segunda-feira, 7 de maio de 2018

As ondas eleitorais

Por Gaudêncio Torquato

O campo eleitoral se movimenta por ondas. Que circulam de cima para baixo e de baixo para cima, absorvendo climas, circunstâncias, discursos, canalizando esses inputs na direção de potenciais perfis, principalmente candidatos a presidente, razão pela qual figurantes estaduais não ganham tanta projeção.

As ondas ganham o empuxo do momento, exibindo as demandas imediatas da sociedade. Estas, por sua vez, reúnem anseios, expectativas, frustrações com governantes e suas políticas, e contextos que levam em conta heranças do passado e esperanças em relação ao futuro.

No caso do Brasil, a leitura exibe um país que afundou na maior recessão econômica da história; ascensão de novo governante sob a decisão congressual de afastar a presidente; reformas – teto de gastos, trabalho, educação, terceirização etc - não suficientemente explicadas e entendidas pela sociedade; a maior investigação de corrupção em todos os tempos, envolvendo altos empresários, políticos e governantes; prisão do líder mais populista do país; tentativa de um partido de tornar vítima seu líder maior e assim retornar ao poder, após 13 anos de comando do país; indignação social contra a classe política; volta da polarização do discurso “nós e eles”; dispersão do campo político; falência de Estados e Municípios; extrema violência nos quatro cantos do país; e precarização dos serviços públicos.

Essa é a moldura por trás de quem se apresenta como pré-candidato. Sob a influência de traços do cenário, o eleitor faz suas primeiras escolhas. De um lado, um partido organizado, militância aguerrida, que se proclama responsável pelo “melhor governo que o Brasil já teve em todos os tempos”, esquecendo o maior rombo do Tesouro por ele praticado. O “Salvador da Pátria”, mesmo preso, continua sendo elevado aos píncaros da glória. O que explica sua margem histórica em torno de 30% nas pesquisas. De outro lado, emerge o contraponto, perfil de extrema direita, ex-militar com o discurso da ordem contra a bagunça, sob os lemas de “bandido bom é bandido morto”, “soldado bom é aquele que mata”.

Jair Bolsonaro é empurrado para o alto pela temperatura ambiental, enquanto Lula continua impulsionado pela onda petista, apesar das águas que levam o petismo para a profundeza oceânica. Eles sustentariam seus índices até outubro? Lula está praticamente fora do jogo. Mesmo solto, deverá entrar na ficha-suja. O substituto não levaria seus votos. Bolsonaro representa indignação, mas não o voto mais consciente da maior parcela da classe média. Terá poucos segundos de TV.

Outras ondas carregam Joaquim Barbosa, Marina Silva e Ciro Gomes. Assim, é razoável supor que outros perfis poderão ascender na escada eleitoral. A decisão do eleitor muda segundo as circunstâncias. Hoje, os ventos do outono sopram para uns. Aguardemos a ventania do inverno e o sopro do verão.

Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP, consultor político e de comunicação - Twitter@gaudtorquato

quinta-feira, 3 de maio de 2018

David Bowie - Life On Mars

Há vida em Marte?


Por Edson Vidigal

Depois de amanhã, sábado, pouco depois das oito horas, começará a viagem de seis meses de uma sonda da NASA, a agencia espacial norte americana, com destino a Marte.

Os cientistas agora querem saber sobre os tremores por lá chamados por nós aqui de terremotos. A sonda irá equipada para nos inteirar de tudo sobre a crosta, o manto, o núcleo e também se o recheio de Marte é ou não parecido com o da Terra.

Há anos já estão por lá uns trecos esquisitos escascaviando desertos, montanhas, fotografando e filmando tudo. São impressionantes as imagens que nos chegam diariamente.

Tem se falado por aqui, quero dizer entre os cientistas, que do jeito como a humanidade vem tratando o planeta Terra, uma explosão, de repente, reduzirá tudo a poeira atômica, deletando para sempre todo o processo civilizatório.

Humanos, bípedes, talvez sobrevivam poucos. Restarão, certamente, as baratas. E as ratazanas, quem sabe?

Aquelas duas bombas atiradas sobre Hiroshima e Nagasaki para amolecer o Japão ainda em luta brava como parte do eixo Berlim-Roma-Pequim, na segunda guerra mundial, soariam hoje destinadas apenas a pequenas agressões se comparadas ao que a insensatez humana já produziu e estocou.

O tempo, e não é de hoje, é dessa Paz precária cada vez mais rodeada de bombas.

Do que se sabe, os Estados Unidos, em 9 de julho de 1962, explodiram no espaço sobre o Oceano Pacifico, a 1.500 kms. do Estado do Havaí, uma bomba equivalente a 1 milhão e 400 mil toneladas de TNT, afetando duramente o campo magnético da terra.

Três dias antes, no subsolo do deserto de Nevada, outra bomba já havia sido explodida, expondo 23 milhões de americanos à radiação. No mesmo julho, dia 26, a então União das Republicas Socialistas Soviéticas começou a armar Cuba com misseis nucleares direcionados para atacar a qualquer hora os Estados Unidos. Por pouco, não fossem a firmeza de Kennedy e o recuo sensato de Kruschev, o então dirigente russo, não chegamos à primeira e talvez última guerra mundial.Começou aí o descolamento da Rússia de Cuba, o que levaria à falência o comunismo de Fidel.

No dizer de Churchill, o mundo estava em Guerra Fria. As explosões se voltaram para o espaço no mais longínquo que os misseis pudessem alcançar. Os malucos queriam o domínio militar do espaço sideral. O placar final – Estados Unidos, 14 bombas. – União Soviética, 7.

Pouco antes da última confirmação de Putin como chefe do Kremlin, a Rússia anunciou que já tem misseis que dão volta em torno da Terra podendo explodir os Estados Unidos e qualquer outro lugar do planeta.

O gordinho da Coreia do Norte, que muitos o tinham como tolo, recusado como Pomba da Paz, virou o Gavião da Paz propondo trégua pois já não lhe interessaria mais fazer bombas atômicas, estando, por isso, disposto a desativar o seu programa nuclear. Mas o que se sabe é que ele, também, já está armado com misseis capazes de grandes estragos, em especial sobre o território norte-americano.

Tirando, certamente, países da África e da América Central e do Sul, quase todos, incluindo Europa e Oriente Médio, já tem num coldre enorme, bem escondida, a sua bomba atômica de estimação.

Como perguntou Sidney Muller, - “o cientista inventa uma flor que parece / a razão mais segura pra ninguém saber / de outra flor que tortura, pois é pra que?”. 

Em 17 de dezembro de 1971, David Bowie lançou em disco uma canção em que recomenda – “dê uma olhada no homem da lei espancando o cara errado / imagino se ele algum dia vai saber que ele está no show mais vendido (em tradução livre, o show de maior sucesso) / é o show de horrores”.

E ao final, como que melancólico, pergunta se “há vida em Marte”, (“Life on Mars?).

Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal.



sexta-feira, 20 de abril de 2018

Porandubas Políticas

Por Gaudêncio Torquato

Abro a coluna com uma historinha de Jânio Quadros.

O selo, coronel, o selo?

Logo depois de 64, Jânio é chamado ao Rio para depor em Inquérito Policial Militar (o famigerado IPM daqueles tempos de chumbo). Mas o ex-presidente não vai. E diz por que não vai:

- Só falo no meu chão, na minha jurisdição.

O coronel vai a São Paulo ouvi-lo. À máquina, o sargento escrevente e, ao lado de Jânio, seu amigo Vicente Almeida. O coronel começa:

- Dr. Jânio Quadros, em que dia e ano o senhor nasceu?

Jânio arregala os olhos, entorta-os e volta-se para o lado:

- Vicente, meu bem, será que ele não sabe? Não pode ser.

O coronel não entende:

- Não sabe o quê?

- Que perguntas têm que ser por escrito. Está na lei, coronel. Na lei.

O depoimento vai indo, por escrito. O coronel tira um maço de cigarros, oferece. Jânio pega-o na ponta dos dedos, passa de uma mão à outra:

- Vicente, meu bem, que coisa. O que é isto? Que estranho, Vicente! Nunca havia visto.

O coronel irrita-se:

- Por que o espanto, dr. Jânio? É um cigarro americano Marlboro.

- Sim, sim, meu caro coronel, sei-o, sei-o muito bem. Mas, onde está o selo? O selo, coronel? O selo?

O IPM acabou.

(Historinha contada por Jô Soares).

Aécio vira réu

Aécio entrou na lista dos réus. Sua eleição em MG fica complicada. Nuvens cinzentas obscurecem os caminhos do senador. Os políticos expandem suas taxas de medo. A Lava Jato continua batendo forte.

A campanha paulista

A pesquisa Datafolha desta segunda-feira começa a desvendar a batalha que se travará em São Paulo, que agrega cerca de 35 milhões de eleitores. Será um dos pleitos mais disputados do país. João Doria, PSDB, sai na frente. Trata-se de um perfil com grande visibilidade adquirida nos últimos tempos, desde a campanha que ganhou em 2016 para prefeito de São Paulo. João é aguerrido, posiciona-se no centro-direita e sabe lidar muito bem com a comunicação, a partir do uso das redes sociais.

Desafio: diminuir rejeição

João Doria vestiu o manto do novo, com sua cara mais asséptica e não contaminada pelo vírus da velha política. Mas o bom índice de Doria - hoje ostentando 29% de intenção de voto e 36% quando Paulo Skaf não aparece na disputa, precisa ser bem administrado. Sua rejeição é alta. Sabemos quão é difícil a um candidato segurar seus bons índices durante a campanha. Há ainda dois fatores que precisam ser levados em conta: a pequena visibilidade e o pouco conhecimento que se tem do atual governador Márcio França, candidato à reeleição. O índice de rejeição a Dória, que chega a 34%, deve ser motivo de preocupação. Os paulistanos, principalmente, sinalizam insatisfação pelo fato de João ter deixado antes mesmo do meio o mandato à prefeitura da metrópole.

O poder da caneta

Márcio França, por sua vez, terá a favor o poder da caneta. Esse fato atrai a prefeitada. Ocorre que mesmo esse poder tem limites, até porque não poderá exercê-lo em plenitude nas margens próximas às eleições. E os prefeitos podem não dispor mais do prestígio que tinham no início do mandato.

PMDB com França?

Diz-se que dos 82 prefeitos do PMDB, ele teria o apoio de 70. A se confirmar. Paulo Skaf, que já se candidatou na campanha anterior, apresenta surpreendentes 20%. Tem cacife para expandir esse índice? Tem fôlego para enfrentar uma contundente campanha? Se fechar o apoio do PSB, com ajuda do seu amigo Flávio Rocha, adicionará mais tempo ao seu programa eleitoral. Claro, se o PMDB não apresentar candidato à presidência da República.

Luiz Marinho

O candidato do PT ao governo de São Paulo, ex-prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, não irá longe. Não possui uma identidade do porte de São Paulo. Parece bem menor do que o gestor que o Estado exige. Marinho firma sua imagem sobre o eixo do sindicalismo. Foi presidente da CUT, hoje uma organização que se junta ao MST e ao MTST para promover mais do que greves: depredações, arruaças, devastação de ruas e lojas. Se chegar aos 15%, fará razoável performance.

O recolhimento de Lula

Para quem passa o dia batendo papo, deixar a conversinha de lado deve ser um sacrifício. Diz-se que o abatimento de Luiz Inácio tem por motivo principal a falta de conversa com amigos e políticos. Lula respira política 24 horas por dia. Trata-se de um perfil acostumados aos momentos de felicidade e de infelicidade na arena política. Por isso, deverá sofrer se ficar muito tempo preso. Deve ter o conforto de ouvir, todas as manhãs, a saudação em coro de militantes nas proximidades: "bom dia, presidente Lula".

Entre a cruz e a caldeirinha

O PT vai ter de enfrentar o problema: deixar o nome de Lula circulando como candidato até o último momento ou, desde já, dar vazão ao plano B e escolher seu substituto. Cabe lembrar que o PT carecerá de um nome no pleito para ocupar os palanques estaduais. Formar uma grande bancada será seu objetivo. Este analista não aposta na hipótese de deixar o nome de Lula até o instante em que for considerado inelegível pelo TSE. Até agosto, o substituto deve sair a campo. P.S. O maior eleitor do PT continuará sendo Lula.

O Fórum do LIDE

Sem a presença de João Doria, às voltas com a pré-campanha em São Paulo, terá início, hoje, em Recife, no hotel Sheraton Reserva do Paiva, o 17º Fórum Empresarial do LIDE, o maior que se faz no país reunindo empresários, políticos e gestores públicos. A conjuntura nacional será objeto de diversos painéis, que debaterão temas centrais da realidade brasileira - Competitividade e Emprego, a Era Reformista, Democracia e Competitividade, entre outros -, sob a batuta de Luiz Fernando Furlan, Chairman do LIDE, e Roberto Giannetti da Fonseca, vice-Chairman.

O Brasil à direita ou à esquerda?

A pergunta embute, além da dúvida, intensa preocupação da sociedade. Uma inclinação do país à esquerda causa imensa preocupação, eis que o petismo-lulismo-dilmismo, somado ao psolismo (PSOL), sob a teia de vandalismo tecida por CUT, MST, MTST, amedronta formidáveis setores, a partir dos campos de negócios, investidores, forças do chamado mercado, e até fortes contingentes das classes médias. Um Brasil à esquerda teria o apoio de parcelas das margens - que tendem a optar por uma via populista ou neo-populista, segmentos da intelectualidade, núcleos da igreja católica, as militâncias engajadas, entre outros compartimentos. Quem teria perfil para atrair esses setores, com Lula fora do páreo?

Direita

Já a ponta direita do arco ideológico tende a agregar os blocos mais conservadores, proprietários rurais, margens indignadas contra a insegurança pública e parcelas das classes médias mais abastadas. Essa frente de direita é abertamente militarista, defendendo o uso de armas por parte da população e mais rigor nas punições. O momento de intranquilidade vivido pelo país abre uma larga janela para essa direita. Entre os perfis que preenchem os espaços dessas demandas estão Jair Bolsonaro e Flávio Rocha, o primeiro com uma visão de Estado mais gordo, o segundo com uma visão de Estado mais enxuto.

Centro

Na visão deste consultor, a tendência do eleitor médio é a afastamento das extremidades do arco ideológico e aproximação ao centro. O que significa a escolha de perfis não radicais. Por isso, a probabilidade da eleição de um candidato de centro é maior do que a eleição de um representante fincado nas margens.

Um arquipélago

Ocorre que o centro tem o formato de um arquipélago com ilhas separadas umas das outras. Se os candidatos da área central não se integrarem, estarão facilitando a escolha de um perfil de direita ou de esquerda. O vetor de força para ganhar a campanha será formado pelos eixos que locomovem as candidaturas do centro. Sem essa unidade, os centristas estarão cometendo um suicídio.

Valores do centro

O centro agrupa valores tradicionais de nossa formação cultural: o equilíbrio, a harmonia, a integração, a solidariedade, o companheirismo, a boa vontade, a disposição para o diálogo. A confusão, as querelas, a luta renhida entre grupos e classes - podem, até, ocorrer circunstancialmente, pontualmente, mas não ancoram a índole brasileira. Basta ler os nossos clássicos: Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Dante Moreira Leite, Darcy Ribeiro, Raymundo Faoro, entre outros.

Fadiga democrática

A observação é do escritor, jornalista e poeta belga David Van Reybrouck: o mundo atravessa um momento de fadiga democrática. Quais são os sintomas da síndrome? Vejamos alguns: apatia do eleitor, abstenção às urnas, instabilidade eleitoral, hemorragia dos partidos, impotência das administrações, penúria no recrutamento, desejo compulsivo de aparecer, febre eleitoral crônica, estresse midiático extenuante, desconfiança, indiferença e outras mazelas.

Legitimidade

E arremata o belga: "a democracia tem um problema sério de legitimidade quando os eleitores não dão mais importância à coisa fundamental, o voto".

Marina cresce

Marina Silva cresce com Lula saindo do páreo. Mas continua uma dúvida: Marina teria condições de sustentar no gogó uma campanha contundente e cheia de curvas? Trata-se de um perfil asséptico e que expressa honestidade e ética. É muito confiável aos jovens.

Barbosa

Joaquim Barbosa está dando sinais de que poderá entrar na corrida presidencial. Joaquim pode encarnar a voz dos mais carentes e humildes. Mas se conterá nos debates televisivos? Parece bom de briga.

O nome de Deus em vão

É tolo pedir aos deuses o que os homens podem fazer sozinhos. O axioma, das Exortações do filósofo grego Epicuro (341-270 a.C.), é um alerta contra a ideia de que os homens têm o direito de invocar o poder divino a qualquer hora e em intensidade modulada para resolver equações terrenas. Quando o nome de Deus é usado em vão com tanta frequência, é porque aqueles que o chamam estão desesperados e clamam urgentes providências divinas para tirá-los de alguma enrascada, tentam repartir culpas por atrasos no cronograma humano de obras sob sua responsabilidade, ou ainda, se esforçam para usar a calota dos céus contra "forças demoníacas" que teimam em fechar os caminhos da salvação.

Sobrenome de parlamentares

Nesses tempos nebulosos, a moda virou usar em vão o apelido Lula e os sobrenomes de Moro e Bolsonaro nos nomes de parlamentares. Quanta imbecilidade. (Por que não usar adjetivos de qualificação, mais apropriados para esses tempos lamacentos? Honesto, desonesto, ético, corrupto, sério, brincalhão, digno, indigno e por aí vai).

Gaudêncio Torquato, cientista politico e consultor de marketing, é Jornalista e Professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

sábado, 14 de abril de 2018

Assim falou Ives Gandra Martins


O jurista Ives Gandra Martins, um dos primeiros a publicar em parceria com o inesquecível professor Celso Bastos, os Comentários à Constituição do Brasil de 05 de outubro de 1988, artigo por artigo, sendo hoje um dos mais respeitados profissionais também no Direito Constitucional, foi instado a pronunciar-se sobre as declarações do Comandante do Exército, General Vilas Boas, às vésperas do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do "habeas corpus" em favor do ex-Presidente Lula. (Clique no vídeo acima).

No limiar do golpe

Por Edson Vidigal

Naquele tempo, saber das coisas do resto do mundo, só pelo rádio – Tupy, Globo, Bandeirantes, Nacional, Voz da América.

E foi assim que por volta da meia noite, já começando o Dia da Mentira, 1º de abril de 1964, a redação do "Jornal do Dia", na Rua de Santana, em São Luís, Maranhão, não levando a sério o que o rádio dizia sobre uma insurgência militar em Juiz de Fora, Minas Gerais, não escondeu logo na primeira página sua clara antipatia e oposição àquele movimento.

Numa cercadura, num canto, um "Manifesto ao Povo Maranhense", em defesa do mandato constitucional do Presidente da República, João Goulart. Assinavam-no Bandeira Tribuzi, pela Frente de Mobilização Popular; Manoel Vera Cruz Marques, pelo Pacto de Unidade e Ação Sindical e Edson Carvalho Vidigal, pela União Maranhense de Estudantes Secundários.

Sim, eu mesmo numa das minhas várias militâncias. Jornalista de Oposição, trabalhava num jornal de Oposição. Estudante secundarista, era Vice-Presidente da UMES. Político de Oposição, já era àquela altura Vereador em Caxias, à época o segundo maior colégio eleitoral do Estado. E na Câmara, era o Líder da Oposição. Uma bancada de três contra nove governistas.

Tudo pelos cantos da Ilha aparentava normalidade, tanto que nos primeiros dias após o golpe ainda ensaiamos passeatas. Lembro que saímos num fusca com um megafone e parando à frente de uma unidade militar gritamos palavras de ordem, em sucessivas atitudes de provocação. Eu acreditava tanto na força da ordem constitucional democrática que andava com um exemplar de bolso da Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 1946, como se aquele livrinho tivesse o condão de mandar para o inferno os demônios do autoritarismo, que se arreganhava. Nem percebi que alguns mais atuantes naquela resistência já estavam saindo fora. Minha mãe me ensinou que "quem não deve não teme" e então fui seguindo em frente.

No Liceu Maranhense, onde cursava o ginásio, turno matutino, meu nome foi riscado da lista de chamadas. Mais uma vez, provocativamente, esperei antes de cada aula que todos os nomes fossem chamados até que, ao final, omitido o meu, eu fosse reclamar com o professor. Ele mostrava o risco firme, em cor vermelha. Na Praça João Lisboa, não percebendo ainda que os agitadores de sempre já não apareciam, continuei me expondo, sem esconder minha posição. Eu não era nada mais do que sempre fui e continuo sendo até hoje, um legalista.

Até que apareceu um jipe verde-oliva na porta do colégio e me levaram ao Quartel do 24/BC. Isso foi no dia 14 de abril de 1964. Foi engraçado no início. Depois não teve graça nenhuma. Os caras mandaram me recolher num cubículo, espaço só para um, que ficava ao lado do Corpo da Guarda.
Fiquei ali dez dias e depois, sem mais nem menos, me soltaram. Foi quando fiquei sabendo que os mandatos, o de Vereador e o de Vice da UMES, haviam sido cassados. Outra vez, sem perceber que estava provocando os vencedores, saí atrás de medidas legais para reaver a cadeira na Câmara.

Num outro dia, que não me lembro, outro jipe, talvez o mesmo, parou pela manhã na porta do "Jornal do Dia", na Rua de Santana, novamente me levaram para o Quartel do 24/BC. Deixaram-me no corredor do quartel, aguardando. Passou um Capitão, conhecido do meu bairro, encarregado do IPM dos estudantes (Inquérito Policial Militar). Olhou o relógio, disse que ia almoçar e que depois falaria comigo. Logo passaram dois soldados levando uma cama de solteiro, em seguida outros dois levando um colchão e roupa de cama. Nem desconfiei. Não demorou, me levaram para um alojamento onde já estavam outros presos, líderes do movimento estudantil.

Em grupo, a raça humana se dá melhor. Soubemos superar o tédio, não cair na depressão. Das visitas familiares ficavam açúcar, limão e na garrafa térmica não café mas cachaça. E desses contrabandos fazíamos caipirinhas deliciosas. Sem gelo mas deliciosas. Instituímos uma República dos Presos Políticos e na Constituição havia um artigo, no Capítulo dos Direitos e Garantias Individuais, que o Cidadão poderia perder todos os direitos se fosse declarado solto, mandado de volta à liberdade. Isso tudo escrito.

Tinha ainda a estória com que nos ameaçavam sobre um navio que estaria a caminho para levar a nós todos para a prisão de Fernando de Noronha, onde já estava Miguel Arrais e outros. Nos banhos de sol reencontrávamos os presos de outras celas. Não podíamos conversar muito e vi algumas vezes dois militares no telhado do quartel nos filmando ou fazendo de conta que nos filmavam.

Um dia chegou um General de Fortaleza, da 10ª Região Militar, e o Capitão do IPM levou-o ao alojamento onde estavam os comuno-subversivos do movimento estudantil no Maranhão. Éramos quase vinte, se bem me lembro. Imaginem a cena. Os dois oficiais fardados, no que eles acreditavam estar prestando o melhor serviço ao País e nosostros, jovens idealistas, legalistas, detrás das grades, sendo mostrados ali como troféus da guerra anti-revolucionária. O Capitão do IPM fumava "Minister" com filtro e arrisquei filar um. Aí o sua excelência se deu conta de mim, ali entre os demais. E me perguntou como se estivesse, de há muito, à minha procura – o que eu estava fazendo ali. Respondi – esperando o senhor acabar de almoçar. Dia seguinte fui excluído do banho de sol.

Cinqüenta e três dias depois fui solto por uma ordem de "habeas corpus" do Superior Tribunal Militar. Estava preso alem do prazo legal, sem culpa formada. Depois, concluído o IPM, decretaram minha prisão preventiva.

A primeira prisão nunca se esquece.

Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal. 

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Que tal essa aí seu Damásio?


quarta-feira, 11 de abril de 2018

Porandubas Políticas

Por Torquato Gaudêncio

Abro a coluna com duas historinhas, uma da Bahia, outra do Maranhão.

Deu-se o vice-versa

Dr. Dantinhas, deputado da Bahia, elo de todo um clã político do Estado (neto do barão de Geremoabo), foi convidado para padrinho de casamento da filha de um coronel de uma cidade do sertão. No dia de viajar, recebeu telegrama:

- Compadre, não precisa vir. Deu-se o vice-versa. Menina morreu.

Puxa-sacos

Tempos eleitorais. Tempos de fidelidade e infidelidade. Guanaré era cabo eleitoral do governador Sebastião Archer, do Maranhão. Convenção do PSD, alguém acusou Guanaré de puxa-saco. Guararé argumentou:

- Cada um puxa o saco de quem pode. Eu puxo o saco do senhor, governador Archer. O senhor já puxa o saco do senador Vitorino Freire. E o senador puxa o saco do general Dutra. É a lei da fidelidade partidária.

Nuvens pesadas

As nuvens da política continuam pesadas. Não há como evitar a montanha de interrogações à nossa frente. Por mais que partidos, alas, grupos de um lado e de outro queiram enxergar um ambiente claro, não conseguem. A prisão de Lula deixa muitas dúvidas no ar. Se há algo que parece transparente, é certamente o aumento do nível de tensões dentro do petismo e fora dele. O discurso do ódio é coisa visível e sobre isso não há dúvidas.

Para onde vai o PT?

Este consultor, por dever de ofício, tentará fazer uma análise da situação, mesmo sabendo que a emoção de um leitor aqui, outro leitor ali, vai considerá-la parcial. Vamos lá. O que será do PT nesse percurso imediato à prisão de Lula? Não arrefecerá, como se pode imaginar. E menos ainda desaparecerá. Lula, individualmente, é o maior eleitor do país. Terá influência sobre o processo eleitoral. Para começo de conversa, mesmo vivendo uma crise, o PT é o partido com a maior bancada após o fechamento da janela partidária: 57 deputados (data de hoje). O PP está atrás, com 54. O MDB tem hoje 53. Mas os números oficiais só serão conhecidos sexta-feira, 13. Pode ser que haja ligeira alteração.

Bancadas estaduais

É evidente que o PT deverá usar o "eleitor Lula" como alavanca das bancadas nos Estados, seja a da Assembleia Legislativa seja a da Câmara Federal. A militância, que se agita ao calor da prisão e fazendo pequenos comícios todos os dias defronte à PF de Curitiba, quer se transformar na tuba de ressonância do lulopetismo.

Entre a cruz e a caldeirinha

Gleisi Hoffmann, presidente da sigla, que ganhou status de advogada e porta-voz de Lula, está sendo mestre de cerimônia de orações e perorações que ali se realizam. Mas Gleisi precisa atualizar sua situação na OAB e, como advogada, ameaça perder o cargo de senadora, eis que o regulamento proíbe a um profissional da advocacia na condição de parlamentar é vetada a tarefa de defender uma causa contra uma empresa pública. No caso, Lula versus Petrobras. A senadora está entre a cruz e a caldeirinha.

Arrufos e querelas

Em alguns Estados, veremos pequenas mobilizações sob o desfraldar de bandeiras vermelhas do PT e de suas extensões, MST e MTST. Grupos contrários, sob a estética do verde-amarelo da bandeira nacional, tentarão fazer o contraponto. Arrufos, querelas, brigas e algum sangue correndo por faces e cabeças, farão parte da paisagem. Nas entranhas do PT, é provável um racha entre alas, uns defendendo linha aguerrida de ataques, outros tentando arrumar o discurso para entregá-lo ao substituto de Luis Inácio. Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo, encabeça a lista.

Gaudêncio Torquato, Professor na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, é consultor politico e comentarista no Jornal da Cultura.

Pressão sobre os tribunais

Numa outra frente, o PT deverá continuar a fazer pressão sobre o STF, particularmente na direção do julgamento das ADCs - Ações Diretas de Constitucionalidade - que permanecem sob a relatoria do ministro Marco Aurélio. O PEN está desistindo de uma. Mas o ministro Marco Aurélio dá sinais de que pretende entrar com um requerimento amanhã para forçar a votação de outra ADC, que trata da prisão após decisão em 2ª instância.

Novamente Weber

Vai depender da aceitação do requerimento pela ministra Cármen Lúcia. A ministra Rosa Weber continua a ser um ponto de interrogação. Comenta-se que, mesmo defendendo a ideia de prisão após esgotados todos os recursos, tende a votar pela manutenção da jurisprudência já firmada pelo STF. Se assim for, o imbróglio chega a um ponto final.

STJ em junho

Mas a defesa de Lula vai insistir no STJ e até no STF. Recursos devem ser interpostos contra decisão do ministro Fachin. Faz parte da estratégia petista adiar ad aeternum a decisão final dos Tribunais Superiores. Se o STF der uma resposta imediata ao caso das ADCs, a situação estará finalizada. Há quem veja o problema sendo levado até mais adiante.

Lula candidato?

Difícil será sustentar a candidatura de Lula com ele na prisão. Mas o PT confia em seus recursos protelatórios. É provável que o TSE o enquadre na Lei da Ficha Limpa. 17 de setembro será a data final para torná-lo inelegível. Espera-se que o Tribunal dê uma decisão antes, eis que a eleição se daria apenas 18 dias depois. Ademais, duvida-se que o PT corra o risco de deixar o nome de Lula na urna para sofrer impugnação depois. Interrogações e dúvidas no ar.

PT e seu entorno

As pressões também emergem do paredão partidário. Governadores petistas e outros que aderiram ao PT, como Renan Filho, do MDB de Alagoas, correm à Curitiba para participar da vigília que a militância faz nas imediações da PF. Maneira demagógica de dizer que estão ao lado de Lula. Na campanha, usarão as fotografias para iludir a boa-fé dos eleitores. O anfitrião da caravana governista em Curitiba é o senador medebista Roberto Requião.

O povo sabe das coisas

7 de abril, sábado, por volta de 21h, em Monte Verde, Minas Gerais, agradável estância climática a 1.560 metros de altitude. 14º C. Ao levar o carro a um estacionamento próximo ao restaurante, este consultor, recebido pelo manobrista, depara-se com abrupta pergunta: "professor, e agora que Lula foi preso, quem tem condições de levar a melhor no pleito de outubro"? Após pequeno susto e tomando ciência do acompanhamento que o manobrista faz do Jornal da Cultura (TV Cultura, 21h15 às 22h15), passei a discorrer sobre o cenário político-jurídico. Saí impressionado desta primeira cruzada de pontos de vista.

E as ADCs?

Ao voltar para pegar o carro, o manobrista se fazia acompanhar de outro rapaz, que exigiu mais uma rodada de conversa, desta feita para saber minha visão sobre os ministros do STF, particularmente sobre os ministros Gilmar Mendes, Rosa Weber e Marco Aurélio. Mais uma pergunta reveladora do nível de entendimento do clima vivido pelo país: "o senhor acha que as ADCs poderão ser votadas na próxima quarta-feira como promete o ministro Marco Aurélio"? Espantei-me com o domínio temático. E, mais ainda, com o vocabulário técnico empregado.

O povo acompanha

As ADCs entraram em nossa conversa, introduzidas por eles de maneira natural. Lá fui eu tentar fazer inferências sobre a insistência do ministro Marco Aurélio, sobre a possibilidade de ele apresentar a questão "em mesa" ou um requerimento à mineira presidente Cármen Lúcia. Quase uma hora de papo com duas extraordinárias figuras do povo. De igual para igual. A certa altura, não tive como deixar de cumprimentá-los pela boa conversa. Responderam: "nós não sabemos os nomes dos 11 jogadores da seleção brasileira, mas os 11 ministros do Supremo sabemos quem são". Podem crer. O Brasil está mudando.

PEC da prisão

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, pré-candidato do DEM à presidência da República, promete colocar em votação uma PEC sobre a prisão após condenação em 2ª instância. Claro, só depois da intervenção na segurança pública no Rio de Janeiro. A legislação não permite votação de PEC enquanto houver intervenção Federal em algum Estado da Federação, ou seja, como a intervenção no RJ pode acabar ao final do ano, é possível que os parlamentares a votem em final de novembro ou em início de dezembro. Com forte possibilidade de mudar a jurisprudência, deixando a prisão para após sentença transitada em julgado.

O parlamento em 2019

O corpo parlamentar de 2019, a ser eleito em outubro, deverá internalizar muitas lições tiradas da cartilha política da era Lava Jato. Podemos dizer que teremos parlamentares mais maduros, mais compromissados com as demandas de suas bases e, ainda, seriamente inclinados a dar passos avançados na fronteira das reformas. Não dá mais para protelar decisões fundamentais como reforma da previdência, reforma fiscal e a própria reforma política, esta de maneira profunda. Se isso não ocorrer, o castigo de Sísifo tomará conta do país (tentar depositar a pedra no topo da montanha; tarefa que desempenhará todos os dias por toda a eternidade).

Ambição desmesurada

No meu livro Marketing Político e Governamental, cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará, constantemente os que a apóiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder".

Torquato Gaudêncio, Professor na Escola de Comunicações da Universidade de S. Paulo, é consultor de marketing político e comentarista do Jornal da Cultura.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

Se Entrega Corisco!



Final do filme "Deus e o diabo na terra do sol", de Glauber Rocha.

Letra e música de Sérgio Ricardo

"Se entrega Corisco!Eu não me entrego não
Eu não sou passarinho Pra viver lá na prisão

Se entrega Corisco eu não me entrego não
Não me entrego ao tenente
Não me entrego ao capitão
Eu me entrego só na morte de parabelo na mão

Se entrega Corisco (se entrega Corisco)
Eu não me entrego não! Eu não me entrego não
Eu não me entrego não
Farrea, farrea povo
Farrea até o sol raiar
Mataram Corisco
Balearam Dadá (bis…)
O sertão vai virá mar
E o mar virá sertão (bis)

Tá contada a minha estória
Verdade e imaginação
Espero que o sinhô
Tenha tirado uma lição
Que assim mal dividido
Esse mundo anda errado
Que a terra é do homem
Num é de Deus nem do Diabo (bis)

quinta-feira, 5 de abril de 2018

Uma dívida que cresce

A Presidente nacional do PT, Senadora Gleise Hoffman, está com os bens bloqueados até o valor correspondente ao pagamento de uma condenação judicial por ter publicado em seu blog à época (2008) que o então Secretário de Saúde do Estado do Paraná, Michel Caputo Neto, era "o maior operador de sacanagem do PSDB do Paraná".

A condenação inicial foi de 5 (cinco) mil reais por danos morais e ato difamatório na internet. Ela foi recorrendo e perdendo, recorrendo e perdendo, até que, após 10 anos, o STJ resolveu por um fim na querela, negando-lhe o Recurso Especial intentado.

Com juros e correção monetária, a dívida da Senadora Gleise somava 162 mil, 199 reais e 53 centavos, segundo os últimos cálculos feitos em março de 2017. Como já se operou o trânsito em julgado, ou seja, não cabe mais interpor qualquer tipo de recurso, o Juiz titular da 8ª Vara Civil de Curitiba ordenou que

- "Após a conferência do recolhimento das taxas, sem dar ciência à parte contrária, providencie a serventia, via BacenJud, a indisponibilidade dos ativos financeiros existentes em nome da executada até o valor indicado na execução".

Moro dá prazo para Lula se entregar e ser preso

Luis Inácio Lula da Silva, Presidente da República por 8 anos consecutivos, se apresentará amanhã, sexta feira, dia 06 de abril, ate às 17 horas, à Policia Federal para ser preso e então começar a cumprir a pena de 12 anos e 9 meses a que foi condenado por corrupção, no bojo da Operação Lava Jato.

Com a decisão do STF ontem negando-lhe ordem de habeas corpus para continuar em liberdade até o fim de todos os recursos contra a sentença do Juiz Sérgio Moro, confirmada em segundo grau pelo TRF-4, o ex-Presidente passa à condição de presidiário, nos termos da Lei de Execução Penal.

A defesa de Lula ainda espera que o STF possa alterar o entendimento vencedor de ontem, quando foram vencidos os Ministros defensores do principio da presunção da inocência, segundo o qual ninguém pode ser preso enquanto não forem opostos todos os recursos até que se opere o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Pelo score de apenas um voto, o da Presidente do STF, Ministra Carmen Lúcia, a tese apresentada pela defesa do ex-Presidente e acolhida por 4 dos 11 Ministros, será novamente discutida quando forem a julgamento duas Ações Diretas de Constitucionalidade, as de números 43 e 44, sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio.

Caso a Ministra Cármen Lúcia não coloque em pauta os dois processos até o fim do seu mandato, já se tem como certo no STF que o próximo Presidente, no caso o Ministro Dias Toffolli, o fará. Ele foi o autor de um dos 4 votos vencidos ontem.

Não há lei no Brasil assegurando regalias na prisão para quem foi Presidente da República, Governador de Estado ou do Distrito Federal, Prefeito Municipal, nem para Senador, Deputado ou Vereador. Nem para Juiz, Desembargador, Ministro, Procurador ou Advogado.

quarta-feira, 21 de março de 2018

Esqueçam o Lula


Por Edson Vidigal
Entre o Estado em dívidas e a Nação dividida, de um lado o ativismo da intolerância barulhenta e do outro o silêncio quase omissivo de uma maioria que só olha de lado, até parece que os eflúvios da próxima semana, a semana santa, sonegarão desta vez a corações e mentes os sentimentos da misericórdia que na reflexão destes dias nos elevam perante Deus e a nós mesmos como cristãos.
O Supremo Tribunal Federal não pautou para a sessão plenária de hoje algo como que, revolvendo o dilema bíblico que a turbinha de Caifás atirou no colo de Pilatos, tenha que optar entre conceder a ordem de habeas corpus unicamente a Cristo ou a Barrabás.
No presente caso, como uns gostam de escrever em seus relatórios e votos, trata-se de um réu já condenado em segunda instância, o qual será imediatamente recolhido à prisão tão logo sejam rejeitados, ou seja, na próxima segunda feira, os embargos de declaração opostos por sua defesa perante o Tribunal Regional Federal-4, sediado em Porto Alegre, RS.
Como lembrou Celso Láfer em artigo no Estadão do último domingo (Incerteza Jurídica, pág. A-2), a propósito de o  Supremo Tribunal Federal (STF) ser o guarda da Constituição, a Corte, no entanto, no exercício dessa função, “não vem construindo a autoridade de uma instituição colegiada”.
“Essa auctoritas, no meu entender – esclarece o Professor Láfer – tem um feitio de poder moderador. Resulta de uma contínua e coerente ação conjunta, voltada para supervisionar a manutenção da independência e harmonia dos outros Poderes da República, impedindo seus abusos e mantendo o seu equilíbrio, concorrendo dessa maneira para o bem estar nacional”.
Nem tanto quanto na Argentina, onde a Corte Suprema resvalou para dividir-se em vários Supremos no qual cada Ministro atua como se concentrasse em si todo poder constitucional atribuído à instituição, o nosso Supremo Tribunal Federal, certamente pela carência de uma maior coesão interna, tem se arranhado muito nas divergências que seriam naturais e até enriquecedoras como as que, no começo das coisas, travaram Pedro Lessa, um luminar paulista extremamente vaidoso, e Enéas Galvão, um gaúcho de admirável cultura jurídica que transpirava humanismo.
Os duelos que esses verdadeiros titãs do oficio de julgar – Pedro Lessa e Enéas Galvão – travavam, incansáveis quando a Corte era convocada a decidir sobre o direito à liberdade, moldaram o habeas corpus como instituto garantidor da cidadania contra ilegalidades ou abusos de poder.
O que está posto em questão é a interpretação que se deve dar corretamente a um mandamento da Constituição da República, inscrito no Art. 5º, Inciso LVII, - “ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Então o Estado Democrático de Direito por seus Juízes sentencia e muito antes do transito em julgado da condenação prende o acusado a título de cumprimento provisório da pena e isso é possível se não há ainda a culpa formada?
Quer dizer que no nosso Estado Democrático de Direito é licito prender quem não é ainda culpado?
O que o Supremo Tribunal Federal vai decidir logo mais, se não houver pedido de vista, é se o que está prescrito na Constituição da República (Art.5º, Inciso LVII) vale como de fato e de direito se conclui lendo ou se a maioria formada por apenas um voto a mais, ao entender diferente, é quem está certa.
Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal.

quarta-feira, 14 de março de 2018

Morre Stephan Warking

Stephen Hawking estava preso a um corpo paralisado por uma doença neuromotora, mas isso não o impedia de nos ajudar a compreender a vastidão do Universo. 

O famoso físico britânico morreu aos 76 anos nesta quarta-feira, deixando ao mundo memoráveis reflexões sobre diferentes questões - da existência de Deus à origem do mundo.
Dependente de uma cadeira de rodas e impedido de falar, ele transmitia grande parte das suas ideias por meio de um sistema de computador que captava o movimento de seus olhos.
Das explicações para a existência do Universo aos aspectos negativos da fama, conheça algumas das mais famosas frases do cientista, que se dedicou a aproximar a Ciência do grande público.
Sobre buracos negros: "Einstein estava errado quando disse que 'Deus não joga dados'. A existência dos buracos negros sugere não apenas que Deus brinca de dados, mas também nos confunde ao jogá-los onde não podem ser vistos"- no livro A Natureza do Espaço e do Tempo, publicado em 1996.
Sobre as razões para a existência do Universo: "Se encontrarmos uma resposta para isso, será o maior triunfo da razão humana, porque conheceríamos a mente de Deus"- no livro Uma Breve História do Tempo, publicado em 1988.
Sobre Deus: "Não é necessário invocar Deus para iniciar uma reação e fazer o Universo funcionar"- no livro O Grande Projeto, publicado em 2010.
Sobre sucesso comercial: "Eu quero que meus livros sejam vendidos em lojas de aeroporto"- em entrevista ao jornal americano The New York Times, em dezembro de 2004.


Stephen HawkingDireito de imagemGETTY IMAGES

Sobre a fama: "O aspecto negativo da minha fama é que eu não posso ir a qualquer lugar do mundo sem ser reconhecido. Não adianta eu usar óculos escuros e peruca. A cadeira de rodas me entrega"- em entrevista a um programa de TV israelense em dezembro de 2006.
Sobre a imperfeição do mundo: "Sem imperfeição, você e eu não existiríamos"- no documentário O Universo de Stephen Hawking, transmitido pelo Discovery Channel em 2010.
Sobre eutanásia: "A vítima deve ter o direito de acabar com a própria vida, se ela quiser. Mas eu acho que seria um grande erro. Por pior que a vida pareça, sempre existe algo que você possa fazer e ser bem-sucedido. Enquanto há vida, há esperança"- fala citada no site de notícias People Daily Online, em junho de 2006.
Sobre a possibilidade de contato entre seres humanos e extraterrestres:"Acho que seria um desastre. Os alienígenas provavelmente estão bem mais avançados que nós. A história do encontro entre civilizações mais avançadas com povos primitivos neste planeta não é muito feliz, e eles eram da mesma espécie. Acho que devemos manter a cabeça baixa"- no programa In Naked Science: Alien Contact, do canal National Geographic, em 2004.
Sobre ser diagnosticado com uma doença neuromotora: "Minhas expectativas foram reduzidas a zero quando eu tinha 21 anos. Tudo desde então tem sido um bônus"- em entrevista ao The New York Times, em dezembro de 2004.
Sobre a morte: "Eu tenho vivido com a perspectiva de morrer cedo nos últimos 49 anos. Não tenho medo da morte, mas não tenho pressa para morrer. Eu quero fazer muita coisa antes disso"- em entrevista ao jornal britânico The Guardian, em maio de 2011.

(Texto e foto da BBC Brasil).

A ilha alagada por dentro e ao derredor

segunda-feira, 12 de março de 2018

Lava Jato e Judiciário, Datena entrevista a Ministra Eliana Calmon, ex-Corregedora do CNJ

Eliana Calmon explica blindagens na lava jato

Repercutiu muito a fala da ministra aposentada do STJ e ex-corregedora do CNJ, Eliana Calmon, sobre a impossibilidade de a operação Lava Jato atingir o Judiciário. 

A ex-ministra falou à TV Migalhas, na XVI Conferência da Advocacia Mineira, em Juiz de Fora, que muitas vezes são os advogados dos colaboradores que impedem que os delatores falem de integrantes do Judiciário.

quinta-feira, 8 de março de 2018

Sinuca de bico



Por Edson Vidigal

Precedentes jurisprudenciais são encontráveis em porções apreciáveis conforme o foco que se queira dar à questão do momento.
Não penso que isso seja bom porque, no mínimo, não ajuda a segurança jurídica, essencial à estabilidade democrática.
Precedentes jurisprudenciais não devem ser evocados como se apanhados num cisqueiro e atirados às agendas das discussões só para tumultuar os encadeamentos.
Direito, afinal, para realizar a Justiça não prescinde de generosas doses de lógica aliada a inquestionável bom senso.
Precedentes, meros precedentes, não se confundem com sumulas vinculantes, eis que estas sim é que produzem, por obvio, efeitos obrigatórios. Nesse ponto, o Ministro Pertence, tem toda razão.
No campo do habeas corpus, por exemplo, nossas principais Cortes, tanto a Suprema quanto a Superior, estão a exarar nos últimos tempos, e mais ainda nestes estranhos tempos, os mais conflitantes entendimentos.
Não são poucas as vezes em que nos assustam com decisões conflitantes em situações semelhantes, umas indeferindo, outras concedendo, muitas nem conhecendo.
O medo do apocalipse se transmuda em alívio ao constatarmos que o remédio heroico do habeas corpus não sucumbirá contaminado pelas intolerâncias e ineficácias de precedentes que afoitamento vão se desintegrando do ordenamento jurídico podendo adoecer por anemia e fraqueza a Constituição, quiçá a República!
Tudo bem, nada mal. Como diria Winston Churchill, “não há mal nenhum em mudar de opinião. Contanto que seja para melhor”. Felizmente, há uma maioria pensando assim no STF e no STJ. Teimando como Churchill.
O ânimo da mudança para melhor não vem só do grande estadista e Nobel de Literatura inglês.
Da França já aconselhava o grande Vitor Hugo – “mude suas opiniões, mantenha seus princípios. Troque suas folhas, mantenha suas raízes.
Também Marco Aurélio, o exemplar Imperador e filosofo romano – “mudar de opinião e seguir quem te corrige é também o comportamento do homem livre.
E encerrando o desfile, um dos principais da literatura e do jornalismo português, Alexandre Herculano – “Eu não me envergonho de corrigir os meus erros e de mudar de opinião, porque não me envergonho de raciocinar e aprender”.
O Direito é uma ciência andante pari passo com a Realidade Social. Nem sempre a norma saída da fornalha do legislador toca na Realidade Social.
Daí a necessidade de um ser, encontrável in natura unicamente entre os racionais na natureza humana, passível, por conseguinte, de muitos erros e grandes acertos, na função quase divina de realizar a Justiça, declarando a cada um o que é seu segundo uma igualdade.
Numa sociedade democrática, a busca para a realização da Justiça focando a lanterna de lentes fortes do Direito sobre o fato típico da complexa Realidade Social não é tarefa que se entregue aos que, por mais hermeneutas que se mostrem, carecem de coragem, a coragem para conceder ou negar, e em especial, a coragem para mudar. Para melhor, é claro.
Não são poucos os entendimentos do passado, que pareceram pétreos, que o próprio STF recolheu depois à memória dos arquivos, não se deixando seguir pela bussola dos precedentes enferrujados.
A Constituição da República já não é mais adolescente. Vai para 30 anos, como diria Sartre, a idade da razão.
O princípio segundo o qual é assegurado a todo acusado o direito de ser presumido inocente, estado de inocência esse que só se extingue com o trânsito em julgado da decisão condenatória, é uma garantia mesmo ou jujuba para tingir de esperanças petições de defensores públicos e de advogados?
Sei, não. Mas o que se diz por aí sobre o “habeas corpus” negado pelo STJ ao ex-Presidente Lula acabou empurrando para uma sinuca de bico a maioria ínfima da Corte Suprema em cujos precedentes o STJ se escorou com brilho, respeitável brilho, dos 5 Ministros da 5ª. Turma.
Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal. E Professor de Direito na Universidade de Brasília.
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quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Depois de 3 mandatos de Senador, Sarney se despede do Amapá


Mensagem ao povo do Amapá
José Sarney


Dirijo-me às minhas amigas e aos meus amigos do nosso querido Estado do Amapá, bem como a todo seu povo para lembrar que encerrei a minha vida política com a decisão tomada, desde a eleição passada, de não concorrer a mais nenhum cargo eletivo, em razão da minha idade e das dificuldades que tenho hoje para atender, plenamente, às obrigações para com o Estado do Amapá.
Como todos sabem, tenho residência em Brasília, no Maranhão e no Amapá. Pela lei, não tenho mais obrigatoriedade de votar. Assim, achei ser do meu dever transferir o meu título eleitoral para onde reside a minha família, que não é formada apenas por mim e minha mulher, mas também por filhos, netos, bisnetos, além de onze irmãos, dos quatorze que possuía.
Diante do fato de vivermos um ano eleitoral, de ter tido insistente apelo a uma possível candidatura minha e de aparecer em grande preferência nas pesquisas eleitorais no Amapá, não quero frustrar nem uns nem outros mantendo falsas expectativas, o que seria certa falta de consideração para com os que sempre estiveram comigo e me apoiaram, que têm o direito de novas oportunidades.
Assim, sem abandonar os meus vínculos e os meus deveres para com esse querido Estado, que me acolheu e me deu três mandatos de Senador, resolvi transferir o meu domicílio eleitoral para a cidade de São Luís, de onde saí.
Eu não digo “Adeus”, digo “Até logo”, pois meus vínculos com essa terra jamais se dissolverão, uma vez que a ela estou ligado por todos os laços, e não por domicílio eleitoral.
Tenho a consciência de que o Amapá hoje tem um grande futuro e está preparado para ser um importante Estado, sobretudo com as portas abertas para a juventude, que, quando aí cheguei, não tinha horizontes.
Assim é que deixo, como parte do meu trabalho, toda a infraestrutura do Estado do Amapá apta para seguir seu grande caminho.
A Zona de Livre Comércio, que ajudei a construir, deu uma nova perspectiva ao Estado e é hoje sua maior fonte de empregos e de desenvolvimento, tendo definido a sua História em dois momentos: antes e depois de existir.
Encontrei o Amapá com motores a óleo diesel e racionamento de energia elétrica durante todo o dia. Hoje o Estado é um exportador de energia, com as Usinas do Caldeirão, de Ferreira Gomes e de Santo Antônio. Além de uma coisa que nem eu mesmo acreditava que pudesse conseguir: influir para que o Linhão do Tucuruícolocasse o Amapá no Sistema Elétrico Nacional.
Deixo também a Zona Franca Verde, cujos primeiros projetos já estão sendo aprovados, que será, sem dúvida nenhuma, a complementação para a economia industrial do Amapá.
Consegui, por outro lado, salvar o Projeto Jari, uma das alavancas da economia de mercado de trabalho para o sul do Estado; que fizessem o Hospital Sarah Kubitschek, que tão grandes serviços tem prestado aos que mais precisam de ajuda, sobretudo às crianças – somente suas mães sabem o que isso significa para elas; em um Estado que não tinha terras, que fossem passadas terras da União para o Amapá; fundei a Universidade do Amapá, que sempre ajudei, e levei para o Estado as escolas profissionais de Porto Grande, de Macapá, de Santana, do Laranjal do Jari e do Oiapoque, com sua grande estrutura de ensino moderno, que se formaram com a criação de recursos humanos.
Foi importante a ajuda que dei ao prosseguimento dos estudos — que comecei ainda como Presidente da República, na época do Governo Nova da Costa — para a construção da ponte sobre o rio Araguari, a ponte sobre o rio Oiapoque e os recursos para a ponte sobre o rio Jari, que por três vezes foram mandados por mim e constitui uma grande frustração que ainda não tenha sido concluída.
Toda a minha atuação foi em obras estruturantes, que duram para sempre. É como dizia Rui Barbosa: “Plantar carvalho, que dura séculos, e não couve, que morre em 48 horas.”
Em todos os momentos, impedi que se cometessem injustiças ao funcionalismo, civil e militar, que defendi com todas as forças. Nunca deixei de defender as causas dos servidores, que passaram a receber o décimo terceiro salário porque o criei quando exerci a Presidência da República.
Não quero fazer um relatório do que deixo, porque não deixarei nunca de trabalhar pelo Estado do Amapá, pelo qual lutarei até a morte.
Devo ressaltar que, do meu lado intelectual, também criei duas obras definitivas para o Estado: a primeira é a história do Amapá — “Amapá, a terra onde o Brasil começa” —, que escrevi e que hoje é a única obra à disposição de estudantes e intelectuais. E a segunda: no meu romance “Saraminda”, a ação se passa numa área do Amapá — esse livro hoje é referência na literatura brasileira e na mundial, para a qual foi traduzido em 12 línguas.
Trabalho ainda e, se Deus me permitir com alguns anos mais pela frente, entregarei um Guia Sentimental do Amapá, para o qual venho colhendo notas e trabalhando há tempos.
A todos que me apoiaram, que me deram três vitórias, a minha mais comovida gratidão.
Agora que estou desobrigado de votar, quero, simbolicamente, eleger o Estado do Amapá como grande destinatário do meu trabalho

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

O direito de Importunar

No caso aqui não há o risco de liminar. Catherine Deneuve mora na França, agora sob novos oxigênios de liberdades e esperanças reinventadas.
Na contramão do que vem rolando nos Estados Unidos contra pessoas do mundo das artes cênicas, acusadas de assédio sexual, celebridades francesas, dentre elas Deneuve, divulgaram um manifesto em defesa dos direitos à paquera reciproca.
O tema, aliás, já havia sido abordado num filme de 1994 em que Demi Moore, na época emparelhando com Vera Fischer, instigavam em Zeca Baleiro inspirações apaixonadas.
Na trama, Tom, personagem de Michael Douglas, é preterido por Meredith, personagem de Moore, que frustrada em suas investidas passa a persegui-lo, ameaçando destruí-lo no emprego.
As francesas, em mais de uma centena, incluindo escritoras, atrizes e acadêmicas, sustentam que nós, os homens, temos de ser “livres para abordar” mulheres.
O movimento que tem ocupado os noticiários sobre os assédios, principalmente em Hollywood, a meca do cinema, são definidos pelas francesas como “caça às bruxas”, uma ameaça à liberdade sexual.
“Seduzir alguém, ainda que de forma insistente – afirmam – não é crime. Crime é o estupro”. Elas vêm à frente um novo inimigo – os extremistas religiosos e reacionários, “inimigos da liberdade sexual.
Deneuve, hoje com 74 anos, celebrizada por sua personagem em “A Bela da Tarde”, (“La Belle d´Jour”), de Luis Buñuel (1967), se opõe aos métodos das militantes do movimento “#MeToo” (eu também) de oposição à onda de assédios. “É excessivo”.
- “Nós defendemos a liberdade de importunar, indispensável à liberdade sexual”, é o título do manifesto no qual lamenta-se a onda de repreensões públicas que vieram à tona após os escândalos envolvendo produtores, atores e diretores nos Estados Unidos.
O manifesto foi divulgado menos de 72 horas depois da festa de premiação do Globo de Ouro onde atrizes famosas e outras celebridades compareceram vestidas de preto, o que levou a nossa Danuza Leão a dizer que o clima lembrava um velório.
Elas, as francesas, ressalvam que consideram legitimo e necessário protestar contra o abuso de poder por parte de alguns homens, mas consideram que as constantes denúncias saíram do controle.
“Os homens têm sido punidos sumariamente, forçados a sair de seus empregos, quando tudo que fizeram foi tocar o joelho de alguém ou tentar roubar um beijo” (...) “Cavalheirismo não é uma agressão machista”.
As autoras e signatárias do manifesto francês denunciam o que entendem como um novo puritanismo no mundo. “Essa febre de enviar porcos ao matadouro, longe de ajudar as mulheres a serem mais autônomas, serve realmente aos interesses dos inimigos da liberdade sexual, dos extremistas religiosos, dos piores reacionários”.
Segundo elas, a onda de acusações induz à percepção de que as mulheres são impotentes e eternas vítimas. “Como mulheres, não nos reconhecemos neste feminismo que, além de denunciar o abuso de poder, incentiva um ódio aos homens e à sexualidade”.
Não tive acesso à integra do manifesto das mulheres francesas. O que transcrevo aqui decorre de leituras e anotações tiradas de fontes como a BBC Brasil, a mais importante e de maior credibilidade. Na minha opinião.
Penso que em tudo não devemos perder de vista os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Quem levar em conta esses princípios não defere liminar. E no mérito, nem pensar.
Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal.