domingo, 10 de novembro de 2019

A volta da corrupção, perturbação à vista

Em seu primeiro comentário sobre a libertação do ex-presidente Lula e seus impactos no governo de Jair Bolsonaro, o principal articulador da nova direita internacional, Steve Bannon, classifica o petista como "o maior ídolo da esquerda globalista do mundo" desde a saída de Barack Obama do governo dos EUA, e afirma que sua volta às ruas trará "enorme perturbação política ao Brasil".
Em entrevista exclusiva à BBC News Brasil, o CEO da campanha de Donald Trump à presidência e ex-estrategista-chefe de governo do republicano chama Lula de "cínico e corrupto", diz que o petista foi corrompido pelo poder e sugere que seu retorno significará a "volta da corrupção" ao Brasil.
"Agora que está livre, Lula vai virar um imã para a esquerda global se intrometer na politica brasileira. Ele é o "poster boy da esquerda globalista", diz.
O americano, por outro lado, avalia as investigações sobre o uso de laranjas no PSL e suposto caixa 2 na campanha de Bolsonaro à presidência como "puro non-sense" e uma tentativa do establishment de boicotar o governo. "Aconteceu o mesmo com Trump."
Na visão de Bannon, que cancelou recentemente viagens ao Brasil, à Inglaterra, à Itália e à Austrália para estruturar uma força-tarefa contrária ao processo de impeachment contra Trump, nos EUA, é "bastante evidente" que o STF (Supremo Tribunal Federal) agiu para atrapalhar Bolsonaro ao decidir que réus só devem ser presos após se esgotarem as possibilidades de recursos - o que permitiu a libertação de Lula da carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, na última sexta-feira
Questionado sobre se estes revezes, somados à volta da esquerda na Argentina e a derrota do aliado Matteo Salvini, na Itália, representaria a derrocada da onda da direita nacionalista populista, Bannon reconhece "obstáculos no caminho", mas reage com as habituais críticas à imprensa.
"Isso é ilusão. nós ainda estamos nos primeiros passos, isso é uma revolução", diz
Para Bannon, a liberdade de Lula pode ajudar a consolidar a base de apoio de Bolsonaro em torno da aprovação de reformas, ao mesmo tempo em que pode unificar a esquerda em torno do ex-presidente.
"Mas não ache que isso não vá vir sem um preço", alerta.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
LulaDireito de imagemEPA/FERNANDO BIZERRA JR.
Image captionPara Bannon, Lula é 'cínico e corrupto'
BBC News Brasil: Como estão as coisas com o processo de impeachment do presidente Donald Trump nos EUA?
Steve Bannon: Criamos um portal e estamos fazendo transmissões diárias, com notícias 24 horas, podcasts. Começamos há duas semanas porque nada estava sendo feito, não havia um local centralizado e é preciso ter para dar respostas às fake news, teorias de conspiração e de caça às bruxas. Ela (Nancy Pelosi, líder do partido democrata na Câmara dos EUA) está dando uma aula magna em guerra política. Então é preciso organizar as forças para contrapor. Isso vai ser grande, bem grande.
BBC News Brasil: A ideia nessa entrevista é ouvi-lo também sobre Bolsonaro, Lula e o que está acontecendo no Brasil.
Bannon: Veja, o Brexit, 2016 (eleição de Donald Trump) e até Bolsonaro são fatores intrinsecamente ligados. Brexit e 2016, definitivamente conectados,e Bolsonaro de forma decorrente. Você vê as mesmas coisas acontecendo. É irônico que no Halloween, em 31 de outubro, eles votaram para formalizar o processo de impeachment nos EUA no exato mesmo dia em que o Reino Unido não deixou a União Europeia como previsto, três anos depois (do referendo do Brexit).
E o voto da nova eleição geral do Reino Unido, em 12 de dezembro, vai provavelmente acontecer a poucos dias do voto do impeachment contra Trump. Acabam de definir que vai ser em meados de dezembro. Então, essas coisas mostram a ordem estabelecida se recusando a reconhecer o poder desse movimento populista e nacionalista.
E Bolsonaro, Lula e o Judiciário permitindo que Lula saia da prisão, isso vai fortalecer Bolsonaro. Acho que os seguidores dele verão a importância de continuar empurrando a agenda dele com um senso extra de urgência. Mas acho que isso vai causar uma perturbação enorme no Brasil, potencialmente enorme.
BBC News Brasil: Por quê?
Bannon: Acho que Lula é um dos políticos e indivíduos mais cínicos e corruptos no mundo. Obama se referiu a esse cara como "o cara". Literalmente, entre aspas, "o cara" e ria.
Lula é o esquerdista o mais celebrado da história do mundo. O que eu chamo reino do terror financeiro e da corrupção… Foi Lula que fez essa roda girar em conchavo com um bando de políticos corruptos brasileiros.
Lula é uma figura trágica. Dado de onde veio e sua ascensão política, havia muitas, muitas coisas boas que ele estava fazendo. Mas ele é alguém que foi corrompido por dinheiro e poder. É evidente e, para mim, isso agora vai causar uma enorme perturbação política no Brasil.
Foi o que aconteceu no Reino Unido e nos EUA. Nos EUA, Nancy Pelosi e as forças da esquerda e da ordem estabelecida forçaram os EUA a uma crise constitucional neste fim de ano, junto à temporada de feriados. No Reino Unido, há uma crise constitucional no Reino Unido. Essencialmente, haverá um segundo referendo sobre o Brexit. As forcas antidemocráticas ganharam, elas tiraram as pessoas do caminho.
A mesma coisa no Brasil, isso vai levar o Brasil a uma crise constitucional, porque agora há um líder ativo da oposição, que deveria estar preso, agora solto e pronto para dar fôlego a seu grupo e tentar impedir tudo o que Bolsonaro está tentando fazer.
BBC News Brasil: Quando o Sr. fala em enorme perturbação, está falando de que exatamente?
Bannon: Tentar parar o movimento de reformas de Bolsonaro, que claramente se contrapõe a muito da corrupção que emanava no escândalo da Lava Jato e outros. A reforma da Previdência, toda a reestruturação financeira, e a retirada da corrupção do sistema.
Segundo, acho que Lula vai tentar criar problemas sobre a Amazônia. O que ele traz consigo é uma rede da esquerda marxista e cultural. Traz os recursos, os globalistas, e traz na forma de um populismo de esquerda. Mas ele é um globalista e eles sempre o apoiaram. Particularmente nesse momento sensível, as forcas globalistas vão tentar interferir nos direitos absolutamente nacionais da população brasileira, que tem o direito de tomar conta da Amazônia.
BBC News Brasil: O Sr. acha que este cenário permitiria ao presidente Bolsonaro eventualmente escalar a repressão policial ou militar?
Bannon: Não, de jeito nenhum. Acho que Lula vai fortalecer as forças populistas de Bolsonaro para dizerem "Temos que fazer essas reformas o quanto antes". Acho que isso é um tiro que ajuda a consolidar o controle de Bolsonaro e colocar um senso de urgência a seus seguidores.
Agora que está livre, Lula vai virar um imã para a esquerda global se intrometer na politica brasileira. Ele é o "poster boy da esquerda globalista". Entre todos no mundo, ele é o maior ídolo, agora que Obama está fora da política. E até Obama se referiu a ele. Com Lula, toda a corrupção antiga vai voltar.
BBC News Brasil: Para muitos analistas, a saída de Lula da prisão aumentaria a polarização no Brasil e isso poderia ser positivo para o presidente Bolsonaro, já que ele enfrenta problemas dentro do seu próprio partido…
Bannon: Espere, espere. Previ a vitória de Bolsonaro quando ele tinha 5% das intenções de voto e disse que ele ganharia quase no primeiro turno. Acho que é positivo por mostrar que é preciso haver urgência e consolidação em torno de Bolsonaro e de seu projeto, mas não acredite que isso não vá vir sem um preço.
A razão de ser preciso mostrar urgência em ajudar seu programa é o fato de que ele agora vai ser desafiado por um "rockstar" internacional da esquerda globalista. Não vai ser tranquilo.
Olhe para o Reino Unido e para os EUA, os dois países estão passando por terremotos. Acho que o processo de impeachment pode potencialmente fortalecer o presidente Trump e acho que a eleição pode fortalecer o movimento de saída do Reino Unido da União Europeia, mas é um teste, é desestabilizador e ninguém sabe no que isso vai dar. Ninguém pode prever nada, cada dia agora é importante.
BBC News Brasil: O Sr. falou em corrupção. O PSL, partido de Bolsonaro, é investigado nesse momento por mau uso de recursos durante a eleição e no pagamento a assessores.
Bannon: Também aconteceu com o presidente Trump. Isso é non-sense, tudo o que está acontecendo é tangencial às mesmas coisas que aconteceram com Trump. Lula é corrupto. É por isso que ele é tão hipócrita. ele veio da pobreza e em algum momento foi idealista. Ele é a trágica figura da modernidade, que é corrompida pelo poder, dinheiro e influencia. Lula foi corrompido e estava preso por sua corrupção e por essencialmente permitir que todos fossem corruptos no governo Dilma. Mas isso (investigações contra Bolsonaro e o PSL) vai ser rapidamente contestado.
BBC News Brasil: Mas, diferente do que acontece com o presidente Trump, Bolsonaro está tendo problemas sérios com seu próprio partido. Ele teve discussões duras e públicas com o presidente do Partido…
Bannon: Isso não é verdade, isso não é verdade.
BBC News Brasil: Mas o próprio presidente admitiu que pode deixar seu partido…
Bannon: Trump teve enormes problemas com seu próprio partido. Outro dia, (o ex-senador republicano) Jeff Flake disse que, se o voto fosse secreto, 35 senadores republicanos votariam pelo impeachment. O establishment do partido republicano tolera Trump, não apoia Trump. E lembre-se que Boris Johnson e Nigel Farage (líder do Partido Brexit) apanharam do establishment do partido Conservador, os manda-chuvas do partido não querem um partido nacionalista populista. O mesmo establishment está fazendo isso com Bolsonaro. Tudo está intrinsecamente ligado. há uma revolta populista nacionalista em escala global em nações individuais e uma ordem de demônios da ordem estabelecida vai lutar até a morte porque entende que, se nós ganharmos, vamos colocar os corruptos fora do jogo.
Jair BolsonaroDireito de imagemREUTERS
Image captionLibertação de Lula pode fortalecer Bolsonaro, diz Bannon
BBC News Brasil: Mas, o que o Sr. está propondo? Se, nas suas próprias palavras, os partidos dos políticos que o Sr. defende são ruins e corruptos, qual é a saída?
Bannon: É preciso haver reformas contínuas. Transparência contínua.
BBC News Brasil: Centralização do poder?
Bannon: Sou o primeiro a dizer que deve haver reformas enormes em Washington. Há o termo "drenar o pântano", que não uso porque acho meio etéreo demais, mas é preciso tirar da classe política os lobistas. O mesmo no Brasil e no Reino Unido. Lembre-se que a razão pela qual o Brexit não aconteceu foi porque os políticos não quiseram.
BBC News Brasil: Para muitos, a onda da direita nacionalista populista estaria se desfazendo mais rápido do que se imaginaria a partir de todos estes eventos que o Sr. cita.
Bannon: Eu digo a você que as mesmas pessoas me falaram isso quando eu comecei. Isso é ilusão. nós ainda estamos nos primeiros passos, isso é uma revolução global. Você vê isso ficando mais e mais forte.
Nem teremos todas as vitórias. Salvini vai voltar. Vamos ter obstáculos no caminho, tivemos obstáculos no caminho com o Brexit, tivemos obstáculos no caminho com o impeachment de Trump, tivemos obstáculos no caminho quando deixaram Lula sair da prisão.
BBC News Brasil: Mas e na Argentina (com a eleição de Alberto Fernández)?
Bannon: Tudo bem. Tudo bem. Aliás, as pessoas agora, e você vê isso, estão prestando atenção na diferença entre nacionalistas e globalistas a cada eleição. As mesmas pessoas que não nos deram crédito no começo estavam errados naquela época e estão errados agora. O grupo que diz que o movimento está enfraquecendo é o mesmo grupo de defensores da ordem estabelecida que estavam errados no começo. Eu sei que a BBC, a The Economist, o Financial Times, o New York Times, iriam todos amar ver o movimento acabar. Mas não vai acabar. Vai ficar mais forte todos os dias.
BBC News Brasil: O cenário que o Sr. está descrevendo, e não eu, é de desafios para os principais líderes do que o Sr. chama de movimento nacionalista populista. Se eles ficarem isolados, isso pode resultar em uma escalada em autoritarismo? O Sr. deve ter acompanhado o que aconteceu com Eduardo Bolsonaro…
Bannon: Você pode descrever assim, porque você é o partido da imprensa opositora. Entendo que vocês vejam (o líder húngaro Viktor) Orban, Trump e Bolsonaro caminhando para a repressão, mas as pessoas do nosso lado não vêm assim.
BBC News Brasil: Não, eu quero trazer um exemplo prático, me deixe completar. Eduardo Bolsonaro, o Sr. o conhece muito bem…
Bannon: Muito bem, sim.
BBC News Brasil: Eduardo Bolsonaro mencionou o AI-5, que foi um dispositivo usado usado na ditadura militar no Brasil para fechar o Parlamento, tirar mandatos de políticos, caçar ministros da Suprema Corte, usar tortura contra inimigos políticos como uma ferramenta possível no caso de a esquerda se radicalizar ou voltar ao poder.
Bannon: Mas você está usando um exemplo extremo.
BBC News Brasil: Não, o exemplo foi usado pelo filho do presidente, não eu.
Bannon: Mas você está interpretando de forma extrema. O que eu acho que ele está dizendo é eles não vão permitir que essa eleição seja derrubada por meios não democráticos e que certamente não vão deixar o Judiciário, junto a Lula, tentar por meios não democráticos reverter as eleições.
Não há nada de anormal, no que ele diz, ele está apenas afirmando um fato básico e acho que Eduardo Bolsonaro está 100% correto, como Trump está: as forças antidemocráticas, as forças fascistas são as do establishment contra o Brexit, do impeachment contra Trump e agora vejo o mesmo no Brasil: deixar alguém corrupto dos pés a cabeça sair da prisão para essencialmente ameaçar Bolsonaro. É o que vai acontecer. Isso é antidemocrático. nós tivemos eleições e a ordem estabelecida perdeu. Mas eles se recusam a deixar que a voz das pessoas seja respeitada.
BBC News Brasil: No Brasil, esta foi uma decisão da Suprema Corte. Uma decisão de 11 juízes. O Sr. está dizendo então que a Suprema Corte brasileira trabalha contra o presidente Bolsonaro?
Bannon: Acho que é bastante evidente. Que a Suprema Corte está tentando ajudar a reverter o mandato que Bolsonaro tem com uma vitória arrebatadora em 2018. Não tenho dúvidas sobre isso. não sou brasileiro, mas como um observador externo, não há dúvida de que Lula é corrupto e deveria ficar muito tempo preso.
BBC News Brasil: O Sr. foi convidado para falar no Congresso brasileiro e recuou…
Bannon: Eu estava indo, queria ir e estava honrado em ir. Tenho ideias muito fortes sobre a Amazônia e o manejo brasileiro sobre seu território, mas a razão pela qual não pude é porque eu comecei um trabalho intenso e diário contra o impeachment, então simplesmente não dá.
Eu cancelei idas a Inglaterra, Roma, Ásia, Austrália e ao Brasil. Cancelei todas as minhas viagens por causa do impeachment. Os únicos lugares a que estou indo são Hungria e Taiwan, mas tive que cancelar tudo porque estão tentando remover Trump do governo.

    Mas quero muito ir assim que a nossa crise constitucional ficar para trás.
    (Fonte: BBC News Brasil)

    sexta-feira, 8 de novembro de 2019

    O dono do PT e o seu labirinto

    1.Condenado: triplex do Guarujá

    No caso conhecido como "Tríplex do Guarujá", o petista é acusado de receber propina da empreiteira OAS na forma da reserva e reforma de um apartamento no balneário paulista.

    Em julho de 2017, Lula foi condenado a 9 anos e 6 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo então juiz Sergio Moro.

    Depois, a condenação foi confirmada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em janeiro de 2018, que aumentou a pena para 12 anos e um mês de prisão.

    Em abril de 2019, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu manter a condenação, mas reduziu a pena imposta a Lula para 8 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão.

    Na ocasião, a defesa do ex-presidente Lula criticou a decisão dos ministros. Para a defesa do ex-presidente, "o único desfecho possível é a absolvição do ex-presidente Lula, porque ele não praticou qualquer crime".

    2. Condenado: sítio de Atibaia

    No caso do sítio de Atibaia, Lula é acusado de receber propinas das construtoras OAS e Odebrecht por meio de reformas, em 2010, num sítio no município do interior paulista.

    O imóvel pertence formalmente ao empresário Fernando Bittar, mas o MPF alega que Lula é o verdadeiro dono do sítio e era o principal usuário do local.

    Gabriela Hardt
    A juíza federal Gabriela Hardt condenou Lula a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro. (Foto - reprodução AJUFE).

    Além de Lula, outras dez pessoas foram condenadas na sentença proferida pela juíza , entre elas os ex-presidentes da OAS, Léo Pinheiro, e da Odebrecht, Marcelo Odebrecht. O ex-presidente Lula nega irregularidades, enquanto os dois empresários são hoje colaboradores da Lava Jato, e confessaram os crimes.

    Em nota, a defesa de Lula acusou a Justiça Federal de Curitiba de fazer "uso perverso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política".

    A defesa destacou que o ex-presidente nunca foi o dono do sítio, e que a decisão se baseia num suposto "caixa geral" de propinas das empreiteiras porque não há, segundo a defesa, provas materiais de que o dinheiro desviado de contratos da Petrobras foi usado nas reformas.

    Sítio de Atibaia
    Foto - Google Maps

    Imóvel em Atibaia pertence formalmente ao empresário Fernando Bittar, mas MPF alega que Lula é seu verdadeiro dono.

    3. Denunciado: nomeação para Casa Civil

    Em 2017, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou denúncia contra os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff por obstrução de justiça.

    A denúncia se refere à nomeação de Lula, no ano anterior, para ministro da Casa Civil do governo Dilma. Segundo Janot, a decisão teria sido tomada para garantir foro privilegiado ao ex-presidente. Na época, Lula já era alvo de investigações da Lava Jato.

    A defesa de Lula nega irregularidades.

    4. Réu: empréstimos do BNDES para Angola (Operação Janus)

    Prédio do BNDES no Rio
    Foto - Reuters Sérgio Moraes

    Para o MPF, Lula cometeu os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influência ao, supostamente, pressionar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a liberar empréstimos para obras da Odebrecht em Angola. A ação de Lula teria se dado entre os anos de 2008 e 2015, segundo a denúncia apresentada em 2016.

    O ex-presidente nega e diz que  jamais interferiu na concessão de qualquer benefício do BNDES.

    Para o MPF, Lula pressionou o BNDES a liberar empréstimos que financiaram obras da Odebrecht em Angola

    5. Réu: terreno para o Instituto Lula

    Neste caso, o MPF acusa Lula de receber propina da Odebrecht, inclusive por meio da compra de um terreno em São Paulo no valor de R$ 12 milhões, que seria usado para a construção de uma nova sede para o Instituto Lula.

    A empreiteira também teria comprado o apartamento nº 121 do edifício Hill House, em São Bernardo do Campo (SP), no mesmo andar e no mesmo prédio onde Lula vivia antes de ser preso.

    A defesa de Lula nega que ele "tenha praticado qualquer crime ou recebido qualquer benefício em troca de atos praticados na condição de Chefe de Estado e Chefe de Governo".

    6. Réu: compra de caças (Operação Zelotes)

    Lula se tornou réu por de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa, no âmbito da Operação Zelotes. O ex-presidente é suspeito de interferir na compra de 36 caças do modelo Gripen pelo governo brasileiro, produzidos pela fabricante sueca Saab, e na prorrogação de incentivos fiscais destinados a montadoras de veículos por meio da Medida Provisória 627 de 2013.

    Em ambos os fatos Lula já não era mais presidente. Ele nega irregularidades.

    7. Réu: MP das montadoras (Operação Zelotes)

    Também no âmbito da Operação Zelotes, a Justiça Federal aceitou denúncia contra Lula por corrupção passiva. Nesse caso, a denúncia se refere ao recebimento de propina para aprovar uma medida provisória (MP 471 de 2009) que prorrogou incentivos fiscais para montadoras.

    A defesa diz que Lula jamais praticou qualquer ato ilícito e que é alvo de perseguição política.

    Defesa do ex-presidente alega perseguição política em acusações e denúncias

    8. Réu: 'Quadrilhão do PT'

    No fim de 2018, o juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10.ª Vara Federal, em Brasília, aceitou denúncia do MPF contra Lula, Dilma Rousseff, os ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e Guido Mantega, e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, por formação de organização criminosa. O caso ficou conhecido como "quadrilhão do PT".

    Segundo a denúncia, do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a cúpula do PT recebeu R$ 1,48 bilhão de propina em dinheiro desviado dos cofres públicos.

    O advogado Cristiano Zanin, da defesa de Lula, afirmou em nota que a ação é "manifestamente descabida" e que o ex-presidente não cometeu nenhum crime no exercício da Presidência.

    9. Réu: Guiné Equatorial e Instituto Lula

    Neste caso, o ex-presidente é acusado de receber propina de R$ 1 milhão – paga por empresários brasileiros – em troca de intermediar negócios destes empresários com o líder da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang. O pagamento teria sido feito de forma dissimulada, por meio de uma doação ao Instituto Lula.

    O ex-presidente nega irregularidades – ele admite ter recebido a doação, mas nega ter feito qualquer favor em troca.

    Na época, sua defesa disse que a acusação "pretendeu, de forma absurda e injurídica, a transformação uma doação recebida de empresa privada pelo Instituto Lula, devidamente contabilizada e declarada às autoridades, em tráfico internacional de influência".

    10. Réu: propina da Odebrecht

    Em junho de 2019, o Juiz Vallisney de Oliveira aceitou denúncia por corrupção contra Lula, o empresário Marcelo Odebrecht e os ex-ministros Antonio Palocci e Paulo Bernardo.

    O caso envolve suposto pagamento de propina da Odebrecht em troca de favorecimento do governo federal.

    Em nota, a defesa de Lula afirmou que o ex-presidente "jamais solicitou ou recebeu qualquer vantagem indevida antes, durante ou após exercer o cargo de presidente da República". Disse, ainda, que o nome de Lula "somente foi incluído na ação com base em mentirosa narrativa apresentada pelo delator que recebeu generosos benefícios para acusar Lula".

    11. Absolvido: obstrução de justiça

    Em julho de 2018, o juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara da Justiça Federal em Brasília, absolveu Lula e outros seis réus no processo em que o ex-presidente era acusado de crime de obstrução de Justiça.

    A acusação era a de que ele tinha atrapalhado as investigações da Lava Jato, ao supostamente se envolver em uma tentativa de comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, um dos delatores da Operação Lava Jato.

    O juiz Ricardo Leite considerou que as provas eram insuficientes e que a acusação estava baseada somente em relatos de delatores. Na ocasião, a defesa de Lula disse que o juiz agiu de maneira imparcial.
    Lula

                                   Direito de imagem REUTERS/LEONARDO BENASSATTO

    12. Denúncia rejeitada: falta de provas

    A decisão judicial mais recente ligada a Lula foi a rejeição de uma denúncia apresentada pela força-tarefa da Lava Jato de São Paulo contra o petista e o irmão dele, Frei Chico, sob acusação de corrupção passiva.

    A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) dizia que Frei Chico                                                               
    recebeu R$ 1.131.333,12 por meio do pagamento de "mesadas" de R$ 3.000 a R$ 5.000, como parte de vantagens indevidas oferecidas a Lula em troca de benefícios obtidos pela Odebrecht.

    A defesa de Lula diz que as acusações são "descabidas" e que o ex-presidente jamais ofereceu ao grupo Odebrecht qualquer "pacote de vantagens indevidas".

    Na decisão de rejeitar a denúncia, o juiz Ali Mazloum, da 7ª Vara Federal Criminal em São Paulo, disse que "a acusação está lastreada em interpretações e um amontoado de suposições".

    A Lava Jato recorreu da decisão.   

    (Texto e fotos - BBC- Brasil). 

    Muito além do palanque continuará sendo réu

    A libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não é automática, mesmo depois da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) pelo fim da prisão após condenação em 2ª instância.

    A primeira etapa, em tese, seria a publicação oficial do acórdão do Supremo.

    Primeiramente, os advogados de Lula têm que entrar com um pedido de soltura na 12ª Vara Federal em Curitiba, o que foi feito na manhã desta sexta-feira, 8 de novembro. Lula está preso na superintendência da Polícia Federal (PF) na capital paranaense, desde abril de 2018.

    Agora, caberá à juíza Carolina Lebbos a autorização da soltura. Na proclamação do resultado do julgamento, os ministros do STF decidiram que os juízes de execução penal vão ter que analisar caso a caso.

    Essa decisão seria, no entanto, apenas pró-forma. Isso porque o STF, a maior instância jurídica do país, acabou de julgar o assunto o que, em tese, impede que um magistrado de grau inferior descumpra a medida. O pedido não tem prazo previsto em lei para ser respondido.

    Se Lula deixar a prisão, poderá viajar pelo país e participar de atos políticos, segundo o Código de Processo Penal (CPP). Por outro lado, não poderá concorrer a cargos públicos em razão da Lei da Ficha Limpa, uma vez que já foi condenado em um processo por duas instâncias.

    Em tese, ele não precisa se recolher em casa à noite, usar tornozeleira eletrônica ou entregar seu passaporte à polícia.

    Mas Lula pode permanecer preso?

    Se o Ministério Público (MP) entender que ele oferece algum risco à investigação, ao processo ou a testemunhas, ou que pode fugir do país, pode pedir à Justiça uma prisão preventiva (sem prazo para terminar). Outros condenados da Lava Jato, como o ex-governador do Rio de Janeiro Sergio Cabral e o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha cumprem prisões preventivas, por exemplo, e consequentemente, não serão beneficiados pela decisão do Supremo.

    Também pode ser pedida alguma medida cautelar, como a proibição de viajar ao exterior.

    Cabe ao juiz de execução, no caso Carolina Lebbos, sacramentar esses pedidos.

    Mas, desde que começou a ser investigado na Operação Lava Jato, no entanto, o ex-presidente não foi alvo de nenhuma decisão deste tipo.

    Lula também pode voltar à prisão caso seja condenado pelo STF no caso do tríplex, como já fez o STJ (Superior Tribunal de Justiça). Ou no caso do trânsito em julgado (uma vez esgotados todos os recursos) em outros processos nos quais é réu.

    O ex-presidente já foi condenado em dois processos e é réu em outros sete.

    (Texto: BBC-Brasil).

    quinta-feira, 7 de novembro de 2019

    Porandubas Políticas

    Por Gaudêncio Torquato


    Abro a coluna com a verve paraibana.

    Amigo do papa

    Rui Carneiro, raposa da política paraibana, era candidato a senador pelo PSD, em 1955. A UDN tinha apoio dos comunistas. Rui esteve na Europa, voltou, foi fazer o primeiro comício da campanha:

    - Paraibanos, estive em Roma com o Papa. Ele me cochichou:

    - Rui, se destruírem meu trono aqui no Vaticano, sei que tenho um grande amigo lá na Paraíba. Vá, dê lembranças à comadre Alice e diga ao povo que estou com você.

    Ganhou a eleição.

    (Dos imperdíveis relatos de Sebastião Nery)

    Cenários bolsonarianos I

    Há uma crise no entorno do governo. Seus vetores, entre outros, são os seguintes: 1) a acirrada expressão do presidente, com ataques à imprensa, e sempre sinalizando a existência de uma conspiração para derrubá-lo; 2) as entrevistas e ações que envolvem seus filhos que militam na política, com ênfase para a fala do 03, o deputado Eduardo, avisando que se "a esquerda radicalizar", pode vir um novo AI-5; 3) a fumaça que não se dispersa em torno das "ligações" entre Bolsonaros, milícias e assassinato de Marielle Franco; 4) as dificuldades crescentes do governo na relação com o Congresso.

    Cenários bolsonarianos II

    Os horizontes que se projetam sobre o pacotão do ministro Paulo Guedes no Congresso ainda carregam pesadas nuvens. A proposta, segundo o roteiro do ótimo relatório semanal da jornalista Helena Chagas, inclui: a) a PEC Mais Brasil, com previsão de distribuição de maior fatia dos royalties do petróleo a Estados e municípios; b) a PEC da Emergência Fiscal; c) a PEC para extinção dos Fundos setoriais, com exceção dos constitucionais; d) Reforma Administrativa e e) Reforma Tributária. É pouco provável que essa imensa mala de propostas atravesse sem dificuldades os corredores congressuais. A reforma tributária, então, carrega muita polêmica. Coisa para o próximo ano. A reforma administrativa encontrará intensa oposição dos servidores públicos.

    Cenários bolsonarianos III

    De 0 a 10, a probabilidade de que esta carga seja aprovada pelas casas congressuais no médio prazo (incluindo os primeiros meses de 2020) é de 4 pontos. O atraso no calendário da tramitação e aprovação é um chega prá lá na boa avaliação do governo. Guedes tem o apoio de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. Mas o fator de risco tem nome e sobrenome: Jair Bolsonaro. O presidente deveria pôr a mão na consciência e ponderar sobre a necessidade de administrar sua índole guerreira. E pedir comportamentos e expressões menos virulentas de sua equipe. A continuar pisando no calo de gregos e troianos, será muito difícil ao governo navegar até o porto de 2022.

    Cenários bolsonarianos IV

    Se a economia botar mais grana no bolso das margens e classes médias, até meados do próximo ano, teremos um panorama eleitoral menos turbulento. A equação BO+BA+CO+CA – Bolso, Barriga, Coração, Cabeça será um anestésico para o corpo governamental. O presidente, nesse cenário, será um grande eleitor. Terá um problema com o novo partido sob sua égide. Não haverá tempo para ser criado e estruturado de forma a ter boa performance na eleição municipal. A querela com Luciano Bivar deve continuar. A não ser que o pernambucano entregue o PSL aos domínios dos Bolsonaros.

    Governo eleva previsão

    O governo vai elevar a previsão para o crescimento da economia em 2020. Atualmente em 2,17%, o novo número deve ficar próximo de 2,5%, mas a equipe econômica ainda não fechou a estimativa. Estudos apontam que, no final do segundo trimestre, o investimento privado cresceu 7,02%, enquanto o investimento público caiu 14,30% ante o mesmo período de 2018.

    Corrosão de imagem

    É clara a tendência de desengajamento de alas simpáticas e votantes no presidente Jair. Nas pesquisas, o índice de afastamento de eleitores aumenta. Nas conversas do cotidiano, expande-se a perplexidade com as barbaridades da família. Mas o bolsonarismo, por enquanto, tem ainda 1/3 dos eleitores. E é para essa comunidade mais fechada que se dirige o discurso presidencial. O presidente procura animar, mobilizar, cutucar sua tradicional base. E consegue. Por isso, seu animus animandi se inspira em coisa pensada, maturada, planejada. Atacar sempre para instrumentalizar seu exército.

    Slim de olho na Globo

    O Grupo Globo está enfrentando intensa crise. A situação geral da economia retraiu uma leva de grandes patrocinadores. As verbas publicitárias do governo sumiram. O presidente chega a ameaçar a concessão pública da TV Globo em 2022. Os altos salários do Grupo foram reduzidos depois de negociações. As versões dão conta de que o grupo de Carlos Slim estaria conversando com a Globo. Aliás, o interesse do grupo mexicano na Globo é antigo. Slim, de 79 anos, é o dono do Grupo que inclui a empresa de telecomunicações América Móvil – com presença em 25 países -, a financeira Inbursa e o Grupo Carso. É o homem mais rico da América Latina, com uma fortuna estimada em 61,6 bilhões de dólares, segundo a revista Forbes. No Brasil, Slim é dono da Claro-Net.

    General Heleno

    O general Heleno, ministro do GSI, era o mais aplaudido general quando entrou no governo. Hoje, é considerado um militar alinhado com os radicais que orbitam em torno do presidente Bolsonaro, a partir do escritor desbocado Olavo de Carvalho. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, acaba de dizer que ele é uma tuba de ressonância do chamado guru dos Bolsonaros.

    Animação de fim de ano

    Há um grupo de empresários que se anima ante as expectativas de recuperação da economia. São pequenos empreendedores dos setores de alimentação, logística e comércio. Mas há um setor que se engaja na animação: a construção civil. Impressiona o número de novos lançamentos de prédios residenciais e comerciais. São sinais positivos no meio de maré de dúvidas.

    Qual é a dos EUA?

    Afinal, o que querem os EUA com o Brasil? Após mostrar preferência pela Argentina na OCDE, pelo menos no que diz respeito a prioridades, o país de Trump acaba de vetar a carne bovina in natura do Brasil. Mais uma derrota do nosso país. E o que o amigo do peito de Bolsonaro, Donald Trump, vai dizer ao seu querido capitão? Que os órgãos de controle americanos vetaram a carne brasileira. E talvez recorra ao ditado: amigos, amigos, negócios à parte.

    Trump na corda bamba

    Se Donald Trump levar a melhor em novembro do próximo ano, Bolsonaro poderá surfar na onda da vitória dos conservadores republicanos. Mas todas as pesquisas de hoje dão vantagem aos democratas, com maior vantagem para o ex-vice de Obama, Joe Biden. Mas não será impossível nova vitória de Trump no colégio dos delegados, apesar de eventual derrota no voto popular. No partido democrata, protagonistas já se posicionam como esquerda. Esse matiz ideológico, na maior Nação liberal do planeta, provocará polêmica.

    A gangorra ideológica

    Afinal, para onde vão a esquerda e a direita na AL? Mauricio Macri perde na Argentina. Evo Morales, na Bolívia, leva a melhor, apesar da pequena diferença para o opositor. No Uruguai, uma Frente Ampla de esquerda continua como a maior força política.O ex-presidente do Uruguai, José Mujica, mais conhecido como Pepe Mujica, acaba de se eleger senador, após ter renunciado ao cargo no Senado ano passado, quando justificou que "estava cansado da longa viagem" e se afastaria "antes de morrer de velho". Seu partido, Movimiento de Participación Popular (MPP), que faz parte da coalizão de esquerda Frente Ampla, vai disputar a presidência em 2º turno tendo a frente o candidato Daniel Martínez, que enfrentará Luis Lacalle Pou, candidato de direita pelo Partido Nacional.

    Zigue-zague - I

    Na Colômbia, o presidente Ivan Duque está em queda livre, após ser eleito em agosto de 2018. Enfrenta problemas com guerrilhas, Congresso, Venezuela e até com aliados. Eleito com 54% dos votos, Duque é o mandatário colombiano com imagem mais impopular nesse período da gestão dos últimos 20 anos. Ernesto Samper (1994-1998), Álvaro Uribe Vélez (2002-2010) e Juan Manuel Santos (em 2010) tinham mais de 60%. A esquerda de Lopez Obrador governa no México.

    Zigue-zague-II

    Em 2013, o Chile, sob o comando de Sebastián Piñera, era o único mais à direita dos 12 países da América do Sul. Em 2018, além do próprio Chile, Argentina, Peru, Colômbia e Paraguai eram governados por presidentes de direita. Mas a cor do mapa político da região sofre mudanças. Piñera começa a enfrentar a oposição das ruas. Seu futuro é incerto.

    Zigue-zague - III

    Em agosto de 2015, Mario Abdo Benítez, filho do secretário pessoal de Alfredo Stroessner, que comandou o governo militar paraguaio, tomou posse como presidente. No Peru, Ollanta Humala foi substituído inicialmente pelo economista liberal Pedro Pablo Kuczynski, que renunciou. O país passou a ser presidido por Martín Vizcarra, de direita, que anunciou semanas atrás a dissolução do Congresso, dominado pela oposição fujimorista, após um dia que refletiu mais do que nunca o choque entre os poderes Executivo e Legislativo.

    Zigue-zague - IV

    A Argentina, antes comandada pelos Kirchner, viu o empresário Mauricio Macri assumir o poder em dezembro de 2015. E agora volta aos Kirchner, com Cristina, a ex-presidente na vice de Alberto Fernández. No Equador, Lenín Moreno rompeu com o ex-presidente Rafael Correa, de esquerda, de quem foi vice, e contou com seu apoio na eleição. Agora, conta com apoio de partidos de direita. Na Venezuela, Bolívia e na Nicarágua, os governos de esquerda continuam no comando.

    Zigue-zague - V

    Por nossas plagas, o governo de direita abre muita polêmica, mas não tem havido grandes manifestações de protesto. A expressão governamental é de muito açodamento. Gera questionamentos. O governo tem perdido apoios e mostra muita desarticulação na frente política. O grande teste será a eleição municipal de 2020. Tudo vai depender do sucesso do pacote econômico do governo.

    E o óleo vazado, hein?

    A linguagem está desencontrada. O presidente diz que o pior ainda está por vir. O ministro da Defesa diz que não sabe se o pior ainda virá. O fato é que o óleo cru, anunciado como de origem venezuelana, continua a bater nas praias do Nordeste. Todas as demonstrações apontam para um navio grego, o Bouboulina, de propriedade da petroleira grega Delta Tankers. Esta empresa diz que 'não há provas' de que o Bouboulina vazou petróleo na costa do Brasil. No comunicado, afirma que o navio não parou nem fez qualquer tipo transferência de óleo; e que não foi procurada por autoridades brasileiras e a carga chegou à Malásia 'sem qualquer falta'. A Interpol foi convocada a entrar no caso, que deverá ter imensa repercussão nos foros internacionais.

    Gaudêncio Torquato, Jornalista e Consultor de Marketing Político, é Professor Titular na USP.

    ------------------------------------------

    Livro Porandubas Políticas

    A partir das colunas recheadas de humor para uma obra consagrada com a experiência do jornalista Gaudêncio Torquato.

    Em forma editorial, o livro "Porandubas Políticas" apresenta saborosas narrativas folclóricas do mundo político acrescidas de valiosas dicas de marketing eleitoral.

    Cada exemplar custa apenas R$ 60,00. Adquira o seu aqui - www.livrariamigalhas.com.br/



    sexta-feira, 18 de outubro de 2019

    Num segundo turno, Moro ganha de todos

    Em todos os cenários, o vencedor é Sérgio Moro. No segundo turno, ganha até de Lula, em tese inelegível nos termos da Lei da Ficha Limpa.

    A revista VEJA desta semana publica a pesquisa que encomendou.

    Por José Benedito da Silva

    O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está inelegível desde janeiro de 2018, quando foi condenado em segunda instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex no Guarujá. Apesar das várias entrevistas concedidas dentro da cadeia, ele não fala diretamente ao eleitorado e à militância desde abril daquele ano, quando foi encarcerado na Polícia Federal em Curitiba para cumprir uma pena de oito anos e dez meses de prisão. É réu ainda em mais nove processos e investigado em outros inquéritos sob a suspeita de ser corrupto ou ter praticado crimes como lavagem de dinheiro, tráfico de influência e formação de organização criminosa. Além disso, é o principal líder de um partido que foi varrido do poder em meio a uma grave crise econômica e política no país e a denúncias de diversos malfeitos envolvendo sua gestão e a de Dilma Rousseff. Em resumo, uma biografia para enterrar de vez a carreira de qualquer homem público no mundo.

    Mas o Brasil, como dizia Tom Jobim, não é coisa para principiantes, e, a despeito dessa ficha da pesada, Lula resiste na forma de um espectro político. Sua capacidade de recuperar o prestígio perdido entre a maior parte da população após a farta relação de malfeitos é discutível. Na esquerda, porém, ele continua sendo o maior nome por aqui (o que também diz bastante sobre a qualidade da esquerda no país). De quebra, pode ainda pregar uns bons sustos nos adversários de fora do universo petista, conforme mostra uma pesquisa exclusiva VEJA/FSB sobre as eleições presidenciais de 2022. Um dos dados mais interessantes do levantamento, realizado entre 11 e 14 de outubro, consiste nas projeções do que seria hoje um confronto de segundo turno entre Jair Bolsonaro e as figuras mais conhecidas da esquerda. Lula perde por 46% a 38% (a margem de erro é de 2 pontos porcentuais para mais ou para menos), mas se sai melhor que políticos de fora da cadeia. Fernando Had­dad, batido por Bolsonaro na última eleição, perderia novamente do atual presidente em 2022 por 47% a 34%. O pedetista Ciro Gomes repete o fiasco de 2018 na pesquisa VEJA/FSB: não chegaria sequer ao segundo turno. Para especialistas, Lula continua a ser uma alternativa forte à esquerda porque soma a fidelidade da base petista à lembrança dos fugazes tempos de prosperidade de sua era no poder. “O primeiro governo dele foi muito virtuoso. Manteve políticas de FHC e foi capaz de oferecer duas coisas que o brasileiro médio deseja: estabilidade macroeconômica e inclusão social. A resiliência de Lula vem dessa imagem que o eleitor tem dele”, avalia o cientista político Carlos Pereira, professor da FGV-RJ.

     INIMIGO ÍNTIMO – Bolsonaro e Moro: o ministro é o único que ganharia do presidente em um eventual segundo turno.

    A volta de Lula ao jogo político ainda depende do enorme caminho que ele precisa enfrentar na Justiça para limpar sua ficha. Mas essa trilha parece bem menos difícil de percorrer hoje do que há alguns meses. No dia 17, o Supremo Tribunal Federal voltou a se debruçar sobre a questão da prisão após condenação em segunda instância no país. Permitida desde 2016, em meio ao clamor da sociedade pelo endurecimento contra os crimes de colarinho-branco, a medida deve cair, já que o entendimento de alguns ministros sobre o tema mudou. O recuo tiraria Lula de trás das grades, uma vez que seu processo ainda não transitou em julgado, mas não seria suficiente para sua pretensão política, porque ele ainda ficaria inelegível pela Lei da Ficha Limpa, que veta a candidatura de condenado em duas instâncias. Pelo mesmo motivo, Lula recusa-se a aceitar a progressão ao regime semiaberto a que tem direito desde setembro por ter cumprido um sexto da pena e ter tido bom comportamento. A mudança de status permitiria a ele sair da cadeia para trabalhar ou até ir para prisão domiciliar, mas sem poder disputar eleições, pois continuaria ficha-suja. O ex-­presidente mantém a cantilena de que só sairá da cadeia se tiver sua inocência reconhecida — para ele, aceitar a medida paliativa seria concordar com a condenação imposta pelo então juiz Sergio Moro e confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) e pelo STJ.

    O julgamento que de fato importa a Lula é o do recurso que pede a suspeição de Moro com base em várias alegações, que vão dos procedimentos em relação ao petista (como a condução coercitiva em 2016, antes de ele ter sido intimado a depor) à aceitação do convite para ser ministro da Justiça do governo Bolsonaro, e por ter auxiliado de forma ilegal o Ministério Público Federal na acusação, como demonstraram diálogos entre ele e o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava-Jato em Curitiba, revelados pelo site The Intercept Brasil em parceria com veículos como VEJA. A questão será decidida pela Segunda Turma do STF, que tem cinco ministros. Dois votaram contra a pretensão do petista — Edson Fachin e Cármen Lúcia. Gilmar Mendes, que pediu vistas e prometeu devolver o processo à pauta até novembro, e Ricardo Lewandowski são votos certos a favor de Lula, o que jogaria a decisão nas mãos do ministro Celso de Mello, que já colocou Moro sob suspeição uma vez. Em 2013, ao julgar um habeas-corpus apresentado pelo doleiro Rubens Catenacci, condenado no caso Banestado, Mello entendeu que o então titular da 2ª Vara Criminal de Curitiba havia extrapolado suas funções ao monitorar os advogados do réu, inclusive com interceptação telefônica, e ajudar o trabalho da acusação — as duas reclamações são feitas também pela defesa de Lula no atual processo. Se prevalecer a tese de suspeição, o julgamento que deixou o petista inelegível será anulado. Nesse caso, ele deixará de ser ficha-suja e poderá se candidatar nas eleições.


    ESTRATÉGIA – Doria, no Japão: tentativa de virar a alternativa de centro-direita.

    Mesmo se toda essa reviravolta ocorrer e Lula voltar à disputa, a esquerda terá de bater de frente com Bolsonaro, que se lançou prematuramente à reeleição e continua sendo um adversário duro de superar. Na pesquisa VEJA/FSB, Bolsonaro aparece numericamente à frente em quase todos os cenários. Em levantamento semelhante realizado em agosto deste ano, ele já liderava, algo até certo ponto natural para quem venceu as eleições há menos de um ano, mas que mostra também uma grande resiliência diante de vários percalços enfrentados no período: as queimadas na Amazônia, o desgaste internacional, o barraco sem fim no PSL (confira a reportagem), as polêmicas que envolvem seus filhos e as acusações do uso de candidatas-laranja pela legenda. Bolsonaro também conseguiu manter estáveis os índices de avaliação de seu governo (33% de ótimo/bom), de sua maneira de administrar o país (43% aprovam) e das expectativas em relação ao fim de seu mandato (43% acham que será ótimo ou bom). Embora seja a maior ameaça vinda da esquer­da, a eventual volta de Lula ao palco eleitoral pode, apesar do paradoxo, representar uma boa notícia para o presidente, já que permitiria a ele repetir o discurso vitorioso que o levou ao poder: evocar o fantasma da vitória do PT. Para Rafael Cortez, analista político da Tendências Consultoria, não há dúvida de que Bolsonaro tem como principal fonte de capital político o combate à esquerda. “O melhor cenário para ele seria enfrentar o PT, mas não necessariamente Lula, que representa um risco muito maior que Haddad”, afirma Cortez. Por isso, entende o especialista, o presidente usa a estratégia de mobilização permanente do eleitorado que responde mais rapidamente a uma eventual ameaça de volta da esquerda.

    PROMISSOR – O apresentador Luciano Huck: conversas políticas constantes

    Bolsonaro tem ainda dois possíveis adversários fortes no horizonte. Segundo a pesquisa VEJA/FSB, em simulações de segundo turno, o presidente perde para Moro (38% a 34%) e vence o apresentador Luciano Huck (43% a 39%), em ambos os casos no limite da margem de erro. Para especialistas, o problema deles é chegar ao segundo turno. “O principal fator é que o próprio presidente incentiva a polarização o tempo todo, o que prejudica o centro”, afirma Alberto Carlos Almeida, autor de O Voto do Brasileiro (2018). Caso consigam ultrapassar essa barreira, Huck e Moro provocam uma situação curiosa, segundo a pesquisa: atraem até eleitores da esquerda que, por rejeição ao atual presidente, votariam em qualquer um para derrotá-lo. O apresentador evita colocar-se como candidato, porém tem mantido uma agenda de encontros cujo principal tema é a discussão de problemas do país. Sem estar filiado a nenhuma legenda, mas militante de movimentos de renovação política suprapartidários como RenovaBR e Agora!, ele tem conversado com líderes de siglas diversas — a última especulação é que iria para o Cidadania. Já o ex-juiz da Lava-Jato também nega ser presidenciável, diz que apoia Bolsonaro por uma questão de lealdade, conforme afirmou recentemente em entrevista a VEJA, mas nem o capitão nem seus aliados mais próximos acreditam nisso. O potencial eleitoral de Moro é enorme. Ele aparece à frente em quatro cenários de segundo turno. Além de vencer o presidente, derrota Haddad, Huck e Lula (veja o quadro). Na mesma pesquisa, o ex-­juiz da Lava-Jato é apontado como o melhor ministro do governo por 31% dos entrevistados, bem acima do segundo colocado, Paulo Guedes (Economia), com 6%. A população também apoia algumas de suas propostas, entre elas o encarceramento após condenação em segunda instância — 70% são a favor da medida.

    CAMPANHA – Fernando Haddad: nome oficial do PT, mas fará o que Lula mandar

    Enquanto Huck e Moro surgem fortes na pesquisa VEJA/FSB, o governador de São Paulo, João Doria, ainda enfrenta dificuldades para se mostrar competitivo e emplacar como uma alternativa de poder mais ao centro. Nos três cenários de primeiro turno abordados no levantamento, o tucano tem no máximo 5% dos votos. Em um possível confronto direto com Bolsonaro no segundo turno, perderia por 46% a 26%. Embora negue em público, Doria tem pretensão presidencial e, por isso, já entrou em rota de colisão com Bolsonaro — a quem apoiou em 2018 —, inclusive com bate-bocas públicos. Na terça 15, em Taubaté, no interior paulista, foi recebido por bolsonaristas com carro de som e cartazes e faixas nos quais era acusado de ter traí­do o presidente. “Vai pra casa, vagabundo”, reagiu o tucano. Um dia depois, o governador reconheceu que se excedera no episódio.

    POUCOS VOTOS – Ciro: longe de ser alternativa da esquerda para 2022

    Enquanto forças mais à direita começam a batalhar, o PT tem sido cauteloso nos movimentos. Para consumo externo, o partido ainda sinaliza com uma nova candidatura de Fernando Haddad e não fala abertamente sobre a hipótese de Lula disputar a eleição, até para não criar mais animosidade em torno do julgamento. Por ora a estratégia petista é defender a ideia de que Had­dad rode o país para apoiar os candidatos do partido na tentativa de reconquistar prefeituras que perdeu em 2016, como a da própria capital paulista. Enquanto isso, avalia-se que o papel imediato de Lula, caso saia realmente da prisão, deve ser o de “líder da oposição”, para reagrupar as forças de esquerda e atrair até o centro. Um dos primeiros compromissos caso a temporada de cárcere em Curitiba se encerre deverá ser procurar o ex-presidente Michel Temer para reconquistar o MDB, que foi fundamental para sustentar os dois mandatos do petista, mas que, ao deixar o governo, também foi decisivo para a queda de Dilma. Hoje, o trabalho do ex-presidente seria muito difícil, até mesmo entre parte da esquerda, que defende há tempos a superação do “lulacentrismo”. Recuperar eleitores perdidos para Bolsonaro também será prioridade do petista. Lula passa parte do tempo na cela vendo programas evangélicos na TV aberta e anotando o nome dos pastores e as ideias que defendem, numa tentativa de, quando for solto, reconquistar esse contingente religioso que já o apoiou, mas migrou para Bolsonaro. Até alguns petistas de carteirinha trocaram de barco. Levantamento feito por VEJA com dados do TSE mostra que 2 631 filiados ao PT foram para o PSL de Bolsonaro, num movimento que supera a questão ideológica. É um indicativo de uma onda maior. A aposta é que, com essa volatilidade, do mesmo jeito que foram, esses eleitores podem voltar. Como a advogada Karina Magalhães, de 29 anos, de Maracaju (MS), que é filha de professora e desde muito jovem teve contato com o movimento sindical da classe, mas trocou o petismo pelo bolsonarismo depois da Lava-­Jato. “Bolsonaro foi a opção para ter renovação, ruptura, mudança”, afirma Karina, eleitora do PT de 2002 a 2014. Agora ela se diz “totalmente contra” algumas das propostas de Bolsonaro, vê o presidente “perdido” e mal influenciado pelos filhos e já não garante o voto nele em 2022.

    A ameaça à reeleição de Bolsonaro, de direita ou de esquerda, será maior ou menor dependendo do desempenho do presidente. O analista político da FSB Alon Feuerwerker diz que o capitão precisa se preocupar em evitar um “efeito Macri”, referência ao presidente argentino Mauricio Macri, que deve perder a eleição para a esquerda kirchnerista em razão da crise econômica. “Os principais concorrentes do presidente são dois nomes não filiados a nenhum partido e que nem podem concorrer em 2022: a estagnação econômica e a taxa de desemprego”, afirma. Ainda faltam três anos para as eleições, uma eternidade no frenético e volúvel tabuleiro nacional do poder. Um fracasso de Bolsonaro e a permanência por mais tempo do indesejável clima de polarização radical, que destrói novas alternativas de liderança, representam o alimento capaz de fortalecer o espectro Lula — e a velha assombração política pode ressurgir, fazendo o país retroceder às retóricas e discussões do passado. O Brasil não é mesmo para principiantes.

    Colaborou João Pedroso de Campos

    Publicado em VEJA de 23 de outubro de 2019, edição nº 2657

    Sentença luminar

    O juiz federal Marcus Vinicius Reis Bastos, da 12.ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, decidiu absolver sumariamente o ex-presidente Michel Temer da acusação de obstrução de justiça. O magistrado também determinou o imediato arquivamento do processo relativo ao encontro do então presidente da República com o empresário Joesley Batista, do Grupo J&F, no Palácio do Jaburu. A denúncia contra Temer foi apresentada em 2017 pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. Em abril deste ano, a acusação foi ratificada pela força-tarefa da Operação Greenfield. Foi neste processo que o magistrado exarou sua decisão.

    Não se trata de uma absolvição qualquer. A sentença do juiz Reis Bastos é uma peça jurídica luminar por expor com raro didatismo o tortuoso método de trabalho de alguns membros do Ministério Público Federal (MPF) sob a chefia do sr. Rodrigo Janot. Ao final da leitura da decisão, tem-se a impressão de que o desrespeito aos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos é um dano colateral aceitável para setores do MPF em nome do sucesso de uma cruzada anticorrupção e de uma suposta “missão” de depurar o País, livrando-o dos “maus políticos”, assim entendidos de acordo com os critérios bastante subjetivos do Parquet.

    Os termos da sentença são duros, à altura da tentativa de manipulação, não só do Poder Judiciário, mas da opinião pública, engendrada pelos patrocinadores da denúncia. No entendimento do juiz Reis Bastos, “a prova sobre a qual se fia a acusação é frágil e não suporta sequer o peso da justa causa para inauguração da instrução criminal”. Ou seja, a julgar pelas “provas” trazidas aos autos pelo MPF, o processo nem sequer deveria ter sido instaurado.

    O ex-presidente Michel Temer foi acusado de ter estimulado Joesley Batista a pagar pelo silêncio do doleiro Lúcio Funaro, então “operador” do MDB às voltas com uma negociação para assinar um acordo de colaboração premiada com o MPF. Para a Procuradoria-Geral da República, foi no contexto dessa conversa que o então presidente da República teria dito “tem que manter isso, viu?”, referindo-se à manutenção da propina supostamente paga a Lúcio Funaro pela J&F.

    Para o magistrado, o MPF adulterou o teor da conversa de modo a incriminar os envolvidos por meio da alteração de seu sentido original. De acordo com o juiz, “o diálogo quase monossilábico entre ambos (Michel Temer e Joesley Batista) evidencia, quando muito, uma bravata do presidente da República, muito distante da conduta dolosa de impedir ou embaraçar concretamente investigação de infração penal que envolva organização criminosa”.

    A ação insidiosa do MPF no processo é descrita com uma clareza solar pelo juiz Reis Bastos, que em outro segmento de sua sentença afirma que “a denúncia transcreve trechos do áudio sem considerar interrupções e ruídos, consignando termos diversos na conversa, dando interpretação própria à fala dos interlocutores”. O que o juiz diz, sem meias palavras, é que o MPF, talvez no afã de levar a cabo um processo descabido em nome daquela “missão” de salvação nacional, editou e descontextualizou o diálogo havido entre os acusados, ignorando as conclusões do laudo pericial que apontou uma série de falas ininteligíveis.

    O vazamento da conversa entre o ex-presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, convém lembrar, ocorreu em maio de 2017, momento em que o Congresso Nacional avançava na tramitação da reforma da Previdência. A grave crise política deflagrada pelo vazamento interrompeu o processo legislativo e adiou por dois anos a aprovação de uma das mais prementes medidas para o País retomar o controle das contas públicas e voltar ao trilho do crescimento econômico. Sabe-se que a aprovação da reforma do sistema previdenciário desagrada às grandes corporações de servidores públicos, sendo as do MPF e do Poder Judiciário as mais fortes.

    No futuro não muito distante, sentenças como a do juiz Reis Bastos hão de lançar ainda mais luz sobre um período nebuloso da história do MPF.

    Editorial de O Estado de São Paulo, edição de 18.10.19

    quinta-feira, 17 de outubro de 2019

    Sobre o triunfo das nulidades

    Na manhã de ontem, pouco depois de o General Villas Boas postar no Twitter mensagem em que considera necessário manter o País no combate à corrupção e à impunidade, sob pena de eventual convulsão social, o Presidente da República, Jair Bolsonaro, recebeu em audiência reservada no seu gabinete no Palácio do Planalto, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Dias Toffoli e o seu colega Ministro Alexandre de Moraes.

    O encontro com os dois Ministros durou 15 minutos. Na sequência, o Ministro Gilmar Mendes, que também não constava da agenda, esteve com Bolsonaro por 20 minutos.

    Oficialmente, os três Magistrados da Côrte Máxima do País foram ao Palácio do Planalto para uma solenidade no Salão Nobre.

    Nenhum dos três falou sobre o que conversaram. Apenas o Ministro Gilmar disse que foi uma visita de cortesia. No começo da noite, o porta-voz da Presidência, Otávio do Rego Barros, confirmando os encontros, disse que o Presidente da República não comentaria essas agendas.

    Coincidentemente ou não, o Supremo Tribunal Federal começa hoje à tarde o julgamento do caso sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio que periga reverter o entendimento segundo o qual os condenados em processo penal só podem ser presos para o cumprimento da pena após o trânsito em julgado da sentença, ou seja, depois de esgotados todos os recursos contra a condenação.

    Caso o STF volte atrás, revogando o entendimento de que a prisão para cumprimento da pena se dá logo após a decisão confirmatória da sentença por colegiado na Segunda Instância, muitos dos presos pela Lava Jato que já estão cumprindo a pena serão soltos.

    Dentre eles, o ex-Presidente Lula e seu ex-Ministro José Dirceu. A lista chegaria a milhares de condenados, incluindo traficantes, homicidas e ladrões de menor porte.

    A mensagem do General Villas Boas, postada ontem no Twitter, começa com aquela célebre advertência de Rui Barbosa sobre o triunfo das nulidades, em 1914:

    "De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto".

    Prossegue o General Villas Boas:

    - "Essa síndrome, reflexionada por Rui Barbosa, infelizmente assolou nosso País ao longo do último século. Contudo, experimentamos um novo período em que as instituições vem fazendo grande esforço para combater a corrupção e a impunidade, o que nos trouxe - gente brasileira - de volta a autoestima e a confiança. É preciso manter a energia que nos move em direção à paz social, sob pena de que o povo brasileiro venha a cair outra vez no desalento e na eventual convulsão social".

    Levantamento feito pelo jornal O Globo indica os casos que podem ser alcançados, caso a decisão do STF revogue o entendimento há anos prevalecente:

    191.480 são presos em execução provisória de pena — condenados, mas ainda com recursos a apresentar.

    Segundo o Conselho Nacional de Justiça, desses 191 mil, só 4.895 têm mandado de prisão expedido em segunda instância e podem ser beneficiados.

    Ao todo, o Brasil tem 836.820 presos. 348 mil presos preventivamente, ou seja, ainda sem condenação.

    294 mil presos com condenação transitada em julgado. E 2 mil presos civis, por não pagar pensão alimentícia.


    Porandubas Políticas

    Por Gaudêncio Torquato

    Abro a coluna com as pernas da corrupção...

    Quando a burocracia ganha pernas

    O cidadão chega à repartição e pede para ver seu processo. Ouve do chefinho do departamento: "ah, meu senhor, tem muitos outros na frente do seu. Vai demorar um tempão até ser despachado. Papel, doutor, não tem pernas". Agastado, o interlocutor reage: "e quanto o senhor quer para por dois pés nesse papel?". Tirou do bolso um maço de dinheiro (que já tinha separado em casa para não dar na vista e, de maneira disfarçada, entregou ao sorridente chefete). Tiro e queda. O adjutório fez o papel correr rapidinho com seus dois pés. A corrupção sabe como dar pernas aos papéis...

    Mesmices

    O que há de novo na cena institucional para aplaudir, comentar, criticar, ou, simplesmente, registrar? Nada. O capítulo das reformas vai virando a página sem surpresas. Tudo dentro do previsível: o governo anunciando a passagem da reforma da Previdência em segundo turno, no Senado; o debate sobre reforma tributária com previsão de que a matéria não se esgotará tão cedo; a reforma sindical, sendo engendrada às escuras, sem deixarem que o olho crítico da sociedade organizada dê uma espiada nas confabulações. É a velha política inspirando os passos de hoje e do amanhã.

    Direita avança

    Alguns movimentos deixam rastros mais fortes, aqui e ali, mas de modo a não garantir que marcarão a índole de nossa gente. Essa onda da direita, por exemplo. O filho nº 3 do capitão-presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro, capitaneou em São Paulo um evento da direita conservadora, reunindo os mais lustrosos membros da corrente e seus líderes norte-americanos.

    Mitinho?

    O deputado, aplaudido como "mitinho", enrolou-se na bandeira brasileira, substituiu as letras LGBT por Liberdade (Liberty, termo ilustrado pela estátua da Liberdade), Armas (Guns, com a imagem de um revólver), Bolsonaro e Trump. Até essa pobre ironia foi uma homenagem aos EUA. Aonde chegamos, hein?

    O arco ideológico

    A questão suscita polêmica: essa direita tem condição de crescer e gerar frutos? Ora, não é novidade a divisão do nosso arco ideológico entre uma direita conservadora, dura, tradicional; uma direita menos radical, que faz defesa de valores da família e da propriedade; uma área de centro-direita, que apresenta maior flexibilidade e evita caminhar nas veredas extremas; um núcleo central, reunindo os quadros de partidos médios e grandes do centro; um território de centro-esquerda, que absorve parcela forte de antigos simpatizantes da social-democracia e setores de profissionais liberais e da "intelligentzia"; nichos da esquerda clássica, aí inseridos grupos e militantes de partidos de esquerda (ex-PPS, que está virando Cidadania; PDT, PSB, etc.); e a esquerda radical, com toques "revolucionários" e apelo à "obsoleta" luta de classes.

    A direita ganha corpo

    Portanto, na configuração ideológica, a direita sempre se fez presente. Mas não exercia com força funções na frente da mobilização política. Com Bolsonaro, sai dos seus recantos e passa a desfilar no palanque da organicidade social. Grandes proprietários rurais, saudosistas dos tempos pesados de chumbo, correntes amarradas aos eixos do tradicionalismo (com emblemas e bandeiras que voltam às ruas), pequena parcela dos militares (grande parcela evoluiu e caminha por veredas mais centrais), conservadores do universo religioso - particularmente das igrejas evangélicas – e outros grupos se integram ao bolsonarismo, enxergando nele a salvação da pátria. E tudo se deve a que?

    As águas do lulopetismo

    É fato que o país viu florescer, nas últimas décadas, uma semente esquerdista, fruto da conquista do poder pelo lulopetismo. Em 13 anos, o PT inundou a vasta estrutura governamental com levas e levas de quadros petistas. A inundação foi particularmente danosa no território das universidades. Gente sem experiência, quadros despreparados, grupos imaturos foram postos na liderança de imensas áreas. O plano petista era tornar perene o poder do partido. Sem volta. E o que aconteceu? O lulopetismo afogou-se na maré da corrupção, que veio de lá de trás desde o mensalão.

    Lula, o mito

    Lula foi e ainda é um mito. Graças ao carisma e à observação de que não surgiu, em seu tempo de mando, nenhuma liderança de expressão, conseguiu ser reeleito mesmo sob o pântano do mensalão. E até elegeu o "poste" de carisma zero, Dilma Rousseff. O PT entrou nos dutos da corrupção. Mas não morreu. Como a sigla mais vertical do país, montada sob um regime de dura hierarquia, com militantes pagando um "óbulo" para sustentar o partido, elegendo bancadas que lhe deram muito dinheiro dos recursos partidários, o PT acabou acendendo a fogueira do bolsonarismo. E o capitão quebrou paradigmas da velha política, abrindo um novo ciclo.

    Extremos se cultuam

    Nesse ponto, cabe inferir: o PT fez e faz bem a Bolsonaro e este fez e faz bem ao PT. Essa é a realidade. Os extremos se esforçam para alimentar a polarização, o enfrentamento diário nas redes sociais, a aspereza recíproca nas acusações, o tiroteio. Lula vive momentos extraordinários. Tem o melhor palanque que poderia armar: a hospedagem na sede da PF em Curitiba.

    O grande palanque

    De lá, sua voz ganha força aqui e alhures. Dentro e fora do país. Não conseguiria tanto destaque se estivesse em regime semiaberto, em São Bernardo do Campo. A direita se adensa sob o medo do lulopetismo voltar a comandar o país. A esquerda lulopetista ganha força a partir das expressões estapafúrdias que o capitão e os seus filhos disparam.

    Atitude de diplomata?

    Voltemos ao deputado Eduardo Bolsonaro, eleito por São Paulo. (Aliás, o deputado conhece pouco da vida política paulista). Azucrina opositores nas redes sociais, usa linguagem destemperada para tratar os desafetos, assume gestos incompatíveis com o manto de quem quer ser embaixador. E logo agora que deve ser sabatinado pelo Senado. Tem tudo para não ganhar a aprovação dos senadores. Pelo que faz e diz. Mas o fato é que, mesmo com o fiasco da OCDE (o Brasil esperava um ingresso mais imediato na Organização), para o qual o deputado se empenhara intensamente, deve acabar levando a melhor. Na última visita que fez aos EUA, Trump não o recebeu.

    Assim, a direita caminhará

    Nessas curvas tortuosas, a direita caminhará. Abrirá espaços com sua estratégia de desconstruir os adversários com acusações e linguagem extravagante. O interesse de Bolsonaro é puxar a polarização até a campanha de 2022. O discurso: o PT é corrupto; o PT é a ameaça de comunismo; o PT é a Venezuela; o PT é Cuba. Já para este, Bolsonaro é a ditadura; é retrocesso; é o descrédito do Brasil no mundo; é ameaça ao meio ambiente. Esses são os eixos da polarização. E as forças centrais, até quando agirão para quebrar a espinha dorsal dos extremos? Eis a questão.

    As forças do centro

    As forças do centro ainda não se integraram. O centro, como se sabe, é muito difuso. Abriga múltiplos nichos. Mas é no centro que se produz o maior volume de racionalidade. Os formadores de opinião, os influenciadores, as áreas mais progressistas habitam os espaços centrais. Os interesses se repartem em blocos. Não há uma liderança forte capaz de aglutinar visões e tendências. Mas esse universo não deixará de colocar o seu dedo na ferida aberta pelos digladiadores das duas margens, esquerda e direita. Até ocorrer a junção de interesses em torno de algo ou alguém em comum, muita água correrá por baixo da ponte.

    Mãos limpas

    Juca de Oliveira continua com a verve pontuando sobre a realidade brasileira. Mãos Limpas, sua nova comédia, no teatro Renaissance, São Paulo, mostra os bastidores da corrupção no país, a índole dos nossos políticos, a vida desregrada de protagonistas da paisagem institucional. Corajoso, e pinçando fatos escancarados pela mídia, Juca não se acanha em trazer à baila nomes como os de Gilmar Mendes, Sérgio Moro, Lula, Gleisi, Toffoli, em cenas que ganham risos e aplausos da plateia.

    O nosso Molière

    Mãos Limpas, como outras peças de Juca, é uma comédia de costumes. Ali se veem a "magnanimidade" dos nossos políticos, a teia que envolve seus "sentimentos" (cívicos?), os cordões que amarram protagonistas da política. Enfim, o nosso Molière levanta o véu dos nossos "padrões de decência". Qualquer verossimilhança com a realidade dos atuais dias não é mera coincidência. Texto primoroso sobre a República corrupta. A turma de Juca no palco se completa com a antológica participação de Fúlvio Stefanini, Taumaturgo Ferreira, Bruna Miglioranza, Claudia Mello e Nilton Bicudo.

    Os astutos

    Um jumento carregado de sal atravessava um rio. A certa altura escorregou e caiu na água. Então o sal derreteu-se e o jumento, levantando-se mais leve, ficou encantado com o acontecido. Tempos depois, chegando à beira de um rio com um carregamento de esponjas, o jumento pensou que, se ele se deixasse cair outra vez, logo se levantaria mais ligeiro; por isso resvalou de propósito e caiu dentro do rio. Todavia ocorreu que, com as esponjas embebidas de água, ele não pôde levantar-se, e morreu afogado ali mesmo. Assim também certos indivíduos não percebem que, por causa das suas próprias astúcias, eles mesmos se precipitam na infelicidade. (Esopo)

    Popularidade para de cair

    A última pesquisa sobre a popularidade do presidente Jair Bolsonaro, feita pela XP Investimentos em parceria com o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), mostra que 46% da população esperam um governo "ótimo" ou "bom" até o fim do mandato. Os pessimistas são 31%. Há um mês, a expectativa positiva era de 43%, uma oscilação de três pontos. A proporção de entrevistados que esperam uma administração "ruim" ou "péssima" caiu de 33% para 31% no período. No início do ano, a expectativa positiva para o mandato correspondia a 63% dos entrevistados, e 15% deles eram pessimistas.

    A gangorra da pesquisa

    A avaliação do governo melhorou um pouco: o porcentual de entrevistados que consideram a administração "boa" ou "ótima" foi de 30% para 33% em relação a setembro. A desaprovação a Bolsonaro oscilou de 41% a 38%, e a porcentagem de entrevistados que consideram o governo "regular" se manteve estável em 27%. Entre julho e setembro, a proporção de quem considerava a administração de Bolsonaro "ruim" ou "péssima" foi de 35% a 41% na pesquisa, enquanto a aprovação caiu de 34% a 30%.

    Imagem ruim do Congresso

    A avaliação do Congresso, também medida na pesquisa, oscilou no sentido contrário. A proporção de entrevistados que consideram o desempenho dos parlamentares "ruim" ou "péssimo" foi de 39% a 42%, e a avaliação positiva foi de 16% a 14%.

    O bom uso do plástico

    A Unilever, presente há 90 anos no Brasil e dona de marcas como Dove, Omo, Seda e Mãe Terra, vai reduzir pela metade o uso de plástico virgem nas embalagens de seus produtos até 2025. Até lá, tudo deverá ser reutilizável, reciclável ou compostável. O compromisso foi assumido globalmente pela companhia, que quer também incentivar a economia circular por meio da coleta e processamento de cerca de 600 mil toneladas de plástico por ano até 2025. Esse total é maior do que a quantidade de material comercializado pela Unilever no mundo.

    Gaudêncio Torquato, Jornalista e Consultor de Marketing Político, é Professor Titular na USP.

    ------------------------------------------

    Livro Porandubas Políticas

    A partir das colunas recheadas de humor para uma obra consagrada com a experiência do jornalista Gaudêncio Torquato.

    Em forma editorial, o livro "Porandubas Políticas" apresenta saborosas narrativas folclóricas do mundo político acrescidas de valiosas dicas de marketing eleitoral.


    Cada exemplar custa apenas R$ 60,00. Adquira o seu aqui - www.livrariamigalhas.com.br/

    quinta-feira, 3 de outubro de 2019

    Estrela Cadente

    O vazamento de uma decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central resultou em lucros milionários para um fundo de investimentos administrado pelo Banco BTG-Pactual. Isso foi entre 2010 e 2012, mas só agora veio à tona porque Antonio Palocci, na condição de colaborador do Ministério Público Federal na Operação Lava Jato, contou tudo e a Polícia Federal entrou hoje em campo para apurar e conferir.

    Os procuradores e policiais investigam os crimes de corrupção passiva, corrupção ativa, informação privilegiada e lavagem de dinheiro, nos quais teriam incidido os beneficiários da informação vazada a partir do Comitê de Política Monetária do Banco Central.

    Mandados de Busca e Apreensão já foram cumpridos na manhã de hoje na sede do Banco BTG - Pactual, em São Paulo. A operação policial foi denominada de Estrela Cadente.

    segunda-feira, 30 de setembro de 2019

    Vozes do Nordeste


    Em 15 de março de 1985, José Sarney assume a Presidência da República substituindo Tancredo Neves, que nem chegou a tomar posse, e convida Marcos Freire, Senador do MDB pelo Estado de Pernambuco, para a Presidência da Caixa Econômica Federal com a missão de faze-la funcionar como um banco social.

    Um dia Marcos Freire chega ao Palácio do Planalto com os maiores autores e intérpretes daquele tempo, uns já famosos como Chico, Gil, Caetano, Roberto e Erasmo, Dori, Tânia Alves, Tim Maia, Bethânia, Nara, Gal, Fafá, Rita Lee, Elizete e outros despontando como Belchior, Djavan e Fagner, Alcione, Simone, Elba, Amelinha, Zé Ramalho, Gonzaguinha, Alceu, Tirso e Marina.

    Todos, mais de uma dezena, sem contar arranjadores e músicos, doaram seu trabalho e direitos subsequentes, à causa do Nordeste então assolado em muitas áreas pela seca, pobreza e males congeneres, incluindo a pobreza politica, males dos quais aquele enorme pedaço do Brasil ao que parece não vai se livrar nunca. Ou ainda vai demorar muito para se livrar.

    Marcos Freire apresentou a plêiade de artistas ao Presidente Sarney, que lhe entregaram, em primeira mão, um exemplar do disco cuja renda se destinaria a um fundo de apoio ao Nordeste.

    Mais lá pra frente foi que Sarney, entusiasmado com o bom trabalho do seu antigo colega de Senado, delegou-lhe a missão de organizar e conduzir o Ministério do Desenvolvimento e Reforma Agrária. Marcos Freire era um dínamo para trabalhar. Topou o desafio e seguiu em frente.

    No dia 8 de setembro de 1987, o avião da FAB em que viajava o Ministro Marcos Freire, a trabalho, caiu no sul do Pará, em plena selva amazônica. Não houve sobreviventes.

    O registro do canto nordestino, em som e imagens acima, faz parte do legado de Marcos Freire.

    sexta-feira, 27 de setembro de 2019

    Porandubas Políticas

    Por Gaudêncio Torquato 

    Abro com uma historinha de Jaguaribe, no Ceará.

    Quatro chinelas

    O médico Francisco Ibiapina, do Jaguaribe/CE, tratava com muito zelo de um cliente recém-casado e acometido de forte gripe. O clínico fazia prescrições sobre o regime alimentar e sugeria cautelas para evitar recaída. A um lado, a jovem esposa presenciava a conversa, silenciosa e atenta aos conselhos do médico. Fixando nela os olhos amorosos e não se conformando com a desarrumação de sua lua de mel, o doente cochichou um pedido com voz rouquenha:

    - Seu doutô: fazerá mal quatro chinela debaixo da minha rede?

    (Causo contado pelo historiador Leonardo Mota no livro Sertão Alegre)

    O presidente na ONU

    O presidente Jair Bolsonaro foi fiel ao seu estilo e às suas convicções no discurso de abertura da Assembleia Geral da ONU. De tom desafiador, chamou de 'falácia' a afirmação de que Amazônia é patrimônio da humanidade. Sem citar nomes, disse que países europeus agem com 'espírito colonialista' visando riquezas do Brasil. Afirmou que a Amazônia é maior do que toda a Europa Ocidental e permanece praticamente intocada: "Meu governo tem o compromisso solene com a preservação do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável em benefício do Brasil". Atribuiu às "mentiras da imprensa", especialmente jornais e tevês, pela imagem "distorcida" do Brasil em todo o mundo. Foi a fala mais dura e acusatória de um presidente do Brasil na ONU.

    Ataques ao socialismo

    Bolsonaro fez um balanço de seu governo (preocupado com o combate à criminalidade e à corrupção), atacou a ideologia de esquerda que invadiu todos os setores da vida brasileira, criticou indiretamente a França e diretamente Cuba e Venezuela, que hoje "experimenta a crueldade do socialismo". E emendou: "Meu país esteve muito próximo do socialismo, o que nos colocou numa situação de corrupção generalizada, grave recessão econômica, altas taxas de criminalidade, ataques ininterruptos dos valores religiosos que marcam nossa tradição". O combate ao socialismo recebeu, também, duras palavras de Donald Trump. Os dois tocaram a mesma tecla.

    Vivas e apupos

    Este consultor fez um apanhado nas redes sociais. E ouviu amigos e formadores de opinião. Conclusão: o presidente recebe vivas e aplausos de adeptos do bolsonarismo, orgulhosos da performance presidencial. Mas ganhou apupos dos contrários, alguns usando a expressão "vergonha". Muitos acham que os efeitos deletérios prejudicarão os negócios. Cada ala com seus exércitos em prontidão.

    A polarização

    Como se pode aduzir, Bolsonaro tentará puxar o novelo da polarização até as margens eleitorais de 2022. Para ele, interessa a luta intensa entre os polos extremos do arco ideológico. Luiz Inácio Lula da Silva e seus seguidores também gostariam de esticar a onda do discurso extremado, pois ali está a chance de o PT divisar luz no fim do túnel. Seria conveniente ao petismo levantar barreiras ideológicas contra o bolsonarismo direitista, principalmente se a economia não der resultados e continuar a frustrar as expectativas das massas.

    A ida para o centro

    O refúgio das classes médias, nos próximos tempos, será o centro. O discurso polarizado começa a cansar. Classes médias, categorias profissionais, profissionais liberais, enfim, os setores racionais, não contaminados pelos dribles da emoção ou do engajamento doutrinário, tendem a habitar o meio do território das ideologias. Esta possibilidade pode se manifestar já nas urnas de 2020, quando será renovada a base do edifício político, 5.570 prefeitos e quase 58 mil vereadores. O Brasil não aguenta muito tempo ficar pendurado num dos cantos do arco.

    Racha na centro-esquerda

    A centro-esquerda está rachada. PSB, PDT e PC do B estão descontentes com o PT. O deputado Orlando Silva, do PC do B, atesta: "muitos partidos cansaram de serem tratados como satélites do PT". Em vez de uma candidatura única em 2022, a tendência aponta para o lançamento de candidatos de cada partido da centro-esquerda: Ciro Gomes, pelo PDT; Flávio Dino, governador do Maranhão, pelo PC do B; Guilherme Boulos, coordenador do MTST pelo Psol; Joaquim Barbosa, ex-ministro do STF, pelo PSB; Fernando Haddad ou o governador da Bahia, Rui Costa, pelo PT.

    Huck se prepara

    É de Luciano Huck o passo mais avançado para ocupar o centro e ser o candidato mais forte das classes médias. Começa a se preparar organizando um time de grandes profissionais em seu torno. O mais brilhante do grupo é Armínio Fraga, um expert em matéria de finanças. O ex-presidente do Banco Central imprime respeito e credibilidade em seus domínios. Huck tem ainda um grande conselheiro: Fernando Henrique Cardoso. O apresentador tem boa ligação com as massas. Seu "Caldeirão" esquenta o coração das massas.

    PSL, difícil de se manter

    O partido do presidente Bolsonaro tende a rachar. As querelas internas geram divisões e ameaças de fuga de quadros. Luciano Bivar, o pernambucano que o preside, é contestado por boa parte da sigla. O major Olímpio luta contra o domínio do deputado Eduardo Bolsonaro, em São Paulo. Espera que ele seja apeado da presidência do partido, caso seja nomeado embaixador nos EUA. O PSL rachado abre a porta da migração partidária.

    Reforma ministerial

    As conversas sobre reforma ministerial se multiplicam. Diz-se que o presidente não está satisfeito com algumas áreas. A economia demora a produzir resultados. Paulo Guedes é cobrado sobre isso. Bolsonaro está ansioso para ver a economia aquecida. Já em relação a Moro cresce a insatisfação da área política contra sua atuação. A morte da menina Ágatha, por uma bala perdida atirada por policiais, é mais um empecilho para aprovação de seu pacote anticrime.

    Generais perdem poder?

    Avoluma-se a impressão de que os generais no entorno do presidente perdem poder. Sua influência sobre o presidente é aquém do que se esperava. Mesmo o general Luiz Eduardo, o maior amigo do presidente e que chefia a Casa Civil, ainda não conseguiu dar peso à articulação política. O Congresso carece cada vez mais dos presidentes das duas Casas Legislativas para fechar o círculo da articulação e operar a agenda das reformas.

    Witzel, o polêmico

    O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, vestiu mesmo a camisa do tiro ao alvo, aliás, do tiro ao bandido. É visto como um defensor da violência policial. Sob esse figurino, quer desfraldar a bandeira da segurança pública. Mas a violência no Rio, sob sua égide, só aumenta. O polêmico dirigente já avisou que entrará no páreo de 2022. Sem chance. Sua índole retocada de sangue gera medo, ao contrário de segurança.

    CPMF?

    Marcos Cintra foi despedido, mas a CPMF continua na cabeça de Paulo Guedes, que considera o tributo "feio", mas adequado para baixar outras alíquotas, não sendo ainda "crue" com os encargos trabalhistas. Bolsonaro garantiu que a CPMF não vingará. E agora Guedes? Conseguirá dobrar a decisão de seu chefe? Quem consegue acreditar em quem?

    Derrotas de Macri e Trump

    Hoje, Maurício Macri e Donald Trump perderiam na Argentina e nos Estados Unidos. Essas derrotas teriam impacto sobre a reeleição de Jair Bolsonaro em 2022. Aliás, a moldura direitista no mundo pode ser alterada nos próximos tempos. Um alerta para o presidente brasileiro. Na Argentina, a chapa peronista de Alberto Fernandez e Cristina Kirchner é favorita para vencer as eleições de outubro próximo. E, nos Estados Unidos, Trump tem muito tempo para se recuperar até 3 de novembro de 2020. Hoje, perderia para o ex-vice de Barack Obama, o moderado Joe Biden, ou mesmo para os senadores democratas progressistas Bernie Sanders e Elizabeth Warren.

    Descompasso

    Apesar do esforço dos presidentes dos três Poderes para mostrar harmonia e equilíbrio entre eles, o fato é que a balança pende para um dos lados. O desequilíbrio é grande. O STF tem adentrado com intensidade e frequência no território da política. Pode-se até dizer que tem entrado no vácuo aberto pelo Legislativo. Por falta de legislação infraconstitucional, o Supremo, sob o argumento da necessidade de interpretação da CF, acaba legislando. Parcela do estranhamento entre políticos e o Judiciário a isso se deve. O Executivo, por sua vez, vê com reservas certas decisões do Judiciário.

    MP contido

    O Ministério Público passou esses anos imperando e reinando. Seus membros queriam e conseguiram formar um Poder ao lado dos três Poderes. Firmaram um pacto com uma camada de juízes de 1ª instância. Lutam por recursos da Lava Jato. E começam a ver seus pleitos derrotados. Mas não desistem da luta por recursos para seus cofres. Juízes como Fábio Prieto, desembargador do TRF-3, têm sido um empecilho para que o MPF alcance seu intento.

    Uma fome de R$ 2,5 bilhões

    Agora, disputa judicial envolve o Ministério Público Federal (MPF), que pretende liberar todos os recursos do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, de R$ 2,5 bilhões, cuja aplicação está suspensa. O ministro da Justiça deseja usar esses mesmos recursos para financiar projetos de sua gestão. Já o ministro da Economia, por sua vez, quer o dinheiro para ajudar no equilíbrio fiscal do governo. A disputa está sendo examinada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª região.

    O conflito de interesses

    Para o desembargador Fábio Prieto, a pretensão do Ministério Público de gerir este fundo não se justifica. Além disso, considera inconstitucional que cidadãos, empresas e governos possam ser condenados a pagar vultosas somas em uma ponta, a partir da iniciativa do Ministério Público, quando na outra ponta a mesma instituição quer garantir a condição de gestora e alocadora da verba a terceiros: "O conflito de interesses com outras entidades e órgãos públicos também atraídos pelos recursos salta aos olhos".

    3,4º c até 2100

    A média da temperatura do planeta, segundo o site Agência do Rádio, poderá aumentar em até 3,4º C até o final deste século. A informação foi divulgada em um relatório das Nações Unidas (ONU), que reúne estudos científicos da Organização Meteorológica Mundial e de outros órgãos especializados.

    Fora do conselho de segurança? 

    O chanceler Ernesto Araújo já anunciou: não é prioridade do atual governo do Brasil lutar por uma vaga no Conselho de Segurança da ONU, o mais prestigiado e poderoso braço da entidade. A eleição será em 2021. Para ter apoio, o país precisa fazer intensa campanha, a partir dos vizinhos da AL. Dilma não se preocupou com isso. E o Brasil perdeu a chance de vir a ocupar no curto prazo. Ficou para 2033. O governo Temer conseguiu antecipar esse prazo em 10 anos, ao negociar com Honduras. Mas o Brasil sofre hoje fortes resistências da Europa e do mundo árabe. Não é mais prioridade, segundo Araújo. O Brasil acabará perdendo o trem da história.

    Gaudêncio Torquato, Jornalista e Consultor de Marketing Político, é Professor Titular na USP.

    ------------------------------------------

    Livro Porandubas Políticas

    A partir das colunas recheadas de humor para uma obra consagrada com a experiência do jornalista Gaudêncio Torquato.

    Em forma editorial, o livro "Porandubas Políticas" apresenta saborosas narrativas folclóricas do mundo político acrescidas de valiosas dicas de marketing eleitoral.


    Cada exemplar custa apenas R$ 60,00. Adquira o seu aqui - www.livrariamigalhas.com.br/