segunda-feira, 1 de novembro de 2021

Ato com Bolsonaro em Roma acaba em violência contra jornalistas brasileiros

Enquanto isso, eles permitiam que apoiadores se aproximassem de Bolsonaro para tirar selfies.

Uma manifestação pró-Bolsonaro com brasileiros que vivem na Itália acabou em violência e intimidação contra jornalistas que cobriam o evento na região da embaixada do Brasil em Roma neste domingo (31/10). Agentes de segurança italianos e brasileiros empurraram, deram socos, arrancaram celular de um repórter que filmava o ato, seguraram, gritaram e impediram repórteres de chegar perto do presidente para entrevistá-lo.

O ato começou pacificamente por volta das 15h (horário local) e reuniu dezenas de pessoas no lado dos fundos da representação brasileira. Vestidos de verde e amarelo. Eles cantavam o hino brasileiro e gritavam palavras de ordem a favor do presidente enquanto aguardavam o presidente. Cerca de uma hora depois, Bolsonaro acenou da sacada e em seguida desceu para discursar para apoiadores reunidos numa praça do centro da capital italiana.

Bolsonaro se defendeu das críticas e acusações à sua gestão da pandemia e fez críticas à imprensa e à CPI da Covid, entre outros assuntos. Enquanto isso, ele era filmado das janelas da embaixada por integrantes de sua comitiva.

Depois de sua fala, ouvida em silêncio por todos, ele decidiu caminhar pelas ruas do centro de Roma. Foi quando o tumulto começou.

Jornalistas de diversos veículos brasileiros, entre eles a BBC News Brasil, credenciados para a cobertura da reunião do G20 (grupo das 20 maiores economias do mundo), tentaram se aproximar do presidente para entrevistá-lo. Bolsonaro foi questionado sobre os motivos de sua ausência na COP26 (Cúpula do Clima na Escócia) e sobre a greve dos caminheiros prevista para esta segunda-feira (1º/11) no Brasil, entre outros temas.

Mas ele não respondeu a nenhuma das perguntas durante sua caminhada de menos de dez minutos, registrada por câmeras de jornalistas, assessores e apoiadores.

Bolsonaro não respondeu a nenhuma das perguntas durante sua caminhada de menos de dez minutos Matheus Magenta / BBC News Brasil).

Enquanto isso, os agentes de segurança do Brasil e da Itália que o cercavam só deixavam apoiadores com as cores verde e amarela e membros da comunicação do governo se aproximarem do presidente para tirarem fotos e se abraçarem enquanto intimidavam e agrediam jornalistas no entorno do mandatário. Parte dos apoiadores xingou e intimidou repórteres.

O jornalista Jamil Chade, que cobria o ato para o portal UOL, teve o celular arrancado de suas mãos, enquanto filmava a manifestação, por um agente de segurança italiano que não quis se identificar. Em seguida, o aparelho foi jogado no chão pelo policial durante a manifestação pró-Bolsonaro e recuperado pelo jornalista instantes depois.

Jornalistas brasileiros são atacados durante passagem do presidente em Roma (Matheus Magenta / BBC News Brasil)

Ao fim do evento, diversos jornalistas brasileiros questionaram os agentes de segurança italianos à paisana sobre as agressões que eles cometeram durante o ato. Em resposta, eles diziam "podem registrar queixa" e não se identificaram. Parte dos profissionais de mídia do Brasil que cobriram o ato iria sim formalizar as agressões com a polícia italiana.

Procurada pela BBC News Brasil para comentar a violência contra os jornalistas, a Secretaria de Comunicação da Presidência da República não respondeu aos questionamentos da reportagem até o momento da publicação deste texto.

Matheus Magenta, de Roma para a BBC News Brasil, 31.10.21

sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Procuradoria abre investigação preliminar sobre Bolsonaro e outros 12 a partir da CPI da Pandemia

Procedimento é apenas o primeiro ato formal da PGR e não implica que os pedidos de indiciamento apresentados pela comissão foram endossados pelo procurador Augusto Aras

Os senadores da CPI da Pandemia entregam oelatório final ao procurador-geral Augusto Aras na quarta-feira. (Antonio Augusro, SECOM/MPF)

O procurador-geral da República, Augusto Aras, tomou seu primeiro ato formal sobre as acusações feitas pela CPI da Pandemia contra o presidente Jair Bolsonaro e os outros 12 portadores de foro privilegiado que protagonizam o relatório final da CPI. A abertura de uma investigação preliminar é um procedimento padrão e não significa que Aras tenha considerado válidos os argumentos apresentados nas 1.288 páginas do documento, em que Bolsonaro é acusado de crime contra a humanidade, entre outros oito delitos, por sua gestão da pandemia de covid-19. “Esperamos que prospere. A CPI da Covid encerrou suas atividades de maneira formal, mas continuamos trabalhando e acompanhando para que o relatório tenha seus resultados esperados”, escreveu o vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), em seu perfil no Twitter ao saber da abertura da apuração

O discurso de vigilância de Rodrigues se explica pelo histórico de Aras, que até agora, em mais de dois anos de Procuradoria Geral da República (PGR), não passou da abertura de investigações preliminares no que diz respeito a Bolsonaro. A desconfiança em relação a seu trabalho levou a PGR a divulgar uma nota nesta quinta-feira, para refutar “textos especulativos acerca do tratamento a ser dado ao Relatório da CPI da covid 19 pela Procuradoria-Geral da República”. “A Procuradoria-Geral da República reitera o respeito ao trabalho feito ao longo de seis meses pelos senadores que integram a CPI que, inclusive, não permite e não condiz com eventuais ilações acerca de análises de materiais que sequer chegaram de forma oficial ao órgão ministerial”, diz a mensagem. Nesta quinta, circularam informações de que assessores de Aras teriam considerado o conteúdo do relatório “devastador”, o que não parece ser a avaliação do procurador-geral.

A cúpula da CPI da Pandemia se reuniu com Aras na quarta-feira, um dia após a aprovação do relatório que pede o indiciamento de 78 pessoas —13 delas com prerrogativa de foro— e duas empresas, para marcar publicamente a entrega do documento. Na ocasião, o procurador-geral fez uma saudação protocolar ao trabalho dos parlamentares. “Esta CPI já produziu resultados. Temos denúncias, ações penais e civis em curso, autoridades afastadas”, elogiou. “E a chegada desse material que envolve pessoas com prerrogativa de foro por função vai contribuir para que possamos dar a agilidade necessária à apreciação dos fatos que possam ser puníveis seja civil, penal ou administrativamente”, completou Aras.

Quem são os 80 alvos de pedidos de indiciamento do relatório final da CPI da Pandemia

Nesta quinta-feira, o périplo dos representantes da comissão passou pelo procurador-geral do Ministério Público do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira, pela presidenta do Tribunal de Contas da União, Ana Arraes, e pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux. “Como guardião da Constituição brasileira, tenho certeza que o Supremo tomará as providências cabíveis para que a justiça seja feita”, declarou o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), ao entregar o documento para Fux. Desde a aprovação do relatório final, redigido pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), os senadores se escoram em eventos como esses para manter as atenções sobre aqueles que os parlamentares determinaram como os principais responsáveis pelas mais de 607.000 mortes da pandemia no Brasil.

Também nesta quinta-feira, os senadores criaram um Observatório da Pandemia, para receber novas denúncias e fiscalizar as ações das autoridades brasileiras no combate ao coronavírus, além de acompanhar o andamento formal das denúncias apresentadas pela CPI. Entre as autoridades com foro implicadas pela comissão estão ss ministros da Saúde, Marcelo Queiroga, do Trabalho, Onyx Lorenzoni, da Defesa, Braga Netto, e da Controladoria Geral da União, Wagner Rosário. Há ainda um senador —Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ)—, um governador —Wlson Lima (PSC)— e seis deputados: o líder do Governo, Ricardo Barros (Progressistas-PR), Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), Bia Kicis (PSL-DF), Osmar Terra (MDB-RS), Carla Zambelli (PSL-SP) e Carlos Jordy (PSL-RJ).

Rodolfo Borges, de S. Paulo para o EL PAÍS, em 28.10.21

Bloqueio da China à carne brasileira põe em risco 10 bilhões de reais neste ano

Estimativa da CNA leva em conta produção que seria vendida até dezembro ao país asiático, responsável por comprar mais da metade do produto exportado pelo Brasil. Atritos de Bolsonaro com chineses e preço do boi afetam o negócio

Linha de produção em frigorífico de Xinguara (PA). (Bruno Cecim, Ag. Pará. Fotos públicas).

A suspensão da exportação da carne bovina para a China deve resultar em perdas para o Brasil de até 1,8 bilhão de dólares (10,1 bilhões de reais) se durar até o fim do ano. No melhor dos cenários, a Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) estima que os produtores brasileiros perderiam 1,2 bilhão de dólares (6,8 bilhões de reais). O histórico de atritos de Bolsonaro com os chineses e o preço do boi afetam o negócio há quase dois meses. A China é responsável por comprar 56% da carne bovina brasileira exportada. A razão oficial para o bloqueio é o registro de dois casos suspeitos da doença da “vaca louca” descobertos no dia 3 de setembro em Minas Gerais e no Mato Grosso. Os chineses suspenderam as aquisições no dia 4 daquele mês e ainda não voltaram atrás, mesmo após o pronunciamento da Organização Mundial de Saúde Animal de que o Brasil representa risco insignificante para a doença.

Além da questão técnico-sanitária, ao menos outros três elementos rondam este tema, conforme analistas e diplomatas relataram ao EL PAÍS: o alto preço da carne, a tentativa do Governo chinês de estimular o tradicional consumo de suínos ao invés dos bovinos e, em menor escala, uma retaliação ao Governo Jair Bolsonaro, outrora marcadamente hostil aos chineses. “O presidente e seu entorno já foram muito duros com a China. Agora, são só elogios. Mas talvez o passado tenha interferido na demora para essa retomada da negociação”, disse um diplomata ouvido pela reportagem.

Até meados deste ano o presidente brasileiro tinha uma relação de atritos com a China. Ele já colocou em suspeita a origem do coronavírus e a confiabilidade das vacinas produzidas naquele país, mas mudou a postura recentemente. Na cúpula dos Brics, em 9 de setembro, Bolsonaro rasgou elogios a Xi Jinping e disse que a parceria entre os países se mostrou essencial para o controle da pandemia de covid-19.

A estimativa da perda para os produtores brasileiros foi feita pelo diretor técnico da CNA, Bruno Lucchi. Sua conta leva em consideração a média de exportações feitas para a China nos últimos três meses do ano, que varia de 400 milhões de dólares a 600 milhões de dólares ao mês. “Esse é o período em que a China mais compra a carne bovina, para estocar para o ano novo chinês [comemorado em fevereiro]”, detalhou o dirigente.

"Quando você deixa de comprar, você acaba induzindo uma queda no valor. É o que o Governo chinês está fazendo. Charles Tang, da Câmara de Comércio Brasil-China

Uma das queixas dos chineses é o preço do gado. A arroba chegou a custar 322 reais em junho deste ano. Desde o veto à carne brasileira, em setembro, o preço da arroba começou a despencar. No dia 28 de outubro, fechou a 258,10 reais. É o menor valor desde outubro de 2020, de acordo com dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo.

“Quando deixa de comprar, você acaba induzindo uma queda no valor. É o que o Governo chinês está fazendo”, diz o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, Charles Andrew Tang. Na avaliação dele, quando o mercado estiver mais estável e a China sentir segurança nas questões sanitárias, o comércio será restabelecido entre os dois países.

Alimentação cara e seca prolongada

Lucchi explica que o preço do boi estava alto porque o custo de alimentação dos animais disparou, como consequência da seca intensa e prolongada pela qual passou o país nos últimos anos, e também porque houve uma retenção de fêmeas para gerar novos bezerros. Em 2019, uma série de abates de vacas resultou na redução de nascimentos e atrapalhou o ciclo de reprodução e reposição do gado. “Não tem mais tanta oferta como antigamente”, sintetiza.

Nenhum parceiro comercial do Brasil tem capacidade de ocupar o espaço da China. De acordo com a CNA, anualmente os chineses compram 920.000 toneladas de carne bovina brasileira. Somadas, todas as outras nações compram 900.000 toneladas. Em tese, a carne que não é vendida para a China deveria passar a ser consumida pelos próprios brasileiros.

Essa mudança na destinação da proteína gerou uma redução do preço no atacado. A média do corte bovino caiu de 17 reais para 14 reais. Contudo, até o momento, os varejistas preferiram ampliar suas margens de lucro a repassar essa redução ao consumidor final. Nas gôndolas dos açougues e dos supermercados, essa diminuição quase não vem sendo sentida. A queda no preço foi de apenas 0,31% em outubro, após 16 meses seguidos de alta. Os dados são do IPCA-15, a prévia da inflação divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Diante da indefinição dos chineses, no último dia 20 o Ministério da Agricultura do Brasil determinou que os frigoríficos habilitados a exportar para a China suspendam a produção para o país asiático. Com isso, a tendência é que aumente a oferta no mercado brasileiro, e o preço finalmente caia.

Funcionários de frigorífico em Xinguara, no Pará. (Bruno Cecim, Ag. Pará. Fotos públicas.

Bolha a estourar

De acordo com a CNA, porém, com a redução do valor da arroba e o aumento dos insumos para alimentação do gado confinado, os produtores passaram a amargar altos prejuízos. Se antes eles ganhavam cerca de 300 reais por animal vendido, agora têm o prejuízo de aproximadamente 500 reais. “Quem pode, segura o gado no pasto agora por um período até a situação se normalizar e, só depois, manda para o abate”, diz Lucchi. Essa retenção, em médio prazo, deverá elevar o preço.

Na tentativa de reverter o bloqueio temporário da compra, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina Dias, cogitou viajar a Pequim para negociar a retomada do comércio com o Governo local. Mas recebeu a sinalização de que não seria necessário no momento. Enquanto isso, técnicos do Ministério da Agricultura brasileiro e da Administração Geral de Aduanas da China se reúnem com frequência para analisar o processo de retomada das exportações.

“Essas reuniões virtuais servem para esclarecer procedimentos implementados no Brasil para o controle e vigilância da enfermidade e fornecer informações complementares solicitadas pelos técnicos chineses”, explicou o MAPA, em nota. “As relações entre Brasil e China são boas, em breve esse problema será superado”, avalia Chang, da Câmara de Comércio. Mais da metade da carne bovina exportada do Brasil depende diss.

AFONSO BENITES, de Brasília, DF, para o EL PAÍS, em 29.10.21

Bolsonaro no G20: Brasil tem pior perspectiva de crescimento em 2022 entre países do grupo

Inflação, juros e dólar em alta devem fazer Brasil ter pior desempenho entre as maiores economias do mundo no próximo ano. Furo do teto de gastos e eleições turbulentas agravam o cenário. 

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) participa neste sábado e domingo (30 e 31/10) da Reunião de Cúpula do G20, grupo que reúne os 19 países mais ricos do mundo e a União Europeia. (AFP)

Na pauta, estarão temas como a criação de um tributo global sobre empresas multinacionais, os preços do petróleo, a crise energética que afeta diversos países do mundo, e os gargalos logísticos e de fornecimento de insumos, que também têm prejudicado o desempenho da economia mundial.

O grupo se reúne num momento em que o mundo enfrenta uma desaceleração do crescimento, diante do avanço das pressões inflacionárias, e da perda de ritmo da economia chinesa, em meio à crise do setor imobiliário e energética enfrentada pela superpotência asiática.

Pelas projeções do órgão multilateral, o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro deve crescer 5,2% este ano, mas apenas 1,5% no ano que vem. O crescimento projetado para 2022 é menor do que o esperado para outros emergentes, como Rússia (2,9%), Argentina (2,5%) e África do Sul (2,2%).

Projeções do FMI para PIB dos membros do G20 em 2022

Nas estimativas da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), divulgadas ao fim de setembro, o quadro não é muito diferente.

O "clube dos países ricos" espera que o PIB do G20 deve desacelerar de um crescimento de 6,1% em 2021, para 4,8% em 2022. Para o Brasil, a previsão é de uma perda de ritmo bem mais acentuada: de alta de 5,2% este ano, para 2,3% no ano que vem. Segundo a OCDE, o país só ficaria à frente do Japão (2,1%) e da Argentina (1,9%) em termos do crescimento esperado para 2022.

Se o cenário já não parece muito bom na comparação internacional olhando esses dados, a tendência é a coisa piorar.

Isso porque as projeções das entidades multilaterais como FMI e OCDE são atualizadas com menos frequência do que aquelas feitas pelos economistas de mercado, que trabalham em bancos, gestoras de recursos e consultorias, acompanhando a economia brasileira no seu dia a dia.

Alguns desses economistas passaram a prever nesta semana que o PIB brasileiro pode entrar em recessão ou ficar estagnado em 2022, diante do desarranjo das contas públicas provocado pela quebra do teto de gastos — regra que limita o crescimento da despesa do governo à inflação.

É o caso do Itaú, que revisou na segunda-feira (25/10) sua projeção para o PIB do país em 2022 para queda de 0,5%. O banco J.P. Morgan e a consultoria MB Associados cortaram suas estimativas de 0,9% e 0,4%, respectivamente, para 0%.

E mesmo quem ainda espera algum crescimento para o Brasil em 2022, está baixando a bola de suas expectativas, caso da XP Investimentos, que cortou sua estimativa para o PIB do próximo ano de 1,3% para 0,8%. O Credit Suisse reduziu de 1,1% para 0,6%. E a ASA Investments, de 1,5% para 0,4%.

Estimativas para PIB do Brasil em 2022, em % ?

Assim, mesmo o microcosmo do G20 parece desmentir a fala do ministro da Economia, Paulo Guedes, na última sexta-feira (22/10): "O Brasil é um país bem visto lá fora. As pessoas veem o que a gente está fazendo aqui. O Brasil vai crescer bem mais no ano que vem", disse Guedes, durante coletiva ao lado de Bolsonaro, em que ambos confirmaram o furo do teto de gastos.

Entenda por que a economia do mundo todo deve desacelerar em 2022 e como o Brasil deve ter desempenho ainda pior do que os outros países.

Por que a economia mundial vai crescer menos em 2022

"O crescimento global deve ser menor e a inflação maior devido à desaceleração na China e ao aumento dos preços de energia em todo o mundo", resumiu o Itaú, em relatório recente.

A economista Margarida Gutierrez, professora do Coppead/UFRJ (Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro), explica que o aumento da inflação em todo o mundo deve levar os bancos centrais de diversos países a encerrar o ciclo de estímulos em resposta à pandemia e normalizar suas políticas monetárias.

A mudança de direção na ação dos bancos centrais deve funcionar como um freio para a atividade econômica em todo o mundo.

"Com a inflação batendo na porta dos Estados Unidos e da Zona do Euro — economias que estavam com taxas de juros zero ou próximas de zero —, vai começar a ter uma normalização das políticas monetárias, então os juros vão começar a subir", diz Gutierrez.

"O caso da economia americana é emblemático: pelo quinto mês consecutivo, os Estados Unidos têm apresentado uma inflação de 5,4% em 12 meses, o que sinaliza que não é uma inflação transitória, como inicialmente se supunha", acrescenta a economista.

"Nesse cenário, o FED [Federal Reserve System, o sistema de bancos centrais dos Estados Unidos] e o Banco Central Europeu já sinalizaram que vão reduzir seus programas de compras de ativos e, depois disso, vão começar a subir as taxas de juros, praticando o que chamamos de normalização monetária. Essa subida de juros já é um freio à atividade econômica por si só."

A inflação global tem sido puxada pela alta de preços das commodities, em meio ao aumento da demanda global com a reabertura das economias após o isolamento social provocado pelo coronavírus; e pela desorganização das cadeias produtivas, que tem provocado falta de insumos para a indústria — como o setor de automóveis, que tem sofrido com a escassez de semicondutores.

Escassez de carvão está paralisando parte do setor produtivo da China

Já na China, são dois os problemas principais: uma crise no setor imobiliário, puxada pelo alto endividamento da incorporadora Evergrande; e uma crise energética, provocada pela disparada de preços e escassez de carvão, num momento em que o país asiático também tenta reduzir suas emissões de carbono, visando atingir metas ambientais estabelecidas para 2030 e 2060.

"Na China, desde a crise de 2008, eles promoveram um padrão de crescimento muito baseado no endividamento", explica Gutierrez. "Essas construtoras que agora estão em crise são um exemplo disso, estão inadimplentes, após serem estimuladas pelos empréstimos de bancos públicos e por uma política de governo de incentivo ao endividamento."

"Soma-se a isso a escassez de carvão que está paralisando parte do setor produtivo. Então a China tem um problema grave aí que é o seu modelo de crescimento", diz a professora.

O FMI prevê que a China desacelere de um crescimento de 8% este ano, para 5,6% em 2022. Já a OCDE, projeta um avanço de 8,5% do PIB da China em 2021 e de 5,8% no próximo ano.

Com a China representa sozinha cerca de 18% do PIB mundial e é uma grande compradora internacional de commodities produzidas por outros países, uma desaceleração dessa magnitude tende a afetar a economia do mundo todo.

Como o Brasil vai ter desempenho ainda pior que o resto do mundo

"Não tem nenhum motor de crescimento no Brasil", diz Claudio Considera, coordenador do Núcleo de Contas Nacionais do Ibre-FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).

"O desemprego está enorme, a inflação está fazendo com que as famílias percam renda, isso diminui o consumo", enumera. "O investimento também não tem nenhum estímulo, porque ninguém acredita que o Brasil vai crescer. Então a economia não tem qualquer impulso de crescimento."

'Não tem nenhum motor de crescimento no Brasil. O desemprego está enorme, a inflação está fazendo com que as famílias percam renda', diz Claudio Considera, do Ibre-FGV (Roberto Parizotti)

Esse cenário tende a ser agravado pela alta de juros que está sendo feita pelo Banco Central, na tentativa de conter a inflação.

Nesta quarta-feira (27/10), o Copom (Comitê de Política Monetária) elevou a Selic de 6,25% para 7,75% ao ano, alta de 1,5 ponto percentual.

O comitê indicou ainda que deve fazer outro aumento de igual magnitude na sua próxima reunião, marcada para dezembro, o que deve levar a taxa para 9,25%. Parte dos economistas aposta que o ciclo de aperto monetário não deve parar por aí, com a taxa básica de juros indo a dois dígitos no começo do próximo ano.

"Com isso, as famílias que gostariam de tomar crédito para consumo não vão mais fazer isso. E essa alta de juros vai espantar os investimentos também, porque ninguém vai investir tendo que pagar juros elevados, é melhor colocar o dinheiro na compra de títulos da dívida e ganhar 10% a 12% de retorno sem os riscos do investimento produtivo", diz Considera.

Mas se o mundo inteiro está sofrendo com inflação, por que a alta de preços no Brasil é tão mais significativa do que nos demais países, exigindo essa dose cavalar de juros em resposta?

"No Brasil, além de sofrer tudo que o mundo está sofrendo, nós temos uma taxa de câmbio super pressionada por causa das nossas incertezas, da nossa percepção de risco, que está subindo muito", explica Margarida Gutierrez, da Coppead/UFRJ.

"A nossa taxa de câmbio está absolutamente descolada do resto do mundo, e o câmbio mais desvalorizado gera pressões inflacionárias, isso contamina as expectativas de inflação e, por isso, nossa inflação é tão maior do que a de outros países".

O dólar fechou 2020 cotado a R$ 5,19 e nesta semana já supera os R$ 5,60, tendo encostado nos R$ 5,70 na semana passada, quando foi confirmada a quebra do teto de gastos. Acompanhando esse movimento, as expectativas para a inflação em 2021 começaram o ano em 3,3% e estão atualmente próximas dos 9%, segundo o boletim Focus do Banco Central.

Na prévia da inflação de outubro, medida pelo IPCA-15, a taxa acumulada em 12 meses chegou a 10,34%.

O câmbio desvalorizado afeta, por exemplo, os custos industrias, já que boa parte dos insumos da nossa indústria são importados. Impacta também os preços dos combustíveis, já que o petróleo é cotado internacionalmente em dólares. E estimula as exportações, reduzindo a oferta de alimentos no mercado interno, o que também contribui para a alta de preços.

Jair Bolsonaro e Paulo Guedes durante coletiva em que confirmaram a quebra do teto de gastos em 2022 (Getty Images)

E por que a quebra do teto de gastos piorou ainda mais esse cenário já desfavorável

Porque, sem o teto como referência para os gastos do governo, os investidores deixam de ter clareza sobre a trajetória da dívida pública. Com isso, a percepção de risco de insolvência do Brasil aumenta e investidores estrangeiros tiram divisas do país, desvalorizando o câmbio e alimentando as expectativas de inflação, o que leva o Banco Central a ter que subir mais os juros para controlá-la.

Por fim, a cereja nesse bolo desandado do Brasil é que 2022 é ano de eleições no país.

"Serão eleições altamente incertas e polarizadas, com dois presidenciáveis a favor do aumento do gasto público, o que pode agravar a situação fiscal. Isso está minando a confiança dos agente para o ano que vem", diz Gutierrez.

Assim, podemos esperar novas revisões para baixo nas projeções de crescimento para o Brasil feitas pelo FMI e pela OCDE, mesmo com o Brasil já estando atualmente na rabeira das expectativas do G20.

"Certamente serão revisadas. Eles devem esperar os resultados da economia no terceiro trimestre, mas devem trazer esses números para baixo, com certeza", acredita Considera, da FGV. "Estamos entrando numa situação que eu não imaginava jamais que nós voltaríamos", lamenta o economista.

Thais Carrança, de S. Paulo para a BBC News Brasil, em 29.10.21

quinta-feira, 28 de outubro de 2021

TSE rejeita pedido de cassação de Bolsonaro e Mourão

Por unanimidade, ministros arquivam ações que acusavam chapa de crimes relacionados ao disparo de mensagens em massa nas eleições de 2018. Em 2022, contudo, prática pode configurar abuso de poder, decide plenário.

Por unanimidade, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) votou nesta quinta-feira (28/10) contra a cassação do presidente Jair Bolsonaro e de seu vice, Hamilton Mourão, pelo escândalo de disparos de mensagens em massa nas eleições de 2018.

Por outro lado, a Corte definiu que, nas eleições de 2022, o uso de aplicativos de mensagens "para realizar disparos em massa, promovendo desinformação, diretamente por candidato ou em seu benefício e em prejuízo de adversários políticos", pode ser considerado abuso do poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social.

O julgamento no TSE analisava duas ações que questionavam o uso de empresas contratadas para realizar disparos de mensagens em aplicativos como o WhatsApp durante a campanha eleitoral de 2018, quando Bolsonaro foi eleito.

As ações foram apresentadas pela coligação O Povo Feliz de Novo, que reúne os partidos PT, PCdoB e Pros e que teve o ex-ministro e ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad como candidato à Presidência em 2018. O petista perdeu para Bolsonaro no segundo turno.

Nas ações, os partidos defendiam que os disparos de mensagens afetaram o resultado das eleições e configuram os crimes de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social. Com a cassação, Bolsonaro e Mourão ficariam ainda inelegíveis por oito anos.

Os votos dos ministros

O julgamento teve início na terça-feira, com os votos de três ministros, incluindo o relator, Luís Felipe Salomão. O TSE retomou a sessão nesta quinta, com os votos dos demais quatro juízes.

Para Salomão, foi comprovado que houve um esquema de propagação de notícias falsas a fim de favorecer Bolsonaro nas eleições de 2018.

"No mínimo desde o ano de 2017, pessoas próximas ao hoje presidente da República atuavam de modo permanente, amplo e constante na mobilização digital de eleitores", afirmou o relator, dizendo que a prática ganha "contornos de ilicitude". A estratégia principal do esquema, segundo o ministro, era atacar adversários políticos, candidatos "e, mais recentemente, as próprias instituições democráticas".

O ministro Mauro Campbell Marques, também na terça-feira, concordou com Salomão, mas ambos entenderam que as provas existentes não justificam a cassação da chapa. Segundo eles, embora tenha havido um esquema de disparos em massa, ainda não há como comprovar que ele influenciou o resultado do pleito.

Outro ministro a votar na terça-feira foi Sérgio Banhos. O julgamento foi então suspenso e retomado nesta quinta com os votos de Carlos Horbach, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso.

Horbach defendeu que o simples uso do WhatsApp e outros aplicativos de mensagens para disparos de mensagens não pode ser considerado uso indevido dos meios de comunicação.

"Se não é possível extrair dos votos todos os aspectos (conteúdo da mensagem, repercussão desse conteúdo, abrangência da ação), como afirmar de modo peremptório que houve disparos em massa com conteúdos inverídicos voltados a prejudicar adversários? As afirmações têm pouco respaldo no conjunto probatório das ações", considerou Horbach.

Ao votar em seguida, Fachin seguiu o colega. "Não se extrai do conjunto probatório indicações seguras de que as violações de termos de uso no Whatsapp estão relacionadas ao uso massivo de envio de mensagens", declarou.

"Todo mundo sabe o que ocorreu"

Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news no Supremo Tribunal Federal (STF), disse ser "mais que notório" que o disparo em massa ocorreu, mas reconheceu não haver provas que comprovem os crimes.

"A Justiça Eleitoral pode ser cega, mas não pode ser tola. Não podemos criar um precedente avestruz. Todo mundo sabe o que ocorreu, todo mundo sabe o mecanismo utilizado nas eleições e depois. Uma coisa é se há a prova específica. É fato mais que notório que ocorreu. Houve disparo em massa. Se os autores negligenciaram na ação, é outra questão", declarou.

Por último, o presidente Barroso, ele próprio alvo de ataques e ameaças por redes bolsonaristas, fez críticas duras à propagação de fake news e discursos de ódio nas redes sociais, mas também salientou não haver provas que justifiquem a cassação.

"Todo mundo sabe o que aconteceu. Quem tem dúvida que as mídias sociais foram inundadas com ódio, com desinformação, com calúnias, teorias conspiratórias? Basta ter olhos de ver", afirmou o chefe da Corte.

"Ainda que o uso de disparos seja notório, exige-se que a prova efetivamente comprove a compra de pacotes e a existência dessa estrutura piramidal de comportamentos mafiosos para distribuição de conteúdos falsos. Apesar de todos reconhecermos a notoriedade dos fatos, para que possa gerar uma condenação, é preciso que haja prova", continuou. "Não foi demonstrado o envio de mensagens por aqueles números a grupos de Whatsapp nem a concatenação entre empresários e a campanha dos candidatos."

Deutsche Welle Brasil, em 28.10.21

Como PEC dos precatórios pode prejudicar professores da rede pública?

Com o apoio do governo, a Câmara dos Deputados deverá votar nesta quinta-feira (28/10) uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que altera regras do chamado teto de gastos e cria novas normas para o pagamento de precatórios.

Aprovação de PEC a ser votada na Câmara pode afetar não só a confiança do mercado, mas professores da rede pública de Estados e municípios (Senado Federal)

A medida é vista por especialistas e parlamentares de oposição como uma manobra do governo para abrir espaço fiscal e financiar, entre outras coisas, o pagamento do Auxílio Brasil, um novo programa social. O que pouca gente sabe é que a aprovação da PEC pode afetar não só a confiança do mercado, mas professores da rede pública de Estados e municípios.

Precatórios são dívidas da União com diversos tipos de credores que a Justiça já reconheceu e sobre as quais não há possibilidade de recurso. Todos os anos, tribunais de todo o Brasil enviam uma relação dos precatórios (dívidas) que a União deverá pagar. A polêmica em torno do assunto começou no segundo semestre deste ano quando o governo passou a procurar formas de abrir espaço no orçamento de 2022 para financiar um novo programa social, agora batizado de Auxílio Brasil.

A previsão é de que o governo deveria pagar R$ 89,1 bilhões em precatórios em 2022. O governo procurou alternativas para evitar o pagamento desse valor, mas vem encontrando resistência em diversos setores, especialmente de agentes econômicos que criticam a medida e classificam como uma espécie de "calote".

Mesmo assim, o governo apoiou a PEC nº 23/2021, que ficou conhecida como PEC dos Precatórios. Na prática, ela abre espaço no orçamento do ano que vem de duas formas. Se for aprovada na Câmara, ela ainda precisa passar pelo Plenário do Senado antes de ser promulgada e entrar em vigor.

De um lado, a proposta altera a forma de correção do teto de gastos do governo. Até agora, a correção do teto de um ano era feito pela inflação calculada pelo IPCA entre julho e junho do ano anterior. O texto do relator Hugo Motta (MDB-PB) muda a regra e propõe a correção para o período de janeiro a dezembro e de forma retroativa a 2017, quando o teto entrou em vigor. Segundo dados do Instituto Fiscal Independente (IFI), essa mudança abriria uma margem de gastos para o governo federal em R$ 47,4 bilhões.

A segunda parte da PEC é que a muda as regras para o pagamento de precatórios. E é essa que pode acabar afetando os professores — possivelmente provocando atrasos para docentes da rede estadual e municipal em alguns lugares.

Rolar a dívida

Em 2022, o governo deveria pagar R$ 89,1 bilhões, um aumento de 64% em relação ao valor previsto para 2021, que foi de R$ 54 bilhões. Esse crescimento foi classificado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, como um "meteoro" nas contas públicas.

A PEC prevê o estabelecimento de um "teto" anual para o pagamento de precatórios. Em 2022, esse valor seria de R$ 41 bilhões. Considerando a dívida de R$ 89,1 bilhões, isso deixaria em aberto um total de R$ 48,1 bilhões para o ano seguinte.

O problema é que desses R$ 89,1 bilhões, pelo menos R$ 16 bilhões são referentes a dívidas que a União tem com os Estados da Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas por conta de um erro do governo no repasse de recursos do antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), que depois foi substituído pelo Fundo de Manutenção da Educação Básica (Fundeb).

União tem dívida com Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas referentes ao antigo Fundef (Getty Images)

Pela legislação, o governo federal deveria fazer uma complementação ao salário dos professores da rede pública por meio do Fundef. Alguns Estados e municípios, no entanto, processaram a União alegando que o cálculo usado por ela para fazer os repasses era incorreto, ocasionando prejuízos.

Os casos foram levados ao Supremo Tribunal Federal (STF) que, nos últimos anos, vêm dando ganho de causa contra a União.

Uma lei de 2020 prevê que 60% dos valores de precatórios devidos pela União como pagamento de dívidas dos tempos do Fundef deveriam ser direcionados aos professores dos Estados e municípios que receberem os valores.

O texto da PEC, porém, prevê mecanismos que dificultam que esses entes recebam as dívidas, o que, em última instância, prejudica os professores.

Um desses mecanismos prevê que se a dívida não for paga dentro do teto estabelecido pela PEC, o Estado ou município credor pode optar por receber no final do ano seguinte com um desconto de até 40%. Na prática, isso poderia diminuir o valor a ser pago aos professores.

Outro dispositivo prevê que o credor que não quiser optar pelo desconto de 40%, pode receber a dívida em até 10 anos, o que também afetaria os professores.

Um terceiro mecanismo é o chamado "encontro de contas". Neste caso, a União poderá propor ao credor que a dívida da União (precatório) seja abatida do total de débitos que ele possa vir a ter com o governo federal.

Um exemplo é o do governo da Bahia que, em 2020, tinha uma dívida com a União de R$ 5,3 bilhões. Em maio deste ano, o STF deu ganho de causa o governo baiano e determinou que a União pagasse R$ 8,7 bilhões em precatórios relativos ao Fundef. Se a PEC for aprovada, o governo federal poderá propor uma espécie de abatimento da dívida, o que, ao final, reduziria o valor a ser recebido pelo Estado da Bahia, afetando, também, o quanto os professores receberiam.

'Tudo ou nada'

Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), Heleno Araújo, a PEC é "absurda" e permite que o governo faça política assistencialista com recursos que não lhe pertencem.

"A PEC é absurda e ilegal. O que o governo quer é fazer pegar um dinheiro que não é seu para fazer política assistencialista em ano eleitoral. Se isso passar, vai desestruturar qualquer confiança que se tenha em decisões da justiça contra a União", afirmou.

Manobra do governo para alterar o teto de gastos é criticada por especialistas (Getty Images)

A política assistencialista à qual Araújo se refere é o programa Auxílio Brasil, lançado pelo governo e que prevê o pagamento temporário de R$ 400 a pessoas em situação de extrema pobreza. Estima-se que o benefício vai atender a 17 milhões de famílias. A expectativa era de que o benefício começasse a ser pago a partir de novembro deste ano, a partir do fim do auxílio emergencial referente à Covid-19.

O economista e fundador e secretário-geral da organização não-governamental Contas Abertas, Gil Castelo Branco, avalia a PEC como uma manobra eleitoreira e que pode prejudicar não apenas os professores, mas o país como um todo.

"A PEC permite o estouro do teto e compromete a confiança do mercado na política fiscal do país. O governo foi para o tudo ou nada de olho nas eleições. É ruim para os professores, que tinham uma expectativa de ganho, mas é ruim também para a população em geral porque isso pode causar crise que afeta a economia", afirmou o economista.

Procurado pela BBC News Brasil, o Ministério da Economia enviou nota afirmando que não iria comentar o assunto.

Na semana passada, porém, o ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu, ao lado do presidente Jair Bolsonaro, a mudança nas regras do pagamento de precatórios e na correção do teto de gastos.

"Eu falei: 'Olha, furamos o teto ano passado para atender a saúde. Os efeitos econômicos sobre os mais frágeis foram devastadores, todo mundo está dizendo que os mais pobres estão sem comida, sem gás, tendo que cozinhar com lenha. Ora, ninguém quer tirar 10 em (política) fiscal e deixar os mais frágeis passarem fome", afirmou o ministro.

Castelo Branco diz ainda que, apesar do discurso do governo, o estouro do teto gerado pela PEC dos Precatórios não vai financiar apenas o Auxílio Brasil, mas também será usado para bancar as chamadas "emendas de relator", um tipo de emenda parlamentar mais difícil de rastrear em que a destinação dos recursos é feita pelo relator-geral do orçamento.

Reportagens publicadas pelo jornal O Estado de S. Paulo ao longo deste ano mostraram que esse tipo de mecanismo estaria sendo usado irregularmente pelo governo para beneficiar parlamentares da base. O governo, por sua vez, se defende afirmando que políticos de oposição também teriam recebido recursos das emendas de relator.

O diretor-executivo do Instituto Fiscal Independente do Senado (IFI), Felipe Salto, avalia que a PEC dos Precatórios poderá custar caro ao país porque o estouro do teto deverá afetar a confiança do mercado nas contas públicas.

"O que está acontecendo é que o governo quer abrir espaço no orçamento para prioridades eleitorais. O governo quer fazer espaço para emendas de relator e gasto social, que é importante, mas que poderia ser feito dentro do teto. Essa história é uma inovação que vai custar caro ao país porque vai afetar a credibilidade no governo", explicou.

Leandro Prazeres, de Brasília, DF, para a BBC News Brasil, em 28.10.21

quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Muito mais que uma ‘conversinha’

Desmandos fiscais do presidente Bolsonaro e de sua equipe reforçam o pessimismo das projeções econômicas para o próximo ano.

O Brasil do ministro da Economia, Paulo Guedes, será o novo país dos sonhos dos brasileiros dispostos a emigrar, se descobrirem onde fica essa terra maravilhosa. Depois de uma recuperação em V, esse Eldorado continuará prosperando, com muita oferta de emprego e fartura para todos, sob o cuidado de um governo eficiente, prudente e atento aos mais vulneráveis. Quem prevê estagnação ou recessão repete a “conversinha” de sempre, disse o ministro, ao comentar a piora das projeções para 2022. Essa piora se acentuou diante da disposição do presidente, com apoio de Guedes, de arrebentar o teto de gastos federais, num claro rompimento com os padrões da responsabilidade fiscal.

A economia brasileira terá contração de 0,5% no próximo ano, segundo a nova projeção do Banco Itaú. A estimativa anterior, já muito sombria, indicava expansão de 0,5%. O Banco JP Morgan reduziu de 0,4% para zero o resultado previsto para 2022, revisão igual àquela anunciada pela consultoria MB Associados. O recuo das expectativas tem ocorrido de modo amplo, no mercado, como tem mostrado a pesquisa Focus, semanalmente realizada pelo Banco Central (BC). Em quatro semanas passou de 5,04% para 4,97% a mediana das projeções do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2021. No mesmo intervalo, o desempenho esperado para 2022 diminuiu de 1,57% para 1,40%.

A tal “conversinha” envolve, portanto, mais do que um par de grandes bancos e umas poucas consultorias. As expectativas captadas na pesquisa vêm piorando há meses. Nessa mudança, aumenta a inflação prevista e diminui o crescimento econômico estimado. Os novos ataques ao teto de gastos e à disciplina fiscal deram aos analistas novos argumentos para tornar mais sombrios os seus cenários.

A gestão mais irresponsável das finanças públicas, argumentam esses analistas, aumentará a insegurança dos investidores, favorecerá a instabilidade cambial, tornará mais cara a dívida pública, alimentará a inflação e prejudicará o crescimento econômico. A aceleração da alta de preços aparece tanto nas projeções quanto na experiência cotidiana e nos dados oficiais. Divulgada um dia depois do pronunciamento ministerial sobre a “conversinha”, a prévia da inflação de outubro confirmou o desajuste crescente no varejo de bens e serviços.

Apurado entre 15 de setembro e 13 de outubro, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) subiu 1,20%. Foi a maior alta para outubro desde 1995 e o maior aumento mensal desde fevereiro de 2016, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 12 meses a variação chegou a 10,34%. Pressionadas pelas péssimas condições de emprego e pela erosão de sua renda, agravada pelo crescente custo de vida, as famílias serão incapazes de manter o consumo necessário para sustentar uma produção robusta de bens industriais e de serviços.

O desarranjo dos preços é mais um forte argumento a favor do pessimismo nas projeções para 2022. Não há sinal de abrandamento desse desarranjo. Ao contrário: a incerteza dos investidores, a insegurança dos empresários e a instabilidade cambial tenderão a realimentar a alta de preços, mantendo os consumidores sob pressão. Na terça-feira, a divulgação do IPCA-15 reforçou as apostas numa forte alta dos juros ao longo dos próximos meses, com prejuízo para o crescimento do PIB.

O aumento do Bolsa Família, com benefício elevado a R$ 400 e estendido a 17 milhões de pessoas, será insuficiente para mudar o quadro. A inflação reduzirá o poder de compra desse dinheiro. Além disso, esse programa, rebatizado como Auxílio Brasil, alcança um conjunto muito menor que o dos beneficiários da ajuda emergencial. As perspectivas, por enquanto, são muito ruins para a maior parte dessa população.

O apoio aos pobres, citado pelo ministro Guedes como bom motivo para a ruptura do teto, poderia ser mais amplo e mais compatível com a boa gestão fiscal. Haveria dinheiro para isso, se o presidente pudesse tocar sua vida política sem depender do apoio do Centrão, um sumidouro de dinheiro público.

Editorial / Notas&Informações, O Estado de S.Paulo, em 27 de outubro de 2021


Maduro manobra para evitar abertura de processo no Tribunal Penal Internacional

Chavismo solta presos e faz reformas judiciais na tentativa de melhorar sua imagem, à espera de visita do procurador-chefe de Haia


Nicolás Maduro na quinta-feira passada em Caracas (Venezuela). (Miguel Gutierrez, EFE)

O Governo de Nicolás Maduro faz manobras para esvaziar uma investigação do Tribunal Penal Internacional (TPI) sobre a situação no país. Com reformas judiciais e a libertação de vários seus 250 presos políticos, o chavismo tenta melhorar sua imagem apesar das acusações de violações sistemáticas de direitos humanos e crimes contra a humanidade. A amostra mais recente aconteceu nesta terça-feira. Dois dos três ativistas da organização Fundaredes detidos em julho, Omar de Dios García e Rafael Tarazona, foram libertados. Seu diretor Javier Tarazona, entretanto, continua detido. Há vários anos, essa ONG denuncia energicamente a presença de grupos guerrilheiros colombianos na Venezuela em conivência com o chavismo. Foram acusados de “terrorismo e traição à pátria”.

Estes movimentos ocorrem às vésperas da visita do procurador-chefe do TPI, Karin Khan, no final desta semana, como parte de uma viagem pela América Latina. O próprio Governo promove essa visita como um sinal de abertura e de mudança no sistema de Justiça, apontado um braço repressor do chavismo no último relatório da Missão Independente das Nações Unidas.

O pedido de investigação sobre a Venezuela pelo tribunal de Haia foi aberto em 2018 por iniciativa da Argentina, Canadá, Colômbia, Chile, Paraguai e Peru, em uma solicitação sem precedentes na curta vida desse tribunal, fundado em 2002. Depois, com a volta do kirchnerismo ao poder, a Argentina se desvinculou da iniciativa do chamado Grupo de Lima. O pedido teve a adesão também da ex-procuradora-geral venezuelana Luisa Ortega Díaz, que pediu asilo político na Espanha, e de organizações de direitos humanos e familiares de vítimas de execuções extrajudiciais, detenções arbitrárias e torturas.

Fatou Bensouda, ex-procuradora-geral do TPI, considerou que havia evidências razoáveis para investigar crimes contra a humanidade na Venezuela. O parecer foi dado logo depois de uma visita do procurador-geral venezuelano, Tarek William Saab, na qual o chavismo tentou demonstrar esforços para melhorar o sistema de justiça no país. A decisão sobre a abertura da investigação é esperada desde julho, quando o novo procurador assumiu, com a intenção de fazer uma visita ao país e dar um último voto de confiança antes de autorizá-la. “Estou convencido de que o estreitamento das relações e a cooperação com os Estados integrantes melhorará o funcionamento do regime do Estatuto de Roma [que rege o TPI], em consonância com o princípio de complementariedade. A comunicação é essencial para explicar o mandato da Procuradoria e do TPI e para fomentar a confiança das partes interessadas. Aguardo com interesse a oportunidade de escutar e de aprender com esta minha primeira viagem à região como Procurador do TPI”, disse Khan em um comunicado. O Governo de Maduro tentará convencê-lo de que não há motivos para abrir uma investigação. As ONGs e vítimas defenderão o início de um processo contra membros do Executivo chavista.

Com a aproximação de uma eleição local que terá a participação de partidos da oposição pela primeira vez após sete anos de boicotes, o chavismo, encurralado em seu cerco diplomático, teve que ceder em vários aspectos. Sentou-se para negociar no México com a oposição, embora tenha congelado esse processo após a extradição para os Estados Unidos de Alex Saab, o operador comercial do Governo para fugir das sanções, também famoso como testa-de-ferro de Maduro. De fato, as reformas no sistema de justiça nacional constavam na pauta no México. Agora, o Governo se antecipou em adotá-las sem conciliar com a oposição, para atenuar as suspeitas no TPI.

O Executivo de Maduro se aferra a alguns marcos que testemunham sua mudança. Em 2018, quando o vereador opositor Fernando Albán morreu ao cair do 10º andar da sede do serviço de inteligência, o procurador Saab rapidamente lançou a tese do suicídio. Há cinco meses o funcionário se retratou, admitindo que se tratou de um assassinato, e três anos depois dos fatos ordenou a captura dos agentes que o custodiavam. Nessa mesma declaração, reconheceu como assassinatos os casos do capitão Rafael Acosta Arévalo, morto por tortura, e de Juan Pablo Pernalete, impactado pelo disparo de uma bomba de gás lacrimogêneo nos protestos de 2017.

Outro caso com o que o Governo tenta melhorar sua imagem é o de David Vallenilla, outro jovem morto nas manifestações de quatro anos atrás. No começo de outubro, uma juíza ordenou a absolvição do sargento que atirou nele. A decisão foi alvo de recurso pela família e o Ministério Público, e em tempo recorde o militar foi condenado a 23 anos da prisão.

Em setembro, muito discretamente, também começaram a ser soltos presos políticos como o ex-deputado Gilberto Sojo. Nesse mesmo mês, a Assembleia Nacional, subordinada ao chavismo, ditou sem maiores consultas públicas um pacote de leis que busca encobrir as graves falhas na situação dos direitos humanos no país. Alguns dos avanços legislativos têm a ver com a desmilitarização da Justiça ou a possibilidade de que ONGs de direitos humanos assumam a defesa de quem denunciar alguma violação de suas garantias fundamentais. Uma reforma do Código Penal reduz os prazos judiciais, para acelerar os julgamentos, e limita a três anos o período máximo de prisão sem trâmite em julgado.

“Se a Venezuela fosse um país de leis, estas mudanças legislativas trariam alguma melhora ao sistema de Justiça. Estas modificações não apontam para o enorme paquiderme que não se atrevem sequer a mencionar: que na Venezuela não temos juízes nem imparciais nem independentes, apenas simples funcionários que se limitam a cumprir ordens”, aponta uma análise sobre as reformas de Acesso à Justiça.

Trata-se de uma mudança radical na postura do Governo de Maduro. A pressão pelas acusações no TPI parecem ser sua maior encruzilhada, um terreno onde o chavismo tem pouca capacidade de manobra. Além das consequências jurídicas deste processo, que poderiam demorar, o processo em Haia acirra o cerco diplomático que Caracas tenta derrubar principalmente com a revogação de sanções, o restabelecimento de relações diplomáticas com a União Europeia e uma incipiente abertura comercial com a Colômbia.

Apesar desses esforços, a recente morte do general Raúl Isaías Baduel na prisão, sobre a qual o procurador Saab também antecipou como causa de morte a covid-19 – tese questionadapor sua família – agitou novamente a luta dos detentos políticos. A décima morte de um preso político custodiado pelo Governo ofusca os movimentos com os quais o chavismo procura se reerguer nos fóruns internacionais. Há duas semanas, os familiares de presos políticos protestaram para exigir que oTPI acelere sua decisão sobre a abertura de uma investigação contra Maduro e outros altos funcionários. A visita de Khan gera expectativas.

Florantonia Singer, de Caracas para o EL PAÍS,em 27.10.21

CPI desafia o Brasil a punir Bolsonaro pela gestão insensível à dor e às mortes na pandemia

Aprovação do relatório final, que pede 80 indiciamentos, pressiona autoridades judiciais por punições e acua o presidente, acusado pelos senadores de crime contra a humanidade

O senador Renan Calheiros durante entrevista coletiva no Senado. (Evaristo Sá, AFP)

Depois de quase seis meses de trabalho, a CPI da Pandemia aprovou seu relatório final por sete votos a quatro, colocando o presidente Jair Bolsonaro no centro de uma gestão frouxa e intencionalmente insensível da pandemia de coronavírus. Os senadores acusam o presidente de ter cometido crime contra a humanidade, e outros oito delitos, entre eles, incitação e propagação da pandemia, além de charlatanismo. Os integrantes da CPI já anteveem um encontro com representantes do Tribunal Penal Internacional para tratar da acusação mais grave.

A CPI sistematizou todos os potenciais crimes, omissões e erros cometidos pela Governo federal no combate à pandemia, em busca de uma suposta imunidade de rebanho. O plano era retomar a economia a qualquer custo, deixando o vírus se espalhar. Bolsonaro foi o principal garoto propaganda da desobediências às regras sanitárias, ao não usar máscaras, promover aglomerações e defender o uso da cloroquina. Além do presidente, outras 77 pessoas e duas empresas foram implicadas por 24 delitos, de charlatanismo a epidemia com resultado morte; de incitação ao crime a corrupção ativa. A lista é longa e já resultou na abertura de 17 procedimentos iniciais em órgãos de controle, como Ministério Público e Tribunal de Contas. Senadores e especialistas calculam que milhares de vidas poderiam ter sido poupadas se tivesse havido uma gestão responsável da pandemia.

A comissão parlamentar desnudou um balcão de negócios no Ministério da Saúde, impediu uma compra de 1,6 bilhão de reais da suspeita vacina Covaxin, descobriu esquemas de lobby de empresas Precisa e VTCLog, que tinham contratos com o Governo, e revelou que seres humanos eram usados pelo plano de saúde Prevent Senior e por um médico como cobaias involuntárias de medicamentos como cloroquina e proxalutamida. “Esta comissão parlamentar de inquérito tirou o Brasil do cercadinho e colocou o negacionismo dentro do cercadinho”, sintetizou o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), em alusão ao local onde os militantes bolsonaristas costumam se concentrar para ouvir o presidente em frente ao Palácio da Alvorada. O senador Renan Calheiros, (MDB-AL), relator da Comissão, chegou a comparar Bolsonaro ao ditador chileno Augusto Pinochet, e ao comandante Carlos Brilhante Ustra, temido agente da ditadura, que chefiou um centro de tortura de adversários do governo militar.

O destino do relatório está nas mãos do Procurador Geral da República, Augusto Aras, que deve analisar oito crimes comuns atribuídos ao chefe do Executivo, e do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que vai avaliar se Bolsonaro cometeu o crime de responsabilidade que lhe é atribuído e deveria, portanto, sofrer um processo de impeachment. “A CPI fez bastante barulho, produziu um relatório sério e robusto, mas o presidente ainda tem dois guardiões, Lira e Aras. Tudo o que a CPI fez, agora, depende deles. No mais, o desgaste político de Bolsonaro já foi dado”, destaca o cientista político David Fleischer, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB).

Aras tem 30 dias para dar uma resposta aos senadores. Ele já disse que montará uma espécie de grupo de trabalho formado por procuradores para analisar as sugestões dos parlamentares para, só então, se manifestar. Lira, por sua vez, dificilmente dará andamento a um processo impeachment a menos de um ano da eleição. Como ressaltou Fleischer, portanto, é possível que a grande punição à política sanitária de Bolsonaro nos últimos meses venha das urnas no próximo ano, quando o presidente tentará a reeleição.

As mudanças

Correndo o risco de ver todo seu trabalho ser perdido por um rejeição do relatório pelo plenário da comissão, o relator Renan Calheiros recuou e decidiu apresentar um pedido de indiciamento do governador do Amazonas, o bolsonarista Wilson Lima (PSC), e do ex-secretário de Saúde do Estado Marcellus Campêlo pelo delito de prevaricação durante a crise de falta de oxigênio em Manaus. A inclusão de Lima era um pedido do senador Eduardo Braga (MDB-AM). O governador também responderá por epidemia com resultado morte e por crime de responsabilidade.

Calheiros acrescentou ao relatório outros 12 pedidos de indiciamento nesta terça-feira. No início do dia, o senador alagoano atendeu a um pedido do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e colocou no rol de possíveis culpados pelos erros na pandemia o senador Luz Carlos Heinze (PP-RS). Eles queriam que Heinze fosse indiciado por incitação ao crime pela divulgação de desinformação. Porém, uma intensa negociação com a cúpula do Senado levou à retirada do nome do parlamentar gaúcho, a pedido do próprio Alessandro Vieira, para evitar o constrangimento de envolver um senador da comissão entre os principais responsáveis pela crise que levou a mais de 606.000 mortes no país.

O nome de Heinze foi cogitado para a lista por ele ter propagandeado nos últimos seis meses o uso da cloroquina, entre outros medicamentos do ineficaz kit covid. É um comportamento semelhante ao de Bolsonaro, que foi apontado como o responsável por nove delitos. Heinze seria indiciado por incitação ao crime. “Não se gasta vela boa com defunto ruim. Esta CPI fez um trabalho, prestou um serviço para o Brasil, muitíssimo relevante. Não posso, a esta altura, colocar em risco nenhum pedaço desse serviço por conta de mais um parlamentar irresponsável”, justificou Vieira ao pedir a retirada do nome do colega do documento final.

Os senadores concordaram ainda em solicitar o banimento do presidente das redes sociais, pela insistência em disseminar desinformação. A última delas ocorreu na quinta-feira passada, quando, durante sua live semanal, ele associou a vacina contra coronavírus à infecção por HIV, o que é falso. “A responsabilidade é principalmente desse presidente da República, desse serial killer, que tem compulsão de morte e continua a repetir tudo que fez anteriormente. Agora, com a declaração de que a vacina pode proporcionar AIDS ele demonstra que não tem respeito nenhum pela vida dos brasileiros”, disse Calheiros, que chamou o presidente de homicida. “Bolsonaro agiu como um missionário enlouquecido para matar o próprio povo.”

O vídeo em que Bolsonaro mente sobre a vacina foi retirado do Facebook, do Instagram e do YouTube. Desta última plataforma o presidente ainda foi suspenso por uma semana. A intenção dos senadores opositores ao presidente é que ele sofra a mesma sanção que o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, suspenso depois de incentivar a invasão do Capitólio e reincidir diversas vezes na divulgação de fake news.

Parlamentares governistas protestaram contra o relatório aprovado. “É uma peça claramente de vingança, com requintes de crueldade, de ódio, com interesses de poder”, disse o senador Eduardo Girão (Podemos-CE). Já o primogênito do presidente, Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), disse que o documento é uma aberração jurídica e minimizou o resultado das apurações. “O maior escândalo que foi levantado aqui é de uma vacina que não foi comprada.”

Com o fim dos trabalhos, os senadores montaram uma espécie de observatório para acompanhar o andamento das denúncias apresentadas. A cúpula da CPI, formada por Randolfe, Renan e pelo presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), tentará conseguir uma agenda com representantes do Tribunal Penal Internacional. A ideia é levar o caso a Haia para que Bolsonaro seja julgado por crime contra a humanidade.

Os senadores Randolfe, Omar e Renan, durante a última reunião da CPI da Pandemia (Adriano Machado / Reuters)

Depois de seis meses de atuação, a Comissão chega ao fim com um projeto de escapar das práticas bárbaras em que o país mergulhou, como discursou o senador Renan Calheiros. “É passada a hora de encerrar esta noite macabra que enluta o país dolorosamente”, concluiu, antes de os senadores fazerem um minuto de silêncio por quem não teve como se defender dos erros e omissões do Governo: os 606.000 mortos pela covid-19.

Afonso Benites, de Brasília, DF e Beatriz Jucá, de Fortaleza, CE, para o EL PAÍS, em 26.10.21.

terça-feira, 26 de outubro de 2021

A última de Bolsonaro

Algumas das mentiras que o presidente conta soariam só ridículas, não fossem tão perigosas no contexto de uma pandemia que já matou mais de 605 mil brasileiros

 O presidente Jair Bolsonaro não é o primeiro mandatário a mentir. Seguramente, não haverá de ser o último. Entretanto, como nenhum outro antes dele, Bolsonaro alçou a desinformação à categoria de método de governo. Distorções de fatos amplamente assimilados como tais ou desinformação da mais desavergonhada têm servido ao presidente da República como instrumentos de mobilização e propaganda eleitoral.

De tão contumazes, por vezes estapafúrdias, algumas das mentiras que Bolsonaro conta soariam apenas ridículas não fossem extremamente perigosas no contexto de uma pandemia que já matou mais de 605 mil brasileiros. No que pode ser classificado como seu mais grave ataque à vacinação contra a covid-19 até agora, Bolsonaro afirmou durante uma live no dia 21 passado – sem apresentar qualquer dado confiável que sustentasse a afirmação – que indivíduos que receberam as duas doses da vacina no Reino Unido estariam “desenvolvendo a síndrome de imunodeficiência adquirida muito mais rápido do que o previsto”. Do seu jeito peculiar, Bolsonaro afirmou que a vacina contra a covid-19 causa aids. A isso ele se prestou para disseminar dúvidas sobre a segurança das vacinas a pretexto de defender o que entende ser a “liberdade individual” dos cidadãos que não querem receber o imunizante contra o coronavírus. O Comitê de HIV/Aids da Sociedade Brasileira de Infectologia publicou nota desmentindo categoricamente o presidente da República. 

Das duas, uma: ou Bolsonaro não sabia que a associação entre a imunização completa contra a covid-19 e a infecção pelo vírus HIV não tem qualquer fundamento, demonstrando inaceitável ignorância para um presidente da República, ou sabia – e mesmo assim divulgou o embuste para confundir os cidadãos, com objetivos inconfessáveis. Seja como for, Bolsonaro deu a entender que sabia que a tal “informação” seria contestada: “Vou só ler a notícia aqui, não vou comentar. Já falei sobre isso no passado e apanhei muito. Posso ter problemas com a minha live”, disse o presidente. De fato, teve.

Pela primeira vez, o Facebook e o Instagram retiraram o conteúdo da transmissão de Bolsonaro de suas plataformas no dia 24. O presidente não se manifestou sobre a exclusão do vídeo. E nem precisava. A Bolsonaro interessa lançar suas mentiras no ar e deixar que elas ganhem vida própria no submundo das redes sociais.

Muitas dessas mentiras que Bolsonaro e seu “gabinete do ódio” fazem circular ressoam apenas entre os seguidores mais fanáticos do presidente, uma parcela cada vez menor da população, ainda que muito barulhenta. Para o bem do País, o discurso antivacina de Bolsonaro é mal recebido pela população em geral. A cultura vacinal tem raízes profundas no Brasil. O número de cidadãos que têm acorrido aos postos de vacinação fala por si só.

Como mostrou a reportagem do Estado, sempre haverá uma parcela da sociedade que não levará em consideração a verdade factual para formar opinião. Não obstante o diligente trabalho de serviços de checagem como o Estadão Verifica, muitas mentiras e teorias conspiratórias compartilhadas nas redes sociais, por mais absurdas que pareçam, são – e continuarão sendo – levadas a sério por uma parte da população. Quanto a isso pouco há de ser feito, haja vista que aqui se está na esfera das paixões. Já exigir responsabilidade de Bolsonaro no exercício da Presidência é dever inarredável dos Poderes constituídos.

O fato de ter amesquinhado o cargo que ocupa não exime Bolsonaro de ser chamado às falas por seus atos e palavras, ao contrário. Em boa hora, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) pediu à CPI da Covid que envie ao Supremo Tribunal Federal uma compilação das falsas alegações de Bolsonaro sobre as vacinas ditas em suas lives, a fim de que constem no inquérito que tramita na Corte sobre a disseminação de notícias falsas.

Não há registro de um chefe de Estado e de governo que tenha degradado a força da palavra da Presidência da República de forma irreparável como logrou Bolsonaro. Quase nada do que ele diz ou escreve é digno da confiança dos cidadãos que não têm por hábito brigar com a realidade. Mas até para um mitômano como ele há limites que não podem ser ultrapassados impunemente.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S.Paulo, em 26 de outubro de 2021

Eduardo Leite se perfila como candidato pacificador enquanto desafia João Doria no ninho tucano

Governadores disputam prévia do PSDB, que serão definidas em novembro. Gaúcho aponta fraude na busca pela vaga do seu partido, que abre espaço para construir a candidatura de terceira via

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, durante entrevista nesta segunda-feira. (Foto: Gustavo Rampini).

O PSDB está em intensa campanha pelas prévias do partido que serão definidas entre os dias 21 e 28 de novembro (se houver segundo turno), para começar a construir a ansiada terceira via pela presidência da República. Os tucanos apostam que há uma avenida aberta entre os eleitores que não querem votar na reeleição do presidente Jair Bolsonaro nem na volta do ex-presidente Lula da Silva, líderes nas pesquisas até agora. Assim, o partido de centro, que já oscilou à esquerda e à direita, aposta em seus quadros mais destacados durante a pandemia. De um lado, o governador de São Paulo, João Doria Jr, visto com favoritismo inicialmente por seu esforço para trazer a vacina contra a covid-19 para o Estado paulista, a despeito da resistência do Governo Bolsonaro.

De outro, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, elogiado por ter colocado em dia o pagamento de salários atrasados de servidores ao longo do seu mandato, e por ter dado curso a privatizações de companhias locais para sanear as finanças do Estado. O gaúcho, de 36 anos, que já foi prefeito de Pelotas, anuncia que pretende ser o polo “pacificador” de uma eleição que, segundo ele, vive dois extremos com Lula e Bolsonaro. “Não podemos ter uma terceira via de polarização”, disse ele nesta segunda em entrevista ao programa Amarelas Onair, da revista Veja, do qual o EL PAÍS participou.

Por fora, corre o ex-prefeito de Manaus, Arthur Virgílio, mas que fica na rabeira na peleja entre os dois primeiros. Tanto Leite como Doria estão confiantes de suas vitórias pela vaga de candidato tucano. Se Leite é um rosto novo na política nacional —e, portanto com uma imagem menos desgastada—, Doria conquistou o capital político de ter liderando o movimento dos governadores pela vacina enquanto Bolsonaro bloqueava o intento.

Cordiais mutuamente em aparições públicas, os dois governadores vivem um embate forte nos bastidores em busca dos votos de lideranças e filiados tucanos. Correligionário de Leite acusam um grupo de prefeitos recém-convertidos ao PSDB de jogo desleal ao querer votar mesmo tendo migrado para o partido em julho, após o prazo permitido, de 31 de maio. São 92 prefeitos mais alinhados a Doria, que estariam na pendenga. “É um questão que precisa ser apurada. Há farta documentação que apresenta a filiação [desses prefeitos] a partir de 20 de julho”, disse Leite nesta segunda.

O governador gaúcho não descarta a judicialização das prévias se os votos desse grupo forem contados. Doria, por sua vez, já disse que essa questão diz respeito ao diretório nacional, mantendo distância das acusações de fraude. Apesar das bicadas, os dois concorrentes pisam em ovos para tecer críticas um ao outro, para não inflamar (ainda mais) os ânimos no partido. “Prefiro acreditar que não foi uma ação direta do governador, mas eventualmente alguém que quis mostrar serviço a revelia do candidato [Doria]”, segue ele, que vê em sua gestão e na administração de São Paulo dois trunfos importantes para a corrida eleitoral. “Mas temos estilos diferentes. Doria vai para um tipo de enfrentamento e desqualificação de seus adversários”, diz Leite, que se vê numa linha de “construção” em vez de “destruição e eliminar quem pensa diferente”.

Tanto ele, como Doria, correm o país em busca de apoio dentro e fora do partido para serem chancelados para a terceira via. Nas pesquisas, entretanto, Doria encara uma rejeição maior que seu colega por manobras passadas, jamais esquecidas pelo eleitor. Eleito prefeito da cidade de São Paulo em 2016, abandonou a prefeitura 1 ano e 3 meses depois para concorrer ao governo do Estado, traindo não só os eleitores, mas seu padrinho no tucanato, o ex-governador Geraldo Alckmin, quando mostrou disposição para flertar com a vaga à presidência. Voltou atrás, mas a rusga já estava posta. O assunto persegue Doria até os dias de hoje, como mostrou um vídeo que circulou nas redes sociais nesta segunda.

Leite, por sua vez, tem menos de 40 anos e a estampa sob medida para um público de classe média e alta do Sul e Sudeste —e para o mercado financeiro. Seguindo a cartilha das privatizações e da gestão austera, coloca as reformas tributária e administrativa como prioridades para o primeiro ano de um eventual Governo. Mas aposta em conciliar o fiscal e o social. “Precisamos focar na redução da desigualdade e do desmatamento [da Amazônia]”, defende ele.

Terceira via

Seja quem for vitorioso na disputa tucana, terá pela frente o pesado desafio de superar os demais candidatos à terceira via. O número de potenciais candidatos se multiplica à medida que a campanha eleitoral se aproxima — na verdade, ela já está posta. A última novidade é a chegada do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que deixará o DEM para se filiar ao PSD, presidido por Gilberto Kassab. Nas próximas semanas, é a vez do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro, que deve se filiar ao Podemos, completando mais de 10 nomes disputando a fatia entre Lula e Bolsonaro. Segundo Andrei Roman, CEO do Atlas Político, esse porcentual já esteve em 28% há algumas semanas, mas o número caiu um pouco. A fragmentação de nomes prejudica essa terceira via. Uma projeção da Atlas mostra, por exemplo, que Moro tiraria bons votos de Eduardo Leite.

O gaúcho, porém, diz ver com cautela as pesquisas neste momento. “A eleição ainda não está na mesa das famílias, no ambiente de trabalho. Está entre nós, políticos, a crítica especializada, não entre a população que está preocupada com pandemia, com preço do gás, alimento...”. Leite bate frontalmente com os dois líderes das pesquisas, mas uma pergunta o persegue, por ter votado no passado em Bolsonaro. Em entrevista ao UOL, na última semana, ele afirmou que não se sentia culpado pela eleição do presidente. “Vamos colocar a responsabilidade nas dezenas de milhões de brasileiros que votaram no Bolsonaro?”, questionou.

Carla Jiménez, de São Paulo para o EL PAÍS, em 26.1021

Quem são os 80 alvos de pedidos de indiciamento do relatório final da CPI da Pandemia

Nova versão do documento foi apresentada pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL) após inclusão de nomes a pedido dos parlamentares. 

O presidente da comissão Omar Aziz (PSD-AM), ao centro, conversa com o vice Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e o relator Renan Calheiros (MDB-AL). (Adriano Machado / Reuters)

A CPI da Pandemia apresentou nesta terça, 26 de outubro, uma nova versão de seu relatório, contemplando pedidos de senadores para a inclusão de novos nomes em relação ao texto lido na semana passada pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL). O novo documento amplia de 68 para 80 o número de possíveis indiciamentos por crimes relacionados à gestão da crise da covid-19 no Brasil, que já matou mais de 600.000 pessoas. A lista inclui pessoas e empresas.

O presidente Jair Bolsonaro continua sendo o principal alvo dos senadores. Entre os novos nomes estão o do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), e o de seu então secretário da saúde, Marcellus Campêlo. No texto, Calheiros argumenta que houve “falta de zelo e seriedade do governador Wilson Lima e do Secretário de Saúde Marcellus Campêlo com a coisa pública, comportamento esse que resultou na morte de milhares de pessoas no Estado do Amazonas”. O senador bolsonarista Luiz Carlos Heinze (PP-RS) também chegou a ser incluído por ter defendido reiteradamente ao longo dos seis meses de trabalho da comissão remédios sem eficácia para a covid-19, mas seu nome foi retirado da lista horas depois.

O relatório da CPI vai à votação ainda nesta terça. Para ter efeito prático, o texto aprovado ainda precisa ser enviado para autoridades como a Polícia Federal, o Ministério Público e a Procuradoria-Geral da República, a quem cabe investigar e apresentar denúncias.


Veja os alvos dos 80 pedidos de indiciamento:

Segundo a mais recente versão do relatório da CPI da Pandemia

1) JAIR MESSIAS BOLSONARO

2) EDUARDO PAZUELLO – Ex-Ministro da Saúde

3) MARCELO ANTÔNIO C. QUEIROGA LOPES – Ministro da Saúde

4) ONYX DORNELLES LORENZONI – Ex-ministro da Cidadania e ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República

5) ERNESTO HENRIQUE FRAGA ARAÚJO – Ex-ministro das Relações Exteriores

6) WAGNER DE CAMPOS ROSÁRIO - Ministro-chefe da Controladoria Geral da União

7) ANTÔNIO ELCIO FRANCO FILHO – Ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde

8) MAYRA ISABEL CORREIA PINHEIRO – Secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde

9) ROBERTO FERREIRA DIAS – Ex-diretor de logística do Ministério da Saúde

10) CRISTIANO ALBERTO HOSSRI CARVALHO – Representante da Davati no Brasil

11) LUIZ PAULO DOMINGUETTI PEREIRA – Representante da Davati no Brasil

12) RAFAEL FRANCISCO CARMO ALVES – Intermediador nas tratativas da Davati

13) JOSÉ ODILON TORRES DA SILVEIRA JÚNIOR – Intermediador nas tratativas da Davati

14) MARCELO BLANCO DA COSTA – Ex-assessor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde e intermediador nas tratativas da Davati

15) EMANUELA BATISTA DE SOUZA MEDRADES – Diretora-Executiva e responsável técnica farmacêutica da empresa Precisa

16) TÚLIO SILVEIRA – Consultor jurídico da empresa Precisa

17) AIRTON ANTONIO SOLIGO - Ex-assessor especial do Ministério da Saúde

18) FRANCISCO EMERSON MAXIMIANO – Sócio da empresa Precisa

19) DANILO BERNDT TRENTO - Sócio da empresa Primarcial Holding e Participações Ltda e diretor de relações institucionais da Precisa

20) MARCOS TOLENTINO DA SILVA – Advogado e sócio oculto da empresa FIB Bank

21) RICARDO JOSÉ MAGALHÃES BARROS – Deputado Federal

22) FLÁVIO BOLSONARO – Senador da República

23) EDUARDO BOLSONARO – Deputado Federal

24) BIA KICIS – Deputada Federal

25) CARLA ZAMBELLI – Deputada Federal

26) CARLOS BOLSONARO – Vereador da cidade do Rio de Janeiro

27) OSMAR GASPARINI TERRA – Deputado Federal

28) FÁBIO WAJNGARTEN – ex-chefe da Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) do governo federal

29) NISE HITOMI YAMAGUCHI – Médica participante do gabinete paralelo

30) ARTHUR WEINTRAUB - ex-assessor da Presidência da República e participante do gabinete paralelo

31) CARLOS WIZARD MARTINS – Empresário e e participante do gabinete paralelo

32) PAOLO MARINHO DE ANDRADE ZANOTTO – biólogo e participante do gabinete paralelo

33) ANTÔNIO JORDÃO DE OLIVEIRA NETO – biólogo e participante do gabinete paralelo

34) LUCIANO DIAS AZEVEDO – Médico e participante do gabinete paralelo

35) MAURO LUIZ DE BRITO RIBEIRO – Presidente do Conselho Federal de Medicina

36) WALTER SOUZA BRAGA NETTO – Ministro da Defesa e Ex-Ministro Chefe da Casa Civil

37) ALLAN LOPES DOS SANTOS – Blogueiro suspeito de disseminar fake news

38) PAULO DE OLIVEIRA ENEAS – Editor do site bolsonarista Crítica Nacional suspeito de disseminar fake news

39) LUCIANO HANG – Empresário suspeito de disseminar fake news

40) OTÁVIO OSCAR FAKHOURY – Empresário suspeito de disseminar fake news

41) BERNARDO KUSTER – Diretor do Jornal Brasil Sem medo, suspeito de disseminar fake news

42) OSWALDO EUSTÁQUIO – Blogueiro suspeito de disseminar fake news

43) RICHARDS POZZER – Artista gráfico supeito de disseminar fake news

44) LEANDRO RUSCHEL – Jornalista suspeito de disseminar fake news

45) CARLOS JORDY– Deputado Federal

46) FILIPE G. MARTINS – Assessor Especial para Assuntos Internacionais do Presidente da República

47) TÉCIO ARNAUD TOMAZ – Assessor especial da Presidência da República

48) ROBERTO GOIDANICH - Ex-presidente da FUNAG

49) ROBERTO JEFFERSON – Político suspeito de disseminar fake News

50) HÉLCIO BRUNO DE ALMEIDA - presidente do Instituto Força Brasil

51) RAIMUNDO NONATO BRASIL – Sócio da empresa VTCLog

52) ANDREIA DA SILVA LIMA – Diretora-executiva da empresa VTCLog

53) CARLOS ALBERTO DE SÁ - Sócio da empresa VTCLog

54) TERESA CRISTINA REIS DE SÁ - Sócia da empresa VTCLog

55) JOSÉ RICARDO SANTANA – Ex-secretário da Anvisa

56) MARCONNY NUNES RIBEIRO ALBERNAZ DE FARIA – Lobista

57) DANIELLA DE AGUIAR MOREIRA DA SILVA – Médica da Prevent Senior

58) PEDRO BENEDITO BATISTA JÚNIOR – Diretor-executivo da Prevent Senior

59) PAOLA WERNECK – Médica da Prevent Senior

60) CARLA GUERRA - Médica da Prevent Senior

61) RODRIGO ESPER - Médico da Prevent Senior

62) FERNANDO OIKAWA - Médico da Prevent Senior

63) DANIEL GARRIDO BAENA – Médico da Prevent Senior

64) JOÃO PAULO F. BARROS – Médico da Prevent Senior

65) FERNANDA DE OLIVEIRA IGARASHI – Médica da Prevent Senior

66) FERNANDO PARRILLO - Dono da Prevent Senior

67) EDUARDO PARRILLO - Dono da Prevent Senior

68) FLÁVIO ADSUARA CADEGIANI – Médico que fez estudo com proxalutamida

69) WILSON MIRANDA LIMA – Governador do Estado do Amazonas

65) FERNANDA DE OLIVEIRA IGARASHI – Médica da Prevent Senior

66) FERNANDO PARRILLO - Dono da Prevent Senior

67) EDUARDO PARRILLO - Dono da Prevent Senior

68) FLÁVIO ADSUARA CADEGIANI – Médico que fez estudo com proxalutamida

69) WILSON MIRANDA LIMA – Governador do Estado do Amazonas

70) MARCELLUS JOSÉ BARROSO CAMPÊLO – Secretário Estadual de Saúde do Estado do Amazonas à época

71) HEITOR FREIRE DE ABREU – ex-subchefe de Articulação e Monitoramento da Casa Civil e ex-coordenador Centro de Coordenação das Operações do Comitê de Crise da Covid-19

72) MARCELO BENTO PIRES – Assessor do Ministério da Saúde

73) ALEX LIAL MARINHO – ex-Coordenador de logística do Ministério da Saúde

74) THIAGO FERNANDES DA COSTA - Assessor técnico do Ministério da Saúde

75) REGINA CÉLIA OLIVEIRA – Fiscal de Contrato no Ministério Da Saúde

76) HÉLIO ANGOTTI NETTO – Secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde, do Ministério da Saúde

77) JOSÉ ALVES FILHO – Dono do grupo José Alves, do qual faz parte a Vitamedic

78) AMILTON GOMES DE PAULA – Vulgo Reverendo Amilton, representante Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah) que, apesar do nome, é uma entidade privada e não é ligada ao governo federal

79) PRECISA COMERCIALIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS LTDA.

80) VTC OPERADORA LOGÍSTICA LTDA

Publicado originalmente pelo EL PAÍS, em 26.10.21