de julho
Total de mortes: 70.524
Mortes em 24 horas: 1.270
Média de novas mortes nos últimos 7 dias: 1.039 por dia (variação em 14 dias: 3%)
Total de casos confirmados: 1.804.338
Casos confirmados em 24 horas: 45.235
(Antes do balanço das 20h, o consórcio divulgou dois boletins parciais, às 8h, com 69.316 mortes e 1.762.263 casos confirmados, e às 13h, com 69.406 e 1.768.970.)

Estados e DF
Veja como o número de novas mortes tem variado nas últimas duas semanas:

Subindo: PR, RS, SC, MG, DF, GO, MS, MT, TO, PI
Em estabilidade: ES, SP, AM, AL, BA, CE, MA, PB, RN, SE, RR, RO
Em queda: RJ, AC, AP, PA, PE

Publicado originalmente por G1  / O Globo

A rede

Os efeitos daninhos da rede de fake news próxima a Bolsonaro comprometem o viço da democracia brasileira ao falsear a opinião pública

Em setembro do ano passado, o Estadão revelou que no terceiro andar do Palácio do Planalto, bem próximo ao gabinete de Jair Bolsonaro, fora montado um núcleo de “assessoramento de comunicação” composto por ex-assessores parlamentares ligados a dois filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), e blogueiros que durante a campanha eleitoral de 2018 ganharam a simpatia do “Zero 2” e do “Zero 3” ao criarem perfis e páginas nas redes sociais cujo conteúdo era amplamente favorável ao então candidato à Presidência e bastante hostil a quem quer que fosse considerado “inimigo” da família, fossem pessoas ou instituições. Naquela ocasião, o País tomou conhecimento da existência do “gabinete do ódio”.

Na quarta-feira passada, o Facebook desencadeou uma operação de combate às fake news e ao discurso de ódio que atingiu em cheio essa rede de apoio ao presidente Bolsonaro na internet. Embora não tenha revelado dado novo – tanto a existência como a forma de atuação do “gabinete do ódio” já eram amplamente conhecidas –, a ação da empresa teve o efeito prático de retirar do ar 35 perfis, 14 páginas e 1 grupo no Facebook, além de 38 perfis no Instagram, empresa que, como o WhatsApp, é controlada pela holding Facebook. Com essas contas e páginas fora do ar, que juntas tinham quase 2 milhões de seguidores, o alcance das ofensas e das falsas informações que circulam por meio das redes sociais haverá de cair substancialmente.

O caráter global da operação do Facebook desfaz quaisquer suspeitas em relação ao possível direcionamento da ação contra alvos políticos predeterminados. Redes similares em vários países – pelo menos 11 – foram atingidas, inclusive nos Estados Unidos, onde pessoas que assessoraram o presidente Donald Trump também tiveram suas contas apagadas.

Os auditores do Facebook vincularam diretamente alguns dos perfis e páginas que foram retirados do ar no Brasil a Tércio Arnaud Tomaz, que ficou conhecido como o administrador da página “Bolsonaro Opressor 2.0” durante a campanha eleitoral de 2018 e hoje está lotado no Palácio do Planalto como assessor especial do presidente Jair Bolsonaro. Tomaz é até agora o elo formal mais forte entre o presidente da República e o tal “gabinete do ódio” que seria chefiado nas sombras por seu filho Carlos Bolsonaro.

A atuação direta de assessor do presidente em uma rede espúria de desinformação e destruição de reputações é algo gravíssimo que pode ter sérias repercussões na CPMI das Fake News, no inquérito que apura a atuação do “gabinete do ódio” contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e seus ministros e no âmbito do processo que corre no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para apurar abuso de poder econômico da chapa liderada por Jair Bolsonaro justamente pelo uso de uma milionária estrutura de rede digital por meio da qual teriam sido disparadas em massa ofensas e fake news em 2018.

Como a atuação de insidiosa rede já se observava antes da vitória de Jair Bolsonaro no pleito, pelo que revela a operação do Facebook, tudo indica que a chegada de Bolsonaro ao Palácio do Planalto apenas teve o condão de dar um caráter oficial a práticas que já ocorriam há meses no submundo da internet. Basta ver que não cessaram – aí está o inquérito que corre no STF para apurar ações recentes de blogueiros próximos ao presidente – e, pior, recrudesceram.

É de suma importância o mais rápido esclarecimento das formas de atuação e, não menos importante, dos meios de financiamento dessa rede profissional de disseminação de fake news, ameaças e ofensas contra pessoas e instituições pátrias. Os efeitos daninhos dessa rede extrapolam o âmbito pessoal – o que é grave por si só – e comprometem o próprio viço da democracia brasileira ao falsear a opinião pública por meios insidiosos. A desinformação estabelece um debate público sob falsas premissas. Poucas coisas são mais antidemocráticas.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
10 de julho de 2020 | 03h00

Desemprego é aqui mesmo

Desocupação no Brasil segue em 2020 bem acima dos padrões globais

Quando a pandemia atingiu o Brasil, a desocupação no País já estava bem acima dos padrões internacionais. No fim do ano a economia poderá estar mais ativa em todo o mundo, mas no Brasil as condições do emprego continuarão, quase certamente, muito piores que na maior parte dos países. No cenário mais pessimista, com uma segunda onda de covid-19, a média do desemprego poderá chegar a 12,6% no quarto trimestre de 2020, nos 37 países-membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), segundo a nova projeção da entidade. No Brasil, projeções correntes apontam níveis próximos de 15%, talvez superiores, e com enormes taxas de informalidade e de subutilização de mão de obra.

Diante das incertezas criadas pela pandemia, economistas da OCDE desenharam dois cenários econômicos, apresentados como igualmente prováveis neste momento. Num deles, a economia mundial encolherá 6% neste ano. Nesse caso, o desemprego nos países da organização estará em 9,4% no trimestre final de 2020. No outro, o produto bruto global será 7,6% menor que o de 2019 e o ano terminará com a desocupação em 12,6%, quatro pontos acima do pico alcançado na crise financeira de 2008-2009.

Com o surto de covid-19, o desemprego nos países da OCDE subiu de 5,2% em fevereiro para 8,5% em abril e recuou para 8,4% em maio. No Brasil, o fraco desempenho da economia, com crescimento de apenas 1,1% no ano passado, manteve condições de emprego muito ruins até o começo de 2020. Havia 11,6% de trabalhadores desocupados no trimestre móvel terminado em fevereiro. Era mais que o dobro da taxa média registrada nos países da OCDE. Sem o vírus, o quadro econômico e social do País já era especialmente dramático.

O surto de covid-19 bateu forte na economia brasileira a partir da segunda quinzena de março. O impacto foi muito maior em abril. No trimestre de março a maio a desocupação chegou a 12,9%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas a taxa de desocupação mostra apenas uma parte de um quadro muito mais feio que o encontrado no mundo rico e na maior parte das grandes economias emergentes.

Os desempregados eram 12,7 milhões no trimestre móvel terminado em maio, de acordo com os dados oficiais. Mas o número dos desalentados – 5,4 milhões desanimados de buscar emprego – foi um novo recorde. Também recorde foi a população subutilizada (30,4 milhões). Este conjunto inclui, entre outros componentes, o grupo dos trabalhadores ocupados por um número insuficiente de horas. Além disso, pela primeira vez o contingente ocupado correspondeu a 49,5% da população em idade de trabalhar. A porcentagem nunca havia sido tão baixa desde 2012, quando foi iniciada a pesquisa com as características atuais.

Esse último recorde negativo foi mantido, com pouca variação, até o meio do mês passado. Na segunda semana de junho havia 170 milhões de pessoas em idade de trabalhar, mas apenas 83,5 milhões estavam ocupadas. Eram 49% do total, parcela praticamente igual à da primeira semana de maio.

Dados ligeiramente positivos foram anunciados terça-feira pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Em junho, o Indicador Antecedente de Emprego subiu 14 pontos e atingiu o nível de 56,7. Com isso, recuperou em dois meses um terço da perda de março-abril. Mas o resultado é o terceiro mais baixo da série histórica. Ainda em junho, o Indicador Coincidente de Desemprego caiu 2,2 pontos, para 97,4, apontando um quadro melhor que o de maio. Mas esses dados apenas confirmam uma avaliação corrente: o pior ficou para trás. Não apontam, ainda, condições muito melhores que aquelas estimadas até agora. As projeções correntes no Brasil apontam para este ano uma contração econômica em torno de 6,5%.

No Brasil, a taxa média de desemprego ficará em 18,7% neste ano, segundo estimativa recente da FGV. Logo, os números mensais ainda poderão piorar. Bastará que alguns milhões dos atuais desalentados voltem às filas em busca de vagas. Não se conhece, ainda, um plano do governo para reduzir essas filas.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S. Paulo
10 de julho de 2020 | 03h00

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Brasil registra 1.199 mortes por coronavírus em 24h; total de óbitos vai a 69.254

Com 42.907 novos casos, País atinge a marca de 1.759.103 diagnósticos da doença

    Coveiros durante enterro no cemitério de Vila Formosa, em São Paulo.
Coveiros durante enterro no cemitério de Vila Formosa, em São Paulo. Foto: Victor Moriyama / NYT

O Brasil registrou nesta quinta-feira 1.199 óbitos pelo novo coronavírus. Foram mais 42.907 casos confirmados de infecção em 24 horas, segundo dados do levantamento realizado por Estadão, G1, O Globo, Extra, Folha e UOL junto às secretarias estaduais de Saúde. No total, 69.254 brasileiros já perderam a vida por causa da covid-19 e 1.759.103 pessoas foram infectadas.

O Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, registrou 145 mortes por covid-19 e 1.995 novos casos da doença no período de 24 horas, segundo boletim divulgado na tarde desta quinta-feira pela secretaria estadual de Saúde. Até agora, 11.115 pessoas morreram em função do coronavírus no Estado do Rio, que soma 128.324 casos. Se fosse um país, o Estado do Rio seria o 20.º do mundo com mais infectados. Mais 998 mortes estão sendo investigadas, sob suspeita de terem sido causadas pela covid-19, e 106.678 pacientes se curaram.

Desde que as regras de isolamento e distanciamento sociais foram flexibilizadas em meio à pandemia, pelo menos 12 capitais brasileiras viram seus índices de infecções aumentarem.

Divulgação de dados 

O balanço de óbitos e casos é resultado da parceria entre jornalistas dos seis meios de comunicação, que uniram forças para coletar junto às secretarias estaduais de Saúde e divulgar os números totais de mortos e contaminados. A iniciativa inédita é uma resposta à decisão do governo Jair Bolsonaro de restringir o acesso a dados sobre a pandemia.

Mesmo com o recuo do Ministério da Saúde, que voltou a divulgar o consolidado de casos e mortes, o consórcio dos veículos de imprensa continua com o objetivo de informar os brasileiros sobre a evolução da covid-19 no País, cumprindo o papel de dar transparência aos dados públicos.

Redação, O Estado de S.Paulo
09 de julho de 2020 | 20h06

Brasil é epicentro emergente de fome extrema, diz relatório

Pandemia e falta de apoio do governo federal aos mais vulneráveis ameaçam desfazer os avanços do país no combate à miséria. Pobreza, diz ONG Oxfam, cresce de forma acelerada.

Pessoas de máscara diante de mural no Rio de Janeiro
    
Pessoas de máscara diante de mural no Rio de Janeiro

Oxfam crítica ameaça do governo de reduzir benefícios num momento em que a covid-19 ainda está fora de controle

A pandemia de covid-19, aliada à falta de apoio do governo Jair Bolsonaro aos mais vulneráveis, está acelerando o crescimento da pobreza no Brasil e já coloca o país como "epicentro emergente" da fome extrema, segundo um relatório divulgado nesta quinta-feira (09/07) pela ONG Oxfam.

O Brasil aparece com esta classificação, juntamente com Índia e África do Sul, no relatório O vírus da fome: como a covid-19 está aumentando a fome num mundo faminto. Nele, a ONG analisa os impactos da doença em países onde a situação alimentar e nutricional já era extrema antes da pandemia.

A ONG diz que, em 2014, o Brasil estava vencendo a guerra contra a fome, graças a investimentos governamentais em benefício de pequenos produtores rurais e a um pacote de políticas que incluíram a criação de um Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), desenvolvido em parceria com a sociedade civil.

Mas a situação da pobreza e fome no Brasil, afirma o relatório, começou a deteriorar-se em 2015 devido "à crise econômica e a quatro anos de austeridade".

"Até 2018, o número de pessoas em situação de fome no Brasil aumentou em 100 mil (para 5,2 milhões) devido a um aumento acentuado nas taxas de pobreza e desemprego e a cortes radicais nos orçamentos para agricultura e proteção social", afirma o documento.

Como fatores para a deterioração da situação da fome no Brasil o relatório aponta os cortes no programa Bolsa Família e, desde 2019, um "desmantelamento gradual" de políticas e instituições destinadas a combater a pobreza, como o Consea.

 "A pandemia da covid-19 somou-se a essa combinação já tóxica de fatores, aumentando rapidamente as taxas de pobreza e fome em todo o país. As medidas de distanciamento social adotadas para conter a propagação do coronavírus e evitar o colapso do sistema público de saúde agravaram a crise econômica", acrescenta o estudo.

A ONG ressalta que milhões dos trabalhadores mais pobres, que têm poucas economias e acesso limitado a benefícios, perderam empregos ou rendimentos devido à pandemia, sem que tenham sido beneficiados por apoios governamentais.

"Até final de junho, o governo federal distribuiu apenas 10% da ajuda financeira prometida aos trabalhadores e empresas, através do Programa de Apoio Emergencial ao Emprego (PESE), com grandes empresas obtendo mais benefícios do governo do que os trabalhadores ou micro e pequenas empresas", aponta a Oxfam.

Da mesma forma, apenas 47,9% dos fundos destinados à ajuda de emergência a pessoas vulneráveis haviam sido distribuídos até o início de julho. Por isso, a ONG entende que "o governo federal está falhando em apoiar as pessoas mais vulneráveis do Brasil no enfrentamento da pandemia".

De acordo com a Oxfam, a implementação do programa de Renda Básica Emergencial regista longos atrasos na resposta aos pedidos de ajuda, recusas injustificadas de ajuda, além da dificuldade imposta pela necessidade de ter um telefone celular, conexão à internet e endereço de e-mail para se qualificar para a assistência.

Por outro lado, continua a organização, apenas três meses após o início do surto do coronavírus do país, e no momento em que ainda está largamente fora de controle, o governo ameaça reduzir o pagamento dos benefícios. 

O Brasil registrou 1.223 mortes por covid-19 e 44.571 casos confirmados da doença nas últimas 24 horas, segundo dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e do Ministério da Saúde divulgados nesta quarta-feira (08/07).

O balanço diário de novos casos fez com que o país superasse a marca de 1,7 milhão de infectados, somando agora 1.713.160 ocorrências. O Brasil acumula ainda o trágico número de 67.964 óbitos causados pelo vírus Sars-Cov-2.

Publicado originalmente pela Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas.

Estudo alerta para danos cerebrais da covid-19

Neurologistas britânicos dizem que novo coronavírus pode deixar graves sequelas no cérebro, gerando delírios, derrames e inflamações. Eles podem aparecer mesmo em casos leves e se manifestar apenas bem mais tarde.

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Diversos estudos já haviam indicado que o novo coronavírus Sars-Cov-2 ataca não apenas o pulmão e as vias respiratórias, mas também outros órgãos do corpo humano, incluindo o coração, os vasos sanguíneos, os nervos, os rins e a pele.

Mas neurologistas britânicos apresentaram esta semana detalhes impressionantes na revista Brain. Segundo eles, o Sars-Cov-2 pode causar graves danos cerebrais mesmo em pessoas com sintomas leves ou já curadas. Muitas vezes esses danos somente são identificados bem mais tarde.

Os médicos da University College London (UCL) analisaram 43 pacientes de covid-19, alguns com sintomas graves. Em 9 casos eles diagnosticaram uma encefalomielite disseminada aguda (EMDA), uma inflamação do sistema nervoso central que afeta a mielina (o revestimento dos neurônios que permite que os impulsos nervosos percorram as células) no cérebro e na medula.

Entre os 43 pacientes analisados, 12 sofriam de inflamação do sistema nervoso central (sendo 9 com EMDA), outros 10 de uma encefalopatia transitória com delírio ou psicose, 8 tiveram AVCs e outros 8 tiveram problemas nos nervos periféricos, em geral com o diagnóstico síndrome de Guillain-Barré. Uma mulher de 59 anos morreu em decorrência de complicações dessa síndrome.

"A maneira como a covid-19 ataca o cérebro ainda não tínhamos visto em outros vírus", disse o médico Michael Zandi, que liderou a pesquisa. Ele disse que os graves danos cerebrais verificados também em pacientes com sintomas leves são inusitados.

Os casos divulgados confirmam o temor de que a covid-19 pode causar problemas de saúde duradouros em alguns pacientes. Vários deles relatam sintomas como cansaço e falta de ar mesmo já curados. Outros falam em dormência, fraqueza e perda de memória.

"Do ponto de vista biológico, a EMDA tem semelhanças com a esclerose múltipla, mas a evolução é mais grave e, em geral, ocorre apenas uma vez. Alguns pacientes ficarão com uma sequela duradoura, outros vão se recuperar bem", disse Zandi.

Segundo ele, é provável que ainda não se saiba quais são todas as doenças cerebrais e sequelas causadas pelo novo coronavírus. Muitos pacientes estão em estado tão grave que não é possível submetê-los a exames.

"Queremos chamar a atenção de médicos do mundo todo para essas complicações do coronavírus", disse Zandi. Ele acrescentou que neurologistas devem ser consultados quando os pacientes apresentam sintomas cognitivos, problemas de memória, cansaço, dormência ou fraqueza.

Os médicos também relataram alguns casos, como o de uma mulher de 47 anos que, depois de uma semana com febre e tosse, de repente passou a ter dor de cabeça e dormência na mão direita.

No hospital ela apresentou sonolência e parou de reagir. Foi necessária uma operação de emergência pare remover uma parte do crânio e assim aliviar a pressão sobre o cérebro inchado.

Uma mulher de 55 anos que já tinha uma doença psíquica começou a se comportar de maneira estranha no dia em que teve alta do hospital. Ela vestia e tirava o casaco repetidamente e começou a ter alucinações, vendo macacos e leões dentro de casa. De volta ao hospital, passou a receber medicamentos antipsicóticos.

Os neurologistas britânicos temem que os casos de covid-19 possam deixar lesões cerebrais em alguns pacientes. Elas poderão vir a ser percebidas só daqui a alguns anos.

Segundo o estudo, a gripe espanhola de 1918 também deixou sequelas tardias no cérebro de até 1 milhão de pessoas.

"Esperamos, é claro, que isso não aconteça, mas quando há uma pandemia tão grande, que afeta uma grande parte da população, temos de permanecer alertas", diz Zandi.

Publicado originalmente pela Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas. 

Bolsonarice contagiosa

Tal qual um vírus, impostura do presidente infecta o País - analisa Vera Magalhães em artigo publicado ontem n'O Estado de São Paulo.

A notícia de que Jair Bolsonaro, depois de tanto desafiar as regras de bom senso em uma pandemia, foi contaminado pelo novo coronavírus deflagrou um outro surto: a ira irracional daqueles que colocam adesivos antifascistas em seus perfis nas redes sociais e passaram a desejar a morte do presidente da República.

A onda não ficou restrita à internet. Chegou a colunas de jornais, travestida de exercício filosófico-linguístico, mas cujo único resultado prático é vitimizar o presidente que até agora destilou sua falta completa de empatia diante da tragédia. Perde a imprensa, perde o País, perdemos todos nós, que nos desumanizamos a cada dia, sem perceber que, aos poucos, nos transformamos naquilo que mais desprezamos.

Bolsonaro não ganhou apenas corações e mentes dos minions que os segue nas portas dos palácios e em posts ensandecidos. O presidente conseguiu comprometer o fígado e o cérebro de parte daqueles que o criticam, num jogo que apenas rebaixa todos ao seu patamar e permite que ele ganhe espaço, porque no lodaçal é imbatível.

Não há nada que justifique que democratas, pessoas e instituições se ponham a “torcer” pela morte desse ou daquele. Muito menos as indignidades de Bolsonaro, uma vez que é justamente contra elas que se conclama a união de esforços daqueles que prezam a vida, a ciência, a educação, a cultura e a civilidade.

Sim, o presidente colhe de volta a absoluta falta de compaixão que cuspiu na cara de um país estarrecido ao longo dos últimos cinco meses. Andou a cavalo, passeou de jet ski, subiu em boleia de caminhão, assoou o nariz e cumprimentou velhinhos em seguida, receitou cloroquina sem ser médico, mandou invadirem hospitais, chegou ao cúmulo de vetar o uso de máscaras e passeou por aí já infectado, possivelmente transmitindo coronavírus para os poucos com os quais diz se importar.


Reprodução

Bolsonaro faz ‘propaganda’ de hidroxicloroquina. Publicou um vídeo mostrando que estava tomando a terceira dose  Foto: Reprodução

Diante de tanta atrocidade, merece morrer? Não. Porque esse pensamento nos prende à barbárie que o presidente, sua família e seu núcleo insano tratam de cultivar desde antes mesmo da campanha, como terreno fértil para permitir a supressão da razão, único ambiente em que alguém tão virulento pode ser eleito presidente da República.

Aqueles que são de fato a antítese de Bolsonaro só têm um caminho: torcer pela medicina, pela ciência e pela sua cura. E para que ele responda diante dos órgãos competentes pelos crimes de responsabilidade que cometeu e diante dos eleitores pelas vezes em que brincou com a vida como um déspota de quinta categoria.

O oposto de Bolsonaro não é a hashtag “força, corona”. Essa é sua consagração, seu triunfo, o caminho para sua perpetuação.

Construir de forma inteligente e lúcida o caminho para que nos curemos de Bolsonaro significa mostrar com dados e evidências o quanto seu comportamento colocou em risco não apenas a si mesmo e seus familiares, mas um país inteiro.

Como sob a falácia de salvar a economia acabou condenando vidas e boicotando qualquer chance de minimizar o estrago econômico.

É acompanhar seu tratamento e repetir aos incautos que não, cloroquina não tem efeito preventivo nem curativo comprovado. E que um presidente da República virar mascate de remédio e impor a um ministério sem ministro há quase dois meses que enfie esse remédio goela abaixo da população é mais um dado que o inabilita para exercer o cargo que exerce.

A morte de Bolsonaro em nada contribuiria para que o Brasil tivesse alta de sua doença crônica e generalizada, em que a política virou uma peste e que, ao se curar de um vírus, você automaticamente cai acamado por outro ainda mais letal. A vacina para isso se chama democracia, já está disponível e permite a imunidade a esse comportamento de rebanho que nos desumaniza.

O STF e o Poder Legislativo

Futuro presidente do Supremo explicou como a corte se relacionará com o Congresso

Dias depois de ter dado uma palestra virtual na qual anunciou as diretrizes que nortearão sua gestão com relação ao Poder Executivo, o ministro Luiz Fux, recém-eleito para a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) e com posse marcada para o dia 10 de setembro, em declarações feitas no Instituto Justiça e Cidadania, informou como a mais alta Corte do País se relacionará com o Congresso Nacional durante os dois anos de sua gestão.

“Nós temos de agir dentro da Constituição. Além de ser um Estado Democrático, o Brasil é um Estado de Direito. No Estado Democrático de Direito, a instância hegemônica encarregada de resolver os problemas políticos é o Poder Legislativo. O Poder Judiciário deve deferência ao Legislativo porque ele tem a palavra mais importante no regime democrático”, disse Fux. Segundo ele, atualmente muitas questões que têm sido submetidas a decisões pelas diferentes instâncias judiciais são basicamente políticas, motivo pelo qual poderiam ser resolvidas por outras esferas de Poder, como a Câmara dos Deputados e o Senado.

O futuro presidente do Supremo está certo. Há muito tempo, todas as vezes em que há um impasse entre o Executivo e o Legislativo a mais alta Corte do País é chamada a arbitrar, o que quase sempre resulta em alguma tensão institucional. E, todas as vezes em que as lideranças partidárias não conseguem resolver elas próprias eventuais impasses políticos, elas também recorrem aos tribunais superiores.

Nos dois casos, o que se tem é não apenas a judicialização da política, mas, igualmente, a politização da Justiça e, por consequência, a tendência cada vez maior de seus integrantes de interpretar as leis e a Constituição de modo extensivo e criativo, o que os leva a exorbitar e a interferir em áreas que não são de sua competência. E, quanto maior é essa tendência, maior é a corrosão da fronteira entre a criação do direito, tarefa precípua do Congresso, e sua aplicação ao caso concreto, atribuição funcional das diferentes instâncias do Judiciário.

Em sua palestra, Fux classificou essa tendência dos juízes como “sanha de protagonismo judicial”, o que acaba resultando na multiplicação de decisões com fundamentos extrajurídicos e o intervencionismo judicial em políticas públicas. Também afirmou que “o Supremo não é um órgão que resolve tudo”. E disse, ainda, que o ativismo da toga prejudica “muitíssimo” a atuação do próprio Supremo Tribunal Federal, especialmente no exercício de sua função mais importante – a de controle da constitucionalidade das leis.

De certo modo, o ministro repetiu o que o consagrado e insuspeito cientista político Luís Werneck Vianna, em artigos publicados no Estado, chama de “pontificado laico” da magistratura, disseminando incerteza jurídica sob a justificativa de garantir a segurança do direito. Segundo o futuro presidente do Supremo, só há certeza jurídica quando a Corte pacifica entendimentos discrepantes a respeito do significado das leis nas instâncias inferiores da Justiça.

Para Fux, a mais alta Corte do País tem o dever de fazer as interpretações fundamentais que as demais instâncias do Poder Judiciário possam seguir, evitando desse modo uma “judicialização excessiva” que, por não dar à iniciativa privada a segurança de que precisa para voltar a investir, poderia retardar a retomada das atividades econômicas assim que a pandemia de covid-19 passar. “O que preconizo é a fixação de um entendimento jurídico capaz de criar previsibilidade, ou seja, o que se pode fazer e o que não se pode fazer. O Supremo tem de garantir a governabilidade do País”, disse ele.

Nas duas palestras que pronunciou, o futuro presidente do Supremo não fez afirmações novas e ousadas. Mas disse o que é oportuno e necessário para distender as tensões institucionais neste momento em que o Brasil vive uma crise de saúde pública, uma crise econômica e uma crise política.

Editorial / Notas e Informações, O Estado de S.Paulo
09 de julho de 2020 | 03h00


A vida, o vírus e a política

Nos tempos atuais, é preciso relembrar: não se deseja a doença de quem quer que seja. Política é arena de vida, não de morte

Não se comemora doença de ninguém, por pior que possa ser seu desempenho público. Não se torce pelo falecimento de ninguém, por mais deletéria que seja sua conduta. São princípios básicos de civilidade e de respeito à dignidade humana, que não precisariam ser lembrados. São pressupostos mínimos da vida em sociedade, sobre os quais não deve haver nenhuma dúvida. No entanto, nos tempos atuais, assustadoramente esquisitos, é preciso relembrar: não se deseja a doença, e muito menos a morte, de quem quer que seja. A política é – e deve ser – arena de vida, e não de morte.

Num Estado Democrático de Direito, a oposição política, por mais ferrenha que possa ser, nunca almeja ou propõe a aniquilação do adversário. Assim, diante da notícia de que o presidente Jair Bolsonaro contraiu a covid-19, não há opção civilizada a não ser desejar o seu pronto restabelecimento, com votos de que tenha os menores e mais leves sintomas possíveis. Tal atitude não é um favor ou privilégio que se concede ao presidente da República, mas a única reação minimamente humana diante da doença de outro ser humano.

A luta política não entra nos domínios da morte, mesmo que o adversário político não tenha escrúpulos de se valer dessa seara. Por exemplo, quando era deputado federal, Jair Bolsonaro transformou o fuzilamento do então presidente Fernando Henrique Cardoso em verdadeira obsessão. Algumas das frases de Jair Bolsonaro: “O governo militar deveria matar pelo menos 30 mil, a começar por Fernando Henrique”, “o erro do governo militar foi não fuzilar o Fernando Henrique”, “defendo o fuzilamento do presidente”. Depois, Jair Bolsonaro alegou que “fuzilamento” era força de expressão, o que, longe de servir de desculpa, ratifica uma mentalidade de barbárie e violência.

A mesma atitude pôde ser observada em entrevista de setembro de 2015. Questionado se a então presidente Dilma Rousseff concluiria o segundo mandato, até o final de 2018, Jair Bolsonaro respondeu: “Espero que o mandato dela acabe hoje, infartada ou com câncer, ou de qualquer maneira”. De enorme brutalidade, a declaração é absolutamente despropositada, a revelar profunda incompreensão não apenas do exercício da política, mas de cidadania e humanidade.

Quase cinco anos depois dessa declaração sobre Dilma Rousseff, o País tomou conhecimento de que o menosprezo de Jair Bolsonaro em relação à vida não era circunscrito a adversários políticos. A pandemia do novo coronavírus revelou um presidente da República capaz de submeter a saúde da população a interesses e cálculos políticos, fosse qual fosse o número de vidas que a doença poderia ceifar. Entre estupefata e incrédula, a população ouviu o “e, daí?” de Jair Bolsonaro, em relação às dezenas de milhares de óbitos pela covid-19.

A confirmar sua indiferença com a saúde pública, no mesmo dia em que recebeu o diagnóstico positivo para o novo coronavírus, Jair Bolsonaro difundiu desinformação sobre o uso de hidroxicloroquina no tratamento da covid-19. Contrariando as evidências médicas, o presidente Bolsonaro atribuiu a ausência de sintomas mais graves da doença ao uso do medicamento que, além de não ter eficácia comprovada, apresenta efeitos colaterais graves. Como se vê, o inquilino do Palácio do Planalto é contumaz na falta de limites.

No entanto, por mais que causem repugnância, as atitudes de Jair Bolsonaro em relação à vida, ao vírus e à política não autorizam outra expectativa que o imediato restabelecimento da saúde do presidente da República. Fazer oposição política não inclui adotar as atitudes do adversário. Se o bolsonarismo manifesta, com estonteante clareza, seus antivalores, a reação contrária não pode ser mero sinal invertido. Não se combate autoritarismo com desumanidade. Num país civilizado, não se enfrenta barbárie pregando a barbárie.

Editorial / Notas e Informações, O Estado de S.Paulo
09 de julho de 2020 | 03h00


Ex-mulher de Bolsonaro presta depoimento nesta quinta em investigação contra Carlos

Ana Cristina Siqueira Valle é apontada como possível 'fantasma' no gabinete do vereador entre 2001 e 2008

Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, prestará depoimento nesta quinta-feira ao Ministério Público do Rio. O interrogatório se dá no âmbito da investigação contra o filho ‘02’ do mandatário, o vereador carioca Carlos Bolsonaro, que é suspeito de empregar funcionários fantasmas e de praticar ‘rachadinha’ na Câmara Municipal. Ana Cristina, que não é mãe dele, é uma das que teriam sido empregadas sem de fato trabalhar para o gabinete.

 Ana Cristina Valle

A advogada Ana Cristina Valle, ex-mulher do candidato Jair Bolsonaro, em sua casa em Resende, no interior do Estado Foto: Fabio Motta/Estadão

O depoimento será por videoconferência. A ex-mulher do presidente vive em Resende, no Sul fluminense, cidade em que também moram outros parentes dela acusados de participarem do esquema. Ao Estadão, a defesa de Ana Cristina confirmou a existência do depoimento, noticiado pelo jornal O Globo, mas não disse o horário em que será dado.

Hoje assessora na Câmara de Resende, Ana Cristina ficou de 2001 a 2008 lotada no gabinete de Carlos. Mesmo morando em outro município, outros parentes do então deputado Bolsonaro também ganharam empregos na Câmara do Rio, o que passou a ser considerado nepotismo pelo Supremo Tribunal Federal apenas em 2008.

A investigação contra Carlos começou em julho do ano passado, um ano depois do processo contra o filho ‘01’ do presidente, Flávio, ser aberto. Era, até este mês, tocada por um grupo ligado à Procuradoria-Geral de Justiça, por causa do foro especial. Agora, contudo, com base em decisão recente do STF sobre a ausência de foro para vereadores, o caso desceu para a primeira instância do MP.

Na atual etapa do processo, os depoimentos não são obrigatórios. Os outros familiares de Ana Cristina, por exemplo, não falaram aos investigadores.
     
Caio Sartori, O Estado de S.Paulo
09 de julho de 2020 | 11h48

O que se sabe sobre a derrubada de páginas ligadas a bolsonaristas no Facebook

'A atividade (da rede) incluiu a criação de pessoas fictícias fingindo ser repórteres, publicação de conteúdo e gerenciamento de Páginas fingindo ser veículos de notícias', comunicou o Facebook sobre retirada de páginas

O Facebook tirou do ar na tarde desta quarta-feira (08) uma rede de perfis, páginas e grupos ligados a partidários do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido). Segundo a empresa, a rede estaria sendo usada para espalhar conteúdo falso.

Entre os operadores da rede estariam servidores dos gabinetes dos filhos do presidente: o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). O assessor especial da Presidência da República, Tércio Arnaud, também estaria ligado a algumas das páginas removidas.

Em comunicado, a empresa disse que foram removidos 35 perfis, 14 páginas e um grupo no Facebook. Também foram removidas 38 contas no Instagram, outra rede social pertencente ao grupo. Segundo o Facebook, a rede de páginas usava uma "combinação de contas duplicadas e contas falsas" para burlar as regras de uso da empresa.

"A atividade (da rede) incluiu a criação de pessoas fictícias fingindo ser repórteres, publicação de conteúdo e gerenciamento de páginas fingindo ser veículos de notícias. Os conteúdos publicados eram sobre notícias e eventos locais, incluindo política e eleições, memes políticos, críticas à oposição política, organizações de mídia e jornalistas, e mais recentemente sobre a pandemia do coronavírus", diz o comunicado do Facebook.

A empresa também disse que os responsáveis estavam ligados ao Partido Social Liberal (PSL), antigo partido de Jair Bolsonaro; e também a funcionários dos gabinetes dos deputados estaduais fluminenses Anderson Moraes (PSL) e Alana Passos (PSL), além de Eduardo, Flávio e do presidente da República.

Segundo a rede social americana, as páginas derrubadas eram seguidas por 883 mil pessoas no Facebook, e por 917 mil no Instagram. Cerca de US$ 1,5 mil (R$ 8 mil) foram gastos para promover as páginas que integravam a rede de desinformação.

Em nota, Flávio Bolsonaro disse que os perfis são "livres e independentes", fruto do apoio espontâneo ao governo.

"O governo Bolsonaro foi eleito com forte apoio popular nas ruas e nas redes sociais e, por isso, é possível encontrar milhares de perfis de apoio. Até onde se sabe, todos eles são livres e independentes", disse o senador.

"Pelo relatório do Facebook, é impossível avaliar que tipo de perfil foi banido e se a plataforma ultrapassou ou não os limites da censura", prossegue a nota de Flávio Bolsonaro. "Julgamentos que não permitem o contraditório e a ampla defesa não condizem com a nossa democracia, são armas que podem destruir reputações e vidas".

O PSL também publicou nota. A agremiação disse que as contas suspensas nada tinham a ver com a sigla. Estavam relacionadas a assessores de deputados do partido, sendo de responsabilidade individual dos parlamentares. Os políticos "na prática, já se afastaram do PSL há alguns meses com a intenção de criar um outro partido", disse a legenda.

A BBC News Brasil também procurou a Secretaria de Comunicação da Presidência da República e o gabinete de Eduardo Bolsonaro, e atualizará a reportagem se houver resposta.

Entre os operadores de rede de conteúdo falso estavam servidores dos gabinetes de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP; na foto, à esquerda) e Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ)

Luiza Bandeira é pesquisadora do Atlantic Council, um centro de estudos que mantém parcerias com o Facebook e que foi em parte responsável pela investigação. Ela disse ter encontrado ligações das páginas derrubadas com assessores de Jair Bolsonaro e seus filhos, via Tércio Arnaud, assessor do presidente e, segundo ela, ex-assessor de outro filho dele, Carlos Bolsonaro.

Bandeira afirma também ter encontrado conexões da rede derrubada com os deputados estaduais do PSL no Rio.

"A ligação que eu estabeleci (das páginas) foi com o Jair (Bolsonaro), pelo Tércio Arnaud, que é um assessor dele (...). Tércio foi assessor, antes, do Carlos Bolsonaro. O Eduardo Bolsonaro tem um assessor ligado a rede também, o Paulo Chuchu, de São Bernardo do Campo", diz ela.

"A Alana Passos costumava empregar o (militante) Leonardo Bolsonéas, cuja conta também foi retirada. Ele era assessor dela até pouco tempo. E o Anderson Moraes empregava no gabinete dele a namorada do Leonardo Bolsonéas, a Vanessa Navarro."

Os dados usados na pesquisa são públicos, acrescenta Bandeira. Só o próprio Facebook tem acesso ao código-fonte da rede social.

"A gente trabalha com open source, com dados abertos. Olhamos os registros dessas contas. Então no caso do Tércio Arnaud (...), a página de Instagram chamada 'Bolsonaro News' estava registrada em nome dele. Estava registrada com (a conta de) e-mail do Gmail dele. Então, está claramente vinculada a ele", diz.

Tércio Arnaud se aproximou de Jair Bolsonaro ainda durante a campanha eleitoral de 2018 e trabalha no Palácio do Planalto desde o começo do governo. Hoje, ocupa o cargo de assessor especial da Presidência da República e despacha no 3º Andar do Palácio do Planalto.

"No caso do Bolsonéas, ele é aberto sobre a conta ser dele. Mas, por exemplo, essa rede usava pelo menos duas páginas que diziam que eram jornais e eram, na verdade, sites superpartidários. Uma delas, chamada Jogo Político, foi registrado pelo Leonardo Rodrigues, o Leonardo Bolsonéas", explica Bandeira.

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Em nota, Alana Passos disse que não foi notificada pelo Facebook sobre nenhuma irregularidade ou violação de regras em suas próprias contas.

"Quanto a perfis de pessoas que trabalharam no meu gabinete, não posso responder pelo conteúdo publicado. Nenhum funcionário teve a rede bloqueada por qualquer suposta irregularidade. Estou à disposição para prestar qualquer esclarecimento, pois nunca orientei sobre criação de perfil falso e nunca incentivei a disseminação de discursos de ódio", disse ela.

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O outro deputado estadual do PSL mencionado, Anderson Moraes, argumentou de forma parecida. Seu próprio perfil, verificado, não sofreu bloqueio ou algo do tipo.

"Mas excluíram a conta de uma pessoa que trabalha no gabinete, uma pessoa com perfil real, não é falsa. A remoção da conta foi absurda e arbitrária, porque postava de acordo com ideologia e aquilo que acreditava", disse, em nota.

"O Facebook em nenhum momento apontou o que estava em desacordo com as regras. (Por) Qual motivo excluíram? Falam em disseminação de ódio, mas será que também vão deletar perfis de quem desejou a morte do presidente?", questionou.

Redes derrubadas em outros países

No comunicado da tarde desta quarta, o Facebook também disse ter retirado do ar outras três redes de desinformação em outros países.

Foram removidas, por exemplo, 72 contas e 35 páginas de Facebook na Ucrânia, voltadas para a política local. Outras 13 páginas de Instagram daquele país também foram tiradas do ar. A rede, diz o Facebook, foi particularmente ativa durante as eleições ucranianas de 2019.

Uma das maiores derrubadas de páginas aconteceu na terra natal do Facebook, os Estados Unidos. Foram 54 perfis e 50 páginas de Facebook derrubadas, e mais 4 páginas do Instagram. No caso dos EUA, a rede parecia estar desativada: foi usada principalmente no período de 2015 e 2016. A rede costumava publicar conteúdos sobre o operador político republicano Roger Stone.

Na América Latina, a "limpa" do Facebook encontrou páginas gerenciadas no exterior cujo alvo parecia ser influenciar a política interna de países do subcontinente.

Foram retirados 41 perfis e 77 páginas de Facebook, e 56 contas de Instagram. A rede era gerenciada a partir do Canadá e do Equador, mas tinha como alvo países como El Salvador, Argentina, Uruguai, Venezuela, Equador e Chile.

Publicado originalmente pela BBC News

Brasil atingirá 2 milhões de casos de coronavírus já na semana que vem, aponta projeção

A marca simbólica deve ser alcançada entre a próxima terça (14) e quarta-feira (15), uma semana depois de o presidente Jair Bolsonaro ter anunciado que contraiu o vírus e menos de um mês depois de o país ter registrado 1 milhão de casos.

Mapa do Brasil

O Brasil vai atingir 2 milhões de casos confirmados de coronavírus já na semana que vem, com as mortes por covid-19 chegando a 80 mil, indica uma projeção feita a pedido da BBC News Brasil pelo Laboratório de Inteligência em Saúde (LIS) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, ligado à Universidade de São Paulo (USP).

Caso as previsões se confirmem, o Brasil chegaria ao patamar de 2 milhões de casos apenas 25 dias depois de atingir 1 milhão de casos, ou seja, quase cinco vezes mais rápido do que os 114 dias que demorou para atingir a primeira marca, no último dia 19 de junho.

O primeiro registro do coronavírus no país aconteceu em 26 de fevereiro.

Até a quarta-feira (8), segundo dados do Ministério da Saúde, o Brasil tinha cerca de 1,7 milhão de casos confirmados de covid-19 e 68 mil mortes.

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Esgoto

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Mas Domingos Alves, responsável pelo LIS, alerta que os números podem mudar "drasticamente", com a reabertura do comércio em vários Estados brasileiros.

"Pode ser que essa marca acabe sendo atingida mais rápido do que inicialmente previmos", diz ele à BBC News Brasil.

Combinação de fatores acelerou a expansão dos casos de coronavírus no último mês
Segundo Alves, uma combinação de fatores acelerou a expansão dos casos de coronavírus no último mês.

A decisão pela reabertura da economia a partir de início de junho, apesar de o Brasil não ter atingido o pico, é o principal deles, em sua visão, por "razões eleitoreiras".

"O Brasil é um dos poucos países do mundo que decidiu pelo relaxamento das medidas de isolamento social enquanto o número de casos e óbitos ainda cresce fora do padrão", diz ele.

"O que balizou essa decisão em vários países europeus foi uma queda substancial do número de casos, óbitos e internações, seguindo o padrão da Organização Mundial da Saúde (OMS). Esses três indicadores têm que cair por três semanas consecutivas para só então um país flexibilizar as regras. E não foi isso que fizemos. Governadores e prefeitos fizeram essa opção por razões eleitoreiras", acrescenta.

Em outro desdobramento, o presidente Jair Bolsonaro ampliou, na segunda-feira (6), os vetos à obrigatoriedade do uso de máscaras. O item de proteção deixa de ser obrigatório em presídios.

Na sexta-feira passada (3), Bolsonaro já havia vetado pontos do projeto de lei aprovado pelo Congresso no início de junho, entre eles a obrigatoriedade do uso de máscara em igrejas, comércios e escolas.

Estabelecimentos também não vão mais precisar instruir frequentadores sobre o uso correto do equipamento de proteção.

Estudos mostram que as máscaras podem reduzir substancialmente a transmissão do novo coronavírus.

Como resultado, a taxa de isolamento social no Brasil caiu para baixo de 40%, patamar semelhante ao registrado antes do fim de março, quando vários Estados brasileiros decretaram algum tipo de confinamento.

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Sem isolamento social

Ou seja, sem a adesão a essas medidas, não há como interromper o contágio, assinala Alves.

"Se olharmos a curva de aceleração do coronavírus no Brasil, ela permanece positiva, diferentemente da maioria dos países do mundo. Isso não quer dizer que nosso confinamento deu totalmente errado. Pelo contrário, salvamos muitas vidas. Mas ele deveria ter sido mais intenso e por mais tempo", assinala.

"Fizemos uma quarentena 'à brasileira'. Nossa estratégia foi de mitigar a doença e não eliminá-la. Ou seja, achatar a curva e não esmagá-la. Não rompemos a cadeia de transmissão com o intuito de deter a pandemia", completa.

Fato é que a taxa de transmissão, ou R0 (número básico de reprodução), sempre permaneceu alta no Brasil. O R0 indica para quantas pessoas, em média, cada infectado transmite o coronavírus. Quando está acima de 1, a doença está fora de controle e a infecção está se acelerando.

Dados da universidade Imperial College de Londres, no Reino Unido, atualizados nesta semana mostram que a taxa de transmissão efetiva da covid-19 no Brasil é de 1,11, a 23ª mais alta dos 56 países analisados com transmissão ativa do vírus.

Segundo o portal Covid-19 Analytics, da PUC-Rio, em nenhum momento desde o início da pandemia, essa taxa de transmissão esteve abaixo de 1 no Brasil, ou seja, a doença nunca foi realmente controlada.

'Na contramão do mundo'

Alves lembra que, diferentemente de outros países do mundo que conseguiram controlar a pandemia de covid-19, o Brasil não adotou estratégias importantes, como testagem em massa, isolamento dos doentes e rastreamento de seus contatos.

Um exemplo é o Vietnã. Com quase 100 milhões de habitantes e renda per capita inferior à um terço da brasileira, o país tomou tais medidas e, até agora, tem apenas 369 casos confirmados de covid-19 e nenhuma morte.

Especialistas também apontam que declarações negacionistas do presidente Jair Bolsonaro contribuíram para dar a falsa impressão aos brasileiros de que não havia motivos para se preocupar com a pandemia.

Um estudo recente de quatro pesquisadores da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de São Paulo mostrou que, em praticamente todas as ocasiões em que Bolsonaro minimizou a pandemia, a taxa de isolamento social no Brasil caiu.

Eles também observaram que mais pessoas morreram, proporcionalmente, nos municípios que mais votaram em Bolsonaro em 2018.

Jair Bolsonaro

Direito de imagem© ISAC NÓBREGA/EDITOR VV/AGÊNCIA BRASIL

Declarações negacionistas do presidente Jair Bolsonaro contribuíram para dar a falsa impressão aos brasileiros de que não havia motivos para se preocupar com a pandemia, dizem especialistas
Alves destaca ainda que os números oficiais estão longe da realidade. "Há muita subnotificação", destaca.

De acordo com suas estimativas, quando o Brasil atingir 2 milhões de casos confirmados, terá, na verdade, 12 milhões de casos, uma margem de erro de 500% em relação às estatísticas oficiais.

Já sobre as mortes, ele calcula que o número oficial representa apenas 60% do total.

Nesse caso, quando o país registrar oficialmente 80 mil óbitos na semana que vem, mais de 130 mil pessoas já terão morrido de covid-19.

Essas estimativas se baseiam na premissa de que não há testes suficientes feitos no Brasil para se determinar o número de infectados.

Assim, Alves e sua equipe usaram dados da Coreia do Sul — país com um dos melhores sistemas de exames de covid-19 do mundo — para calcular a taxa de mortalidade da doença, ou seja, a proporção das pessoas que morrem em relação ao total de doentes.

Assumindo que essa taxa de letalidade da doença seja fixa para todo o mundo — ou seja, que a covid-19 mata a mesma proporção de pessoas em todos os países —, eles calcularam o total de pessoas contaminadas com covid-19 no Brasil.

Alguns ajustes pontuais foram feitos, considerando diferenças nas pirâmides etárias dos dois países e tempo médio entre internação e óbito.

Foi usando essa "engenharia reversa" que eles concluíram que o Brasil pode estar com até seis vezes mais casos do que mostram as estatísticas oficiais.

Alves diz que seu maior temor agora é com a expansão da pandemia no interior do país.

"Meu maior temor agora é o aumento substancial no número de casos de covid-19 no interior do Brasil. Cidades como Manaus (AM) e Fortaleza (CE) parecem ter passado pelo pior da pandemia, mas a situação é crítica no interior desses Estados", diz.

"Os planos de relaxamento nunca tiveram a ver com saúde pública. Ao voltarmos à normalidade, estamos praticando um genocídio", conclui.

Luis Barrucho - @luisbarrucho
Da BBC News Brasil em Londres
Há 2 horas

quarta-feira, 8 de julho de 2020

O presidencialismo envenenado

Trata-se de um jogo de par ou ímpar entre a sociedade e seus Poderes cheios de dedos

Para Maquiavel, o governante encontra sempre razões legítimas para quebrar sua promessa. Para Lampedusa, quem propõe mudar tudo quer que tudo continue como está. Dois clássicos italianos sobre a incorrigível mania da política de agir acima da lei.

Não escrevo para escarnecer do governante que disse ser fácil implantar uma ditadura no País. Por que confia que a Justiça não encontre a má evidência do que disse? Não vejo lógica em tomar formicida para saber se mata. Melhor levar a sério.

Ninguém se torna o que não pode deixar de ser. A suavização combinada de desejos não extingue o princípio legal da não contradição.

Como todo mundo pode ser presidente pelo princípio da universalidade de direitos, basta partir para cima do eleitor. Espírito de aventura, esquema, capacidade, nada importa. Logo alguém da oligarquia presidencialista aplica no eleito a droga da governabilidade, o sapatinho apertado de cinderela oferecido pelo feudalismo brasileiro a todo vitorioso que chega ao poder. Com o despreparado é pior. Após a posse o governante se acha forte e arrebatador. Não é o primeiro, mas underground assim é insuperável.

Barulho ou silêncio são mobilizadores. O presidente se conecta ao sofrimento psicológico da população como o entende. A eleição presidencial anda impulsionando o enfraquecimento das pessoas como cidadãos. Atordoado pela propaganda política falsa e pela longa e real paralisia econômica, o indivíduo confinou sua alma no outro, e ali alienou sua esperança.

O método segregador, base do presidencialismo pragmático, popular e arregimentador, continua a dividir o País. Visa à dispersão de todos no individualismo dos direitos individuais exclusivos. Nascido da virtude das lutas sociais autônomas, passou a ser manipulado pelos governos. Serviu de atalho para alimentar o patinho feio do livre-arbítrio que sustenta a agenda atual. Porte de arma, codinome, não usar máscara, linguagem libidinal agressiva, informante confidencial, invadir hospital, diplomacia recalcada, justiceiros, fake news, abandono da saúde e da educação.

O governo usa o avesso da política de ação afirmativa para acabar com o diálogo, formar guetos para seu usufruto. Tabus estimulados por Poderes institucionais costumam ser o caos, fantasiados de liberdade.

No presidencialismo cada um desenvolve sua maneira de tocar a coisa. Quando o estilo esbarra num problema, procura logo disfarçar para calibrar a mágoa dos insatisfeitos. É regra do sistema secreto que nos governa agir como areia movediça. Espere no céu para saber quantos problemas são necessários para fazer do governante um problema.

Há um Brasil que não merece o Brasil onde se expressa um Estado falso permanente. De um lado, a humanidade da pessoa comum, de outro, a legalidade dos costumes feudais, o poder da oligarquia. A prevalência do segundo sobre o primeiro não deixa a substância da economia, da cultura e da ordem social sarar a cicatriz da repressão contra a modernidade, a criatividade e a paz. É a tutela da verdade, a falta de crédito da vida comum, a deseducação que paralisa a democracia.

O presidencialismo deve ser compreendido como psicologia aplicada ao comportamento da autoridade. O povo encena a peça do teatro do governante inapto, mas cheio de desejo, oportunidade e aliados de ocasião. A irracionalidade que é mandar sem saber amplia o caminho para o desregramento pessoal dentro do sistema. O que permite à minoria unida impor seu estilo e se expressar por meio da manipulação da maioria dispersa.

Tudo isso funcionou até aqui porque o fardo de empurrar o governo até o fim é a calma do povo. Este privilegiado cidadão é a vítima que assume a culpa pelo que as autoridades não fazem e o acusam de ser a origem de tudo. Não é certo acusar alguém de escolha errada se o candidato – indicado por partido e aprovado pela Justiça – atravessou na frente da urna fazendo o V com dois dedos, sorrindo sem pecado visível.

Já por qualquer slogan somos paralisados em crença errada. Continua o País escamoteando seu futuro, contido nos limites de um sujeito. O presidencialismo é a melhor forma de o governante autoritário contaminar quem o fiscaliza. E como diz o Talmud, se dois saem da mesma chaminé, os dois saem sujos.

Pobre cidadão desconectado, sobrevivente vulnerável da má higienização governamental. De repente fica sabendo que há um nível de decepção para a porca torcer o rabo e nele o sofrimento dos outros não conta. Enquanto o poder, inautêntico na falsa etiqueta, espera que cada um não cumpra seu dever. O eleitor pressente a impotência e o convite patológico para tolerar o agressor.

Assim é o presidencialismo. Não tendo nada que o prenda ao dia a dia das pessoas, o sistema político não exige do governante pudor e cautela. Antes consente nele toda imprudência no presente e negligência diante do futuro.

Não depende tanto de disposição do titular mudar as coisas. O presidencialismo que inventamos é dirigido por mau costume e desinteresse de limites. É um jogo de par ou ímpar entre a sociedade e seus Poderes cheios de dedos.

O autor deste artigo, Paulo Delgado, é sociólogo. Publicado originalmente em O Estado de S.Paulo
08 de julho de 2020 | 03h00

Vice-líder do governo Bolsonaro xinga Moraes: 'canalha, lixo'; vídeo repercute no STF e no Planalto

Otoni de Paula critica Moraes pela decisão que libertou o blogueiro Oswaldo Eustaquio, mas o proibiu de usar as redes sociais. Parlamentar é um dos alvos do inquérito das manifestações antidemocráticas. Informa Andreia Sadi, do G1 / O Globo

O deputado federal Otoni de Paula (PSC-RJ), pastor evangélico e um dos vice-líderes do governo Bolsonaro na Câmara, publicou um vídeo em suas redes sociais atacando e xingando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. O parlamentar critica Moraes pela decisão que libertou o blogueiro Oswaldo Eustaquio, mas o proibiu de usar as redes sociais.

No vídeo, publicado em 6 de julho, Otoni chama Moraes de "lixo", "tirano" e "canalha", entre outros.

"Por isso é chamado de cabeça de ovo, porque respeito, Alexandre de Moraes, não se impõe, se conquista", diz trecho do video. "Você é um lixo, você é o esgoto do STF, a latrina da sociedade brasileira". O deputado também faz ameaças ao ministro do STF.

Alexandre de Moraes é o relator do inquérito que apura a divulgação de fake news e do que investiga financiamento de manifestações antidemocráticas. Otoni de Paula é um dos alvos do inquérito das manifestações antidemocráticas.

O vídeo chocou integrantes do STF e do próprio governo por ter sido publicado no momento em que o Planalto prega a mudança de tom de Bolsonaro com o STF. O Planalto está preocupado com o avanço de investigações na corte que atingem o próprio governo, aliados e familiares.

A avaliação nos bastidores da corte, compartilhada por ministros do governo que pregam a diminuição do tom de Bolsonaro nas agressões, é a de que se trata do vice-líder do governo, e, portanto, um cargo de confiança do presidente da República. Ao todo, são 14 vice-líderes escolhidos pelo presidente.

O blog apurou que, nas últimas semanas, o Planalto pediu a seus aliados que diminuam o tom contra o STF e vetou, por exemplo, o uso da tribuna na Câmara por aliados, com o tempo da liderança do governo, para fazer ataques ao STF. Mas aliados de Otoni argumentam, ao comentar o vídeo, que não têm como controlar as redes dos vice-líderes.

Ministros do STF, no entanto, repercutem o vídeo e avaliam que a manutenção de Otoni como um dos vice-líderes de Bolsonaro reflete a desconfiança de alguns: que a mudança de comportamento do governo em relação a ataques ao STF não é para valer.

Aliados do governo ouvidos pelos blog defendem que um dos caminhos seria tirar o vice-lider do governo do posto para reforçar as intenções de pacificação do governo com o STF, mas a ideia enfrenta resistências, até agora.

Bolsonaro sanciona, com vetos, projeto que prevê medidas para tentar proteger indígenas

Entre os trechos vetados estão os que preveem obrigação do governo em fornecer água potável, higiene, leitos hospitalares e facilidades ao acesso ao auxílio emergencial.

O presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, a lei com medidas de proteção a povos indígenas durante a pandemia do coronavírus.

O texto, publicado na madrugada desta quarta-feira (8) no "Diário Oficial da União (DOU)", determina que os povos indígenas, as comunidades quilombolas e demais povos tradicionais sejam considerados "grupos em situação de extrema vulnerabilidade" e, por isso, de alto risco para emergências de saúde pública.

Bolsonaro vetou vários trechos do projeto aprovado pelo Senado em 16 de junho e antes, pela Câmara dos Deputados, em 21 de maio.

Dentre os trechos vetados, estão os que preveem:

que o governo seja obrigado a fornecer aos povos indígenas “acesso a água potável” e “distribuição gratuita de materiais de higiene, limpeza e de desinfecção para as aldeias”;

que o governo execute ações para garantir aos povos indígenas e quilombolas “a oferta emergencial de leitos hospitalares e de terapia intensiva” e que a União seja obrigada a comprar “ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea”;

que o governo seja obrigado a liberar verba emergencial para a saúde indígena e para a União;
instalação de internet nas aldeias e distribuição de cestas básicas;

que o governo seja obrigado a facilitar aos indígenas e quilombolas o acesso ao auxílio emergencial.
Para justificar os vetos, o Executivo argumentou que o texto criava despesa obrigatória sem demonstrar o “respectivo impacto orçamentário e financeiro, o que seria inconstitucional”.

Segundo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o país somava 10,3 mil casos confirmados de coronavírus entre indígenas e 408 mortes no último dia 2. Os números são maiores que os contabilizados no dia anterior, 1º de julho, pela Secretaria de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde: 6,8 mil casos e 158 mortes listadas no site da secretaria.

A Abip atribuiu a diferença ao fato de a Sesai não estar fazendo atendimento e registros dos indígenas infectados que moram em cidades. Um estudo da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel) revelou que a prevalência do novo coronavírus entre a população indígena urbana (5,4%) equivale a cinco vezes a encontrada na população branca (1,1%) (veja vídeo ao final da reportagem).

A organização não governamental Instituto Socioambiental, que atua em defesa de povos indígenas e comunidades tradicionais, criticou em rede social os vetos do presidente.

"No mesmo ritmo que a #Covid19 avança em aldeias e comunidades, se intensifica a omissão do governo com indígenas, quilombolas e populações tradicionais. Com vetos ao #PL1142, Bolsonaro nega, por exemplo, acesso à água potável e materiais de higiene", diz a mensagem.

Projeto original

O projeto ressalta que povos indígenas, comunidades quilombolas e povos tradicionais são "grupo em extrema situação de vulnerabilidade" e que, por isso, têm alto risco de contaminação.

O projeto cria o Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nos Territórios Indígenas, coordenado pela União, para assegurar o acesso às ações e aos serviços de prevenção e tratamento da Covid-19. O plano previa:

acesso à água potável;

distribuição gratuita de materiais de higiene, limpeza e desinfecção para comunidades indígenas;
garantia de equipes multiprofissionais de saúde indígena, qualificadas e treinadas para enfrentamento da Covid-19, com disponibilização de local adequado para quarentena, bem como acesso a equipamentos de proteção individual (EPIs);

disponibilização de testes de identificação do vírus (rápidos e RT-PCRs), medicamentos e equipamentos médicos adequados para o combate ao Covid-19;

estrutura para o atendimento aos povos, como, por exemplo: oferta emergencial de leitos e ventiladores; acesso a ambulâncias para transporte fluvial, terrestre ou aéreo; construção emergencial de hospitais de campanha em municípios próximos a aldeias com maiores casos de contaminação pelo coronavírus;

distribuição de materiais informativos sobre sintomas da Covid-19;
pontos de internet nas aldeias para viabilizar acesso à informação;
garantia de financiamento e construção de casas de campanha para o isolamento de indígenas nas comunidades.

O plano determina, ainda, que nenhum atendimento da rede pública seja negado por falta de documentação ou outros motivos.

Pelo projeto, o atendimento aos indígenas que não vivem em comunidades ou aldeias deve ser feito por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), com as devidas adaptações na estrutura, "respeitando as especificidades culturais e sociais dos povos".

Povos isolados

O projeto também trata, especificamente, sobre povos indígenas isolados ou de recente contato "com o objetivo de resguardar seus direitos e evitar a propagação da Covid-19".

Pelo texto, "somente em caso de risco iminente e em caráter excepcional" será permitida a aproximação a estes grupos para prevenção e combate à pandemia. A aproximação deve ser feita por meio de um plano específico articulado pela União.

O projeto determina, ainda, que o governo federal elabore, no prazo de 10 dias, planos de contingência tanto para situações de contato em comunidades isoladas quanto para casos de surtos e epidemias em comunidades de recente contato.

A União também deve suspender atividades próximas às áreas de ocupação de índios isolados, desde que não sejam fundamentais para sobrevivência desses indígenas.

O texto ainda proíbe o ingresso de outras pessoas em áreas com a presença de indígenas isolados em caso de epidemia ou calamidade, desde que não sejam autorizadas pelas autoridades.

Alimentação

O projeto determina, ainda, a garantia da segurança alimentar e nutricional dos povos. A União deve distribuir diretamente às famílias indígenas, quilombolas e dos demais povos tradicionais, por meio de cestas básicas, sementes e ferramentas agrícolas.

Pelo texto, a distribuição e cestas básicas e outros produtos relacionados ao combate da Covid-19 devem ser preferencialmente realizados pelo poder público, com a participação das comunidades interessadas.

Além disso, cabe ao governo federal garantir suporte técnico e financeiro à produção e escoamento dos povos, por meio da aquisição alimentos em programas da agricultura familiar.

O texto também determina que os ministérios da Agricultura e da Cidadania, junto da Fundação Nacional do Índio (Funai) e da Fundação Cultural Palmares, crie um programa específico de crédito para povos indígenas e quilombolas para o Plano Safra 2020.

Quilombolas e demais povos tradicionais

Enquanto durar estado de calamidade pública, aprovado pelo Congresso (até 31 de dezembro), os quilombolas e demais povos tradicionais do país também têm direito ao plano emergencial estabelecido aos indígenas.

O texto prevê ações emergenciais de saúde, incluindo:

medidas de proteção territorial e sanitária, restringido o acesso às comunidades por pessoas estranhas, com exceção de missões religiosas que já estejam atuando no local e servidores públicos;
ampliação do apoio por profissionais de saúde e garantia de testagem rápida para casos suspeitos;
inserção, pelo Ministério da Saúde, do quesito raça/cor no registro dos casos da Covid-19, com notificação compulsória em casos confirmados entre quilombolas e sua "ampla e periódica e publicidade";
os recursos no atendimento dessas comunidades devem partir de dotações consignadas ao Ministério da Saúde e ao Ministério da Cidadania ou de fundo específico para o combate ao coronavírus.

Publicado originalmente por G1 / O Globo

Universidade inglesa prevê 8,2 mil mortes por covid no Brasil esta semana

Pesquisa do Imperial College de Londres prevê um aumento inédito de fatalidades nesta semana. 

País registrou 1.254 vidas perdidas por causa da covid-19 em 24 horas, totalizando 66.741 óbitos, além de um acréscimo de 45.305 novos casos

No dia em que o presidente da República, Jair Bolsonaro, confirmou estar infectado com a covid-19, o Brasil registrou mais 45.305 casos e 1.254 mortes pelo novo coronavírus. No total, são 1.668.589 diagnósticos positivos e 66.741 vidas perdidas. O balanço diário do Ministério da Saúde, por si só, mostra que o novo vírus não dá trégua ao Brasil, o que é reforçado por pesquisas que confirmam que o país ainda está longe do fim da pandemia. Pelas novas análises do Imperial College de Londres, o Brasil deve registrar mais 8,2 mil perdas esta semana. Com a margem de erro entre 7,5 mil e 8,6 mil mortes, caso a estimativa da pesquisa internacional se concretize, seria o maior acumulado de fatalidades do mundo e o mais alto já registrado no histórico da pandemia brasileira. Até ontem, a 28ª semana epidemiológica somava 2.476 mortes.
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O número crescente de registros diários no país também tem chamado a atenção de autoridades da saúde ao redor do mundo. Ontem, a diretora da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Carissa Etienne, disse que as atualizações de casos da covid-19 do Brasil têm feito com que o país lidere e puxe a curva das Américas, considerada atualmente o epicentro da pandemia. “Dois meses atrás, os Estados Unidos representavam 75% dos casos em nossa região. Na semana passada, registraram menos da metade dos casos na região, enquanto a América Latina e o Caribe registraram mais de 50% dos casos. Sozinho, o Brasil foi responsável por cerca de um quarto deles”, afirmou em coletiva.

O crescimento da curva é notado no balanço dos estados. Desde que as regras de isolamento e distanciamento sociais foram flexibilizadas em meio à pandemia, capitais brasileiras viram seus índices de infecções aumentarem. Metade das unidades federativas (13) já bateu a marca de mil óbitos; outras estão próximas de atingi-la.

São Paulo atingiu, ontem, 332.708 casos e 16.475 mortes em decorrência do coronavírus. O governo paulista estima que o estado possa ter, em 15 de julho, até 23 mil mortes e 470 mil casos da doença.

O interior já responde por 70,8% dos novos casos da covid-19 registrados no estado de São Paulo. O Rio de Janeiro, outro estado bastante afetado pela pandemia, registrou, ontem, o total de 10.881 mortos e 124.086 infectados. O segundo estado mais afetado em números absolutos de casos, após SP, é o Ceará, que, no fim de semana, ultrapassou o Rio em total de infectados. São 124.952 casos confirmados. A quantidade de mortes, porém, é menor, 6.556 pessoas.

Pernambuco e Pará têm mais de 5 mil perdas cada, com 5.234 e 5.128 registros, respectivamente. Os outros oito estados com mais de mil fatalidades são: Amazonas (2.952), Maranhão (2.286), Bahia (2.216), Espírito Santo (1.880), Rio Grande do Norte (1.291), Minas Gerais (1.282), Alagoas (1.192) e Paraíba (1.145).
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Transmissão

A nova análise do Imperial College de Londres apontou, ainda, que o Brasil sofreu um retrocesso e aumentou a Rt para 1,11, ou seja, cada grupo de cem pessoas infectadas transmite o vírus para outras 111. Na semana passada, o país chegou perto de atingir níveis considerados controlados da transmissão, Taxas acima de 1 significam que a disseminação da covid-19 no país está descontrolada, não sendo possível rastrear com precisão o caminho do vírus. Com a atualização, o Brasil se mantém pela 11ª semana na lista de países com transmissão ativa.

O Imperial College de Londres estima, ainda, a taxa de subnotificação dos 55 países avaliados. Segundo o estudo, o Brasil reporta 43,9% dos casos, o que representa uma melhora gradual ao longo das semanas. No balanço anterior, o índice estava em 36,3%. Em relação ao início de abril, o avanço foi significativo, já que, à época, o país só registrava 10,4% das infecções.

Para o cálculo, os pesquisadores consideram o número de mortes reportados como sendo um dado fiel e levam em conta os registros de óbitos de duas semanas anteriores e de casos dos 10 dias anteriores. Quanto maior a discrepância entre a taxa de mortalidade divulgada e a estimada, maior o grau de subnotificação.

Bruna Lima e Maria Eduarda Cardim / Correio Braziliense

Coronavírus: o modelo matemático que explica como evitar meio milhão de mortes na América Latina


médica com máscara

Universidade de Washington aponta que medidas importantes como uso de máscara podem evitar centenas de milhares de mortes na América Latina

Rafael Lozano insiste que a mensagem importante aqui é: vidas podem ser salvas.

O renomado médico mexicano é diretor de sistemas de saúde do Instituto de Métricas e Avaliação da Saúde (IHME, na sigla em inglês) da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, autor de um modelo que prediz como será a propagação da covid-19 em diversos países do mundo.

No fim de junho, foram acrescentados três cenários possíveis ao modelo matemático, que é uma das referências utilizadas pela Casa Branca para tomar decisões e traçar estratégias.

Os cenários levam em conta medidas adotadas por países ou regiões para projetar quantas pessoas serão infectadas ou morrerão da doença causada pelo novo coronavírus em 1º de outubro.

"Mais do que contar mortos, os cenários buscam quantificar quantas vidas podem ser salvas. Isso muda muito a mensagem", afirma Lozano à BBC Mundo (serviço em espanhol da BBC) por videochamada desde a cidade americana de Seattle.

(Piora da alimentação na pandemia deixa população mais vulnerável à covid-19, diz ex-chefe da FAO

Brasil responde por um quinto das novas mortes por coronavírus no mundo
Coronavírus: o que podemos aprender com a gripe espanhola, pandemia que matou milhões há 100 anos

Dos Medici à Amazon: como pandemias ajudaram megacorporações a crescer ainda mais
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A insistência de Lozano no enfoque otimista faz sentido. Em junho, América Latina e Caribe se tornaram o novo epicentro da pandemia, depois de China, Europa e EUA ocuparem esse posto.

Nos últimos 14 dias, o Brasil e outros países do subcontinente americano somaram 872 mil casos novos, pouco mais de um terço do total global (2,6 milhões), segundo dados do Centro Europeu de Controle e Prevenção de Doenças.

Se formos considerar as mortes por covid-19 registradas no fim de junho, morriam cerca de 5 mil pessoas no mundo por dia. A cada 10 mortes, 2 ocorriam no Brasil e 3 em outros países da América Latina e do Caribe.

Segundo cálculos do IHME, em 1º de outubro, a América Latina e o Caribe (contando o Caribe inglês) somarão 438 mil mortes.

Mais especificamente, o Brasil deve superar 166 mil mortes e o México 88 mil, enquanto outros seis países ultrapassarão a barreira das 10 mil mortes: Argentina, Chile, Colômbia, Equador, Guatemala e Peru.

E esses números nem são os projetados pelo cenário mais fatalista.

Mortes por covid-19 na América Latina
Mortes registradas até 3 de julho* Mortes projetadas para 1º de outubro**
Argentina 1.385 24.721
Bolívia 1.271 7.334
Brasil 61.884 166.362
Chile 5.920 25.344
Colômbia 3.641 35.314
Costa Rica 17 39
Cuba 86 306
República Dominicana 765 5.665
Equador 4.639 20.260
El Salvador 191 4.357
Guatemala 843 10.090
Haiti 110 1.377
Honduras 591 4.958
México 29.189 88.160
Nicarágua 83 280
Panamá 667 2.802
Paraguai 19 271
Peru 10.045 36.210
Uruguai 28 340
Venezuela 57 2.893
Fonte: *ECDC, **Instituto de Métricas e Avaliação da Saúde (IHME)

O modelo

O IHME não é o primeiro nem o único instituto medindo o curso da pandemia de covid-19 a partir do número de pessoas suscetíveis à doença, daquelas expostas ao vírus, de infectados e de recuperados.

Mas a equipe do instituto vai além e está em contato com governos da Colômbia, do Peru, do Brasil, do Chile e dos EUA, entre outros tomadores de decisão.

"A grande vantagem do modelo que estamos usando é que nos baseamos em uma série de variáveis que ajudam não apenas a estabelecer dados concretos como também em que momento haverá uma demanda maior por leitos hospitalares", diz Lozano.

Para isso, são levados em consideração "elementos como o número de pessoas que circulam pelas ruas, quando as normas de distanciamento social entraram em vigor e o grau de aceitação destas normas, ou que proporção da população usa máscara."

Além disso, leva em consideração outros determinantes "menos tradicionais" entre modelos matemáticos, segundo ele, como densidade demográfica, perfis de mortalidade no país ou padrões sazonais de pneumonia — que atualmente estão no auge no hemisfério Sul.

Mas talvez o mais interessante seja como seu gráfico interativo simplesmente mostra o efeito que diferentes decisões políticas e individuais têm na trajetória da pandemia.

Os 3 cenários
Lozano explica que, ao construir o modelo matemático, conversaram com governantes, equipes técnicas e encarregados de setores de saúde pública das partes mais distintas do mundo.

"Primeiro, eles queriam saber em que momento haverá uma pressão maior por leitos", conta Lozano, tanto gerais quanto em unidades de terapia intensiva (UTI), e também por respiradores artificiais.

Depois, segundo Lozano, os países queriam entender quando é o momento de sair da mitigação da pandemia, do distanciamento social severo.

"E agora, estamos com o debate entre não fazer nada ou forçar muito a abertura, e é sempre bom para o político e a população em geral ter em vista esses cenários."

O primeiro cenário é o "pessimista". Ele supõe que as medidas de quarentena (obrigação de ficar em casa, fechamento de escolas e serviços não essenciais, proibição de eventos coletivos etc.) vão se flexibilizando de forma contínua e constante.

Segundo Lozano, "se as medidas preventivas forem flexibilizadas, estimamos para a região da América Latina e do Caribe que haverá cerca de 900 mil mortes em 1º de outubro".

"Não há governo que possa aceitar esse tipo de cenário, mas não mostrá-lo é deixar de informar", afirma o pesquisador.

Nos outros dois cenários, as projeções também se baseiam na ideia de que as medidas vão sendo relaxadas, mas aqui, se a taxa diária de mortes atinge a marca de 8 por 1 milhão de habitantes, o país volta a impor medidas de restrição de circulação por seis semanas.

A diferença desses dois cenários está na utilização ou não de máscaras.

Na projeção que o IHME chama de "tendência atual", a população não usa máscaras de forma abrangente. Mesmo assim, como resultado, a estimativa de mortes por covid-19 para toda a região passa a ser 438 mil em 1º de outubro.

No terceiro cenário, em que, além da volta de medidas de distanciamento, o uso de máscara passa a ser generalizado, as mortes cairiam para 389 mil.

"É uma ação que mistura a responsabilidade dos indivíduos, toda vez que saímos para as ruas, com a dos governantes, que são os que estão gerando essas válvulas de escape para reabrir a economia", diz Lozano.

Quais são as projeções para o Brasil?

O modelo matemático da Universidade de Washington aponta três perspectivas para o Brasil.

No cenário "pessimista", em que a flexibilização do distanciamento social segue em frente mesmo quando a situação se agrava, o país atingiria a marca de 4,5 mil mortes por dia em 7 de setembro. Em comparação, o Brasil registra em 7 de julho uma média de quase mil mortes por dia.

No cenário considerado como "tendência atual", o país estaria em torno do patamar de 900 mortes por dia. E caso haja uma adoção abrangente de máscaras pela população, haveria cerca de 760 mortes por dia.

Em números absolutos, o modelo prevê 340 mil mortes no pior cenário, 166 mil na perspectiva de abre e fecha e 147 mil com uso abrangente de máscaras.

A Universidade de Washington também estima que, por causa da subnotificação, o número de casos novos diários de covid-19 é seis vezes maior que o oficial. Ou seja, segundo o modelo, 250 mil pessoas contraem atualmente o vírus no país por dia. Em comparação, os dados oficiais indicam uma média de 40 mil casos por dia.

Daqui a um mês, seriam 900 mil no pior cenário, cerca de 110 mil na tendência atual e quase 100 mil com uso abrangente de máscara.

O caso do Equador

Ao analisar os gráficos, os cenários parecem não oferecer soluções simples para os governos da região.

O exemplo mais dramático é o do Equador, onde o IHME projeta uma segunda onda a partir de agosto.

Segundo o modelo, se as medidas de flexibilização avançarem sem qualquer recuo, o país sul-americano passará das 4.781 mortes registradas em 6 de julho para mais de 21,3 mil em 1º de outubro. No cenário em que o distanciamento é readotado, morreriam 20,2 mil. Na projeção que considera uso abrangente de máscaras, as mortes totalizariam 19,5 mil.

"A epidemia no Equador é completamente diferente da epidemia no Brasil, no México e na Colômbia. É muito parecida com a europeia. Teve seu crescimento nos meses de março e abril e depois um platô por muitos meses", explica Lozano.

Segundo ele, a pequena diferença entre os três cenários do Equador mostram que quando os níveis de propagação do vírus são muito elevados, as intervenções perdem sua eficácia.

Os bem-sucedidos Paraguai e Uruguai

Por outro lado, as projeções preveem um crescimento considerável de infecções e mortes em países que têm sido elogiados mundialmente por suas exitosas estratégias de contenção do coronavírus.

É o caso do Paraguai, que em 6 de julho tinha 20 mortes pela covid-19 e pode ter 271 mortes em 1º de outubro, segundo o IHME. Nos mesmos três meses, o Uruguai passaria de 28 para 340 mortes.

Em relação a esses dois países, Lozano afirma que a explicação dos números está na sazonalidade e na prevalência de pneumonias. "O inverno no Sul é dentro e fora de casa, e não apenas fora, como acontece nos países europeus. Isso faz uma enorme diferença."

Segundo Lozano, do IHME, "a narrativa sobre a pandemia deve começar em busca de esperança, de saídas".

Para isso, ele acredita que é importante fornecer dados que permitam aos governos tomar medidas fundamentadas, mas também que as pessoas possam avaliar e decidir se devem ou não visitar seus avós ou encontrar seus amigos.

Descobrir qual é a prevalência de casos na área, se a reunião ocorrerá em um espaço aberto ou fechado e quanto tempo durará, por exemplo, "permite que um comportamento mais colaborativo reduza a propagação do vírus", defende o médico mexicano.

"O que precisamos é melhorar nossos indicadores para que as pessoas possam avaliar a situação dia a dia e se sentirem confiantes em sair."

Ana Pais (@_anapais)
BBC News Mundo