segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Zelenski: de humorista a herói nacional

Por muito tempo, Volodimir Zelenski foi visto como um ator cômico que tropeçou na presidência. Durante o confronto com a Rússia, no entanto, o homem de 44 anos amadureceu e se tornou um respeitado estadista.

Um ator, um satirista político, subestimado até por seus apoiadores, decide mudar de carreira e concorrer ao cargo público mais alto do país. É quase inconcebível. E, no entanto, esse homem tem algo que falta a muitos políticos – algo que lhe permite brilhar, especialmente em tempos de crise: ele é um excelente comunicador. Muitas das frases de Volodimir Zelenski, o atual presidente da Ucrânia, serão lembradas por muitos anos e acabarão entrando nos livros de história.

Em 12 de junho de 1987, no Portão de Brandemburgo, em Berlim, o ex-ator de Hollywood Ronald Reagan, então presidente dos Estados Unidos, declamou as palavras que, até hoje, são citadas sempre que alguém se refere ao período que encerrou a Guerra Fria: "Senhor Gorbachev, abra este portão, derrube este muro."

Quase 45 anos depois, um homem com experiência em entretenimento semelhante fala com seus compatriotas em mensagens de vídeo como o líder nacional, dirigindo-se a eles como "Pessoas livres! País livre!".

Zelenski diz coisas como: "Nós, ucranianos, somos uma nação pacífica. Mas se ficarmos calados hoje, amanhã partiremos!". Ele critica ferozmente a falta de apoio do exterior: "Precisamos de uma coalizão antiguerra. Estamos defendendo nosso país sozinhos. As forças mais poderosas de todo o mundo estão apenas assistindo".

De "Servo do Povo" a presidente da Ucrânia

Ronald Reagan morreu há 18 anos, mas muitos nos EUA ainda o reverenciam: para eles, ele é praticamente um santo. Zelenski parece estar construindo um status semelhante na Ucrânia. No entanto, não está totalmente claro o que acontecerá com ele nos próximos dias e semanas. Circulam relatos de que a Rússia pretende matá-lo. O próprio Zelenski especulou que um dos objetivos do ataque russo é derrubá-lo, e disse que o inimigo o declarou seu alvo número um.

Apenas alguns anos atrás, Zelenski era um ator e artista, que satirizou a corrupção e a má administração na Ucrânia ao interpretar o presidente ucraniano na popular série de televisão ucraniana O Servo do Povo. Eleito em 2019 como presidente, ele rapidamente se tornou um estadista sério, que parece capaz de dar o tom certo as suas falas, sem esforço, mesmo em momentos de crise. Talvez seja justamente porque, antes de se tornar presidente, ele era um ator cômico, apresentador e um artista com talento retórico notável, o que lhe permite usar as palavras para obter o maior impacto possível.

Zelenski durante um exercício militar em Rivne, no norte da Ucrânia, em 16 de fevereiro (Foto: AP/picture alliance)

Zelenski como um excelente comunicador

Com a invasão russa, a situação na Ucrânia parece cada vez mais perigosa. E cada um dos apelos de Zelenski tem sido mais urgente e apaixonado do que o anterior. Observadores consideram seu discurso logo após o início da invasão russa como o melhor de sua vida. Emotivo, destemido e resoluto, ele disse às tropas russas: "Se vocês atacarem, verão nossos rostos, não nossas costas!"

O presidente ucraniano também domina perfeitamente a arte de se comunicar via Twitter. A cada poucas horas, escreve declarações concisas para o mundo. Ao meio-dia de sexta-feira, por exemplo, agradeceu a Suécia em ucraniano e inglês por sua assistência militar, técnica e humanitária, concluindo que eles estavam "construindo juntos uma coalizão anti-Putin".

Duelo de mídia com Vladimir Putin

É parte da história paradoxal desta guerra que, enquanto em termos militares a Ucrânia está irremediavelmente atrás dos russos, quando se trata de retórica, Zelenski derrota Putin. Após o discurso confuso de uma hora do presidente russo, no qual ele reconheceu as regiões separatistas do leste da Ucrânia como "independentes", o ucraniano Zelenski assegurou a seus compatriotas: "Não entrem em pânico! Estamos fortes e prontos para qualquer coisa. Vamos derrotar todos, porque nós somos a Ucrânia!" e, ao fazê-lo, evitou o pânico em massa.

Quando o presidente russo fala de alegações infundadas de "genocídio" no leste da Ucrânia e em "desnazificação" como pretexto para a guerra, soa como pura zombaria, especialmente para Zelenski. O chefe de Estado ucraniano – que cresceu em uma família de língua russa – é judeu. Seu avô, que esteve no Exército Vermelho, perdeu três irmãos no Holocausto.

Zelenski, ao lado de Merkel, Macron e Putin em Paris, em 2019 (Foto: picture-alliance/AP Photo/C. Platiau_

No passado, aprovação no fundo do poço

Zelenski provavelmente nunca foi tão popular na Ucrânia quanto agora. No entanto, antes da guerra com a Rússia, muitos de seus compatriotas estavam tudo menos satisfeitos com seu chefe de Estado. Ele foi incapaz de cumprir a promessa ambiciosa que fez há três anos, de acabar com o conflito no leste da Ucrânia.

O progresso previsto nos acordos de Minsk não se concretizou - em vez disso, os acordos gradualmente se desintegraram completamente.

Além disso, o escândalo em torno dos Pandora Papers, nos quais Zelenski e pessoas próximas a ele estariam envolvidos, não passou despercebido. Uma investigação de uma rede internacional de jornalistas revelou que Zelenski possui empresas offshore que foram pagas indiretamente por um oligarca. 

Guerra Fria se aproxima novamente

No final da década de 1970, Ronald Reagan era visto como um homem ultrapassado. Tinha falhado duas vezes em ser o candidato presidencial republicano, perdendo as primárias para Richard Nixon, em 1968, e Gerald Ford, em 1976. Mas então, em 1979, a União Soviética invadiu o Afeganistão, a Guerra Fria estourou novamente e, um ano depois, Reagan venceu a eleição dos EUA contra o então presidente democrata Jimmy Carter.

Mais de quatro décadas depois, após o ataque da Rússia à Ucrânia, o mundo enfrenta uma nova versão da Guerra Fria. E o papel de Volodimir Zelenski ainda não foi determinado.

De Oliver Pieper  para a Deutsche Welle Brasil. Publicado originalmente, em 27.02.22.

Últimas notícias: Ucrânia pede para entrar na UE

País quer ser aceito como membro da UE. Negociação entre Rússia e Ucrânia termina sem avanços. Assembleia-Geral da ONU realiza reunião de emergência sobre a guerra. Acompanhe as últimas notícias.

Negociação entre Rússia e Ucrânia termina sem avanços

Hungria diz que não vai permitir trânsito de armas à Ucrânia em seu território

Suíça adota as mesmas sanções da UE contra a Rússia

Assembleia-Geral da ONU terá reunião de emergência sobre guerra na Ucrânia

UE planeja conceder visto de três anos a ucranianos

Ucrânia pede adesão imediata à UE

Sanções da UE contra Banco Central da Rússia entram em vigor

Google desativa funções em tempo real para proteger população ucraniana

Kiev e Kharkiv amanhecem ao som de explosões


As atualizações estão no horário de Brasília

17:00 – Mônaco anuncia congelamento de ativos de alguns russos

Mônaco, um paraíso fiscal no Mediterrâneo que atrai muitos bilionários, irá congelar ativos e aplicar sanções contra alguns russos, informou o Palácio Real de Mônaco nesta segunda-feira.

Segundo um comunicado, o príncipe Albert ir apoiar os esforços para pressionar a Rússia a retirar suas tropas da Ucrânia. "O Principado adotou e implementou, sem atraso, procedimentos para congelar fundos e [aplicar] sanções econômicas idênticas às adotadas pela maioria dos países europeus", afirma o texto.

O Palácio Real de Mônaco não informou quem seriam os russos afetados pelas medidas.

16:45 – Companhias petrolíferas rompem parcerias com Rússia

Três grandes companhias petrolíferas anunciaram que o rompimento de parcerias com empresas russas do setor.

A primeira foi a BP, que no domingo anunciou que iria se desfazer de sua participação de 19,75% na estatal russa de petróleo Rosneft, como resultado do "ato de agressão na Ucrânia". 

A empresa, que tinha uma parte da estatal russa desde 2013, estava sob pressão do governo britânico para encerrar o vínculo com a Rosneft. O presidente da BP, Bernard Looney, renunciou ao seu assento no conselho da Rosneft "com efeito imediato".

Nesta segunda-feira, a Shell também anunciou que iria se desfazer de suas operações na Rússia, inclusive uma joint venture em uma grande planta industrial de gás natural liquefeito, a Sakhalin 2 LNG, da qual a empresa possui 27,5%. A planta é operada pela gigante russa do gás Gazprom.

A Shell também pretende deixar sua participação no gasoduto Nord Stream 2, que liga a Rússia à Alemanha e já está concluído, mas não chegou a entrar em operação e foi bloqueado após a invasão da Ucrânia por tropas russas.

"Estamos chocados pela perda de vidas na Ucrânia, que deploramos, como resultado de um ato de agressão militar sem sentido que ameaça a segurança europeia", afirmou o presidente da Shell, Ben van Beurden, em um comunicado.

Também nesta segunda, a empresa norueguesa de energia Equinor afirmou que interrompeu novos investimentos na Rússia e que iria se desfazer de suas participações em operações no país. A empresa é parceira da Rosneft desde 2012 e no final de 2012 tinha 1,2 bilhão de dólares em ativos não circulantes na Rússia.

“Estamos todos profundamente preocupados com a invasão da Ucrânia”, declarou o presidente da Equinor, Anders Opeda, em um comunicado.

15:20 – Ucrânia pede para entrar na União Europeia

A Ucrânia pediu oficialmente nesta segunda-feira (28/02) à União Europeia que autorize a sua adesão como país-membro do bloco, em um movimento para tentar consolidar os vínculos entre os ucranianos eo  Ocidente. O presidente Volodimir Zelenski divulgou fotos dele assinando o pedido formal.

A iniciativa é em grande medida simbólica, pois a análise do processo pela União Europeia deve demorar anos, e se opõe à intenção do presidente russo, Vladimir Putin, de manter a Ucrânia sob sua esfera da influência.

16:00 – Ucrânia oferece anistia e dinheiro a soldados russos que baixarem armas

O ministro da Defesa da Ucrânia, Oleksii Reznikov, enviou nesta segunda-feira uma mensagem aos soldados russos que estão na Ucrânia, e afirmou que os que voluntariamente baixarem suas armas receberão anistia total e compensação monetária. "Aqueles de vocês que não querem se tornar um assassino e morrerem podem se salvar", escreveu Reznikov em uma rede social.

Na sexta-feira, o presidente russo, Vladimir Putin, também enviou uma mensagem aos soldados ucranianos. Em um pronunciamento, ele os instou a dar um golpe de Estado e assumir o poder em Kiev. "Não deixe que os banderites e os neonazistas tomem como reféns seus filhos e mulheres. Tomem o poder com suas próprias mãos", disse o líder russo.

14:20 – Primeira rodada de negociação entre Rússia e Ucrânia é encerrada

Representantes dos governos da Ucrânia e da Rússia concluíram uma reunião realizada na fronteira de Belarus nesta segunda-feira.

Agora, os representantes retornam às suas respectivas capitais para consultas, antes de uma segunda rodada de conversas, segundo a agência de notícias russa RIA.

Um dos representantes da Ucrânia na reunião, Mykhailo Podolyak, afirmou após o encontro que as negociações são difíceis. 

O governo de Kiev pediu um cessar-fogo imediato e a retirada das forças russas da Ucrânia. 

14:10 - Finlândia e Noruega decidem enviar armas para Ucrânia

A Finlândia, que não integra a Otan e tem cerca de 1,3 mil quilômetros de fronteira com a Rússia, decidiu nesta segunda-feira fornecer armas para a Ucrânia, em meio à invasão do país por forças russas.

A primeira-ministra finlandesa, Sanna Marin, afirmou tratar-se de uma decisão "histórica". "A Finlândia irá fornecer assistência militar à Ucrânia", disse. O país enviará inicialmente 2,5 mil fuzis, 150 mil balas e 1,5 mil armas antitanque.

Em seguida, a Noruega, que integra a Otan, também decidiu enviar armas à Ucrânia. A iniciativa reverte uma política em vigor desde os anos 1950 na Noruega que impedia o envio de armas a países não membros da Otan que estejam em guerra ou sob risco de conflito armado.

13:45 – Putin apresenta a Macron suas condições para acordo sobre Ucrânia

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, apresentou ao presidente da França, Emmanuel Macron, durante uma conversa por telefone nesta segunda-feira, suas condições para encerrar a guerra na Ucrânia.

Putin quer que a Ucrânia declare-se neutra entre a Rússia e o Ocidente e seja "desmilitarizada" e "desnazificada". 

Além disso, o controle da Rússia sobre a península da Crimeia, tomada à força por militares russos da Ucrânia em 2014, precisaria ser formalmente reconhecido. 

Na conversa, Macron disse ser necessário que a Rússia interrompa ataques contra pessoas, edifícios e infraestrutura civis na Ucrânia e pediu um cessar-fogo imediato.

13:30 – Putin amplia o controle sobre fluxo de capitais na Rússia

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, proibiu nesta segunda-feira (28/02) que moradores e empresas na Rússia contraiam empréstimos em moeda estrangeira, e que moradores do país transfiram divisas para fora do país.

O Kremlin afirma que as medidas são uma retaliação às sanções econômicas impostas pelo Ocidente contra a Rússia, que incluem o congelamento de ativos do Banco Central russo na União Europeia e nos Estados Unidos e a exclusão de instituições financeiras russas da rede de comunicações bancárias. 

As novas normas entram em vigor nesta terça-feira, e também constituem uma tentativa de evitar fuga de capitais do país.

O presidente russo sancionou ainda uma lei que obriga as empresas exportadoras na Rússia a venderem no país 80% da moeda estrangeira obtida por elas como receita desde 1º de janeiro. O objetivo é suprir a falta de dólares, euros e outras moedas provocada pelas sanções do Ocidente.

12:50 – Em Colônia, em vez de carnaval, marcha pela paz na Ucrânia

Segundo números divulgados pela polícia local, em torno de 250 mil pessoas marcharam em solidariedade à Ucrânia na cidade alemã de Colônia nesta segunda-feira (28/02). O protesto ocorreu em substituição à tradicional celebração de carnaval Rosenmontag ("segunda-feira de rosas”).

O carnaval de rua de Colônia havia sido mais uma vez cancelado este ano devido à pandemia de coronavírus. Entretanto, os organizadores decidiram realizar uma marcha pela paz por causa do conflito na Ucrânia.

A imagem panorâmica mostra uma grande aglomeração de pessoas em uma rua da cidade alemã de Colônia. A maioria delas veste as cores azul e amarelo, em protesto pela paz na Ucrânia, e também carregam bandeiras do país do Leste Europeu.A imagem panorâmica mostra uma grande aglomeração de pessoas em uma rua da cidade alemã de Colônia. A maioria delas veste as cores azul e amarelo, em protesto pela paz na Ucrânia, e também carregam bandeiras do país do Leste Europeu.

Festa do carnaval de rua foi substituída por uma marcha pela paz na Ucrânia, na cidade de Colônia, AlemanhaFoto: Susan Bonney-Cox/DW

12:30 – COI recomenda que atletas de Rússia e Belarus fiquem fora de competições

O Comitê Olímpico Internacional (COI) recomendou nesta segunda-feira que federações e organizadores de competições "não convidem, nem permitam a participação de atletas ou dirigentes da Rússia ou Belarus".

A medida, de acordo om informações divulgadas pelo Comitê Executivo da entidade, o objetivo é "proteger a integridade das competições esportivas mundiais e a segurança de todos os participantes".

Além disso, a instância máxima do COI decidiu retirar a principal condecoração, a Ordem Olímpica, a todos os membros do governo da Rússia que a receberam, entre eles, o presidente do país, Vladimir Putin, e o vice-primeiro-ministro, Dmitry Chernyshenko.

O Comitê Olímpico Internacional apontou, em comunicado, que o desejo é "não punir atletas pelas decisões do governo, se não participam ativamente delas", no entanto, admite que a guerra na Ucrânia deixa o Movimento Olímpico "em um dilema".

"Enquanto que os esportistas de Rússia e Belarus poderiam seguir participando em competições, muitos da Ucrânia estão impedidos, devido ao ataque ao seu país", indica comunicado do Comitê Executivo. "Trata-se de um dilema que não tem solução", completa a nota.

A recomendação é que russos ou bielorrussos, seja individual ou coletivamente, "devem ser aceitos unicamente como atletas ou equipes neutras. Não devem ser exibidos símbolos, cores, bandeiras ou hinos nacional".

11:55 – Ministra alemã do Exterior comenta ações contra a Rússia

Em uma entrevista coletiva de imprensa nesta segunda-feira (28/02), a ministra alemã do Exterior, Annalena Baerbock, disse que "Putin não esperava que estivéssemos tão determinados", enfatizando a resposta unificada e as sanções impostas contra a Rússia pela União Europeia e outros países, como Estados Unidos e Canadá, devido à invasão russa à Ucrânia.

"A guerra de Putin é um ponto de virada e é absolutamente apropriado para nós reavaliar tudo que pensávamos saber com certeza", acrescentou Baerbock.

A ministra ressaltou ainda que a Europa está pronta para receber todos os refugados vindos da Ucrânia, não somente ucranianos, e afirmou que está analisando os problemas relatos por civis, especialmente negros, que estão sendo impedidos de entrar nos países vizinhos.

11:35 – Hungria diz que não vai enviar tropas ou armas para a Ucrânia

O ministro das Relações Exteriores da Hungria, Peter Szijjarto, disse nesta segunda-feira (28/02) que o país não deve enviar tropas ou armamentos para a Ucrânia. Além disso, Szijjarto também anunciou que o governo não vai permitir o trânsito de armas através do território húngaro rumo à Ucrânia.

"A razão para tomar essa decisão é que repasses podem virar alvos de ações militares. Nós temos de assegurar a segurança da Hungria, (mostrar que) não estamos envolvidos nesta guerra", afirmou Szijjarto, após encontro com a ministra das Relações Exteriores de Kosovo, Donika Gervalla.

11:00 – Kiev exige retirada de tropas russas do país

As negociações entre russos e ucranianos começaram na fronteira de Belarus nesta segunda-feira, com o governo de Kiev pedindo um cessar-fogo imediato e a retirada das forças russas da Ucrânia. 

A delegação russa é chefiada pelo enviado especial do Kremlin, Vladimir Medinsky, enquanto o lado ucraniano é representado por Davyd Arakhamia, que lidera o partido do presidente Volodomir Zelenski no parlamento ucraniano.

10:55 – Suíça adota as mesmas sanções da UE contra a Rússia

A Suíça divulgou nesta segunda-feira que vai adotar as mesmas sanções econômicas já aplicadas pela União Europeia contra a Rússia. A decisão ocorreu no Conselho Federal, em Berna, devido à invasão russa à Ucrânia.

As sanções da União Europeia ao Banco Central russo entraram em vigor na madrugada desta segunda-feira. Segundo a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, as restrições incluem a proibição de transações com o instituto financeiro.

Além disso, todos os ativos do banco na UE deverão ser congelados para impedir o financiamento da guerra do presidente Vladimir Putin contra a Ucrânia.

As sanções são consideradas tão pesadas quanto a exclusão de instituições financeiras russas da rede de comunicações bancárias Swift.

Após a resolução, autoridades suíças concluíram que é improvável que a Rússia utilize armas nucleares contra o Ocidente em meio à invasão à Ucrânia. A declaração foi feita pela ministra da Defesa da Suíça, Viola Amherd.

"É claro que estamos observando todos os cenários, mas nossas investigações indicam que a probabilidade de essas armas serem usadas é baixa", disse Amherd, durante entrevista coletiva de imprensa em Berna.

10:15 – Rússia fecha espaço aéreo para ao menos 36 países

A Rússia anunciou que vai fechar o seu espaço aéreo para companhias da Alemanha e outros 35 países. A proibição será aplicada, por exemplo, para França, Espanha, Itália e Canadá. A União Europeia e o Canadá já haviam fechado o espaço aéreo para aeronaves ou linhas aéreas russas no final de semana.

08:55 – Mais de meio milhão de pessoas deixaram a Ucrânia, diz ONU

O alto comissário das Nações Unidas para Refugiados, Filippo Grandi, informou que mais de 500 mil pessoas já fugiram da guerra na Ucrânia para países vizinhos.

Até agora, a maioria se dirigiu à Polônia, com mais de 281 mil chegadas desde que a guerra estourou, segundo a guarda de fronteira polonesa. Apenas no domingo, quase 100 mil pessoas teriam cruzado a fronteira Ucrânia-Polônia.

O porta-voz do Alto-comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), Chris Melzer, acrescentou que outras centenas de milhares de pessoas se deslocaram dentro do território ucraniano, mas não foi possível dar um número concreto.

Refugiados da Ucrânia atravessam a fronteira com a Polônia (Foto: Czarek Sokolowski/AP Photo/picture alliance)

08:05 – Começa reunião entre russos e ucranianos

Autoridades russas e ucranianas informaram que teve início nesta segunda-feira a primeira reunião entre os dois lados desde que Moscou invadiu a Ucrânia, na semana passada. O Ministério do Exterior da Rússia publicou fotos de ambas as delegações sentadas à mesa.

O encontro ocorre na cidade de Gomel, em Belarus, perto da fronteira com a Ucrânia.

A Ucrânia disse que seu objetivo nas negociações é um cessar-fogo imediato e a retirada das forças russas de seu território. Já a Rússia tem sido mais cautelosa, com o Kremlin se recusando a comentar suas intenções no diálogo com Kiev.

07:25 – Nigéria condena relatos de racismo na fronteira ucraniana

A Nigéria fez um apelo nesta segunda-feira para que autoridades fronteiriças da Ucrânia e de países vizinhos tratem seus cidadãos de forma igualitária, em meio a uma série de relatos de discriminação racial contra africanos que fogem da invasão russa.

Cidadãos da Nigéria, Gana e outros países africanos, a maioria estudantes, se juntaram às centenas de milhares de pessoas que tentam fugir da Ucrânia por meio das fronteiras terrestres com a Polônia e outras nações.

"Há relatos infelizes de policiais e seguranças ucranianos se recusando a permitir que nigerianos embarquem em ônibus e trens em direção à fronteira Ucrânia-Polônia", afirmou um comunicado do governo nigeriano. "Em um vídeo amplamente divulgado nas redes sociais, uma mãe nigeriana com seu bebê foi filmada sendo fisicamente forçada a ceder seu assento a outra pessoa."

O texto também diz haver relatos separados de autoridades polonesas que negam a entrada de cidadãos nigerianos na Polônia vindos da Ucrânia. "É fundamental que todos sejam tratados com dignidade e sem favores."

A embaixadora da Polônia na Nigéria, Joanna Tarnawska, rejeitou as alegações de tratamento injusto. "Todos recebem tratamento igual. Posso garantir que tenho relatos de que alguns cidadãos nigerianos já cruzaram a fronteira para a Polônia", disse ela à mídia local.

07:02 – UE planeja conceder visto de três anos a ucranianos

A União Europeia (UE) está se preparando para conceder aos ucranianos que fogem da guerra o direito de ficar e trabalhar nos Estados-membros do bloco por até três anos, afirmaram autoridades francesas e europeias.

Ao menos 300 mil refugiados ucranianos entraram na UE desde a invasão russa da Ucrânia na semana passada, e o bloco se prepara para a chegada de outros milhões, segundo as autoridades. 

"É nosso dever receber aqueles que fogem da guerra", disse o ministro francês do Interior, Gérald Darmanin, em entrevista a uma emissora francesa.

Segundo ele, a Comissão Europeia foi encarregada no domingo de preparar propostas preliminares para conceder proteção a esses ucranianos. Os ministros europeus do Interior deverão se reunir novamente nesta terça-feira para ajustar os detalhes.

"Todos os Estados-membros da UE estão preparados para receber refugiados da Ucrânia", afirmou a ministra alemã do Interior, Nancy Faeser. "Essa é uma forte resposta da Europa ao sofrimento terrível que Putin inflige com sua guerra criminosa de agressão: juntos, nos solidarizamos com o povo da Ucrânia."

Com homens em idade de alistamento militar impedidos de deixar o país, principalmente mulheres e crianças estão chegando às fronteiras dos quatro países-membros que têm fronteiras terrestres com a Ucrânia: Polônia, Romênia, Eslováquia e Hungria.

06:40 – Ucrânia pede adesão imediata à UE

O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, pediu nesta segunda-feira a adesão "imediata" da Ucrânia à União Europeia (UE) sob um "novo procedimento especial".

"Nosso objetivo é estar junto de todos os europeus e, mais importante, estar em pé de igualdade. Tenho certeza de que é justo. Tenho certeza de que é possível", afirmou Zelenski em um novo discurso em vídeo.

O presidente também afirmou que 4.500 soldados russos foram mortos até agora durante o ataque de Moscou contra a Ucrânia.

05:52 – Moeda russa tem desvalorização recorde

O rublo, a moeda russa, despencou na manhã desta segunda-feira nos mercados internacionais, perdendo um quarto de seu valor, pressionada pelas sanções internacionais contra Moscou por causa da invasão russa da Ucrânia. 

No início das negociações nos mercados asiáticos, a moeda chegou a perder quase um terço de seu valor em comparação com a sexta-feira passada, uma desvalorização recorde. Logo depois, conseguiu se recuperar ligeiramente.

Para responder à desvalorização do rublo, o Banco Central russo aumentou a taxa básica de juros de 9,5% para 20%.

05:25 – Rússia reivindica cidades, Ucrânia defende aeródromo

As forças russas tomaram as cidades de Berdyansk e Enerhodar, na região de Zaporizhzhya, no sudeste da Ucrânia, bem como a área ao redor da usina nuclear de Zaporizhzhya, afirmou a agência de notícias russa Interfax citando o Ministério da Defesa da Rússia nesta segunda-feira. As operações da usina continuaram normalmente.

Enquanto isso, o Ministério da Defesa do Reino Unido disse que o avanço da Rússia em Kiev foi retardado por falhas logísticas e forte resistência ucraniana.

"A maior parte das forças terrestres de Putin permanece a mais de 30 quilômetros ao norte de Kiev, seu avanço foi retardado pelas forças ucranianas que defendem o aeródromo de Hostomel, um alvo essencial da Rússia no primeiro dia do conflito", disse o ministério britânico. "Falhas logísticas e firme resistência ucraniana continuam frustrando o avanço russo."

Os militares ucranianos ainda acusaram Moscou de lançar um ataque com mísseis contra edifícios residenciais nas cidades de Zhytomyr e Chernigiv, cidades no noroeste e norte do país.

"Ao mesmo tempo, todas as tentativas dos invasores russos de atingir o objetivo da operação militar falharam", afirmaram os militares. "O inimigo está desmoralizado e sofre pesadas perdas."

05:00 – Rússia diz querer acordo interessante para as duas partes

A Rússia tem interesse em chegar a um acordo que seja interessante para ambas as partes nas negociações com a Ucrânia, afirmou o negociador russo Vladimir Medinsky.

Autoridades russas e ucranianas deverão se reunir perto da fronteira ao meio-dia (hora local, 6h em Brasília) desta segunda-feira, segundo Medinsky. 

04:08 – Líder de Belarus conquista mais poder em controverso referendo 

O presidente de Belarus, Alexander Lukashenko, ganhou mais poder após um controverso referendo neste domingo para mudar a Constituição do país.

A comissão eleitoral em Minsk disse que cerca de 65% dos votos foram dados a favor da mudança constitucional, informou a agência de notícias Tass. Apenas 10% teriam votado contra a mudança.

A mudança dá a Lukashenko imunidade vitalícia contra processos e punições. Permite também que ele garanta mais tempo no cargo.

A emenda também permite que tropas e armas nucleares russas sejam estacionadas em Belarus. Lukashenko governa o país desde 1994, sendo conhecido como "o último ditador da Europa". 

03:47 – UE financiará 450 milhões de euros em armas à Ucrânia

A União Europeia (UE) concordou neste domingo em conceder 450 milhões de euros (R$ 2,6 bilhões) para financiar o fornecimento de equipamento militar letal à Ucrânia, e outros 50 milhões de euros (R$ 288 milhões) para equipamento não letal, como combustível e equipamento de proteção.

Segundo o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, o montante será coberto pelo Fundo Europeu para a Paz e pelo fundo intergovernamental, que conta com 5 bilhões de euros para usar entre 2021 e 2027 e é financiado pelos Estados-membros, não pelo orçamento da UE.

O chefe da diplomacia europeia salientou que esta é "a primeira vez na história" que a UE vai financiar conjuntamente esse tipo de equipamento, para o que "todos concordaram ou, pelo menos, não obstruíram esta decisão".

Borrell também disse que a Polônia, país que faz fronteira com a Ucrânia, se ofereceu como centro logístico para montar o equipamento antes de sua entrega aos ucranianos, e acrescentou que nesta segunda-feira os ministros de Defesa do bloco se reúnem para discutir os detalhes.

01:51 – Banco russo Sberbank perto da falência

Segundo informações do Banco Central Europeu (BCE), a filial europeia do banco russo Sberbank e seus braços na Croácia e na Eslovênia estão insolventes ou deverão abrir falência em breve, por causa de saques de depósitos causados pela guerra na Ucrânia e pelas sanções ocidentais. 

Os levantamentos levaram a uma "deterioração da liquidez" do banco e "não há meios disponíveis" que deem uma "oportunidade realista" de regressar aos cofres da instituição, comunicou o organismo de supervisão bancária do BCE, em comunicado.  

Assim, o regulador austríaco FMA impôs "uma moratória" à filial europeia, impedindo "quaisquer levantamentos, transferências ou outras transações" até pelo menos quarta-feira (02/02). Ao abrigo dos regulamentos da UE, os depósitos de particulares são garantidos até 100 mil euros. 

Desde quinta-feira passada (24/02), dia do início da invasão russa à Ucrânia, os dois maiores bancos russos, Sberbank e VTB Bank, têm sido alvo de pesadas sanções dos Estados Unidos para limitar severamente as transações internacionais.  

As sanções contra o sistema bancário russo foram, desde então, reforçadas, com o anúncio, no fim de semana, de que alguns bancos seriam banidos do sistema Swift. 

O Sberbank Europe AG é propriedade exclusiva da matriz russa do banco.

As filiais na Bósnia-Herzegovina, República Checa, Hungria e Sérvia também seriam afetadas por uma falência, mas não são abrangidas pela jurisdição do BCE.

01:42 – Google desativa funções em tempo real para proteger população ucraniana

A empresa Alphabet, dona do Google, anunciou que vai desativar temporariamente algumas funções que fornecem informações em tempo real sobre condições de trânsito e engarrafamentos de diferentes localidades. 

Após coordenação com diversas organizações, incluindo autoridades regionais, a decisão teria sido tomada para proteger a população ucraniana, já que é possível visualizar engarrafamentos pelo Google Maps. As imagens poderiam servir para a vigiar a movimentação de tropas russas e ucranianas, assim como rotas de fuga.

Rússia ataca também com hackers e fake news

01:34 – Preço do petróleo registra alta com invasão russa da Ucrânia

O preço do petróleo mundial registrou forte aumento devido à guerra na Ucrânia. Na madrugada desta segunda-feira, o preço do barril WTI (West Texas Intermediate) subiu mais de 5%, para 96,23 euros. O preço do barril tipo Brent aumentou mais de 4%, para 102,14 dólares. 

Ao mesmo tempo em que países ocidentais impuseram severas sanções a Moscou, a Arábia Saudita reforçou sua aliança com a Rússia no ramo do petróleo, no âmbito da Opep+, uma união dos 13 países-membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e de mais dez países, incluindo a Rússia. Os países tentam influenciar o preço do petróleo por meio de acordos. Os 23 membros da Opep+ debaterão sobre um possível aumento da produção nesta segunda-feira.

00:53 – Japão considera impor sanções a Belarus, aliado da Rússia

O Japão considera impor sanções também a Belarus, aliado da Rússia, depois de já ter adotado restrições contra Moscou em linha com as ações de parceiros de Tóquio como os Estados Unidos. 

O Japão também faz parte dos países que excluíram bancos russos do sistema Swift. 

O premiê japonês, Fumio Kishida, afirmou nesta segunda-feira que seu governo deverá tomar uma decisão em breve. 

Belarus, vizinho de Kiev e de Moscou, apoia a invasão russa da Ucrânia e permitiu que tropas de Moscou usassem seu território como base para atacar a Ucrânia pelo norte. 

Em referendo realizado no domingo, 65% dos belarussos que participaram da votação se disseram a favor da eliminação do status de "não nuclear" do país. Se entrar em vigor, a decisão permitirá o estacionamento de armas nucleares em solo belarusso pela primeira vez desde que o país devolveu à Rússia as ogivas que herdou após a queda da União Soviética, em 1991.

00:38 – Sanções da UE contra Banco Central da Rússia entram em vigor

As sanções da União Europeia ao Banco Central russo entraram em vigor na madrugada desta segunda-feira. Segundo a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, as restrições incluem uma proibição de transações com o instituto financeiro. 

Além disso, todos os patrimônios do banco na UE deverão ser congelados para impedir o financiamento da guerra do presidente Vladimir Putin contra a Ucrânia.

As sanções são consideradas tão pesadas quanto a exclusão de instituições financeiras russas da rede de comunicações bancárias Swift.

Publicado originalmente por Deutsche Welle Brasil, em 28.02.22

Negociações sobre cessar-fogo terminam sem decisão; veja os últimos acontecimentos da guerra na Ucrânia

Os dois lados ainda não tinham se reunido desde que o começo da guerra, mas as expectativas de um cessar-fogo não eram altas.

Primeira reunião para negociar acordo de paz foi realizada em Belarus (EPA)

A invasão da Ucrânia pela Rússia entrou nesta segunda-feira (28/2) no seu quinto dia com o primeiro encontro entre representantes de Kiev e Moscou em Belarus para discutir um armistício entre os dois países.

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, havia dito antes do encontro que seu país queria um cessar-fogo imediato e a retirada das tropas russas do seu território.

O Kremlin afirmou, por sua vez, que não anteciparia sua posição — os negociadores russos falaram apenas em fechar um acordo que seja do interesse de ambos os lados.

Mas o próprio Zelensky disse mais cedo não acreditar que as discussões produzam resultados. E declarou que as "próximas 24 horas serão cruciais" para o país.

Agora, ambos os lados retornarão às suas capitais para consultas antes de uma segunda rodada de negociações, que pode ocorrer nos próximos dias, segundo a agência de notícias Reuters.

A BBC News Brasil apresenta a seguir os acontecimentos mais recentes e importantes do conflito e as perspectivas do que está por vir.

Capital segue sob controle ucraniano, mas russos se aproximam

Militares patrulham as ruas da capital (EPA)

Kiev, a principal cidade do país ainda permanece nas mãos da Ucrânia, mas as tropas russas vêm se aproximando e estão posicionadas a somente 30 km de distância.

O toque de recolher foi suspenso na manhã de segunda-feira (28/2), quando milhares de pessoas puderam deixar seus abrigos subterrâneos, como porões e estações de metrô, onde a maioria da população procurou se proteger.

Mas, apenas meia hora depois, as sirenes de ataque aéreo soaram, e elas precisaram voltar correndo.

O prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, chegou a dizer que a capital estava "cercada" por tropas russas e que a retirada de civis da cidade era um desafio porque todas as rotas de saída estavam bloqueadas.

Após a repercussão da entrevista, dada à agência de notícias AP, Klitschko escreveu em um post no Telegram não ser aquela a situação: "Publicações russas na internet espalham informações atribuídas a mim de que Kiev está supostamente cercada e a evacuação de pessoas é impossível. Não acreditem em mentiras! Confie apenas em informações de fontes oficiais".

Batalhas estão sendo travadas em outras cidades do país

Russos e ucranianos disputam controle de Kharkiv (EPA)

A cidade de Chernihiv, no nordeste da Ucrânia, enfrentou fortes bombardeios das tropas russas durante a noite de domingo (27/2), e um edifício residencial foi atingido por um míssil.

A cidade permanece, no entanto, sob controle ucraniano até o momento.

Relatórios sinalizam que militares russos tomaram a cidade de Berdyansk, no sul do país.

Também foram registradas explosões nesta manhã em Kharkiv, no leste do país, onde dezenas de civis foram mortos e centenas ficaram feridos, segundo as autoridades ucranianas.

Kharkiv é a segunda maior cidade ucraniana. O governo local declarou que os militares conseguiram recuperar o controle após ataque de tropas russas.

A situação é bastante fluida, no entanto, e é difícil verificar de forma independente quem está controlando a cidade de fato.

Alguns civis também disseram à BBC que Kharkiv está sob controle ucraniano e que o conflito nas ruas está diminuindo.

Anton Herashchenko, conselheiro do ministro do Interior de Kiev, escreveu no Facebook que as tropas russas atacaram áreas residenciais com mísseis.

Não é possível dizer neste momento exatamente quantos civis já foram mortos.

A alta-comissária de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), Michelle Bachelet, informou mais cedo que pelo menos 102 civis morreram, e outras 304 pessoas ficaram feridas.

"A maioria destes civis foi morta por armas explosivas com uma ampla área de impacto, incluindo bombardeios de artilharia pesada e sistemas de multilançamento de foguetes e ataques aéreos. Os números reais são, eu receio, consideravelmente mais altos", afirmou Bachelet.

Ministro do Interior da Ucrânica: 'Situação é grave, mas estável'

O ministro do Interior ucraniano falou à BBC

O ministro do Interior ucraniano, Denys Monastyrskyy, disse à BBC que seu país está se preparando para um ataque russo ainda mais poderoso, incluindo em Kiev e em outras cidades.

"Todos os dias o presidente me pergunta, todos os dias coordenamos nossos esforços, sobre a situação e o que está acontecendo, e todos os dias respondemos que a situação é grave, mas estável", disse ele.

"Sim, de fato, todos os dias o inimigo envia mais e mais forças. Mas nossas gloriosas forças armadas estão basicamente destruindo tudo o que chega a Kiev. Kiev continua sendo o local do ataque principal..."

"Estamos criando grupos móveis para procurar e capturar sabotadores. Temos até 100 desses grupos ativos em Kiev, dependendo da hora do dia. Você pode ouvir tiros na cidade [enquanto eles operam]. Muitas pessoas são capturadas, nossos especialistas estão trabalhando com elas."

Europa envia armas à Ucrânia

Ursula von der Leyen anunciou novas sanções da UE à Rússia

A União Europeia está tomando a medida sem precedentes de enviar armas para a Ucrânia, fechar o espaço aéreo para aeronaves russas e proibir os meios de comunicação estatais russos.

Será a primeira vez em sua história que o bloco comprará armamentos para entregar a uma nação em guerra.

Ao anunciar a medida, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também divulgou uma série de novas sanções contra a Rússia, entre elas o fechamento do espaço aéreo europeu também para aeronaves de Belarus, que ajudou na invasão russa.

A Suécia anunciou o envio de 5 mil lançadores de mísseis antitanque, 5 mil coletes, 5 mil capacetes e 135 mil pacotes de ração militar à Ucrânia.

Segundo a primeira-ministra do país, Magdalena Andersson, esta é a primeira vez que a Suécia manda armas para uma região em conflito desde a invasão soviética à Finlândia em 1939.

Ministros europeus se reúnem para debater a crise

O representante da União Europeia para assuntos externos e política de segurança convocou uma reunião com os ministros da Defesa do bloco para discutir o conflito na Ucrânia.

A agenda se concentrará em "necessidades urgentes" e na coordenação da assistência do bloco aos ucranianos.

Baixas nas forças russas

A Ucrânia divulgou uma estimativa de perdas russas que teriam sido provocadas pelos ucranianos até agora.

A BBC não conseguiu verificar de forma independente essas alegações — e a Rússia não divulgou números de vítimas.

Segundo post publicado no domingo no Facebook da vice-ministra da Defesa da Ucrânia, Hanna Malyar, os russos perderam: 4,3 mil soldados, 27 aviões, 26 helicópteros, 146 tanques, 706 veículos blindados de combate, 49 canhões, 1 sistema de defesa aérea Buk, 4 sistemas de lançamento de foguetes múltiplos Grad, 30 veículos, 60 veículos de abastecimento, 2 drones e 2 barcos.

Ucrânia pede para entrar imediatamente na União Europeia

Presidente ucraniano fez pedido formal à UE

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, pediu à União Europeia (UE) para que seu país seja admitido "imediatamente" como membro do bloco.

"Estamos gratos aos aliados que estão do nosso lado. Mas o nosso objetivo é estar com todos os europeus e, acima de tudo, sermos iguais", disse Zelensky em um vídeo publicado na segunda-feira (28/2).

"Eu tenho certeza de que isso é justo. Eu tenho certeza de que merecemos. Eu tenho certeza de que é possível."

O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, respondeu dizendo que há "diferentes opiniões e sensibilidades dentro da União Europeia sobre o alargamento", segundo a agência de notícias AFP.

No domingo, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou em entrevista à TV EuroNews que a Ucrânia é "um de nós e queremos eles conosco" na UE, mas não definiu um horizonte concreto para ingresso do país no bloco.

"Nós temos um processo com a Ucrânia que é, por exemplo, a integração do mercado ucraniano ao mercado único" e "uma cooperação muito estreita na rede de energia, por exemplo. Portanto, há muitas questões sobre as quais trabalhamos muito próximos juntos", disse ela sem dar mais detalhes.

Fontes da comunidade diplomática disseram no domingo que "neste momento não há unanimidade na perspectiva europeia" sobre o ingresso ucraniano no bloco, noticiou a Agência EFE.

Para que a Ucrânia faça parte do bloco europeu, é preciso haver unanimidade no Conselho.

Por que Ucrânia pede entrada imediata na União Europeia

Moscou tenta conter impacto de sanções

Moscou está lutando para atenuar o impacto das severas sanções ocidentais em sua economia, proibindo corretores de vender títulos de propriedade estrangeira e aumentando as taxas de juros.

Mais notavelmente, a União Europeia, os Estados Unidos, Reino Unido e aliados concordaram em remover bancos russos selecionados do sistema de mensagens Swift, que permite a transferência tranquila de dinheiro através das fronteiras.

A medida visa cortar a Rússia do sistema financeiro internacional e "prejudicar sua capacidade de operar globalmente".

Os líderes ocidentais também concordaram em congelar os ativos do banco central da Rússia, para limitar sua capacidade de acessar suas reservas internacionais em dólares de US$ 630 bilhões.

Grandes bancos russos estão tendo seus ativos congelados e sendo excluídos do sistema financeiro do Reino Unido. Isso os impede de acessar a libra esterlina e liberar pagamentos no Reino Unido.

E os governos ocidentais também impuseram sanções a alguns indivíduos, incluindo o presidente russo Vladimir Putin, o ministro das Relações Exteriores Sergei Lavrov e vários membros da elite oligárquica russa.

A União Europeia, Reino Unido, Estados Unidos e Canadá lançaram uma força-tarefa transatlântica para identificar e congelar os bens de indivíduos e empresas sancionados, visando mais "funcionários e elites próximos ao governo russo, bem como suas famílias".

Rússia reprime protestos

Manifestantes contrários à guerra foram presos em cidades da Rússia (Getty Images)

A polícia russa prendeu no domingo mais de 900 pessoas que protestavam contra a invasão da Ucrânia em 44 cidades, de acordo com dados divulgados por um grupo de monitoramento independente.

O grupo OVD-Info diz que 4 mil manifestantes antiguerra foram detidos na Rússia desde que o conflito começou, há quatro dias.

A BBC não conseguiu verificar de forma independente esses números.

Os protestos de hoje coincidiram com o sétimo aniversário do assassinato do político da oposição e crítico de Putin, Boris Nemtsov.

ONU faz reunião de emergência

O Conselho de Segurança das Nações Unidas realiza uma reunião de emergência da Assembleia-Geral da ONU para discutir a invasão russa à Ucrânia.

O encontro na segunda-feira (28/2) reúne seus 193 países-membros.

A Rússia é membro permanente do Conselho de Segurança - Estados Unidos, França, Reino Unido e China são os outros quatro - e, portanto, tem poder de veto.

O país de fato votou contra a realização da reunião, mas, por conta de uma das resoluções da organização de cooperação internacional, sua posição não teve poder de veto nesta ocasião.

O presidente da Assembleia Geral, Abdulla Shahid, foi o primeiro a falar. Ele disse que a assembleia representa a consciência coletiva da humanidade e sua força está enraizada em sua autoridade moral.

Shahid pediu a todas as nações que demonstrem coragem moral e usem o debate nos próximos dias não para "incitar a retórica da guerra, mas para dar uma chance à paz".

Ele reforçou que a ONU foi fundada para tomar medidas coletivas eficazes para a prevenção e remoção de ameaças à paz.

Esta é apenas a 11ª sessão especial de emergência da Assembleia Geral da ONU desde a primeira, em 1956. A natureza rara desta reunião ressalta a enorme preocupação em torno desta crise.

O Conselho de Segurança da ONU convocou esta sessão depois de ter sido impedido de agir quando a Rússia vetou um projeto de resolução dos Estados Unidos na sexta-feira, que condenava a ação russa e exigia a retirada imediata de todas as suas tropas do país.

Diplomatas esperam a votação de um projeto de resolução - que ainda está sendo negociado - na quarta-feira (2/3).

Espera-se que o projeto seja aprovado porque nenhuma nação tem poder de veto nesta câmara, mas não é juridicamente vinculativa como as resoluções do conselho de segurança.

Rússia deixa arsenal nuclear a postos

Presidente russo reagiu a declarações de membros da Otan (Getty Images)

No domingo, Vladimir Putin, anunciou que está colocando as forças nucleares do país em alerta máximo.

A ação foi um protesto contra "declarações agressivas" sobre a Ucrânia por líderes da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), aliança militar liderada pelos Estados Unidos, e contra sanções econômicas aplicadas contra a Rússia.

Muitos acreditam, no entanto, que o gesto tem um valor mais simbólico do que indica uma intenção real de usar tais armas, porque Putin sabe que, caso ative as armas, sofrerá uma retaliação nuclear por parte do Ocidente.

União Europeia alerta para crise humanitária

Ucranianos se refugiaram em países vizinhos para fugir da guerra (EPA)

A União Europeia declarou que o continente está diante de uma crise humanitária de grandes proporções.

O bloco estima que até 7 milhões pessoas tenham sido desalojadas até agora com a invasão do território ucraniano.

"Estamos testemunhando o que pode vir a se tornar a maior crise humanitária no nosso continente europeu em muitos, muitos anos", afirmou em coletiva de imprensa Janez Lenarčič, comissário europeu para ajuda humanitária e gerenciamento de crises.

Segundo ele, estimativas preliminares apontam que 18 milhões de ucranianos podem ser afetados do ponto de vista humanitário e que cerca de 4 milhões deixem o país.

Dados da ONU apontam que, até o momento, 368 mil pessoas entraram em nações vizinhas vindas da Ucrânia.

Brasileiros fogem da Ucrânia

O Itamaraty informou que 80 brasileiros conseguiram até o momento sair da Ucrânia e entrar nos países vizinhos, especialmente Polônia e Romênia.

"Ainda constam cerca de 100 brasileiros, registrados na lista da embaixada brasileira em Kiev, que permanecem em solo ucraniano", afirmou o comunicado divulgado na noite de domingo.

Estima-se que, no total, haja 500 brasileiros no país.

Ainda segundo o Itamaraty, há funcionários da embaixada brasileira em Chernivtsi, perto da fronteira ucraniana com a Romênia.

"Diplomata da embaixada do Brasil na Romênia também se deslocou para a fronteira para auxiliar o traslado, em ônibus providenciado pela Embaixada, de brasileiros para a capital Bucareste."

Bolsonaro: 'Brasil será neutro no conflito'

Em coletiva dada à imprensa do Guarujá, em São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro (PL) declarou que o Brasil adotaria um posicionamento neutro no conflito, para evitar "prejuízos para o Brasil".

"O Brasil depende de fertilizantes", declarou o presidente.

Segundo o portal G1, Bolsonaro disse ter falado por duas horas ao telefone com Putin e afirmou que o povo ucraniano "confiou em um comediante".

"O comediante que foi eleito presidente da Ucrânia, o povo confiou em um comediante para traçar o destino da nação. Eu vou esperar o relatório da ONU para emitir a minha opinião."

Publicado originalmente por BBC Brasil, em 28.02.22, às 14:20 hs

Os russos precisam derrubar Putin

É Zelensky que cerca Moscou. Diante da derrota moral, da ruína econômica que se avizinha e do risco nuclear, a Rússia tem de enxotar o carniceiro do Kremlin. Mário Sabino, d'O Antagonista, analisa a invasão da Ucrania pela Russia de Vladimir Putin.


Volodymyr Zeleinsky, Presidente da Ucrânia. (Foto: Reprodução, Twitter)

Vladimir Putin acha que cerca Kiev, mas é Kiev que o cerca. O carniceiro russo esperava fazer uma blitzkrieg na Ucrânia agredida, mas encontrou uma resistência não menos do que heroica do exército oponente, comandada por um presidente que conta hoje com a aprovação de 94% dos ucranianos. 

Volodymyr Zelensky se tornou um símbolo de coragem e resiliência para os seus compatriotas e para o mundo. O Ocidente, temeroso de uma guerra prolongada que também lhe seria custosa, ofereceu-lhe uma rota de fuga. Ele recusou-se a abandonar a luta, como Vladimir Putin esperava que fizesse — e, com o seu comportamento inspirador e impressionante capacidade de comunicação nas redes sociais, obrigou os líderes ocidentais a mostrar os dentes para a Rússia, seja na forma de sanções econômicas mais duras do que as previstas, seja por meio de ajuda militar efetiva. 

Ainda que o rolo compressor russo atinja os seus objetivos militares, já está claro que os ucranianos não se dobrarão aos invasores e estão dispostos a transformar o seu país numa espécie de Afeganistão para os russos. Na Europa, a cifra fornecida por Kiev, de que o seus exército matou 3.500 soldados inimigos em cinco dias de conflito, começa a ser levada a sério, depois de ser considerada mera propaganda. Se a informação for mesmo verdadeira,  é algo assombroso. Será espantoso ainda que seja um terço disso. Para se ter ideia, em 10 anos de guerra, os russos perderam 14,5 mil homens em território afegão. Moscou anunciou hoje que vai desacelerar a ofensiva.

Volodymyr Zelensky é um ex-comediante que foi subestimado no Kremlin e no Ocidente — e só continua a sê-lo pelos idiotas.  Com um simples celular, ele já derrotou Vladimir Putin e a sua máquina de censura e fake news. O carniceiro russo perdeu a batalha de comunicação, como se pode ver pelas manifestações de rua contra a invasão da Ucrânia que ocorrem nos países ocidentais e na própria Rússia. Pelos boicotes esportivos de imensa repercussão. 

Pelas sanções ocidentais aos canais de notícias falsas patrocinados pelos russos que vinham operando livremente no Ocidente. O mundo livre e moderno constata a diferença entre um Volodymyr Zelinsky, que transmite de lugares públicos de Kiev e sabe se comunicar pelo Twitter (quase 4 milhões de seguidores neste momento) e pelo Instagram (quase 13 milhões de seguidores), e um Vladimir Putin, isolado no cavernoso Kremlin e que faz uso apenas de um TV estatal que lhe é inteiramente submissa, da censura e das fake news. 

Como disse o jornalista americano Dan Rather no Twitter, “Putin deve estar se mordendo ao ver Zelensky tornar-se um herói mundial, o líder forte e corajoso que se eleva moralmente sobre o pária russo. Isso torna o destino de Zelensky ainda mais precário. E a situação na Ucrânia ainda mais preocupante”.

O ex-agente obscuro da KGB achou que poderia cancelar a Ucrânia como nação, com um discurso montado numa retórica velha da época da Guerra Fria, mas acabou fortalecendo o sentimento nacional ucraniano expresso admiravelmente pelo presidente ex-comediante. Hoje, enquanto a Ucrânia é objeto de solidariedade e ajuda financeira e militar, a Rússia se vê sob um carniceiro que, roído pela vaidade, pela inveja e pela vingança, ameaça não apenas a Ucrânia, mas a humanidade, dizendo que pode lançar mão de armas nucleares, para liquidar um mundo que não reflete a imagem que ele acha ter de si próprio.

Só há um caminho a seguir para a Rússia. Depois do desmoronamento moral do seu líder e da degradação da imagem do país, da possibilidade de se atolar em outro Afeganistão, mas na Europa, da ruína econômica que se avizinha — o rublo desabou 40%, a taxa de juros foi a 20%, a bolsa de valores não abriu hoje — e, principalmente, do risco de o carniceiro lançar mão de armas atômicas para destruir não somente a Ucrânia, mas a inteira civilização, o que ainda compreende a Rússia, cabe aos próprios russos se livrar de Vladimir Putin. É preciso que eles o derrubem. 

Zelensky é um líder corajoso e admirável na sua modernidade; Putin é um ditador covarde e perigoso no seu anacronismo. Ele foi longe demais para que a sua palavra possa ser crível em qualquer negociação.

Publicado originalmente por Mario Sabino n'O Antagonista, em 28.02.22, às 06:59

Rússia x Ucrânia. Um conflito por direitos humanos?

Entenda a origem dos ataques e os fatores que envolvem o conflito no âmbito do Direito Internacional.

Mais de 30 mil mortos em cinco dias de conflito. Enquanto países adotam sanções e negociações avançam para frear o ataque de tropas russas à Ucrânia, as nações vizinhas já receberam mais de 500 mil refugiados desde o início das invasões militares.

No cenário de mortes, destruição, ameaça nuclear e possível aumento das pressões inflacionárias e redução das perspectivas de crescimento econômico em todo o mundo, a equipe do Âmbito Jurídico conversou com a professora de Direito Internacional e professora permanente do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Uberlândia, Tatiana Cardoso Squeff, sobre a guerra que acontece em plena escala no segundo maior país  da Europa. 


Tatiana Cardoso Squeff é professora de Direito Internacional e professora permanente do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Uberlândia, doutora em Direito Internacional pela UFRGS, com período-sanduíche junto à University of Ottawa, mestre em Direito Público pela Unisinos, com período de estudos junto à University of Toronto. Membro da ILA-Brasil e da ABRI.

ÂMBITO JURÍDICO: Qual a origem dos conflitos entre Rússia e Ucrânia?

O conflito atual entre Rússia e Ucrânia remontam às tensões iniciadas ainda em novembro de 2013, quando o então presidente ucraniano, Viktor Yanukovich, negou-se a assinar um tratado de livre comércio com a União Europeia. Essa situação levou centenas de manifestantes às ruas, culminando em protestos sangrentos contra as forças do governo, que se desdobraram até fevereiro de 2014, quando os confrontos em Kiev deixaram mais de 100 mortos na capital Kiev.

Esse fato levou a destituição de Yanukovich, cuja base eleitoral era largamente formada por descendentes de russos e russos étnicos situados ao sul e à leste do país, em especial na região da Criméia e na região de Donbas, onde ficam províncias de Luhansk e Donetsk. Em 2014, essas regiões declararam-se independentes, tendo a Criméia obtido certo sucesso na sua reivindicação, culminando, inclusive, na sua anexação à Rússia. Por outro lado, as forças separatistas de Luhansk e Donetsk mergulharam em um conflito armado contra as forças ucranianas (governamentais). Já morreram mais de 14.000 nessas províncias desde então

AJ: O que está em jogo atualmente? Seria um conflito por direitos humanos?

Enquanto a Ucrânia defende a manutenção de suas fronteiras e, logo, de sua soberania sobre a totalidade de seu território, forjado ainda em 1991 quando da sua independência da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e referendado em 1994 pela assinatura do Memorando de Budapeste entre Ucrânia, Grã-Bretanha, Estados Unidos e Rússia, para justificar a sua entrada no pais vizinho, a Rússia baseia-se na defesa dos direitos humanos (especificamente, na proibição de genocídio) e no direito de autodeterminação das pessoas situadas em Luhansk e Donetsk, as quais tiveram a sua declaração de independência de 2014 reconhecida pela Rússia em 21 de fevereiro de 2022.

AJ: Qual o interesse no Leste Ucraniano?

Além de uma relação histórico-cultural para com a região e as pessoas que habitam Donbas, é possível dizer que o interesse da Rússia na região poderia estar baseado em outros critérios, a exemplo do econômico-energético e do político-geográfico.

Quanto ao econômico-energético, cumpre dizer que o leste ucraniano é uma região industrial baseada na exploração do carvão, sendo a 4a maior da Europa, com reservas que beiram 10 milhões de toneladas. Assim, controlar essa região significa ter um poder de barganha ainda maior frente aos europeus, os quais já são largamente dependentes da energia proveniente da Rússia, significando, ao mesmo tempo, um potencial incremento para a economia do Estado em termos de estoque, afinal, sabe-se que os altos custos de produção do carvão em Donbas fazem com que o mesmo não seja tão competitivo mercadologicamente. Além disso, não se pode esquecer que os gasodutos que ligam a Rússia à Europa passam pela Ucrânia, a qual recebe uma verba pela concessão de seu território para tal fim, de modo que a eventual anexação de Donbas – seguindo os passos da Criméia – poderia gerar uma redução de gastos.

Quanto ao segundo, político-geográfico, tem-se que a Ucrânia funciona como um estado-tampão às influências ocidentais, de maneira que o alinhamento da Ucrânia à União Européia ou mesmo à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) poderia significar o seu próprio enfraquecimento político e cultural. Esse “cinturão de influência” não ocorre apenas com a Ucrânia: veja-se o exemplo da Armênia que se juntou à União Econômica Eurasiática em 2015 – organização composta ainda por Rússia, Bielorrússia, Cazaquistão e Quirguistão.

AJ: Os EUA estariam envolvidos?

Dificilmente os Estados Unidos de Joe Biden enviarão tropas para a Ucrânia. O governo americano não vê com bons olhos o envolvimento do país em outro conflito após a trágica saída do Afeganistão em 2021. Isso só ocorreria caso algum membro da OTAN fosse alvo das incursões russas, pois o tratado constitutivo da OTAN prevê a legítima defesa coletiva em caso de ataque armado cometido contra outro membro da Organização, tal como ocorreu em 2001, após o 11 de setembro, contra o Afeganistão. Joe Biden limitar-se-á ao envio de ajuda militar para a Ucrânia avaliados em 350 milhões de dólares, já aprovados em 26 de fevereiro de 2022.

AJ: Do ponto de vista do Direito Internacional e relembrando o referendo conduzido na região da Crimeia em 2014, houve violações no decorrer dos conflitos? Estaria a Rússia por trás deste fato? Quais os pontos críticos a serem destacados a respeito do Direito Internacional?

A grande questão relativa à Criméia é que esta região declarou-se independente em 11 de março de 2014 e cinco dias depois, em 16 de março, realizou um referendo em que questionava a sua população formada largamente por russos étnicos se estes gostariam de ser anexados pela Rússia. O referendo foi massivo: 93% apoiaram essa idéia, tendo a Rússia, então, anexado a região.

Esse ato estaria fundado no princípio de autodeterminação, o qual, segundo o direito internacional, permite a secessão estatal quando a população local está sendo oprimida pelo governo central, que, no caso, seria a Ucrânia. Não apenas isso, para que seja considerado válido, a argüição da autodeterminação deve partir da própria população, não podendo esta estar sob influência externa. Nesse passo, o que se argumenta em relação a Criméia é que, mesmo se a população estivesse mesmo sofrendo de diversas e massivas violações de direitos humanos desde o acirramento dos protestos em meados de 2014, ainda há duvidas quanto a real independência e autonomia da população da Criméia em solicitar a autodeterminação, pois há indícios de que os Russos estariam por trás de tais reivindicações. Afinal, a Criméia tem uma grande importância estratégica em função da sua posição geográfica, na medida em que garante acesso – inclusive de embarcações comerciais – ao Mar Negro desde o Mar de Azov, que banha o sudoeste russo. Além disso, a Rússia já detinha uma base militar na Criméia, em Sevastopol, de modo que o acesso a base, com o controle do território, restaria facilitado.

AJ: O que seria o acordo Acordo Minsk II, assinado em 2014? O não cumprimento do acordo estaria no centro do conflito?

O Acordo de Minsk II é uma tentativa de por fim aos conflitos na região de Donbas entre as tropas do governo ucraniano e os separatistas de Luhansk e Dontesk. Este acordo, conjecturado por Ucrânia, Rússia, Alemanha e França, além de ter sido “referendado” pelo Conselho de Segurança, previa 13 pontos centrais: 1) o cessar-fogo, 2) o desarmamento da região; 3) o apontamento da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE) como entidade fiscalizadora; 4) o avanço dos diálogos em prol de maior autonomia e eleições nas províncias de Donbas; 5) a anistia às partes envolvidas; 6) a libertação de prisioneiros de guerra; 7) a garantia da chegada de ajuda humanitária à região; 8) o restabelecimento de relações econômicas entre a região de Donbas e o governo central ucraniano; 9) o restabelecimento do controle ucraniano sobre a fronteira russo-ucraniana; 10) a retirada de mercenários e outros agentes externos da região; 11) a continuação da reforma constitucional ucraniana para a garantia de maior autonomia à Luhansk e Dontesk; 12) realização de eleições locais, com a supervisão da OSCE; 13) a criação de um ponto de contato entre separatistas, ucranianos, russos e OSCE.

Apesar de as partes terem concordado com os seus ermos em 12 de fevereiro de 2015, as autoridades ucranianas não estariam realizando as medidas relativas à garantia de maior autonomia à região de Donbas ou mesmo a realização de eleições locais, o que teria sido um dos argumentos para que os russos reconhecessem a autonomia de Luhansk e Donetsk em 21 de fevereiro de 2002 e, logo, acolhessem o seu pedido de ajuda, culminando no ingresso no território ucraniano em 24 de fevereiro de 2022.

AJ: Em 2015 o governo assumiu o regime autônomo provisório na região de Donbas. Qual seria a estratégia?

O governo provisório tinha como objetivo fazer com que a Ucrânia demonstrasse estar disposta a atender os pleitos de parte de sua população por maior autonomia. Este argumento é de suma importância, vez que impede a argüição do princípio de autodeterminação por parte dos separatistas, pois, materialmente, estes somente poderiam pleitear a sua independência perante o direito internacional caso estivessem sofrendo opressão no plano doméstico – o que seria, então, afastado diante desse quadro. Por isso, em outras palavras, a garantia de um governo autônomo provisório em Donbas é favorável ao governo ucraniano para a manutenção da integridade territorial.

AJ: Vladimir Putin afirma que o leste ucraniano vem sendo reprimido desde 2014, fazendo referência a um genocídio. Qual o papel do Direito Internacional, neste caso?

O Direito Internacional já apontou, desde a construção da Convenço para a Prevenção e Punição do Crime de genocídio, de 1948, que esta conduta é inadmissível no plano internacional, fazendo com que os Estados-Parte do tratado não só se abstenham de condutas genocidas, como também previnam que atos genocidas ocorram. Trata-se, assim, de uma obrigação inter partes, a qual a Rússia se vincula desde 1954. Desta forma, na medida em que Putin alega estar ocorrendo um genocídio na região de Donbas e intervém na Ucrânia com o propósito de evitar o cometimento de um crime de genocídio, ele estaria amparado pela obrigação internacional derivada da citada Convenção.

AJ: Haveria legitimidade das declarações de independência da região de Donbas?

Consoante a Corte Internacional de Justiça, o direito internacional não proíbe declarações de independência, desde que elas sejam feitas por pessoas legítimas e que a sua realização esteja conectada a violações de Direito Internacional geral. No caso, para afirmar se as declarações foram legítimas, ter-se-ia que verificar quem foram aqueles que declararam Lohansk e Donetsk independentes em 2014 e a sua legitimidade para tanto. No tocante a violações de direito internacional geral, não parece ter havido nenhuma transgressão nesse sentido.

AJ: Qual o papel do conselho de segurança da ONU neste conflito?

De acordo com a Carta das Nações Unidas, edificada em 1945 ao final da Segunda Guerra Mundial, o Conselho de Segurança deteria a função de lidar com situações que ameacem a paz e a segurança internacional. Desta forma, quando se vislumbra essa possibilidade de ameaça o Conselho se reúne em sua sede, em Nova York, para debater o tema e aprovar resoluções contendo diretrizes para as partes em litígio.

Ocorre que para a aprovação de uma medida, é necessário obter-se 9 votos favoráveis de um total de 15, sem que haja vetos de membros permanentes (Rússia, Estados Unidos, França, China e Reino Unido). Logo, estado a Rússia dentre os membros permanentes, ela poderá inibir a tomada de decisão neste órgão por meio do seu veto, tal como ocorreu no dia 26 de fevereiro de 2022.

Salienta-se, porém, que o bloqueio de resolução sobre a paz e a segurança internacional no âmbito do Conselho de Segurança, torna possível que a Assembléia Geral das Nações Unidas se reúna em caráter especial e emergencial para debater o tema. Esta medida está ancorada na resolução de n. 377A(V), de 3 de novembro de 1950. Apesar disso, ressalta-se que, apesar de reunir os 193 Estados Membros da ONU e não haver poder veto, as medidas aprovadas nesse órgão são meramente sugestivas (uma soft law), não tendo força de lei, diferentemente de uma resolução aprovada no âmbito do Conselho de Segurança, pautada no capítulo VII da Carta da ONU.

AJ: Por que se fala em guerra híbrida?

Guerra híbrida é aquela que contempla meios tradicionais e não tradicionais, edificado por Frank Hoffman em 2007, em um artigo intitulado ‘Conflict in the 21st Century: The Rise of Hybrid Wars‘. Dentre os meios não tradicionais incluir-se-ia, por exemplo, a guerra cibernética, a qual envolve o uso da internet como meio de batalha. E a Rússia teria agido também por meio desta frente em sua incursão armada à Ucrânia iniciada em 24 de fevereiro de 2022, na medida em que ela teria hackeando sistemas bancários e do próprio governo ucraniano.

AJ: Recentemente a Rússia vetou a resolução do Conselho de Segurança da ONU que condenava a invasão da Ucrânia. Quais os próximos passos no esforço para cessão ao ataque?

Outras medidas estão sendo implementadas, como, por exemplo, as sanções econômicas. Estas ‘contramedidas’ são consideradas tentativas legítimas de fazer com que um país cesse com certa violação de direito internacional, estando prevista nos Artigos sobre a Responsabilidade Internacional dos Estados de 2001, em seu artigo 49 e seguintes.

No caso, países como Estados Unidos, França, Alemanha, Reino Unido, Países Baixos, etc. têm argüido que a Rússia estaria violando o princípio da não intervenção, contido no artigo 2(4) da Carta das Nações Unidas e o princípio das soluções pacíficas de controvérsia, previsto no artigo 2(3) do mesmo documento. Assim, eles entendem que teriam o poder legítimo de agir contra a Rússia por serem indiretamente atingidos pela sua conduta em relação à Ucrânia, impondo-lhe embargos econômicos, tais como restrições à importação de produtos russos, ou mesmo realizando outras medidas como o congelamento de bens de autoridades e pessoas influentes russas, a exclusão de certos bancos russos do sistema swift ou a proibição de circulação de navios e aeronaves russos, públicos e/ou privados.

Salienta-se que o Conselho de Segurança também poderia autorizar sanções econômicas com base no artigo 41 da Carta das Nações Unidas, muito embora esta decisão esteja igualmente submetida à aprovação de uma Resolução, a qual não deve ocorrer em função do poder de veto que a Rússia detém.

Apesar disso, registra-se que essas medidas acabam por prejudicar mais a população – no caso, a russa – do que o próprio governo (ou pessoas influentes), especialmente em tempos de criptomoedas e de aquisição de nacionalidades por investimentos, os quais fazem com que os principais alvos destas medidas não sofram diretamente com as restrições impostas. Outrossim, as sanções econômicas servem justamente para ocasionar uma grande insatisfação interna, a ponto de fazer com que as lideranças do Estado cedam e ajam de acordo com o direito internacional.

AJ: Uma possível reunião entre os presidentes da Rússia e Ucrânia foi sinalizada. O que seria discutido nesta reunião? Há a possibilidade de recuo de Putin?

Em uma eventual reunião entre o líder ucraniano e o líder russo, além da suspensão das hostilidades, a autonomia de Luhansk e Dontesk certamente estariam sob a mesa de negociações.

AJ: Como você avalia o comportamento dos EUA durante o conflito?

Os EUA não estão interferindo diretamente no conflito em função dos acontecimentos envolvendo a sua saída do Iraque e, mais recentemente, do Afeganistão, os quais geraram um enfraquecimento político interno muito grande. A insatisfação da população, assim como os altos gastos em conflitos no exterior foram temas centrais nos debates das últimas duas eleições presidenciais.

AJ: O precedente do presidente Ucraniano como ator e comediante integra um estereótipo “showman”, repetido por líderes populares de outros países, como Trump e Bolsonaro. O que explicaria a popularidade destas figuras? Poderia existir uma relação propensa a conflitos?

A popularidade de pessoas sem passado político normalmente está atrelada a uma insatisfação da população para com os políticos ou mesmo para com a política tradicional. Este é o exemplo da  eleição de Tirirca, no Brasil, para a Câmara dos Deputados em 2011. Não acredito ter uma relação destes com conflitos.

AJ: Em que condição seria possível que o conflito evolua para uma 3ª guerra mundial?

Uma eventual evolução só seria possível caso Estados Membros da OTAN sejam alvo das incursões armadas russas, pois consoante o tratado constitutivo desta Organização demanda uma resposta conjunta dos demais em nome e ao lado daquele que sofrera da violação. Ainda, ouso em dizer que também dependeria de qual membro da OTAN fora atingido, pois inegavelmente existe um imperialismo no Direito Internacional, que coloca países da Europa Ocidental e os Estados Unidos no centro do ordenamento internacional.

AJ: Qual o papel do Brasil neste conflito? O não pronunciamento perante o mundo pode trazer quais consequências?

O Brasil sempre teve uma agenda diplomática pacífica, voltada a solução de litígios por meios diplomáticos, políticos e jurídicos, tal como previsto no artigo 33 da Carta das Nações Unidas. O voto do embaixador do Brasil para a ONU, Ronaldo Costa Filho, em favor da resolução no Conselho de Segurança (que foi vetada pela Rússia) no dia 25 de fevereiro de 2022 é uma fiel representação deste modelo, na medida em que este é um órgão político e a sua aprovação representaria a necessidade de um cessar-fogo por parte das autoridades russas, tal como proposto no documento.

Apesar disso, Jair Bolsonaro, em 27 de fevereiro de 2022, manifestou-se em relação ao conflito pela primeira vez, defendendo uma posição neutra brasileira em virtude de o Brasil ser importador de petróleo e fertilizantes russos. As conseqüências desta posição é eventualmente o de ocasionar um maior isolamento do Brasil dos centros decisórios mundiais, tal como indiretamente já alertou a porta-voz da Casa Branca.

AJ: Sobre o papel das embaixadas, quais os direitos dos brasileiros na Ucrânia?

A Lei de Migrações de 2017, pela primeira vez, trouxe a proteção do brasileiro no exterior como sendo um princípio que rege a política migratória brasileira (art. 3, inc. XIX). Além disso, em seu art. 77 e seguintes, a citada Lei impõe a proteção e a prestação de assistência consular a brasileiros por meio das representações do Brasil no exterior, sendo este um dever do Governo Federal.

Desta forma, tem-se que as autoridades brasileiras deveriam prestar auxílio e promover a repatriação dos brasileiros que busquem sua ajuda, tal como realizado desde fevereiro de 2020 em função do fechamento de fronteiras e das medidas de distanciamento social impostas em virtude da pandemia de Covid-19 por diversos países.

Especificamente, essa regra está prevista no art. 79 da Lei de Migrações, que está assim redigido: “Em caso de ameaça à paz social e à ordem pública por grave ou iminente instabilidade institucional ou de calamidade de grande proporção na natureza, deverá ser prestada especial assistência ao emigrante pelas representações brasileiras no exterior”. 

Entrevista concedida a Flávia Peres, Diretora de Comunicação do Âmbito Jurídico. Publicada originalmente em 28 de fevereiro de 2022 - às 13:01

sábado, 19 de fevereiro de 2022

Moro nega embate com PF, mas diz que 'combate à corrupção está estacionado'

Ex-juiz participa em SP de debate com os pré-candidatos ao Planalto Simone Tebet e Luiz Felipe d'Avila

Simone Tebet, Sergio Moro e Luiz Felipe d'Avila em evento organizado pelo Lide - Leco Viana/TheNews2/Agência O Globo

O pré-candidato à Presidência da República Sergio Moro (Podemos) negou nesta sexta-feira (18) que tenha travado um embate público com a Polícia Federal, mas afirmou que "houve queda na qualidade" da corporação e que, atualmente, o "combate à corrupção no país está estacionado".

O ex-ministro da Justiça e Segurança Pública comentou a troca de críticas entre ele e a PF durante conversa com jornalistas após um debate com os pré-candidatos ao Planalto Simone Tebet (MDB) e Luiz Felipe d'Avila (Novo). Os políticos participaram de um evento organizado pelo grupo empresarial Lide, em um hotel da zona sul de São Paulo.

Em nota oficial, nesta semana, a corporação rebateu as acusações feitas pelo ex-ministro da Justiça de que o órgão não tem atuado para combater a corrupção no país e que isso seria um resultado direto das nomeações feitas pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em postos-chave da PF, com a troca de superintendentes.

Questionado pelo UOL, Moro atribuiu apenas ao diretor-geral da PF, Paulo Maiurino, as críticas abertas que recebeu. Para Moro, "houve uma tentativa do diretor da Polícia Federal de interferir no debate eleitoral". "Meu embate não é com a instituição", reafirmou.

"O que existe, assim, é um fato que é inegável de que o combate à corrupção hoje no país está estacionado", criticou Moro.

"Houve uma queda de qualidade. Eu duvido que você consiga lembrar um nome de uma pessoa relevante que foi investigada e presa por corrupção em 2021. Quando eu falo isso é que a gente valorizar a Polícia Federal", concluiu o ex-juiz, que disse ter respeito por todos os servidores do órgão.

Moro saiu do governo Bolsonaro em abril de 2020, após o presidente ter demitido o então diretor-geral da PF, Maurício Leite Valeixo. Moro chegou a acusar Bolsonaro de interferir na Polícia Federal para ter informações de inquéritos do órgão.

A reportagem procurou a Polícia Federal, e o texto será atualizado caso um posicionamento seja enviado.

CRÍTICAS A LULA E BOLSONARO

O presidente Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foram os alvos das críticas nos discursos dos pré-candidatos que se veem como "terceira via" na disputa ao Planalto.

No evento desta sexta, os pré-candidatos citaram supostos casos de corrupção da gestão de Lula e atacaram Bolsonaro usando termos como "populista", "incontrolável" e "negacionista".

Foi um "almoço-debate" para os empresários do grupo Lide —que tem o governador de São Paulo, João Doria (PSDB) como um dos fundadores do grupo empresarial. Mas ele não compareceu. Quem apresentou o evento foi seu filho, João Doria Neto.

As críticas mais ácidas vieram do ex-juiz Sergio Moro e de D'Avila, que é cientista político. Tebet, senadora pelo MDB, não deixou de dar opiniões contra o petista e o capitão reformado, mas as fez de forma mais amena.

Ela centrou suas considerações na ideia de uma união de candidaturas como alternativa a Lula e Bolsonaro. "Não podemos continuar com esse radicalismo. Nós entendemos de política para saber que o centro, lá na frente, tem de caminhar junto. O Brasil é governado por alguém incontrolável, que flerta com regimes autoritários e faz discursos de ódio", disse.

Já Moro abriu sua fala avisando aos convidados que faria críticas. "Temos que parar com essa história de que a eleição está dada porque começamos a ver isso se concretizar. Temos vários meses até outubro. Tenho visto uma insatisfação entre esses dois extremos."

Para o ex-juiz, a candidatura de Lula é "baseada numa mentira" e Bolsonaro é um "governo que não deu certo".

Moro criticou os ministros do Supremo Tribunal Federal pela anulação das condenações de Lula, ao ser questionado sobre como seria sua relação com a Corte.

"Tenho um respeito institucional pelo Supremo, que tem ótimos ministros. Mas essa anulação da condenação do presidente Lula é um baita erro judiciário. [Anular o processo] com base numa fantasia? Por que foi perseguido? Foi escondida alguma prova? Fraudada alguma prova?", questionou Moro, que foi aplaudido pelos empresários.

D'Avila também desaprovou Lula e Bolsonaro ao longo de seu discurso, chamando-os de populistas. "Temos que destruir o populismo no Brasil. Não tem como o Brasil crescer de forma sustentável com o populismo", afirmou.

Para os três candidatos, a ideia é seguir em campanha separadas, por enquanto. Mas, antes do primeiro turno, eles defendem que as candidaturas de centro se unam em torno de apenas um nome, para não dividir votos e conseguir chegar ao segundo turno.

Leonardo Martins, de S. Paulo para o UOL. Publicado na edição online da Folha de S. Paulo, em 19.02.22.

Contra fake news

Razoáveis, acordos do TSE com redes, à exceção do Telegram, ainda geram dúvidas

O bom funcionamento da democracia depende de um eleitor bem informado que escolhe de forma livre seus dirigentes e representantes. Novas escolas da ciência política relativizam essa ideia de estirpe iluminista, mas ninguém em sã consciência defenderá que a circulação maciça de fake news seja virtuosa ou mesmo inofensiva.

Nesse contexto é bem-vindo o acordo entre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e empresas que administram redes sociais para tentar conter a desinformação durante a campanha para o pleito de outubro. Assinaram a parceria Twitter, TikTok, Facebook, WhatsApp, Google, Instagram, YouTube e Kwai.

O Linkedin já está em negociações com a corte, mas o Telegram, plataforma na qual o presidente Jair Bolsonaro e seus seguidores têm grande peso, não tem representação no Brasil e continua sem responder às solicitações.

Se as medidas acordadas —que incluem filtragens para identificar informações enganosas, rotulagem e até a remoção de conteúdos que violem as regras da própria empresa— bastarão para diminuir significativamente o volume de fake news ainda é uma incógnita.

É positivo, de todo modo, o fato de que os gigantes da tecnologia tenham começado a aceitar suas responsabilidades como editores de informação. Preocupa, porém, que estejam adotando por aqui políticas menos rigorosas do que as que utilizaram no pleito americano de 2020, como noticiou a Folha.

No caso do TikTok, prevalece a percepção de que o entendimento foi firmado de forma displicente. Os termos de uso sobre integridade eleitoral adotados pela empresa são uma tradução descuidada do documento utilizado no pleito dos Estados Unidos —fala-se até em voto pelo correio, modalidade de sufrágio que não existe no Brasil.

A grande questão no momento, ou pelo menos a que mobiliza as atenções, é o tratamento que será dado ao Telegram. Como a empresa não tem representação nem ativos no Brasil, não está ao alcance fácil da Justiça nacional.

Se o TSE decidir enfrentar a plataforma, só o que poderá fazer é tentar bloquear o aplicativo, o que não é uma resposta consensual, além de apresentar desafios técnicos.

Melhor que não se chegue a essa situação. O que o tribunal está pedindo aos administradores de rede é perfeitamente razoável e não parece contrariar os interesses de médio e longo prazo da empresa.

Ela, afinal, deverá enfrentar dificuldade para monetizar os dados que coleta de seus usuários se passar a ser vista globalmente como um covil virtual, no qual párias de todo o planeta se reúnem para propagar o ódio e cometer crimes.

Editorial da Folha de S. Paulo, em 19.02.22

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