quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Porandubas do Torquato


Sinceridade e sagacidade

Zé Cavalcanti, ex-deputado paraibano, conta em seu livro A Política e os Políticos, que um coronel do sertão, ao passar o comando de seus domínios para o filho, aconselhou:

- Meu rapaz, se queres ser bem sucedido na política, cultiva estas duas verdades: a sinceridade e a sagacidade.

- O que é sinceridade, meu pai?

- É manter a palavra empenhada, custe o que custar.

- E o que é sagacidade?

- É nunca empenhar a palavra, custe o que custar.

O relatório de Bonifácio - I

O deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) apresentou ontem o relatório em que recomenda à Câmara barrar a tramitação da denúncia criminal contra o presidente Michel Temer e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral). Bonifácio fez fortes críticas ao Ministério Público, ao dizer que ele "comanda a Polícia Federal, mancomunado com o Judiciário, causando um desequilíbrio entre os Poderes e se tornando um novo poder".

O relatório de Bonifácio - II

O relator afirmou que o Ministério Público exerce uma atuação policialesca com o apoio "do noticiário jornalístico que fortalece essas atuações espetacularizadas pelos meios de comunicação". Para ele, Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal têm tido um poder exacerbado, eivado de abusos, em detrimento do Legislativo e do Executivo. A votação da CCJ deve ficar para a semana que vem, podendo ir a plenário na semana do dia 25. E assim o governo espera mais uma vitória, até mais fácil do que na primeira denúncia.

Homenagem a Mariz

Antônio Claudio Mariz de Oliveira, que brilha na galeria dos advogados criminalistas do país, recebeu bela homenagem da classe, anteontem, em evento de desagravo organizado pela seccional paulista da Ordem e que teve como orador principal o jurista Técio Lins e Silva, representante do IAB - Instituto dos Advogados Brasileiros, a mais antiga entidade da Advocacia. Ali se ouviu um conjunto de perorações sobre a vida de Mariz, com destaque para sua bravura desde os tempos duros do arbítrio, e um painel sobre a importância da Advocacia. Alguns significados merecem destaque.

Tempos nebulosos

Fez-se na sessão de desagravo ampla radiografia desses nossos tormentosos tempos. Tempos de desrespeito aos advogados, a partir da invasão de seus escritórios; tempos de mídia servindo como arauto de uma cultura punitiva, como bem salientou o homenageado Mariz; tempos em que a mídia, de maneira irresponsável e espetaculosa, noticia "fatos que chegam às redações" sem conferir o teor de verdade; tempos em que os advogados são confundidos com a clientela; tempos em que a letra da lei é jogada no lixo, puxando "interpretações" que emergem ao sabor de fluxos e ondas com impacto na mídia; tempos de judicialização da política.

Advocacia nos anos de chumbo

Técio Lins e Silva lembrou os tempos da ditadura, quando a advocacia teve papel fundamental na defesa dos direitos humanos. Mostrou como em nossos estranhos tempos, o arbítrio dá sinais de volta, com o ardor punitivo, na esteira de certo "conluio" entre mídia, juízes e procuradores. A indignação é geral na classe com as invasões de escritórios, o acesso ao sagrado sigilo que resguarda a interlocução do advogado e clientes; as manchetes bombásticas que, a título de informação, acabam mais adiante desmentidas ou corrigidas em parte. O desleixo e a imprudência povoam a divulgação de "fatos".

Mariz e a cultura punitiva

Mariz, com a verve sempre muito bem certeira, mostrou o abandono da apuração de "fatos" pela mídia. A sociedade tem o direito de ser informada. E a imprensa exerce o dever de transmitir as informações que apura, sem acréscimos, elipses ou versões estapafúrdias, de forma a aparelhar o cidadão com a moldura informativa que o ajudará a formar opinião abalizada sobre os acontecimentos. A expressão do grande criminalista foi um chamamento à razão. Os juízes, por sua vez, não podem fazer letras mortas das leis. Ou produzir julgamentos sob a inspiração de manchetes espetaculosas, que servem para irradiar uma "cultura punitiva" no país. Se assim age, a mídia se transforma em arauto dessa cultura, quando deveria apurar fundamentos verdadeiros.

Tempos de ontem e de hoje

A impressão é a de que, nos tempos de ontem, mesmo os mais duros, havia mais respeito pelo exercício da advocacia. Hoje, advogados não são apenas considerados "longa manus" da ilicitude que se espraia no país, como são acusados de ganhos exorbitantes, de servirem apenas aos ricos, esquecendo os acusadores que a advocacia pro bono coloca exércitos de advogados na ajuda às causas de pessoas sem posse. Observação ao pé do ouvido: entre os porta-vozes dos "extraordinários ganhos dos advogados", estão âncoras de TV, cujos salários, pela grandeza, assombram crentes e descrentes.

A responsabilidade da mídia

Este consultor passou três décadas dentro de salas de aula, a partir de 1968, ministrando disciplinas de jornalismo (informativo, interpretativo, opinativo, empresarial, etc.) em algumas escolas de comunicação, entre as quais a ECA-USP e a Cásper Líbero. O eixo da responsabilidade social da imprensa ganhava sempre destaque nos cursos de graduação e pós-graduação. Pois bem, urge constatar que, naquela época, a apuração de fatos se regia por acurado rigor. Hoje, a pressa nas redações - ante a rapidez das redes eletrônicas - acaba amortecendo a apuração completa de informações. A crise da democracia representativa acabou puxando a política para o fundo do poço. E o jornalismo acabou correndo atrás.

Mídia detesta felicidade

Mariz fez um contraponto interessante, ao mostrar que a mídia prefere notícias escandalosas, negativas, bombásticas a fatos positivos. E arrematou, cáustico: a mídia não gosta da felicidade, só de coisas ruins. Observação: o principal telejornal do país virou uma imensa galeria de fatos policiais/policialescos. Sob o signo da condenação ou da morte.

Espetáculo

Na verdade, a informação nesses nossos plúmbeos tempos acaba sendo envelopada com os adereços do Estado-Espetáculo. E os profissionais do espetáculo, da política e, mais recentemente, da mídia compartilham frequentemente as mesmas atitudes e os mesmos vezos. Como diz Roger-Gérard Schwartzenberg: "como se o show business de desdobrasse em um pol'business", e nosso acréscimo, vemos também a mídia'business. Os cidadãos acabam saindo de sua condição de leitores para a condição de espectadores.

Degradação

A política vem se transformando em talk-show. Juízes e políticos se acostumaram a exibir suas performances nas TVs de suas casas de trabalho. Os discursos se atropelam. A democracia se afasta de seus valores centrais. O tom das mensagens busca uma abordagem "euforizante", ou seja, capaz de produzir euforia, catarse, espetáculo. Gérard é duro com os artistas do espetáculo, estejam eles na política, na mídia ou no Judiciário. Diz: "Calígula, o imperador, fez cônsul o seu cavalo. Mas a história recente tem também seus casos de desequilíbrio mental".

Narcisismo

Sobra, ainda, aos protagonistas do Estado moderno a propensão para o desejo de se transformarem em Narcisos. O mito diz que o belo Narciso desdenhou o amor da ninfa Eco. Que morreu de desespero e seus lamentos ainda hoje soam nas florestas. Os deuses puniram Narciso. Condenaram-no a se apaixonar pela própria imagem. Por isso, tomou-se de amores pela imagem, contemplando-a nas águas transparentes de sua fonte. Ficou obcecado pela paixão do reflexo. Definhando até morrer. A mídia não seria, para muitos, o espelho de Narciso? Que parece, parece.

Descrença

O velho Rousseau era um descrente da representação política. Para ele, uma abstração. O filósofo, defensor do ideal da soberania popular, dizia que "toda lei que o povo não tenha ratificado diretamente é nula, não é uma lei". E arrematava: "o povo pensa ser livre, mas está enganado, pois só o é durante a eleição dos membros do Parlamento, assim que são eleitos, ele é escravo".

Como explicar o fundo?

A reforma política produziu uma reversão de expectativas. Ganhou poucos adereços, entre os quais o fim das coligações proporcionais e a cláusula de barreira. As coligações vão durar um pouco mais, até 2020. Mas um estatuto vai gerar muitas críticas: o fundo de campanhas. Como justificar um fundo de quase R$ 2 bilhões para financiar o pleito de 2018? Será difícil explicar ao eleitor. Que vê escândalos por todos os lados. E dinheirama jogada fora com projetos que não lhe farão bem.

História

Nicolas Eymerich, um frade, produziu "O Manual dos Inquisidores em 1376". O Manual mostra os dez truques do inquisidor para neutralizar os truques dos hereges, na verdade um conjunto de manipulações, pressões, ameaças, promessas, benevolências, enfim, um completo arsenal de violência psíquica contra os réus. (A escolha desse roteiro tem o propósito de mostrar como alguns políticos usam artifícios semelhantes em seu discurso cotidiano.).

1. O primeiro consiste em responder de maneira ambígua.

2. O segundo truque consiste em responder acrescentando uma condição.

3. O terceiro truque consiste em inverter a pergunta.

4. O quarto truque consiste em se fingir de surpreso.

5. O quinto truque consiste em mudar as palavras da pergunta.

6. O sexto truque consiste numa clara deturpação das palavras.

7. O sétimo truque consiste numa autojustificação.

8. O oitavo truque consiste em fingir uma súbita debilidade física.

9. O nono truque consiste em simular idiotice ou demência.

10. O décimo truque consiste em se dar ares de santidade.

Nossos mestres

Uma vez, perguntei a Roberto Campos, ministro do Planejamento do presidente Castelo Branco, se sua estratégia não era a de pulverizar as verbas que, na época, em 1965, o governo tinha para aplicar na região Nordeste. O conceito de pulverização era a distribuição das verbas, de maneira franciscana, um pouquinho a cada Estado, uma migalha, o que poderia não gerar os resultados desejados. Contestador, dialético, Bob Fields (como era conhecido), pegou o foca (eu mesmo) de surpresa: "O que o senhor entende por pulverização?". Fiquei calado. Jânio Quadros era perito na arte de se fazer de surpreso. Perguntado por Leon Eliachar se o oval da Esso é mesmo oval ou aval, Jânio se toma de surpresa e arremete: "Sugiro-lhe, amistosamente, uma consulta a qualquer psicanalista. O Brasil é tão mencionado nesse seu questionário quanto a Esso". Foi uma tremenda gozação. E diante da pergunta: "Qual será seu slogan, 50 anos em 5 ou 5 anos em 60?". Jânio não hesita: "50 anos em 5, mais o pagamento dos atrasados". O truque de mudar as palavras das perguntas é muito comum no meio político. Ao político, é perguntado algo assim: "O senhor vai dizer tudo que sabe aos procuradores?". E ele responde: "Quem diz a verdade tem tudo a seu favor. Quem não deve não teme". O truque de deturpar as palavras é usual. Exemplo: "O senhor acredita que o relatório do BNDES não vai condená-lo?". Resposta: "O relatório pode ser uma peça de condenação ou de inocência. Se não comprova nada sobre minha pessoa, sou inocente. Quem me condena não é o Banco. É a imprensa".

Fecho a coluna com tiradas mineiras.

Mineirice

Frases de Augusto Zenun, de Campestre, sul de Minas - político, industrial, filósofo e, antes de tudo, udenista ortodoxo da linha bilaqueana (Bilac Pinto, o Bilacão, seu dileto amigo). Sempre infernou a vida de seus adversários, com as suas atitudes destemidas e sua natural mineirice.

"Quando estamos no governo, todo adversário que quer se encaixar, diz ser técnico".

"O preço do voto de um eleitor mentiroso é sempre o mais caro".

"Há um fato na política que a torna bastante interessante: o choque dos falsos políticos com os políticos falsos".

"Político é dividido em duas partes. Uma trabalha para ser eleito. A outra trabalha para conseguir um cargo público se for derrotado".

"Muita campanha eleitoral se parece com sauna: depois do calorão vem uma ducha fria". (De A Mineirice, de José Flávio Abelha).

Gaudêncio Torquato, Jornalista e Consultor em Marketing Político, é Professor na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Ninguém quer briga

O antigo ditado popular, segundo o qual "só brigam dois quando os dois querem", vem agora a calhar na dissolução à vista do impasse gerado entre o Senado da República e o entendimento de três dos onze Ministros do Supremo Tribunal os quais compondo a Primeira Turma formaram maioria contra os dois outros Magistrados, que rechaçaram a possibilidade de prisão de parlamentar federal no exercício do mandato ou de medida alternativa quando não há flagrante de crime inafiançável.

Ademais, a maioria do colegiado fracionário entendeu, ainda, que além da imposição de recolhimento domiciliar à noite, o parlamentar fosse suspenso do exercício do mandato, outra hipótese não admitida, em nenhum momento, no texto constitucional.

Decisões semelhantes, mas não iguais, já haviam sido tomadas,a primeira no caso do então Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o qual depois de afastado do cargo por maioria de votos do plenário da Casa, teve sua prisão decretada pelo plenário do Supremo Tribunal, a pedido do então Procurador Geral da República, Rodrigo Janot.

Antes, o Senado da República já havia autorizado a prisão do Líder do Governo, Delcídio do Amaral (PT-MS) porque segundo o MPF fora flagrado em obstrução da justiça, segundo gravação de uma conversa dele num quarto de hotel com um filho de um investigado na Operação Lava Jato. Delcídio teve o mandato cassado pelo Senado e agora está em prisão domiciliar depois de ter firmado acordo de colaboração com o Ministério Público.

Outro episódio que levou o Supremo Tribunal Federal ao quase confronto com o Senado da República foi quando um pedido de liminar, também da lavra do então Procurador Geral Janot, foi acolhido e, assim, determinando-se o afastamento do Senador Renan Calheiros (PMDB-AL) do cargo de Presidente do Senado.

Agora, vendo o incomensurável perigo para a estabilidade das instituições republicanas, caso a decisão recente suspendendo o Senador Aécio Neves (PSDB-MG) e, mais, impedindo-o de sair de casa à noite e até de se reunir com os outros políticos, os Presidentes do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE) e do STF, Ministra Carmen Lúcia, ao que tudo indica, já teriam combinado as coisas.

O PSDB, partido de Aécio, ajuizou hoje à tarde dois Mandados de Segurança objetivando derrogar no plenário da Corte a decisão do órgão fracionário, a Primeira Turma. As medidas liminares que podem ou não ser concedidas pela Presidente do Supremo abortariam, de logo, o choque de trens à vista entre os dois Poderes, o que, aliás, quase aconteceu quando o Senado, no caso Renan Calheiros, resolveu não cumprir a ordem liminar pela qual o Presidente da Mesa deveria ser afastado.

domingo, 1 de outubro de 2017

Porandubas do Torquato

O Professor Gaudêncio Torquato começa hoje com uma historinha da politica de Minas Gerais:

Lei da Gravidade? Ah, de âmbito Federal

A Lei da Gravidade, de vez em quando, dá dor de cabeça aos mineiros. E a lei da gravidez, essa, nem se fala. Na Câmara Municipal de Caeté, terra da família Pinheiro, de onde saíram dois governadores, discutia-se o abastecimento de água para a cidade. O engenheiro enviado pelo governador Israel Pinheiro deu as explicações técnicas aos vereadores, buscando justificar a dificuldade da captação: a água lá em baixo e a cidade, lá em cima. Seria necessário um bombeamento que custaria milhões e, sinceramente, achava o problema de difícil solução a curto prazo, conforme desejavam:

- Mas, doutor - pergunta o líder do prefeito - qual é o problema mesmo?

- O problema mesmo - responde o engenheiro - está ligado à Lei da Gravidade.

- Isso não é problema - diz o líder - nós vamos ao doutor Israel e ele, com uma penada só, revoga essa danada de lei que, no mínimo, deve ter sido votada pela oposição, visando perseguir o PSD.

O líder da oposição, em aparte, contesta o líder do prefeito e informa à edilidade, em tom de deboche, que "o governador Israel nada pode fazer, visto ser a Lei da Gravidade de âmbito Federal". E está encerrada a sessão.

(A historinha é de José Flávio Abelha, em seu livro A Mineirice).

Primavera meio nebulosa

A primavera é a mais bela estação do ano. Há uma explosão de cores nos parques, jardins e alamedas. Mas há algo fora de tom: a impressão é de que, por enquanto, esta explosão ainda não chegou. O amarelo e o roxo dos ipês não estão tão intensos como em anos passados. Será que o clima vivido pelo país é motivo para essa primavera meio nebulosa? O fato é que essa 2ª denúncia contra o presidente Michel Temer e dois ministros deixa o ambiente político mais tenso. A perspectiva é a de que, mais uma vez, a Câmara vetará o pedido de investigação contra Temer. Dessa feita, até com uma votação mais expressiva que a primeira. Mas o país perde o passo e confunde o compasso.

Passo e compasso

Explico. Há uma agenda de reformas posta sobre a mesa política. A economia começa a respirar. O oxigênio chega aos poucos nos poros da indústria, do comércio e dos serviços. O varejo dá sinais de vitalidade. O consumo toma fôlego. O agronegócio está bombando. A confiança de investidores cresce. A inflação desce. Os juros, idem. O PIB volta a ter aumento nas projeções de institutos. Mas o passo do país fica mais devagar. A denúncia de Janot é uma espécie de trava no compasso entre avanço e estática, andar e parar. Esse final de setembro transmite tal sensação. Nuvens ainda plúmbeas teimam em obscurecer o azul do horizonte.

Ensaios presidenciais

Enquanto a pauta fica travada para exame da 2ª denúncia contra o presidente, pré-candidatos ensaiam movimentos eleitoreiros. Geraldo Alckmin, o governador paulista, decidiu se movimentar após ver os passos acelerados de seu pupilo João Doria. Alckmin tem na testa o carimbo do poder paulista. Carece de feição mais nacional. Doria está aqui, ali e acolá. É o mais onipresente dos protagonistas. O excesso de andanças pode lhe dar visibilidade, mas causará canseira. Esgotamento. Marina é quase uma reclusa. Bolsonaro conta com militância aguerrida e simpatizantes nas redes.

A maior interrogação

A maior interrogação diz respeito a Lula. Será candidato? Na visão deste consultor, pela régua de 0 a 100, a possibilidade de emplacar uma candidatura é apenas de 20. Ganhou a sétima denúncia e já tem uma condenação em primeira instância. Vai ser muito difícil passar incólume pela segunda instância. O TRF da 4ª região se mostra muito duro. Vejam o que fez com José Dirceu: aumentou a pena de prisão para 30 anos. Sobram Fernando Haddad e Jaques Wagner. O ex-prefeito parece não ter apetite. E o ex-governador da Bahia possui uma identidade inferior ao tamanho de uma candidatura presidencial.

O palrador

O PDT irá de Ciro Gomes. Atrairia a esquerda se Lula não for candidato? Não. Poderia, isso sim, ter votação ampliada no Nordeste. Ciro é um canhão ambulante. Atira sem medir as consequências. Com seu arsenal linguístico, criará desconfiança junto ao eleitorado. Urge reconhecer, porém, que se trata de um perfil preparado. Em debates, consegue boa performance.

Podemos ou não podemos?

Álvaro Dias ensaia ser candidato pelo PODEMOS, esse partido com um nome bronzeado de marketing. Quem imaginou o nome, deve ter pensado no recado: "hei, leitor amigo, com você junto podemos alcançar a vitória". Ora, de tão óbvia, a asserção cairá no descrédito. Por isso, senador Álvaro, é bem provável que seu PODEMOS não vá muito longe. Conforme-se com a rejeição dos milhões que poderão não seguir seus passos.

As grandes mudanças

Hora de lembrar um preceito da ciência política: as grandes mudanças da História são produzidas quando os favorecidos e apaniguados do poder não têm a capacidade para transformá-lo em força, enquanto os que dispõem de pequeno poderio aproveitam essa capacidade ao máximo para convertê-la em força crescente.

Mulheres

As mulheres deverão fazer uma baciada de representantes maior que a de 2014. Estão muito organizadas. E os escândalos têm preservado a condição feminina. A contaminação do vírus da velha política abarca mais o gênero masculino.

Juízes e procuradores

Os juízes e procuradores estão na crista da onda, puxados pela carruagem de Curitiba. Daí a inferência: terão boa oportunidade caso alguns representantes do Judiciário e do Ministério Público decidam ser candidatos em 2018. Serão vistos como alavanca moral no panorama geral da política. Seria interessante ver alguns procuradores vivendo a real politik. Enfrentariam a dura realidade imposta por nossa cultura política.

Rocinha

O Rio de Janeiro vive a síndrome de Sísifo, aquele condenado pelos deuses a levar uma pedra sobre os ombros para depositá-la no cume da montanha. Quando está prestes a conseguir o feito, eis que a pedra cai e rola ao sopé da montanha. Sísifo volta para tentar novamente. Tentativa que durará por toda a eternidade. Quando imaginamos que o Rio está pacificado, o tiroteio volta intenso com facções criminosas se digladiando e matando inocentes com balas perdidas. O Rio de Janeiro continua lindo... e cada vez mais perigoso.

Manipulação

Em 1922, Walter Lippmann, o famoso jornalista norte-americano, fazia o alerta: "Fabricar consentimento, pela velha arte da manipulação da opinião pública, não morreu com a democracia, como se supunha".

26 recibos

A defesa de Lula apresentou 26 recibos de aluguel da cobertura vizinha ao apartamento dele. Dentre esses, dois com datas inexistentes. Assinados por Glaucos da Costamarques, proprietário do imóvel e primo do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. Glaucos diz que só recebeu a partir de novembro de 2015. Afinal, a assinatura é dele ou não? E se ele confirmar que assinou, mas não recebeu? Onde está a verdade?

Rebelião das costureiras

O Rio Grande do Norte acaba de presenciar um feito histórico: trabalhadores fazendo uma grande mobilização em defesa de uma empresa, a Guararapes, e mostrando-se revoltados contra o Ministério Público do Trabalho, que está multando a empresa em R$ 38 milhões. A razão? O MPT está vetando as facções de costura (microempresas da área têxtil) que produzem peças adquiridas pela Guararapes.

Pró-Sertão

Trata-se de um projeto chamado Pró-Sertão que dá guarida a cinco mil trabalhadores. O MPT criminaliza a Guararapes, exigindo que essa mão de obra seja incorporada ao quadro efetivo da empresa. Ou seja, o MPT despreza a Lei da Terceirização e joga a Reforma Trabalhista no lixo. Os trabalhadores esperam que a Justiça do Trabalho preserve seus empregos. As facções também chegam a vender seus produtos para outras empresas. Mas o MPT diz que há subordinação das costureiras à Guararapes, daí a exigência para sua incorporação ao quadro de funcionários do grupo. Até quando vamos conviver com essa visão retrógrada?

O Brasil de Campos

Roberto Campos, exímio na arte de atirar contra a improvisação, narra: "O Brasil tem a propriedade de, no começo, anedoticamente divertir, depois exasperar e, por fim, desesperançar aqueles que confiam na racionalidade, na procura de causas e efeitos e na sequência do discurso como sujeito-verbo-predicado".

Cabral, fim de linha

Sérgio Cabral Filho parecia predestinado a chegar ao ápice da política. Tinha o talhe adequado para o alto cargo de presidente da República. Governador do charmoso Estado do Rio de Janeiro, jovial, bom trânsito na esfera política, filho de um grande brasileiro, também de nome Sérgio Cabral, renomado nome das artes e da música popular brasileira, Cabral Filho era um perfil dos mais elevados do PMDB. Preso e condenado a 45 anos de prisão - a pena mais pesada da Lava Jato - acaba de ter seus imóveis postos a leilão, somando um total de R$ 44 milhões. Na política, tudo é possível. Até a ressurreição de mortos. No caso de Cabral, a volta à cena seria um verdadeiro milagre.

CPI da JBS

A CPI da JBS está se apresentando como oportunidade para alguns deputados darem resposta a seus acusadores. Não pode ter esse viés sob pena de cair na desmoralização.

Pleito à moda antiga

O pleito de 2018 poderá ocorrer dentro das velhas regras. O que será um desastre. Havia muita expectativa em torno da reforma política. Que poderá se limitar a detalhes, sem grande significação. Os dois instrumentos mais badalados - cláusula de barreira e fim das coligações proporcionais - ameaçam não passar pelo crivo dos deputados. Temos poucos dias pela frente para aprová-los. Mas o interesse parece concentrado no fundão para financiar as campanhas.

Um sonho

Colombo aferrava-se à obsessão de que poderia chegar ao Oriente pelo caminho do Ocidente. O pensamento não lhe dava trégua. Esta foi a diferença entre Colombo e os seus contemporâneos. Estava convencido. Queria partir. Mas seria forçado a esperar muito. Enquanto aguardava, falava do sonho. D. João II, rei de Portugal, interessou-se pelo assunto e submeteu o projeto de Colombo a uma junta de sábios. Estes condenaram a ideia. Quando morreu a esposa, Colombo gastou a maior parte de suas economias com o enterro. E foi para a Espanha.

Esperou, esperou

Fernando e Isabel, empenhados em dispendiosa guerra com os mouros, deram apenas meio ouvido à proposta do genovês. A rainha, entretanto, foi simpática a ele. Concedeu-lhe uma pensão, enquanto a junta de notáveis do Reino estudava o assunto. Depois de dois anos, a pensão foi suspensa. Foi obrigado a se manter sem ajuda durante os oito anos seguintes com a venda de livros e de mapas que confeccionava. Seus cabelos ficaram brancos. Foi atacado pelo artritismo. Mas nunca desesperou. E, um dia, realizou seu sonho.

Fecho a coluna com Tancredo

Conchavo

Premido pelos casuísmos, Tancredo Neves foi obrigado a fundir o seu PP com o MDB de Itamar. Alguns pepistas pularam do barco e protestaram alegando conchavo. Tancredo foi curto e seco: "Conchavo é a identificação de ideias divergentes formando ideias convergentes". Tinha razão. Há curvas que desembocam em retas.

Gaudêncio Torquato, Jornalista e Cientista Político, é Professor Titular na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Atua ainda como Consultor em Marketing Político.


quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Aécio condenado

Para o Senador Aécio Neves (PSDB-MG) a decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal afastando-o do exercício do mandato de representante do seu Estado no grande conselho da União Federal e mandando, ainda, que não saia de casa à noite, foi uma condenação sem processo.

A assessoria do Senador Aécio Neves divulgou há pouco esta nota:

“O senador Aécio Neves entende a decisão proferida por três dos cinco ministros da 1ª Turma do STF como uma condenação sem que processo judicial tenha sido aberto. Portanto, sem que sequer ele tenha sido declarado réu e, o mais grave, sem que tenha tido acesso ao direito elementar de fazer sua defesa.

As gravações consideradas como prova pelos três ministros foram feitas de forma planejada a forjar uma situação criminosa. Os novos fatos vindos à tona comprovam a manipulação feita pelos delatores e confirmam que um apartamento da família colocado à venda foi oferecido a Joesley Batista para que o senador custeasse gastos de defesa.

Usando dessa oportunidade, o delator ofereceu um empréstimo privado ao senador, sem envolver dinheiro público ou qualquer contrapartida, não incorrendo, assim, em propina ou outra ilicitude.

O senador Aécio Neves aguarda serenamente que seus advogados tomem, dentro dos marcos legais, as providências necessárias a buscar reverter as medidas tomadas sem amparo na Constituição. E confia que terá restabelecido o mandato que lhe foi conferido por mais de 7 milhões de mineiros.”

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Escutando Janaína

Sempre tive, tenho e quererei sempre ter o mesmo respeito intelectual de atualmente pela Professora Janaína Paschoal.

A jovem advogada, estudiosa do Direito Penal, que conheci na varanda da nossa casa, em Brasília, não prenunciava nem de longe a mulher que se transmuda em fera quando percebe violações a valores e princípios republicanos.

Atraídas por afinidades profissionais, Eurídice, minha mulher, mais focada em segurança com cidadania e Janaina, em complemento, nas ferramentas legais mínimas necessárias à formação da cidadania, as duas conversando por horas pareciam inundar a casa de esperanças alcançáveis.

Com orgulho ainda hoje vejo em Janaína uma ilimitada paixão pela legalidade democrática. Foi o que a Nação brasileira, por inteiro, constatou nos intermináveis debates que culminaram no impeachment da primeira mulher a ocupar a Presidência e, o que é deplorável, da forma mais desastrada.

Sem a Janaina, apoiada na iniciativa por dois cobras da ciência do Direito – Hélio Bicudo e Miguel Reali Junior, o impedimento da Presidenta não teria acontecido. Dezenas de outras propostas adentraram à Mesa da Câmara, mas sem a motivação e fundamentação jurídicas indispensáveis.

Àquela altura não tínhamos na visão geral em nitidez de bom senso ideia do desastre econômico e social cujos destroços de difícil remoção ainda nos fazem penar.

Ontem à tarde chegou-me por e-mail um texto da Janaina que ela intitulou de “Primeiras notas sobre a resolução 181/17 do CNMP”, ou seja, do Conselho Nacional do Ministério Público. No subtítulo, uma cobrança – “esqueceram que há Constituição Federal e leis no Brasil?”.

A indigitada Resolução do CNMP nº 181/17 objetivaria regulamentar o chamado PIC (Procedimento Investigatório Criminal), a cargo do Ministério Público.

Mas, segundo Janaina, o Conselho transcendeu ao conferir ao Ministério Público “poderes não contemplados nem pela Constituição Federal, nem pela legislação ordinária. E mais, em certas oportunidades torna completamente prescindível o próprio Poder Judiciário!”

“A fim de espancar dúvidas, reitero nunca ter feito oposição à possibilidade de o Ministério Público investigar, sobretudo, sobretudo quando há indicio de corrupção, ou qualquer fato especial a justificar a intervenção”.

“Afinal, prossegue Janaina, em terra com tanto crime, resta temerário concentrar poderes em um único órgão. Ocorre que essa preocupação (de não criar superpoderes) também se aplica ao Ministério Público “.

“Já de plano destaca-se que o artigo 7º confere ao membro do Ministério Público poder irrestrito para inspeções, vistorias e requisições de documentos, inclusive os sigilosos, independentemente da interferência do Poder Judiciário, o que não parece adequado”.

“O artigo 8º, por sua vez, ao tratar da tomada de depoimentos de testemunhas e investigados, traz uma série de inovações que tornará ainda mais morosas as apurações, dado que se fala, inclusive, em deprecar oitivas para as muitas policias. Ora, as investigações pelo Ministério Público são excepcionais, a Resolução o transforma em polícia paralela com ascendência sobre as demais, inclusive as guardas municipais! Isso não é legalmente possível, nem lógico!

“Mas o pior é o artigo 18, que fala do novel Acordo de Não-Persecução Penal. Reza o dispositivo que, em delitos cometidos sem violência ou grave ameaça, o Ministério Público poderá propor ao investigado acordo de não-persecução penal, desde que este confesse e cumpra, dentre outros, os requisitos de reparar o dano, prestar serviços à comunidade e pagar prestação pecuniária”.

Janaina confirma que essa criação do Conselho do MP não tem nada a ver com a colaboração, ou delação premiada, da lei 12.850/13. Adverte que essa Resolução institui, na prática, a barganha (“plea bargaining”), que além der não ser admitida no Brasil, já foi rechaçada pelo Congresso Nacional.

Na sequência, ainda sobre o artigo 18 da Resolução 181/17, um dos últimos legados da era Janot no Conselho e na condução do MPF:

“A leitura do artigo 18 mostra que para efetivar o novel acordo (de não perseguição penal) é necessário CONFESSAR (veja bem, confessar), como se já não tivéssemos saído da era da confissão como a rainha das provas. Mais grave – continua – é o fato de o Ministério Público se conferir o poder de aplicar pena sem processo e de acompanhar a própria execução.

“Quando a Lei nº 9.099/95 foi promulgada, houve enorme celeuma em torno da possibilidade de se aplicar pena sem processo. Entretanto, nas hipóteses de suspensão condicional e de transação penal, não há assunção de culpa e há a interveniência do Poder Judiciário. Pela Resolução em análise o Juiz não será sequer informado da aplicação da pena”.

Janaína pergunta:

“Depois de confessar, qual garantia terá o cidadão de que um outro membro do Ministério Público não vai pegar seu depoimento e oferecer denúncia?

“Quem advoga sabe bem que, apesar de o Ministério Público ser uno, muitas são as vezes em que um dos seus membros pede absolvição, o Juiz acata e o outro membro recorre. Nesses casos, eles alegam independência funcional.

“E se paralelamente ao tal PIC (Procedimento Investigatório Criminal), tramita um inquérito policial, pelos mesmos fatos, que vem a ser distribuído daquele diverso daquele que preside o procedimento investigatório? A realização do acordo com um impedirá o oferecimento da denúncia pelo outro, com fulcro no que fora apurado no inquérito? O CNMP vai legislar sobre o conflito de atribuições entre os muitos integrantes do Ministério Público?

“Por mais que queiramos que a impunidade seja combatida neste País, não é com a ilegalidade que esse fim se alcançará. O monstro criado (a tal Resolução nº 181/17 do CNMP) parte da premissa de que o Ministério Público é um Poder mais limpo e acima de todos os demais. Independentemente da discussão referente ao ser ou não poder, os últimos fatos mostram que não está imune às fraquezas humanas. Até para a preservação de seu importante e fundamental papel, vale lembrar que o Ministério Público também precisa observar as leis e, sobretudo, a Constituição Federal. A História nos mostra que concentração de força sempre gera arbítrio e, por conseguinte, injustiça”.

As constatações de Janaína Conceição Paschoal, Advogada e Professora Livre Docente de Direito Penal na Universidade de São Paulo, soam como grave advertência ao CNMP em sinal de alerta ao Supremo Tribunal Federal, único hoje ainda com poder nesta República para enquadrar os agentes públicos renitentes à ordem democrática, que no Executivo, no Legislativo e, em especial no próprio Judiciário, fazendo de conta que não sabem, ou por ignorancia não sabem mesmo, que a Constituição há de ser sempre a inspiração única nas decisões administrativas, legislativas, judiciárias e por que não também do Ministério Público, suas corporações e colegiados?

Que mais Janaínas e Janaínos despontem neste cenário já tão infestado por tantas mediocridades. Para o bem da cidadania no Brasil!

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Uma aula de jornalismo

Entrevista concedida pelo jornalista Martin Baron, editor do The Washington Post, ao jornalista Marcelo Lins para o Milênio — programa de entrevistas que vai ao ar pelo canal de televisão por assinatura GloboNews às 23h30 de segunda-feira, com reprises às terças (17h30), quartas (15h30), quintas (6h30) e domingos (14h05)

Martin Baron, jornalista americano e editor chefe do The Washington Post desde 2013, foi decisivo na cobertura da equipe Spotlight, do jornal Boston Globe. O grupo investigou o escândalo de padres pedófilos na igreja católica em 2012 e recebeu vários prêmios Pulitzer. Um deles, pela série de reportagens sobre investigações secretas da Agência Nacional de Segurança dos EUA.

Marcelo Lins — Quais são as principais mudanças que você vivenciou desde que entrou no jornalismo, em meados dos 70, e o que não mudou porque não pode mudar?
Martin Baron — O que mais mudou foi a forma como as pessoas consomem notícias e informações. Estamos na era digital, e não era assim quando me tornei jornalista profissional. Não havia a internet aplicada à indústria de notícias. As pessoas estavam apenas começando a falar da internet, que só começou a afetar nosso negócio no início dos anos 1990, com as conexões de banda larga de alta velocidade. Essa foi a mudança mais fundamental que enfrentamos.

O que não mudou foi a nossa missão. Nossa missão primordial é informar sobre o que acontece no mundo, informar o básico. Além disso, acho que nossa missão mais importante é responsabilizar instituições e indivíduos poderosos, principalmente o governo, mas também outros indivíduos e instituições poderosos. Essa é uma missão que persigo desde o início de minha carreira e que já existia antes dela.

Marcelo Lins — Como está o ambiente da imprensa nos Estados Unidos de Trump? Ele está tão diferente quanto parece para nós, de fora, do que era durante a era Obama?
Martin Baron — Todos os governos americanos tentam manipular a imprensa, assim como qualquer governo de qualquer país do mundo. Muitas vezes existe um conflito entre a imprensa e o governo, e isso é natural, porque tentamos obter informações que às vezes o governo não quer divulgar.

Havia uma relação difícil entre o governo Obama e a imprensa. Eles eram muito controladores, às vezes muito hostis, lançaram várias investigações sobre vazamentos de informações confidenciais, tentaram obter registros telefônicos e outros de jornalistas que cobriam segurança nacional, portanto a relação com o governo Obama era bem difícil.

Mas a situação agora é pior, de certa forma radioativa, porque o presidente atual, durante a campanha e durante seu governo, está, nas próprias palavras, travando uma guerra contra a imprensa. Ele procura nos marginalizar, nos deslegitimar, nos denegrir...

Marcelo Lins — Ele chamou a imprensa de inimigo público.
Martin Baron — Quer nos desumanizar. Ele nos chamou de lixo, de forma mais primitiva de ser humano, depois achou pouco e nos chamou de forma mais primitiva de vida. Depois nos chamou de inimigo do povo americano, o que considero muito perigoso. Isso leva a uma relação extremamente hostil e sugere que nós representamos traidores ou que praticamos traição, o que é absurdo.

Eu já disse que, apesar de o presidente afirmar que está em guerra com a imprensa, não estamos em guerra com o governo. Nós estamos trabalhando. Esse é o nosso trabalho, é o que devemos fazer. Está escrito na Declaração de Direitos, é o que nossos fundadores imaginaram, é a nossa função e posso dizer que é isso que vamos fazer.

Marcelo Lins — O senhor tem uma carreira bem longa. Começou como repórter, mas logo se tornou editor. O que o atraiu? Foi a visão mais ampla que o cargo oferece ou algum outro motivo?
Martin Baron — Ser repórter é bem diferente de ser editor. O repórter se concentra em uma matéria, assina a matéria e está bem claro quais são suas responsabilidades. Depois ele parte para outra. Para um editor, isso não está totalmente claro. Você precisa entender que tenta causar impacto na organização como um todo, orientá-la certa numa direção, inspirar a equipe a fazer o melhor trabalho possível e exigir altos padrões, os padrões que o público exige de nós. Então como editor seu impacto é maior do que como repórter.

Marcelo Lins — E foi como editor já que talvez o Martin Baron tenha conseguido a maior exposição mundo afora, no início dos anos 2000, com a investigação sobre abusos sexuais dentro da Igreja Católica em Boston. Pelo que aparece no filme Spotlight, você pediu para a equipe se aprofundar na investigação sobre os abusos em seu primeiro dia de trabalho no Boston Globe, co m base em um artigo que havia lido. Isso é verdade?
Martin Baron — Sim, é verdade, e o que o filme mostra foi o que aconteceu de fato. Eu tinha acabado de chegar a Boston, não tinha morado nem trabalhado lá, não conhecia ninguém. Quando cheguei, comecei a ler o jornal, claro, e na véspera de meu primeiro dia de trabalho, li uma coluna de opinião do Boston Globe sobre o caso de um padre acusado de abusar de até 80 crianças.

O advogado dos autores da ação, dos pais de crianças que sofreram abusos e de pessoas que alegaram ter sofrido abusos, disse que o cardeal Bernard Law sabia dos abusos do padre e o transferia de paróquia em paróquia sem contar a ninguém. O padre voltava a praticar os abusos e era novamente transferido. Isso durou muito tempo, e o próprio cardeal sabia de tudo. A resposta do cardeal e da Igreja foi que eram acusações irresponsáveis e infundadas. E, no final do texto, a colunista dizia que a verdade poderia nunca vir à tona, porque os documentos eram confidenciais e não viriam a público.

Então, no meu primeiro dia de trabalho, tivemos nossa primeira reunião de pauta às 10h, todos disseram no que estavam trabalhando e ninguém mencionou esse caso. Perguntei se não poderíamos continuar investigando para tentar descobrir a verdade. Por que tínhamos de aceitar um lado dizendo uma coisa e o outro lado dizendo exatamente o contrário? Alguém disse que um juiz decretara confidencialidade e que os documentos não seriam divulgados. Eu disse que tinha lido isso na coluna, mas que poderíamos entrar com uma moção para tentar tornar os documentos públicos.

Acho que os jornalistas se surpreenderam, porque eu era novo em Boston, era meu primeiro dia, minha primeira reunião, e sugeri entrar com uma ação contra a instituição mais poderosa de Boston e da Nova Inglaterra: a arquidiocese de Boston.

Marcelo Lins — Quase 20 anos depois desse caso, a igreja de novo é abalada por mais um escândalo, envolvendo o principal cardeal da Austrália, George Pell, acusado oficialmente de envolvimento com o acobertamento e envolvimento direto também em crimes de abuso sexual lá na Austrália...
Martin Baron — Eu sabia do caso, sabia de um grande escândalo na Austrália, não fiquei surpreso com as acusações, embora seja impressionante, porque o cardeal Pell é muito próximo ao papa. Esse caso demonstra claramente que a Igreja ainda não resolveu essa questão. O problema persiste. É um caso significativo nesse aspecto.

Marcelo Lins — Ficou satisfeito com a forma como Liev Schreiber o retratou no filme?
Martin Baron — Não posso reclamar. Claro, como poderia? Muitos amigos e colegas disseram que foi uma interpretação precisa. Já outros amigos disseram que eu tenho senso de humor e que isso não transpareceu no filme, mas é importante frisar que aquele foi um capítulo da minha vida. O filme retrata 6 ou 7 meses da minha carreira. Foi um período de seriedade para mim. Eu não tinha amigos na cidade, então não sei se estava muito bem-humorado na época.

Marcelo Lins — Já ouvi o senhor falar sobre a importância da modéstia para o jornalismo. Por que modéstia?
Martin Baron — Precisamos nos perguntar o que torna um jornalista bom, e eu acho que um bom jornalista não é aquele que se impressiona com o quanto sabe, mas que se impressiona com o quanto ainda não sabe. Temos muito o que aprender. Devemos sempre aprender a ouvir. Acho importante não deixar nosso ego inflar demais, reconhecer que há muitas coisas que não sabemos e que quanto mais investigarmos e fizermos perguntas, mais saberemos. Devemos ser ótimos ouvintes. Então devemos encarar nosso trabalho com modéstia e humildade e reconhecer que não sabemos tudo, que há muita coisa que não sabemos e devemos sempre trabalhar para descobri-las.

Marcelo Lins — Então é importante ser modesto e também cético, não é?
Martin Baron — Acho que o ceticismo é outra qualidade importante. Nós sabemos que nem sempre nos contam a verdade ou a história completa, precisamos fazer perguntas difíceis. Não devemos ser cínicos, mas sim céticos.

Marcelo Lins — Qual é o lugar da emoção no jornalismo? Tem lugar além de no chamado jornalismo sensacionalista?
Martin Baron — É uma boa pergunta. Não sei se tenho a resposta. Nunca pensei profundamente sobre isso. Nós precisamos ter empatia, precisamos nos colocar no lugar de nossos personagens, ver o mundo do ponto de vista deles. Precisamos tomar cuidado para não deixar as emoções falarem mais alto, porque precisamos de um certo distanciamento, de um certo ceticismo, precisamos ser analíticos, precisamos buscar documentação adicional, provas adicionais. Não podemos confiar na palavra das pessoas só porque elas têm uma história emocionante. Por outro lado, depois de termos sido meticulosos, de termos sido cuidadosos, justos e honestos com nossa reportagem, fomos céticos e fizemos todo o trabalho, pode haver uma história muito emocionante para contar. E uma coisa que devemos fazer quando isso se justificar é instilar emoção em nossos leitores, ouvintes ou espectadores. Portanto, caso se justifique, devemos tentar ajudar os leitores a entender para que eles se emocionem. Nós devemos ser mais contidos.

Marcelo Lins — Quando a internet começou a crescer muito rápido e as pessoas começaram a ficar com medo de todas as possibilidades que ela apresentava, elas também começaram a pensar no futuro do jornalismo. Jeff Bezos, da Amazon, comprou o Washington Post e você, que já estava lá, passou a fazer parte dessa nova fase do jornal. O que pode nos falar sobre essa interseção entre a Amazon e o mundo da mídia? Teve medo ou é uma boa oportunidade de desenvolvimento?
Martin Baron — É bom frisar que somos um investimento pessoal de Bezos, não fazemos parte da Amazon. Somos totalmente independentes. Mas eu encarei como uma ótima oportunidade. Nossos donos anteriores, que eram incríveis, que criaram a marca Washington Post, uma empresa que mudou a história em Watergate e em outras ocasiões, ficaram sem ideias sobre o que fazer neste novo ambiente jornalístico. Então Jeff nos comprou e chegou não só com capital financeiro, que precisávamos, mas com capital intelectual, com um conhecimento muito sofisticado de tecnologia e internet e um conhecimento sofisticado do comportamento do consumidor, que é o negócio dele. Ele mudou a estratégia do jornal fundamentalmente, o que foi imensamente positivo.

Marcelo Lins — Em relação ao futuro, qual é o futuro do jornal impresso na sua opinião? Vai sobreviver ou virar o vinil do jornalismo?
Martin Baron — Achamos que ele vai durar ainda algum tempo, talvez mais do que se espera. Eu acho que daqui a 10 ou 15 anos o jornal impresso ainda existirá, mas um dia vai acabar desaparecendo. Jeff Bezos disse que continuará existindo, mas que, em algum momento, será encarado como um lixo. Será como alguém dizer que tem um cavalo. As pessoas verão um jornal impresso e dirão: “Que legal! Você tem um jornal. Interessante.” Mas o fato é que vivemos num mundo digital. As pessoas vivem no computador e principalmente no celular. É nele que buscam informações, é assim que vivem. Sempre que têm um tempinho, consultam o celular. Se estão esperando o ônibus, olham o celular, andando na calçada também. É assim que as pessoas vivem. É digital, é o mundo das redes sociais e é móvel.

Marcelo Lins — Quando pensa no Brasil, o que vem à sua mente?
Martin Baron — No momento, um grande escândalo, mas... É um país com oportunidades tremendas, e é isso que todos dizem sobre o Brasil, que é um país com muitas oportunidades, recursos...

Marcelo Lins — Muitas oportunidades perdidas também.
Martin Baron — Há muitas piadas sobre o Brasil nessa linha, mas ele ainda tem oportunidades, tem recursos. Seu maior recurso, como em todo país, é seu povo, uma população instruída, empreendedora, uma população que quer progredir, que em geral dá valor à democracia e à liberdade de expressão.

Marcelo Lins — É possível atingir a imparcialidade?
Martin Baron — Acho que podemos ser imparciais no início de nossa investigação, estar abertos a várias possibilidades. Podemos ter uma hipótese inicial e os fatos não a comprovarem. Devemos ser honestos e dizer: “Não há história aí.” Mas acho que devemos informar o que descobrimos. Fala-se muito em sermos justos e concordo totalmente. Devemos ouvir todo mundo, estar abertos ao que as pessoas dizem e às provas que elas apresentam, mas também devemos ser justos com nossos leitores, o que significa contar a eles o que nossa investigação revelou. Se investigarmos corretamente, o que descobrimos? Em vez de fingir que não investigamos e esconder a reportagem. Devemos ser justos com nosso público e dizer o que descobrimos com a investigação que fizemos. (Fonte: Consultor Juridico, edição de 07.09.17).

terça-feira, 5 de setembro de 2017

MBL quebra o silêncio

Saudações a quem tem coragem

Agora que o golpe de estado perpetrado por Joesley, validado por Janot e amplamente divulgando pelas organizações Globo mostrou-se um gigantesco fiasco, cumpre ao MBL lembrar a seus amigos e seguidores o quão custoso foi manter uma postura serena e prudente durante os meses de insanidade que se iniciaram a partir do 17 de Maio.

Muitos foram os que apontaram o dedo para nós dizendo que havíamos nos “vendido” para Temer, que tínhamos “bandidos de estimação”; passamos a ser alvo dos moralistas de ocasião e dos oportunistas que escondem seu projeto político por trás de um véu de combate à corrupção.

Alertamos sobre a inconsistência da tramoia e apontamos seu objetivo: criar uma nova alternativa à esquerda mediante o combate ao novo “inimigo número um do Brasil”, o impopular presidente Michel Temer. As capas da Época, das organizações Globo, demonstram isso: esquece-se Lula e coloca-se Temer – um mero subalterno no projeto de poder do petismo – como “cabeça” da quadrilha que tomou de assalto o país. Trataram os brasileiros como otários.

Paralelamente, saía do longo silêncio a Rede de Marina Silva, através de seus parlamentares que batiam cartão no Jornal Nacional: Alessandro Molon e Randolfe Rodrigues. Grupelhos bancados pelo empresariado de esquerda obtinham espaço cativo na grande imprensa; seus nomes eram validados por procuradores da Lava Jato que afirmavam categoricamente a legitimidade da delação de Joesley e do trabalho de Janot.

Conforme visto, todos falharam. Não será fácil para Marina, Barbosa e seus amigos globais criarem uma alternativa política manipulando a mente dos brasileiros. Joesley precisa ser preso. Todos os envolvidos precisam ser investigados. E os agentes políticos do “lado de cá” que serviram a tramoia, bem como jornalistas sérios que se prestaram a esse papel ridículo – inclusive contra suas próprias convicções – devem refletir se de fato defendem uma “nova política”, como gosta-se de falar por aí, ou se são meros oportunistas de ocasião disfarçados de “bons rapazes”.

Saudamos, porém, quem teve coragem e hombridade neste momento de crise. Carlos Andreazza, Rodrigo Constantino , Reinaldo Azevedo, Ana Paula do Vôlei, Guilherme Fiuza, Paulo Eduardo Martins, Luciano Ayan, Jornalivre, Nas Ruas, Avança Brasil e tantos outros: obrigado por não se curvarem ao discurso fácil. Foi bom estar na trincheira da razão e do bom senso ao lado de todos vocês. Se o Brasil não cair nas mãos da nova esquerda no ano que vem, o será, muito, por causa de sua honestidade intelectual.

Movimento Brasil Livre.

Os joinhas da coroa

UM PEDACINHO DA FITA

Personagens:

Ricardo Saud, ex-diretor de relações institucionais da JBS.
Joesley Batista, o beato-delator e um dos controladores da JBS, constituída e mantida à custa dos financiamentos do BNDES na era em que o manda chuva, ou melhor, o escancara os cofres, se chamava PT.
A advogada da JBS, que aparece no enredo em defesa do STF, chama-se Fernanda Tótima

Ricardo – Deixa eu falar uma coisa para você. O Marcelo deu uma tarefa para nós… agora acaba… …. é muito fácil, e quer mais, é isso? Já contou para o Janot… …para entregar a fita… toca o enterro… …no caso do Temer…
Joesley – Vamos lá, vamos dar um passo atrás. Na minha cabeça. Marcelo é do MPF. Ponto. O Marcelo tem linha direta com o Janot. Quando falo o Janot, é Janot, Pelella…
Ricardo – Te falei… Mandei a mensagem…
Joesley – Não, não… É tudo a mesma coisa. MPF é Janot, Pelella… Qual é o nome daquele outro? É o… Que a… que a…
Ricardo – Janot… ‘Perrella’…
Joesley – E o outro lá… Ricardo, nós somos… nós somos joia da coroa deles. O Marcelo já descobriu e já falou para o Janot: ‘Janot, nós temos o cara, nós temos o pessoal que vai dar todas as provas que nós precisamos’. Ele já entendeu isso. A Fernanda surtou por que? Porque a Fernanda entendeu que nós somos muito mais e nós podemos muito mais. E aí até a Fernanda perdeu o controle. Ela falou: ‘Nossa senhora, peraí, calma, o Supremo não, peraí, calma, vai foder meus amigos, vai…’. Só para… Ricardinho, eu não vou conseguir te explicar e te falar assim… Ricardinho, confia ni mim. É o seguinte: vamos conversando tudo, nós vamos tocar esse negócio. Nós vamos sair lá na frente, nós vamos sair amigo de todo mundo e nós não vamos ser presos. Pronto. E nós vamos salvar a empresa.
Ricardo – Não, eu não ligo não. Eu não ligo com nada.
Joesley – Eu sei… mas…. eu não consegui te falar…

Parte 2

Ricardo – Eu não consigo entender o seguinte… Então, por que, então por que nós estamos assim tudo bacana, está só a joia da coroa e por que a Fernanda não acha isso?
Joesley – Calma. É porque ninguém comeu ela ainda.
Ricardo – Não. Profissionalmente… Agora é sério. Só para fechar meu coisa. O povo… tão afinado com a gente. O cara mandou escrever tudo hoje. Escapou. Quarta-feira vamos entregar tudo 100%. Pergunto o seguinte: por que a Fernanda não fecha com a gente?
Joesley – Ela fecha. Ela fecha. Ricardinho, a maior agonia de todo mundo é porque é o seguinte: nós vamos chegar lá.
Ricardo – Tem quatro semanas que a gente…
Joesley – Oi?
Ricardo – Tem quatro semanas que nós estamos… Todas. Depois nós estamos na Veja de novo.
Joesley – Joia, legal.

Ainda vai ter mais mais. Muito mais.



quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Porandubas do Torquato

O Professor Gaudêncio Torquato abre a sua coluna com a mineirice em ação. Assim:

31 de março de 1964. Benedito Valadares se encontra com José Maria Alkmin e Olavo Drummond no aeroporto de Belo Horizonte:

– Alkmin, para onde você vai?

– Para Brasília.

– Para Brasília, ah, sim, muito bem, para Brasília.

Os três saem andando para o cafezinho, enquanto Benedito cochicha no ouvido de Drummond:

– O Alkmin está dizendo que vai para Brasília para eu pensar que ele vai para o Rio. Mas ele vai mesmo é para Brasília.

Esse tipo de artimanha é chamado de engano de segundo grau. Quer significar: engano meu interlocutor, dizendo-lhe a verdade para tirar proveito da sua desconfiança. Essa malandragem vem de longe. Conta-se que a historinha é judia e expressa com humor o refinamento a que leva o esconderijo de informações.

Um interlocutor encontra-se com outro na rodoviária na antiga União Soviética:

- Para onde o amigo está indo?

- Para Minsk.

- "Quer me enganar, hein? Você quer me fazer acreditar que vai a Minsk para que eu pense que vai a Moscou. Pois bem, acontece que você vai mesmo a Minsk".

Campanha nas ruas

A campanha presidencial de 2018 começa a ganhar as ruas. Deixemos as firulas de lado. O fato é que pré-candidatos ensaiam seus primeiros passos, ao participar de caravanas, fazer viagens pelas regiões, aceitando convites de entidades, mobilizando militância e grupos de simpatizantes, etc.. Nomes aos bois: Lula corre pelos 9 Estados do Nordeste; João Doria recebe títulos de cidadania e homenagens em grandes cidades; Jair Bolsonaro não fica atrás e corre para abraçar correligionários; Geraldo Alckmin, o mais discreto, também se movimenta. Marina, Ciro Gomes estão à espera de convites.

Nos limites da lei?

Afinal, pode-se começar a campanha de 2018 a essa altura? Campanha pedindo votos? Não. Mas campanha disfarçada sob a capa de visita às regiões, conversas com lideranças, encontros com o povo, isso pode. É o que garante a lei e o que dizem os juízes. É evidente que, mesmo não pedindo voto do eleitor, os pré-candidatos fazem campanha. Mostram-se por inteiro, discursam, fazem conclamações ao civismo pátrio, exaltam valores e virtudes da boa política e chegam, até, a fustigar eventuais adversários.

Linha tênue

A linha entre o permissível e o proibido é tênue. Pouco se distingue uma coisa de outra. Visitar regiões, fazer comício em cenas abertas ou fechadas – nas ruas ou em ambientes restritos – significa fazer o principal exercício da atividade eleitoral: apresentar-se à população, expressar ideias e discorrer sobre problemas brasileiros, a partir da análise dos vetores que estão na agenda política: gestão, emprego/desemprego, resgate do poder de compra do consumidor, ética/moral, corrupção, reformas (trabalhista, previdenciária, tributária, política, etc.).

A caravana de Lula

Luiz Inácio decidiu começar pelo Nordeste, a região onde continua a ter grande prestígio. Escolheu cidades grandes e médias para fazer seu périplo. Abriu intensa polêmica entre correligionários e adversários. Passam pelas redes sociais vídeos sobre suas andanças, dando conta de entreveros da caminhada – pequenas plateias, desorganização, etc.. Parcela desse material é fake, ou seja, são vídeos feitos por adversários.

Inversão de discurso

Digamos, porém, que a caravana não repita o sucesso de antigas jornadas. Mesmo assim, a perambulação é importante na estratégia de colocar o bonde nos trilhos. No fundo, Lula está avisando que é candidato. Matreiro como é, inverte os eixos do discurso, escondendo que o descalabro que afundou o país ocorreu nos idos do petismo no poder. Se for candidato, será muito difícil que assegure os 30% (históricos) de intenção de voto do voto do petismo. Na régua de 0 a 100 deste consultor, a chance de ser candidato chega apenas na casa dos 30.

Doria aproveita bem

João Doria também entra na paisagem ao aceitar parte das centenas de convites que lhe chegam. Como é um perfil não tão conhecido, aproveita para se mostrar – com sua densa experiência na vida empresarial, passagens importantes pela administração pública, valores da gestão moderna etc.. João encarna a novidade, um perfil asséptico na política, a estampa que entusiasma grupamentos centrais. Seu desafio é chegar às margens sociais, de forma que a mensagem seja percebida por todo o território. Constrói também parte de sua identidade como o anti-Lula. Prefeito da maior cidade do país, desperta curiosidade. Hoje, chance de João Doria ser candidato pela régua de 0 a 100 deste consultor: 40.

Prévias com Geraldo, não

Mas a candidatura de João Doria pode ficar apenas na intenção de seus simpatizantes. Ele tem dito e repetido a este consultor que não disputará prévias com Geraldo Alckmin, seu amigo e tutor. Hoje, João tem vida própria. Mas respeita o amigo. Não disputará com ele. Geraldo defende as prévias e, segundo os caciques tucanos, a partir de Tasso Jereissati, tem a preferência do partido. Hoje, contaria com a maioria do colégio eleitoral das prévias. Hoje, chance de Geraldo Alckmin ser candidato pela régua de 0 a 100 deste consultor: 60.

A razão de João

Por que, então, João continua a pavimentar caminho em direção ao Planalto? Por confiar no feeling: se as pesquisas derem a ele considerável percentagem de intenção de voto, deixando outro pré-candidato muito atrás (Geraldo, por exemplo), apostará em sua indicação pelo PSDB. Quem sabe, até o próprio Alckmin não faria o gesto de levá-lo até o pódio da candidatura? Em política, tudo é possível. Até mudança de partido.

E o governo de SP?

Essa alternativa é desconsiderada por João Doria. Há outros pré-candidatos, a partir do vice-governador Marcio França, voz forte no PSB, que tentará se viabilizar como candidato em São Paulo com o apoio de Geraldo, e levar, em contrapartida, os socialistas na direção da candidatura do tucano. Os paulistanos, por seu lado, até compreenderiam a saída de João Doria para uma disputa presidencial (a crise do país seria o pano de fundo), mas certamente não gostariam que o prefeito deixasse o cargo para disputar posto mais alto no próprio Estado. Seria oportunismo. Crítica que possivelmente ganharia suavidade no caso da opção pela presidência da República.

Bolsonaro, o discurso radical

Jair Bolsonaro, de seu lado, também se movimenta. Foi ao Nordeste, onde ganhou calorosos aplausos de simpatizantes, sendo recebido de forma entusiástica em aeroportos. Procura radicalizar o discurso, internalizando o sentimento da população que se indigna contra a violência nas ruas. As mortes violentas se expandem. Bolsonaro é a porta de entrada em tempos duros: militarismo nas escolas, nas ruas, guerra total às esquerdas. Não se espere dele, porém, voo longo. Seu teto terá entre 10% a 12% de votos.

Reforma política

A reforma política ameaça gerar uma reversão de expectativas. Pelo andar da carruagem, pouca coisa avançará. E a Câmara, sob a regência de André Fufuca, terá dificuldade de votar temas complicados. Mesmo com Rodrigo Maia exercendo monitoramento, a partir do Palácio do Planalto.

Janot prepara o espetáculo

Rodrigo Janot, sob a fosforescência midiática, prepara os atos finais de sua gestão na PGR. Promete uma 2ª denúncia de peso contra o presidente da República. Que, na visão deste consultor, não terá o impacto da primeira. Janot entra por completo no saguão do Estado-Espetáculo.

Lava Jato nas eleições

A operação Lava Jato driblará as pressões e suas águas correrão agitadas pelas veredas eleitorais de 2018. Vai afinar discursos, adensar críticas contra candidatos, gerar intensos debates. O resultado será um processo de "canibalização recíproca", com as críticas de um lado e de outro se chocando e passando ao eleitor o conceito de que todos os candidatos estão no lamaçal. A conferir.

Tipos de candidatos

1. O continuista - Candidato à reeleição, máquina a serviço da candidatura, cabos eleitorais multiplicados, o continuista poderá ter vantagens sobre adversários, se, claro, houver realizado um bom governo. Particularmente se construiu forte identidade junto à comunidade. E se não tiver contas a pagar na operação Lava Jato. Pontos fortes: assepsia, ações e obras a mostrar. Pontos fracos: governo fraco, mesmice e denúncias de corrupção.

2. O oposicionista – Se encarnar situação de mudança, troca de peças velhas na máquina administrativa, terá sucesso. Para tanto, precisa absorver o espírito da comunidade, interpretar demandas, fazer intenso corpo a corpo, deixar-se mostrar, ganhar confiança do eleitor. Usar bem as redes sociais. Pontos fortes: alternativa à velha ordem; encarnação do espírito do novo. Quando se tratar de perfil já conhecido, todo esforço se fará necessário para vestir o manto da renovação. Pontos fracos: fraca visibilidade; tênues estruturas de apoio; ausência de ideias.

3. A terceira via - O candidato da terceira via tem a vantagem de poder quebrar a polarização entre situação e oposição. Para angariar apoio de todos os lados, carece organizar um discurso moderado, ouvindo todos os segmentos, buscando uma linha intermediária. Demonstrar possuir um grande programa de trabalho. Pontos fortes: bom senso, equilíbrio, experiência, alternativa à polarização acirrada entre grupos, inovação. Ponto fraco: eventual falta de apoio de estruturas e lideranças.

Discurso duro

O desembargador Fábio Prieto, que já presidiu o TRF da 3ª região, tomou posse, sexta-feira passada, no TRE/SP. Fez o mais duro discurso que este consultor já ouviu da boca de um membro do Judiciário sobre os desvios do sistema de Justiça no Brasil. Destaco algumas passagens:

Mazelas

- "O patrimonialismo, o clientelismo, o assembleísmo corporativo, o desperdício de dinheiro público, o pouco caso com a independência funcional dos juízes, a preguiça premiada, a burocratização, a demagogia e a falta de decoro – são estes velhos males que a Reforma do Judiciário tem contribuído para reforçar".

Sindicalização da magistratura

- Denunciou com palavras fortes a sindicalização da magistratura.

- "O exercício de mandato classista, em associações privadas de juízes, foi vulgarizado e também justificou milhares de faltas ao serviço. Ninguém sabe quantas são as associações de juízes. Como foi ampliado o número de entidades ou de seus diretores.

- Muitas destas associações de juízes passaram a atuar como verdadeiros sindicatos, prática vedada aos magistrados, agentes do poder estatal."

Quatro conselhos

- "Somados os quatro conselhos de Justiça, o Brasil deve ter um dos maiores e mais caros sistemas de controle e fiscalização judiciária do mundo. Com tal fragmentação, os órgãos são necessariamente disfuncionais. As decisões são contraditórias e inconciliáveis. A composição dos conselhos é vulnerável ao corporativismo."

"Seu Lunga"

Por insistentes pedidos, "Seu Lunga" faz uma visita à coluna. Respostas do mestre a perguntas idiotas

1. De olhos fechados, na cama, ele se depara com a pergunta da mulher: Você tá dormindo?

- Não, tô treinando pra morrer!

2. Seu Lunga leva um aparelho eletrônico para manutenção e o técnico pergunta:

- Tá com defeito?

- Não, é que ele estava cansado de ficar em casa e eu o trouxe para passear.

3. Está chovendo e aí a pessoa pergunta para Seu Lunga:

- Vai sair nessa chuva?

- Não, vou sair na próxima.

4. Seu Lunga acabou de levantar, aí a mulher pergunta:

- Acordou?

- Não. Estou sonâmbulo!

5. Um amigo liga para a casa do Seu Lunga e pergunta:

- Onde você está?

- No Pólo Norte! Um furacão levou a minha casa pra lá!

Gaudêncio Torquato (gt@gtmarketing.com.br) é jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

O Ministério de Raquel

A nova Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, ao escolher seus auxiliares para o seu mandato de 2 anos, em substituição a Rodrigo Janot, levou em consideração a especialização jurídica, a experiência profissional e o conhecimento dos problemas do país, considerando a lotação geográfica dos integrantes da equipe ao longo de suas carreiras.

O vice-procurador-geral da República será Luciano Mariz Maia, e o vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros. Os dois são subprocuradores-gerais da República.

Maia é subprocurador-geral da República desde 2012. Atua perante as 5ª e 6ª turmas do Superior Tribunal de Justiça, que julgam processos criminais. Medeiros oficia atualmente junto ao STJ em matéria criminal e participar das sessões das turmas de Direito Privado. Oficiou junto ao Tribunal Superior Eleitoral em temas de propaganda eleitoral nas eleições de 2014.

A nova Procuradora Geral da República acrescentou mais dois membros no grupo de trabalho que cuida da “lava jato”: Alexandre Espinosa e José Alfredo de Paula Silva. Espinosa participou da equipe que auxiliou o então procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, nas investigações e processos da Ação Penal 470, o processo do mensalão, no Supremo Tribunal Federal.

Pela primeira vez, os cargos da Secretaria-Geral do Ministério Público da União e da Secretaria de Cooperação Jurídica Internacional serão ocupados por mulheres: Zani Cajueiro e Cristina Romanó, respectivamente. Também será mulher a titular da Secretaria da Função Penal Originária junto ao STF, pasta a ser criada por Dodge. Nesse caso, o posto será ocupado pela procuradora-regional da República Raquel Branquinho.

Nos próximos dias, de acordo com a nova Procuradora Geral, serão definidos os nomes dos titulares da Secretaria de Direitos Humanos e Tutela Coletiva, da Secretaria de Análise Constitucional e da Secretaria da Função Penal Originária junto ao Superior Tribunal de Justiça.

Outros nomes escolhidos para a equipe de Raquel Dodge são: Lauro Cardoso e Marcelo Ribeiro Oliveira (membros da Secretaria de Função Penal Originária no STF), Alexandre Espinosa e José Alfredo de Paula Silva (Grupo de Trabalho "lava jato"), Alexandre Camanho (secretário-geral Jurídico), Cristina Schawnsee Romanó (secretária de Cooperação Jurídica Internacional), Pablo Coutinho Barreto (Secretaria de Pesquisa e Análise e Secretaria Pericial) e Sidney Pessoa Madruga (Coordenador do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral).

Com informações da Assessoria de Imprensa do MPF e da Agência Brasil. 

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Porandubas do Torquato

O Professor Torquato Gaudêncio começa o seu encontro hoje com você contando historinhas de Campos, RJ.

Cálculo

Perguntaram ao advogado Benedito Rubens por que desistira de lecionar matemática.

- Receio estar com um cálculo na vesícula...

(350 Causos de Campos e Adjacências - Saulo Pessanha)

Ignorinhos

Em visita a uma feira no Pavilhão de São Cristóvão, no Rio, Dodozinho gostou muito de um casal de pássaros. Como não conhecia as aves, indagou a origem delas a uma recepcionista.

- Ignoro senhor!

Na volta a São João da Barra, Dodozinho falou maravilhas da feira e um assessor dele quis saber o que mais o atraiu.

-Adorei um casal de ignorinhos!

(Saulo Pessanha)

Governo avança

A cada semana, o governo dá um passo em sua trajetória. Quem apostava que o presidente estaria afastado no começo de agosto saiu perdendo feio. Alguns veículos de comunicação e seus principais colunistas embarcaram na canoa. Ontem, quarta, Michel Temer foi mais uma vez vitorioso. Este analista se inclina a acreditar na hipótese de que o presidente concluirá seu mandato. Sob as reflexões que seguem.

Boa articulação

O presidente é um hábil articulador político. Consegue maioria nas casas congressuais para obter seguidas vitórias. Ex-presidente da Câmara por três vezes, duas vezes líder do PMDB, partido que presidiu por 15 anos, Michel sabe conduzir conversas, alcançar apoios e formar maioria. Essa identidade tem sido fundamental para se aduzir que usará seu poder de convencimento para fazer sua pauta seguir adiante no Congresso.

Quem no lugar?

Outra vertente desta reflexão aponta para a questão: quem colocar no lugar de Michel Temer nesse momento de crise? Ora, o país registra melhoria na frente econômica. Inflação caindo, juros na casa de um dígito, curva do desemprego parando com os primeiros números (animadores) de contratações no mercado de trabalho. Tirar o presidente e colocar alguém no lugar seria um ato muito arriscado. Essa é a tese que está por trás do voto favorável ao presidente.

Rodrigo Leal

Rodrigo Maia, que poderia ser o nome para o lugar de Temer, tem dado mostras de lealdade. E não faz, como alguns dizem, jogo duplo. É claro que pode até ver com agrado a possibilidade de vir a assumir o cargo de presidente, mas as perspectivas de um novo governo, faltando apenas um ano e meio para o final do atual governo, são sombrias. Poderia não ser para Maia um bom negócio, eis que outras posições seriam atraentes, como o Senado, o próprio governo do Rio de Janeiro em 2018 ou, ainda, a volta como deputado Federal, posto que poderia lhe dar novamente a presidência da Câmara.

Janot vingativo

As denúncias do procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, começam a mexer com a cachola dos parlamentares, que enxergam em sua atitude vingança, ódio exacerbado contra o presidente. Por que Janot não exibe mesmo ímpeto em relação aos protagonistas Luiz Inácio e Dilma Rousseff? Seu tiroteio concentra-se em Temer e Aécio Neves. A imagem de um procurador vingativo se incrusta na mente dos parlamentares.

Sentimento geral

O presidente é impopular, dizem as pesquisas. Mas o sentimento geral do universo produtivo é o de que Michel Temer está fazendo o país caminhar, com os avanços na esfera das reformas. Por isso, a voz comum é de apoio às medidas que estão sendo tomadas. Não se vê "fora Temer" nem em placas nem na expressão oral. O endosso do empresariado e de fortes conjuntos das profissões liberais só é questionado quando a questão é a de tributos. As entidades de muitos setores se posicionam contra o aumento de impostos, como se viu recentemente por ocasião do aumento de combustíveis.

Orgulho do país

"Quando alguém pode dizer em qualquer país do mundo, meus pobres são felizes, nem ignorância nem miséria se encontram entre eles, minhas cadeias estão vazias de prisioneiros, minhas ruas de mendigos: os idosos não passam necessidades, os impostos não são opressivos [...] quando essas coisas podem ser ditas, então pode tal país orgulhar-se de sua Constituição e de seu governo" (Os Direitos do Homem -Thomas Paine)

O Brasil moderno

O que está em jogo, na visão de analistas, é a visão de um país moderno, que deve fazer as reformas fundamentais para estabelecer patamares de alta produtividade e eficácia, e um país com o status quo do passado, cercado pelas mazelas geradas pelo patrimonialismo: mandonismo, grupismo, nepotismo, caciquismo, fisiologismo. Os horizontes descortinam saídas para a maior recessão econômica da história brasileira, herança da era PT. Mas esse partido e outros fazem de conta que a crise começou hoje com o governo Temer. Caradurismo. A visão do país arcaico faz o gosto das oposições.

PSDB dividido

Os tucanos estão divididos. A banda de "cabeças brancas" (os mais velhos) contra a banda de "cabeças pretas". O partido tem quatro ministros. E a agenda que o presidente Temer está mostrando é praticamente a agenda do PSDB. Sair do governo nesse momento é covardia. Ocorre que certos parlamentares temem perder votos em 2018 caso continuem a fazer parte do governo. O tucano Cássio Cunha Lima diz que quer preservar a posição de seu filho deputado. O tucano Tasso Jereissati quer levar o comando do partido para o Nordeste. Para Geraldo Alckmin, não interessam maremotos e tsunamis. Por isso, a continuidade do governo Temer é a melhor opção para sua candidatura em 2018. Fato: o PSDB é o partido que apresenta, hoje, maior divisão.

A caravana de Lula

Dia 17 de agosto Lula iniciará suas caravanas pelo país, a começar pelo Nordeste. Entrará pela Bahia e encerrará a jornada nordestina no Maranhão. Passará por cidades grandes e médias. Na região, consegue obter uma média de 45% de intenção de voto. Percorrerá depois as regiões Norte e Centro-Oeste. Como se vê, sua estratégia é a de comer pelas bordas. Das margens para o centro. Mas terá poucas chances de vir a ser candidato. A 2ª instância da Justiça Federal (PR, SC e ES) tende a confirmar a condenação dada pelo juiz Sérgio Moro, de 1ª instância.

Reforma política: o poder é do povo

Ponto 1: nos termos do parágrafo único do artigo 1º da Constituição, "todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".

Ponto 2: nos termos dos artigos 45 e 46 da Constituição Federal, os deputados Federais representam o povo e os senadores representam os Estados e o Distrito Federal.

Ponto 3: os deputados são eleitos pelo sistema proporcional e os senadores, pelo sistema majoritário.

Ponto 4: se o povo vota em um candidato e este, com sua bagagem de votos, leva para o Parlamento mais dois ou três de contrabando, esses excedentes ferem o princípio constitucional alinhavado no primeiro item.

Reforma política: Distritão

Ponto 5: a representação popular, para ganhar respeito e legitimidade, deve se submeter a uma radiografia moral a fim de se conformar aos ditames constitucionais.

Ponto 6: o exercício do poder em nome do povo é tese ancorada na hipótese de escolha dos eleitos de acordo com o preenchimento das vagas que cabem a cada Estado.

Ponto 7: essa hipótese abriga o voto majoritário, que, adotado na escolha dos representantes do povo, acabaria com a excrescência gerada por coligações proporcionais, pela qual o eleitor vota em um candidato e, alheio à sua vontade, elege mais um, dois ou até mais de três.

Portanto, o Distritão é uma boa alternativa.

Reforma política: Emenda Lula

Outubro está à vista e a reforma política caminha a passos de caranguejo. O relator Vicente Cândido, do PT, acabou retirando a "Emenda Lula", de sua autoria, como é conhecida, aquela que dizia que candidatos não podem ser presos até 8 meses antes da eleição. O próprio Lula teria sugerido a retirada.

Ambição desmesurada

No meu livro "Marketing Político e Governamental" cito um pensamento do cientista político Robert Lane, em Political Life, que explica como a ambição desmesurada pelo poder funciona como um bumerangue. "A fim de ser bem-sucedida em política, uma pessoa deve ter habilidades interpessoais para estabelecer relações efetivas com outras e não deve deixar-se consumir por impulsos de poder, a ponto de perder o contato com a realidade. A pessoa possuída por um ardente e incontrolável desejo de poder afastará constantemente os que os que a apoiam, tornando, assim, impossível a conquista do poder".

PT quer Michel no comando

O PT diz uma coisa e faz outra. Na Tribuna, seus líderes pregam o impeachment de Michel Temer. Mas, na surdina, trama pela continuidade, sob a crença de que o presidente "sangrando" conviria mais aos seus desígnios. Mas quem garante este "sangramento" até outubro de 2018?

Avaliação melhor

Este consultor sempre fala de sua equação: BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Bolso cheio, barriga satisfeita, coração agradecido e cabeça aprovando o comandante da jornada. Ou seja, a democracia do pão sobre a mesa, na esteira de uma economia recuperada, melhorará os padrões de avaliação do governo. Essa hipótese é plausível.

Centrão

O Centrão, que reúne os partidos médios do Congresso, deverá ser o bloco mais forte dentro da composição das forças governistas. Seus integrantes deram o maior número de votos ao presidente na sessão de ontem. Deverá ser recompensado.

- "Quando o efeito é bom...ele sempre justifica a ação" (Maquiavel)

Simula e dissimula

O cardeal Mazarino, sucessor de Richelieu e preceptor de Luís XIV, o Rei Sol, começa seu tratado Breviário dos Políticos, que versa sobre a arte de operar a política, com um conselho não muito sagrado: "Simula e dissimula". Esta lição de engodo costuma ser submetida ao crivo da população durante as falas de nossos representantes. Na sessão de ontem, essa estratégia foi muito usada. A simulação e a dissimulação - e aqui já é o ensinamento do filósofo inglês Francis Bacon - ocorrem de três formas: a cautelosa, quando uma pessoa impede que a tomem tal qual é; a negativa, quando expressa sinais de que não é o que é; e a positiva, quando finge e pretende ser o que não é.

Fecho a coluna com o folclórico Newton Cardoso, das Minas Gerais.

Helicóptero

Newton Cardoso assumiu o governo de Minas. No dia seguinte, foi ao aeroporto para viajar no helicóptero da administração estadual. Ao tomar conhecimento de que aquele "trem" tinha o nome de seu adversário, foi logo dando bronca no piloto:

- Não entro de jeito nenhum nesse trem com o nome do Hélio (Hélio Garcia era o governador anterior).

O piloto, constrangido, respondeu:

- Mas governador, esse helicóptero é do governo do Estado e não do ex-governador Hélio.

Newton não quis saber:

- Esse trem agora vai se chamar Newtoncóptero. Falei e tá falado. 

Torquato Gaudêncio, Jornalista e Cientista Político, é Professor na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

A intolerância não perdeu

O Governo Temer ganha novo fôlego e agora vai precisar correr em busca do tempo desperdiçado nos últimos meses, desde quando o Presidente da República, por ingenuidade ou cansaço mental, talvez, digamos assim, concordou em receber à noite, em audiência privada no Palácio do Jaburu, onde reside com a família, um dos irmãos Batista, antigos magarefes no interior de Goiás e que sob as graças dos governos petistas alargaram tanto os seus negócios, diversificando-os com incursões bem sucedidas incluindo iogurtes, sandálias e até aquisições de empresas de outros ramos no exterior, incluindo Estados Unidos da América.

Temer confidenciou a seu advogado, o competente Mariz de Oliveira, que nunca poderia imaginar que aquela audiência fosse parte de um roteiro adrede preparado, uma inimaginável armadilha. Com a experiência de quem fez carreira politica em oposição ao regime militar, tendo servido inclusive como Secretário de Segurança do Governo Montoro, do PMDB, em São Paulo, Temer sempre foi um politico acessível, praticante das boas maneiras, daqueles que sob a boa fé quase não veem a maledicência ambulante.

Numa de suas campanhas eleitorais em São Paulo eu o vi num restaurante indo de mesa em mesa em sorrisos e cumprimentos a distribuir seus santinhos. De outra vez,  Temer, já presidindo o maior partido de oposição do País, aceitou ser Vice na chapa de Luiza Erundina candidata a Prefeita de São Paulo. Lula comentou não entender aquela decisão. A seu ver, Michel Temer poderia estar viajando pelo Brasil promovendo o PMDB para as próximas eleições nacionais ao invés de se restringir à capital paulista como Vice da Erundina.

A conversa meio sem pé nem cabeça, que está na fita que o senhor Batista entregou ao Procurador Geral da República em troca daquele acordo, o qual, saber-se-ia depois, foi o mais vantajoso até então negociado com um delator, ensejou vazamentos extras em primeira mão, coincidentemente ou não, a único repórter da maior rede de comunicações do País, no caso o sistema globo.

De pronto, o Procurador Geral da Republica fez aportar no Supremo Tribunal Federal o pedido para investigar o Presidente da República. Perícias foram feitas por profissionais de grande credibilidade por encomendas dos jornais O Estado de São Paulo e da Folha de São Paulo, o que deu ensejo a graves desconfianças sobre aquela pretensa prova.

A denúncia do Procurador Geral contra o Presidente da Republica, exaustiva pelas centenas de laudas, protocolada no STF, foi remetida à Câmara dos Deputados porque, em se tratando de acusação por crime comum, em tese, praticado no exercício do mandato, o juízo de admissibilidade, em primeiro lugar, tem que ser politico, sujeito, portanto, aos pressupostos da oportunidade e da conveniência politica.

O País vinha praticamente solto no labirinto no qual o atirou a cegueira pelo poder movida pela intolerância de parte dos radicais ditos de esquerda e ditos da direita. E línguas como que de fogo tornando-se inaudíveis, como numa babel invisível, já ousavam ensaios para um apocalipse.

Tão logo foi se tornando clara a tendência para a rejeição da denuncia pela Câmara dos Deputados logo o chefe do Ministério Público fez chegar ao Supremo Tribunal Federal pedido para a inclusão do Presidente Michel Temer no inquérito instaurado contra dois Ministros de Estado filiados ao PMDB.

O resultado da votação pela rejeição da denúncia contra Temer não deixou dúvida. Dos 492 votos apurados, 263 deputados aprovaram o Parecer vencedor da Comissão de Constituição e Justiça, apresentado pelo Deputado Paulinho Abi-Ackel rejeitando a denúncia. 227 votaram não. 2 se abstiveram e 19 deputados não compareceram à sessão.