quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

Estados e municípios poderão comprar vacina sem registro na Anvisa

Caso a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não expeça autorização em até 72 horas após o recebimento do pedido de registro de vacina contra a Covid-19, estados e municípios poderão importar produto que tenha sido registrado em agência sanitária internacional.

Agentes públicos devem ter atuação proativa para implementar programas de vacinação, disse ministro Ricardo Lewandowski

É o que determina o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, ao analisar duas ações que tratam da compra da vacina. As liminares são desta quinta-feira (17/12) e deverão ser remetidas para referendo do Plenário. Com a chegada do recesso forense, a confirmação ficará para 2021.

Para Lewandowski, a  Lei 13.979/2020, ao fazer referência ao termo "autoridades" — sem qualquer distinção expressa entre os diversos níveis político-administrativos da federação — autoriza qualquer ente federado a lançar mão do uso de medicamentos e insumos sem registro na Anvisa.

A possibilidade de "autorização tácita" pela Anvisa consta do parágrafo 7-A do artigo 3º da Lei 13.979/2020. Segundo o dispositivo, a autorização excepcional e temporária para a importação e distribuição de produtos essenciais para auxiliar no combate à epidemia de Covid-19 "deverá ser concedida pela Anvisa em até 72 (setenta e duas) horas após a submissão do pedido à Agência, dispensada a autorização de qualquer outro órgão da administração pública direta ou indireta para os produtos que especifica, sendo concedida automaticamente caso esgotado o prazo sem manifestação". 

Além disso, o ministro considerou que as disposições constantes da Lei 13.979/2020 gozam da "presunção de plena constitucionalidade, revelando, portanto, a solução encontrada pelos representantes do povo reunidos no Congresso Nacional para superar, emergencialmente, a carência de vacinas contra o novo coronavírus".

Agências internacionais

A alínea "a" do inciso VIII do artigo 3º determina uma condição para a autorização excepcional e temporária de importação: o produto deve ter sido registrado por ao menos uma autoridade sanitária estrangeira (entre as listadas na lei) e autorizado para ser vendido no respectivo país. As autoridades sanitárias mencionadas pela norma são: Food and Drug Administration (FDA); European Medicines Agency (EMA); Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA); National Medical Products Administration (NMPA). Respectivamente, as agências do Estados Unidos, Europa, Japão e China.

Nesta quinta-feira (17/12), o Instituto Butantan anunciou que irá pedir à Anvisa justamente a autorização para uso emergencial da Coronavac, desenvolvida pela entidade em parceria com a empresa chinesa Sinovac Biotech. No início da semana, a estratégia era outra: pedir à agência reguladora nacional o registro definitivo do fármaco.

Origem das ações

A chegada da vacina ao Brasil é prevista para janeiro, mas a imunização da população deve começar somente depois que houver o registro na Anvisa — mesmo que o imunizante já tenha sido aprovado por autoridades sanitárias internacionais. Foi contra essa obrigação de aval da Anvisa que foram ajuizadas ações pelo governador do Maranhão e pelo Conselho Federal da OAB.

Outras duas ações que tratam da compra da vacina foram retiradas da pauta neste final de semana. Com isso, a OAB buscou apressar uma resposta da Corte e pediu para o relator autorizar liminarmente a compra de vacinas, o que foi parcialmente acolhido agora.

Lewandowski define outra possibilidade para a compra e distribuição com registro internacional: no caso de descumprimento do plano nacional de vacinação contra a Covid-19, recentemente tornado público pela União. "Na hipótese de que este não proveja cobertura imunológica tempestiva e suficiente contra a doença, poderão dispensar às respectivas populações as vacinas das quais disponham, previamente aprovadas pela Anvisa".

O relator afirmou não descartar que a Anvisa tenha aprovado resolução para autorizar temporariamente o uso emergencial de vacinas em caráter experimental. No entanto, entendeu que a norma não exclui as previsões que já existem. O registro é definido no artigo 12 da Lei 6.360/1976, e a autorização excepcional e temporária é estabelecida justamente pelo artigo 3°, VIII, da Lei 13.979/2020.

"Qualquer que seja a decisão dos entes federados no concernente ao enfrentamento da pandemia deverá levar em consideração, por expresso mandamento legal, as evidências científicas e análises estratégicas em saúde, nos termos do art. 3°, § 1°, da Lei 13.979/2020. Essa apreciação, sempre explícita e fundamentada, compete exclusivamente às autoridades públicas estaduais, distritais e locais, consideradas as situações concretas que vierem a enfrentar."

Em um contexto de pandemia, afirmou o relator, exige-se que agentes públicos tenham "atuação fortemente proativa (...), sobretudo mediante a implementação de programas universais de vacinação".

Uma peculiaridade da ação da OAB é que foi pedida a destinação do dinheiro do fundo da "lava jato" e do fundo dos serviços de telecomunicações (Fust) para o plano nacional de imunização contra o coronavírus. O tema, porém, não foi analisado pelo ministro. 

Por Fernanda Valente, do Consultor Jurídico, em 17.12.2020

Por que evangélicos americanos resistem à vacina contra covid-19

Líderes evangélicos nos Estados Unidos têm ajudado a semear a desconfiança na ciência, nos profissionais de saúde pública e nas vacinas contra o coronavírus. Para especialista, Trump também teve seu papel nisso.

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (à direita), em conferência da coalizão Evangélicos por Trump na igreja do Ministério Internacional King Jesus em Miami, Flórida, em 3 de janeiro de 2020

O presidente americano em conferência da coalizão Evangélicos por Trump

Durante o verão no hemisfério norte, quando o coronavírus se alastrou pelos Estados Unidos, campanhas de desinformação promoveram teorias da conspiração com o potencial de colocar em risco a saúde de centenas de milhares de americanos. Muitos cristãos evangélicos – um grupo de protestantes em sua maioria doutrinariamente conservadores – foram bombardeados de mitos sobre a vacina e a pandemia de covid-19.

Críticos acusaram pastores fundamentalistas de direita de perpetuar teorias infundadas que encorajavam seus seguidores a ignorar dados de saúde pública e especialistas em combate ao coronavírus. Algumas dessas teorias incluem a afirmação de que a vacina é a marca da besta ou que ela irá provocar esterilização em mulheres.

"Existe uma suspeita de que [o coronavírus] não seja real. Eles estão se afastando cada vez mais da realidade", disse Mark Labberton, presidente do Fuller Seminary, um seminário cristão evangélico da Califórnia.

Com o início da aprovação e distribuição de vacinas pelo mundo todo, tal desinformação pode representar um obstáculo para os profissionais de saúde pública na atual campanha de vacinação.

A enfermeira Lillian Wirpsza administra uma vacina de covid-19 na enfermeira Barbara Neiswander, do departamento de emergência, no Hospital Universitário George Washington, em 14 de dezembro de 2020, em Washington

Mitos entre evangélico

A vacina tem polarizado a comunidade evangélica de direita. Rumores sobre o uso mal-intencionado do imunizante e conspirações em massa têm sido cultivados nas redes sociais – e continuam a ser promovidos por alguns líderes religiosos.

Um dos mitos que se espalharam pela internet, por exemplo, é o de que o vírus é uma tática de encobrimento para o bilionário Bill Gates implantar microchips rastreáveis nas pessoas.

Já outras teorias infundadas afirmam que Anthony Fauci, chefe do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas dos EUA, ajudou a planejar a pandemia de coronavírus em benefício próprio. A desinformação foi propagada por um vídeo promovendo a chamada "Plandemic" (um jogo com as palavras "plano" e "pandemia" em inglês), teoria da conspiração que rapidamente se espalhou pelas alas conservadoras da web. Para contê-la, as empresas de mídias sociais tiveram que batalhar. 

O pastor Tony Spell, da Igreja Tabernáculo da Vida (Life Tabernacle Church), em Baton Rouge, Louisiana, é conhecido por violar as medidas restritivas desde que o coronavírus aterrissou em solo americano. Ele realizou reuniões lotadas em sua igreja quando as regulamentações estaduais as tornaram ilegais, além de rechaçar os avisos de que a pandemia é perigosa.

"Somos antimáscara, antidistanciamento social e antivacina", disse Spell à DW. Para ele, a vacinação tem motivação política e acabará deixando as pessoas doentes, embora as evidências disponíveis apontem o contrário. O pastor afirma que, com o início da distribuição das vacinas, vai continuar desencorajando seus seguidores a tomá-la.

Uma pesquisa realizada em julho pelo instituto americano Pew Research Center constatou que cerca de 70% dos entrevistados já tinham ao menos ouvido falar que a pandemia foi planejada pelas chamadas elites, enquanto 36% acreditavam que isso era verdade.

Anthony Fauci (à direita) e o presidente Donald Trump entraram em conflito sobre a política de covid-19

O ceticismo em torno da vacina contra a covid-19 entre os conservadores cristãos é produto de décadas de uma desconfiança crescente na ciência, na medicina moderna e no que é descrito como a elite global. É também a raiz de uma rejeição maior a vacinas que, por décadas, ajudaram a quase erradicar várias doenças graves, incluindo sarampo e poliomielite.

"O raciocínio principal é uma profunda desconfiança no governo", diz Sam Perry, especialista em teorias da conspiração de direita e professor do núcleo interdisciplinar da Universidade Baylor, no Texas. "Existem certas alas da direita cristã que acreditam fazer parte da luta do bem contra o mal."

O receio entre muitos evangélicos de direita é que os líderes globais estejam tomando decisões sem embasamento bíblico e contra a vontade do Deus cristão.

O presidente Donald Trump deixa o palco depois de falar durante a Cúpula de Vacinas da Operação Warp Speed no complexo da Casa Branca, em 8 de dezembro de 2020, em Washington.

Trump tem usado sua posição para ajudar a perpetuar notícias falsas sobre o coronavírus

Influência de Trump

Uma exceção dentro do governo é o presidente Donald Trump, que mantém forte apoio entre os evangélicos. Ao longo de seus quatro anos no cargo, ele obteve um índice de aprovação de até 78% entre os evangélicos brancos, com 54% de todos os protestantes apoiando o líder americano.

Trump – cujos partidários o veem em grande parte como um outsider de Washington – usou sua posição para ajudar a perpetuar notícias falsas sobre o coronavírus. Após ter inicialmente dito que o vírus era uma farsa, ele tem transmitido mensagens contraditórias sobre o uso de máscaras – tanto em palavras quanto em ações, aparecendo repetidamente em grandes reuniões públicas sem a proteção facial.

Ele chegou inclusive a refutar a letalidade do vírus, dizendo que em breve ele irá desaparecer.

Trump desconfia de vacinações há tempos, mas tem tentado mudar de tom assim que os EUA começaram a aprovar a vacina contra a covid-19. Por meio do Twitter, ele também alegou falsamente que a vacinação pode causar autismo em crianças. São atitudes como esta que têm dado impulso às conspirações sobre a vacina.

"Donald Trump não inventou isso, mas acelerou drasticamente a desinformação, e algumas pessoas tendem a acreditar", disse Peter Wehner, vice-presidente e pesquisador sênior do Centro de Ética e Políticas Públicas e ex-redator de discursos do presidente George W. Bush.

EUA têm sido palco de protestos de negacionistas do coronavírus e de pessoas contrárias à vacina

Convencendo céticos

Alguns líderes evangélicos têm buscado soluções para combater as falsas informações sobre as diretrizes em torno da pandemia e da vacina.

Representantes do governo – como Francis Collins, diretor de longa data do Instituto Nacional de Saúde e cristão assumido – conversaram diretamente com líderes religiosos para conter os receios da população perante a vacinação.

No final de agosto, um grupo de mais de 2.700 líderes cristãos assinou uma carta escrita pela Fundação BioLogos, grupo de interesse de Collins, apoiando a "ciência em tempos de pandemia". O texto clamava aos cristãos para que "usassem máscaras, fossem vacinados e corrigissem a desinformação".

Equipe de profissionais de saúde cerca um paciente que morreu dentro de uma unidade hospitalar para pacientes de coronavírus no Centro Médico United Memorial, em Houston, Texas, em 12 de dezembro de 2020.

Mais de 300 mil americanos já morreram devido à covid-19

"Durante o verão, vimos circular uma quantidade crescente de teorias da conspiração e queríamos mostrar que há membros da comunidade cristã e muitos outros que apoiam as medidas de saúde pública", disse Deborah Haarsma, presidente da BioLogos, à DW.

Os EUA, que recentemente iniciaram a maior campanha de vacinação de sua história, em breve farão a transição da presidência de Trump para a do recém-eleito Joe Biden. Recairá então sobre a equipe do democrata a difícil tarefa de ajudar a dissipar a desinformação que o governo anterior ajudou a espalhar – ou que pelo menos não conseguiu deter.

"Há pastores e igrejas proeminentes que basicamente rejeitaram a ciência. Isso nunca é uma boa ideia no meio de uma pandemia", diz Peter Wehner.

Deutsche Welle, em 17.12.2020

Macron é diagnosticado com covid-19

Presidente francês fez o teste para coronavírus após apresentar os primeiros sintomas. Líderes europeus e autoridades com quem ele teve contato nos últimos dias adotam quarentena. Merkel testa negativo, diz porta-voz.

O presidente da França, Emmanuel Macron

Macron esteve recentemente em Bruxelas para uma cúpula entre líderes europeus

O presidente da França, Emmanuel Macron, foi diagnosticado com o novo coronavírus, informou o Palácio do Eliseu nesta quinta-feira (17/12).

"O presidente testou positivo para covid-19", disse a presidência em nota, afirmando que ele fez o teste após apresentar os primeiros sintomas. Segundo seus assessores, ainda não se sabe como ele foi infectado com a doença.

Macron, de 42 anos, iniciou uma quarentena de sete dias onde "continuará a realizar suas atividades remotamente". Seus assessores disseram que o presidente tem estilo de vida saudável, se exercita regularmente e não fuma.

A equipe de Macron realizou a identificação das pessoas com quem ele manteve contato recentemente, para informá-los da situação. Todas as próximas viagens na agenda do presidente foram canceladas, incluindo uma visita marcada para o dia 22 ao Líbano, onde o francês vem liderando os esforços para resolver a grave crise política no país.

Recentemente, Macron esteve na cúpula dos 27 líderes europeus, ocorrida nos dias 10 e 11 de dezembro em Bruxelas.

Uma porta-voz da chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, disse que a líder testou negativo para o coronavírus logo após o encontro. Autoridades alemãs dizem que ela usou máscara de proteção durante todo o tempo e observou as regras de proteção. Ela enviou a Macron seus "desejos por uma rápida recuperação".

O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, também desejou melhoras ao francês. "Sinto em saber que meu amigo Emmanuel Macron testou positivo para o coronavírus. Todos lhe desejamos uma rápida melhora", escreveu em seu perfil no Twitter. Johnson contraiu o vírus em março e enfrentou problemas graves de saúde, inclusive sendo internado em uma UTI.

Líderes europeus em quarentena

Recentemente, Macron se reuniu ainda com o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, e o diretor-geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento econômico (OCDE), Ángel Gurria, de 70 anos. Sánchez e Michel iniciaram um período de quarentena.

Nesta quarta-feira, o francês se encontrou com o premiê português, António Costa, que também disse estar em isolamento e aguardando o resultado de um teste para detectar a doença.

Há dois dias, Macron presidiu uma reunião de quatro horas de duração de um Conselho de Cidadãos com dezenas de pessoas. Ele usou máscara durante todo o evento. Na quarta-feira, ele também chefiou uma reunião de gabinete.

O primeiro-ministro francês, Jean Castex, que esteve em contato com o presidente, entrou em isolamento voluntário, apesar de testar negativo para a doença. Líderes de partidos políticos da Assembleia Nacional também adotaram o autoisolamento após saberem do diagnóstico de Macron, com quem se reuniram no início da semana.

Até agora, o ministro das Finanças, Bruno Le Maire, era a autoridade mais alta do país a ser infectada pelo vírus. Depois de se recuperar, ele contou que passou por alguns momentos difíceis durante o tratamento.

O diagnóstico de Macron ocorre no momento em que o país inicia o relaxamento do lockdown para conter a disseminação do coronavírus. Até o momento, a França acumula 2,4 milhões de casos da doença e quase 60 mil mortes.

Deutsche Welle, em 17.12.2020

"Brasil continua atrasado no enfrentamento da pandemia", diz Abrasco

Associação Brasileira de Saúde Coletiva aponta lacunas no plano de vacinação apresentado por ministério, critica atrasos e vê falta de seriedade do presidente Bolsonaro no enfrentamento da pandemia.

Titular da Saúde, Eduardo Pazuello, tem sido criticado por plano de vacinação

Cobrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o plano nacional de vacinação contra a covid-19 apresentado pelo governo de Jair Bolsonaro nesta quarta-feira (16/12) deixa lacunas. Embora faça referência a diversas opções de vacinas, o documento não é claro sobre possíveis acordos com o Instituto Butantan, que vai produzir a vacina chinesa Coronavac, e a partir de quando será implantado.

Para a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a emergência não está sendo enfrentada como deveria no Brasil. A falta de um comando central desde o início da pandemia faz com que o combate ainda seja ineficiente, avalia a sanitarista Gulnar Azevedo e Silva, presidente da Abrasco, em entrevista à DW Brasil.

No último sábado, uma versão do plano de vacinação entregue pelo ministério ao STF chegou a citar pesquisadores indicados pela Abrasco como autores do documento. Os cientistas, no entanto, se manifestaram dizendo que não haviam sido consultados e que não tiveram acesso ao plano de então. Depois dessa manifestação, a nova versão apresentada pelo governo retirou os nomes e reviu alguns pontos criticados pela associação.

Até essa quarta-feira, a pandemia já tinha custado a vida de mais de 183 mil brasileiros.

DW: Vocês vieram a público dizer que não participaram efetivamente da elaboração do plano nacional de vacinação contra covid-19 do governo federal, como dizia o documento do Ministério da Saúde apresentado ao Supremo Tribunal Federal. O que de fato aconteceu?

Gulnar Azevedo e Silva: Nós tivemos conhecimento de que estava sendo montada uma câmara técnica no Ministério da Saúde. Não era no mesmo molde do Programa Nacional de Imunização (PNI), que já tem 47 anos, que tinha um conselho formado de pessoas de áreas de pesquisa, acadêmicos, profissionais muito experientes em vacinação. Esse conselho do PNI foi extinto por Bolsonaro quando ele assumiu o governo. O PNI ficou sem alma, sem orientação, porque cada vacina que o Brasil incorporava era analisado pelo conselho, que fazia estudos e orientava, inclusive sobre o custo e efetividade.

Agora, com a vacinação na pandemia, esse governo criou uma câmara técnica por pressão do Supremo Tribunal Federal, que pedia que o governo apresentasse um plano.

Entramos em contato com o governo enquanto entidade de saúde coletiva pra entender. Ouvimos que poderíamos indicar pessoas pra participar, então fizemos dez grupos separados. Indicamos 14 nomes com muita experiência em doença transmissível, em vacina. Os grupos eram assessores, mas poderiam ajudar na orientação do plano.

Alguns grupos se reuniram, outros, não. Quando os colegas indicados viram que o plano foi finalizado e entregue ao STF, eles acharam muito estranho, pois não viram o plano final.

E o que é pior é que o documento saiu com o nome deles. Então eles reclamam que não aprovaram o plano, que não concordam com tudo, que há omissões, que é vago, que não se trata de um plano efetivo. Os colegas ficaram muito desconfortáveis porque o nome deles aparece como elaboradores no documento e, na realidade, isso não aconteceu.

Quem elaborou foi o grupo do ministério, não sei com qual orientação do ministro. Os pesquisadores, nossos colegas, se sentiram usados.

Nesta quarta-feira, o governo federal apresentou publicamente o plano nacional aparentemente reformulado. O mudou em relação ao documento que foi entregue no último sábado ao STF?

O plano apresentado hoje é um pouco melhorado em relação ao que foi enviado ao STF. Em primeiro lugar, o ministério tirou o nome dos pesquisadores que estavam como elaboradores. Creio que a nossa pressão teve algum efeito.

Em geral, está um pouco melhor em relação aos grupos de risco. Algumas das sugestões que nós tínhamos considerado na nota que enviamos ao STF aparecem, como os quilombolas, comunidades ribeirinhas. Os indígenas já estavam.

O plano inicial trazia os trabalhadores do sistema prisional no grupo de risco, mas não os presidiários. Agora, esses foram incluídos. Entrou também as pessoas com deficiência. Ou seja, melhorou. Por outro lado, não está claro quais grupos serão vacinados na primeira e segunda fases.

O plano atual traz uma campanha de comunicação. Mas o texto coloca a questão de receber a vacina muito para o indivíduo. Não fica claro se será obrigatório, se as pessoas vão poder escolher.

O plano anterior só fazia menção às vacinas da AstraZeneca, ao consórcio da Organização Mundial da Saúde e Pfizer-Biontech. Na avaliação de vocês, a referência às outras opções, como a Coronavac, está clara?

Existe a referência às demais vacinas, inclusiva a do Butantan (Coronavac), mas não foi colocado de forma clara que o ministério quer fazer um acordo, de que vai assinar um acordo, e quantas doses seriam caso os acordos fossem assinados. Ainda está vago.

O acordo com o Butantan poderia estar mais adiantado, até porque o instituto já ofereceu e disse ter capacidade de fornecer para o governo federal.

O plano também não faz menção à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), à regulação, embora essa agência tenha dito que poderia trabalhar para liberar vacinas emergências em dez dias.

A manifestação contrária que fizeram e o fato de terem recorrido ao STF parece ter surtido efeito?

Sim, alguns pontos foram considerados.

O plano entregue ao STF não falava especificamente em todas as vacinas, e a gente vai precisar de todas as vacinas disponíveis para poder cobrir a população toda.

Aquele plano que não era um plano. Não continha todas as etapas, desde a produção da vacina até o monitoramento de quem foi vacinado. Não existia explicação sobre a rede de frio, que é como se mantém as vacinas na temperatura adequada. O tempo todo é preciso fazer o controle da temperatura, e quem faz isso é a vigilância sanitária. O controle não é só sobre a validade da vacina, mas também sobre o armazenado na temperatura exigida.

A rede de frio tem que ter desde quando se produz até chegar na ponta, quando chega na geladeira da Unidade Básica de Saúde. É um ponto importantíssimo. Se faltar eletricidade, por exemplo, a vacina pode perder qualidade.

No Programa Nacional de Imunização, esse aspecto era super rígido, super controlado, todo cheio de orientação. O plano tinha várias e graves omissões.

O que ainda precisa ser melhorado, na visão da Abrasco?

Falta acertar melhor com os estados como vai se dar a compra das vacinas, isso está vago.

Ainda não se sabe também quando começa a vacinação. Quando uma determinada vacina for aprovada, em quanto tempo vai começar o programa de imunização? Não sabemos.

Com base na experiência que vocês têm em relação ao Plano Nacional de Imunização do SUS, que já tem mais quatro décadas, será possível implantar esse planejamento apresentado de vacinação contra a covid-19?

A comparação é um pouco difícil porque a escala de vacinação é muito diferente. Nunca se vacinou a população inteira. Até então, a vacina ocorre por grupos (idosos, adultos crianças), em locais específicos de focos de doenças, como a febre amarela…

No entanto, essas lacunas já poderiam ser esclarecidas no plano atual, assim como a relação com estados e municípios. O desafio maior é vacinar a população toda, a partir dos 18 anos. Crianças ainda não foram testadas.

O Brasil parece atrasado nesse enfrentamento da pandemia?

O Brasil está atrasado. Na questão da vacina, o país poderia já estar se preparando para a questão dos acordos, para entender que a gente precisa de mais vacinas, e não só de uma farmacêutica.

Correr atrás agora não dá. A Pfizer já disse que não tem condições de produzir agora milhões de doses para o Brasil.

A gente está chamando a atenção desde maio que não existe um plano geral de enfrentamento da pandemia. Esse é um grande problema. Não existe um plano do Ministério da Saúde que diga quais são as medidas de saúde pública a serem seguidas: o que tem que ser feito, qual é a ajuda que eles estão dando para estados e municípios. Isso está fazendo com que cada um tente resolver seu problema de forma isolada. A pandemia não está só em alguns lugares, está no Brasil inteiro. Então precisa de muita articulação.

Essa falta de articulação entre estados e municípios e de apoio do governo federal está fazendo com que o nosso enfrentamento seja totalmente ineficiente.

No dia 3 de junho nós entregamos ao ministério e ao Congresso um plano nacional de enfrentamento com 70 recomendações. A Abrasco liderou esse processo, tivemos a participação de 14 entidades da saúde, do Conselho Nacional de Saúde. Não houve resposta por parte das autoridades executivas. Muitos parlamentares entraram com muitas medidas e ações, forçando para que algumas coisas fossem aprovadas.

Essa ausência, esse vácuo, faz com que a gente tenha todos esses problemas. E o maior de todos eles é o presidente da República minimizar, fazer pouco da doença, não passar uma comunicação correta de campanha.

Esse atual recrudescimento da primeira onda de covid-19 que estamos vendo é por que a população está achando que está tudo bem, que pode aglomerar, que pode sair porque o comercio está liberado.

Para enfrentar uma epidemia desse tipo, tem que contar com pessoas experientes, com pesquisadores, com o controle social. O Sistema Único de Saúde tem controle social, que é o Conselho Nacional de Saúde. Nada do que foi feito passou por controle social. Esse plano que o governo apresentou inclusive.

Se estamos vivendo um recrudescimento da primeira onda, ainda teremos uma segunda?

A gente espera que, até lá, a gente consiga ter vacina e que a população entenda que não dá pra ter Natal e Ano Novo como antes. Não pode haver aglomeração até que a situação esteja mais controlada.

Mas, para a população entender, é preciso ter medidas de fiscalização e um comando único, uma comunicação clara da situação emergencial que a gente está vivendo.

Deutsche Welle, em 17.12.2020


Cientistas descobrem proteína no cérebro que pode ligar Alzheimer aos distúrbios do sono

Proteína produzida no cérebro está ligada tanto ao surgimento da doença degenerativa quanto ao relógio biológico, sistema que interfere nos processos de descanso. Descoberta feita por americanos abre a possibilidade de desenvolvimento de novas ações terapêuticas

Um dos sintomas precoces da doença de Alzheimer, que se agrava com o tempo, são os distúrbios do sono. Embora essa associação esteja bem estabelecida, ainda não se sabe exatamente como ela se dá. Agora, pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington, em St. Louis, nos Estados Unidos, descobriram uma proteína que pode explicar parte do problema.

Em um artigo publicado na revista Science Translational Medicine, os cientistas descrevem a descoberta de que uma proteína produzida no cérebro, a YKL-40, relaciona-se tanto com o Alzheimer quanto com o ciclo circadiano. Enquanto genes do “relógio biológico” regulam a produção da proteína, ela está envolvida no processo de limpeza de substâncias tóxicas que caracterizam a doença neurodegenerativa. Além disso, pacientes de Alzheimer com uma variante genética que reduz os níveis da YKL-40 têm um declínio cognitivo mais lento do que aqueles sem as mutações.

O ritmo de cada pessoa é definido por um “relógio” no cérebro, acionado pelo ciclo diurno e noturno. Cada célula também mantém o próprio relógio interno, vinculado ao principal. “Uma variedade surpreendentemente ampla de processos biológicos — da absorção de açúcar à temperatura corporal e às respostas imunológicas e inflamatórias — muda de acordo com a hora do dia”, explica o neurologista Erik Musiek, principal autor do estudo.

Embora a disfunção circadiana afete muitos aspectos da saúde, ela é mais facilmente identificada nos distúrbios do sono, como dificuldade em adormecer ou permanecer dormindo à noite e o aumento da sonolência durante o dia. Esses problemas são comuns em pessoas com Alzheimer, mesmo nos primeiros estágios da doença, quando as placas amiloides começaram a se formar, mas os sintomas cognitivos ainda não apareceram.

Musiek, cujo trabalho se concentra na ligação entre o ritmo circadiano e doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer, conta que estava conduzindo uma triagem de genes regulados pelo ciclo circadiano quando um específico chamou a sua atenção. “O gene que produz a proteína YKL-40 mostrou-se altamente regulado pelos mesmos genes responsáveis pelo relógio biológico. Isso foi realmente interessante porque ele já é um biomarcador muito conhecido do Alzheimer”, conta.

De acordo com o pesquisador, terapias que tenham a proteína como alvo podem retardar o curso da doença. “Se o seu ciclo circadiano estiver desregulado por anos e anos — você rotineiramente sofre de sono interrompido à noite e cochila durante o dia, por exemplo —, o efeito cumulativo da desregulação crônica pode influenciar as vias inflamatórias, de modo que você acumule mais placas amiloides”, diz Musiek. O acúmulo desses lipídios no cérebro é uma das primeiras marcas fisiológicas da doença de Alzheimer. “Esperamos que uma melhor compreensão de como o relógio circadiano afeta a proteína YKL-40 possa levar a uma nova estratégia para reduzir a amiloide no cérebro.”

Inflamação crônica

Musiek relata que, há mais ou menos uma década, uma equipe do Departamento de Neurologia da Universidade de Washington descobriu que altos níveis da proteína YKL-40 no cérebro — detectados no fluido espinhal, que carrega a “sujeira” retirada do órgão — são um sinal de Alzheimer. Pesquisas posteriores indicaram que a quantidade da proteína aumenta tanto com o envelhecimento natural quanto com a progressão da doença.

O pesquisador e um dos coautores do artigo, Brian V. Lananna, começaram a explorar a conexão entre o relógio circadiano, a YKL-40 e o Alzheimer. Como a doença é caracterizada por uma inflamação crônica, os cientistas investigaram como a presença ou a ausência de um gene circadiano chave afeta as células cerebrais não neuronais em condições inflamatórias. Eles descobriram que o relógio biológico dita a quantidade de YKL-40 produzida.

Em estudos com camundongos com Alzheimer, os cientistas notaram que aqueles sem o gene produtor da proteína tinham metade da quantidade de placas amiloides, comparado aos demais. Esse agrupamento lipídico geralmente é cercado por células do sistema imunológico chamadas microglia, que ajudam a evitar que as placas se espalhem. Nos ratos sem YKL-40, a microglia era mais abundante e mais preparada para consumir e remover a amiloide.

“A proteína YKL-4, provavelmente, serve como um modulador do nível de ativação microglial no cérebro”, diz Musiek. “Quando você se livra da proteína, parece que a microglia é mais ativada para consumir a amiloide. É uma coisa sutil, um ajuste no sistema, mas parece ser o suficiente para reduzir substancialmente a carga amiloide total.”

A descoberta condiz com estudos realizados em humanos. Outro coautor do artigo, Carlos Cruchaga analisou dados genéticos de 778 participantes de pesquisas sobre envelhecimento e demência. Cerca de um quarto (26%) deles carregavam uma variante genética que reduz os níveis de YKL-40. As habilidades cognitivas diminuíram 16% mais lentamente nas pessoas com a variante.

Paloma Oliveto, Correio Braziliense, em 17.12.2020

Por que tomar vacina não é só 'problema meu', como diz Bolsonaro

Mesmo quem já teve covid-19, como Bolsonaro, deve se vacinar, alerta infectologista


"Eu não vou tomar vacina e ponto final. Minha vida está em risco? O problema é meu", disse o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na última terça-feira (15/12).

Tal postura é cada vez mais frequente entre os brasileiros, de acordo com o instituto Datafolha.

Uma pesquisa feita no início de dezembro aponta que 22% dizem que não vão se vacinar. Em agosto, eram 9%. Nas duas pesquisas, a maioria disse que pretende tomar a vacina, mas o percentual caiu de 89% para 73%.

Caso a vacinação contra a covid-19 não seja mesmo obrigatória, como defende Bolsonaro — um tema que o Supremo Tribunal Federal julga neste momento —, a imunização será, de fato, uma decisão individual.

Mas a recusa do presidente e de outros cidadãos em fazer isso é uma postura egoísta, que coloca a saúde de outras pessoas em risco e compromete seriamente os esforços para acabar com a pandemia, dizem especialistas ouvidos pela BBC News Brasil.

"Quem fala que não vai se vacinar porque é uma decisão individual diz isso por ignorância. A vacinação não é nem nunca foi uma preocupação individual", afirma a infectologista Raquel Stucchi, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Por que sua vacinação protege as outras pessoas


           Estima-se que 70% a 80% das pessoas terão de ser vacinada para acabar com o surto                                                                     / CRÉDITO,GETTY IMAGES

A médica explica que o objetivo de uma vacina é conferir a proteção contra um vírus ou bactéria a uma parcela suficiente da população para impedir que essa ameaça continue a se disseminar.

Quanto maior o número de pessoas vacinadas, mais fácil é controlar a propagação de uma doença. Mas, se poucas pessoas se vacinarem, ela se espalha mais facilmente.

"Isso é diferente de um câncer, por exemplo. Se eu não me trato, só eu vou sair prejudicada, porque vou morrer mais cedo. Mas a decisão de se vacinar tem impacto na saúde coletiva", diz Stucchi.

O percentual de pessoas que têm que ser vacinadas para conseguir a chamada imunidade coletiva ou de rebanho — bloqueando a disseminação de um vírus ou bactéria e evitando epidemias — varia.

Isso depende da facilidade com que o patógeno é passado de uma pessoa para outra e também da eficácia da vacina, ou seja, a proporção de pessoas que ficam protegidas ao serem imunizadas.

No caso do sarampo, uma doença altamente infecciosa, essa taxa deve ser de 95%, explica o infectologista Alberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e diretor-médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, no Rio de Janeiro.

Para a covid-19, ainda não se sabe ao certo qual é esse índice, porque ainda é preciso verificar se a eficácia dos estudos será confirmada pela vacinação em massa e quanto dura a imunidade conferida desta forma.

Mas estima-se que será necessário vacinar entre 70% e 80% da população para reduzir a circulação do coronavírus e acabar com a pandemia.

"Temos que lembrar que sempre haverá uma parte da população que não poderá ser vacinada, como grávidas, para quem hoje não é recomendado, quem tem alergias graves e outras contraindicações", diz Chebabo.

Inclusive, para quem não puder se vacinar, a imunização em massa será essencial para impedir que estas pessoas não sejam infectadas. O mesmo vale para quem não tiver uma resposta ideal à vacina.

"Uma postura como a do presidente é uma atitude egoísta, de quem só pensa em si próprio e não em proteger quem está à sua volta", diz o infectologista.

Chebabo diz ainda que se vacinar será importante mesmo para pessoas que já tiveram covid-19, como Bolsonaro, porque há cada vez mais casos confirmados de pessoas que se infectaram mais de uma vez, algumas até em estado pior do que antes.

Os cientistas ainda não  sabem ao certo quanto dura a imunidade adquirida ao se ter a doença. Por isso, uma parte destas pessoas, ou mesmo todas elas, podem ainda ser vulneráveis ao coronavírus.

"A recomendação é que todos se vacinem", diz Chebabo.

Pandemia só acabará com vacinação em massa


Mão de luva segurando seringa com vírus ao fundo / CRÉDITO,GETTY IMAGES

Vacinas produzem imunidade melhor do que proteção natural conferida pela doença, diz epidemiologista

Além disso, a nossa experiência com a pandemia de covid-19 até agora mostra que ela dificilmente será controlada naturalmente ou apenas com as medidas de isolamento ou distanciamento social.

O epidemiologista Antonio Augusto Moura da Silva, professor do departamento de Saúde Pública da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), aponta para o exemplo de Manaus.

Um estudo publicado na revista Science estima que, em outubro, 76% da população da capital do Amazonas já havia sido infectada pelo novo coronavírus.

No entanto, a média de novos casos diários se mantém alta, e os hospitais da cidade voltaram a ficar lotados nas últimas semanas.

"Mesmo com uma taxa de infectados tão elevada, a doença continua se espalhando, e, sem uma vacina, a taxa de qualquer lugar tende a subir até chegar a 80% ou 90%, a não ser que haja uma imunização em massa para bloquear isso antes", diz Silva.

O epidemiologista ressalta que os dados científicos das vacinas que foram publicados até agora mostram que elas têm uma eficácia e segurança muito boas.

Para Silva, elas são a "melhor esperança" que temos de atingir a imunidade coletiva, porque estudos apontam que algumas das vacinas contra covid-19 produzem mais anticorpos e anticorpos mais eficazes do que aqueles que são gerados quando alguém fica doente naturalmente.

Raquel Stucchi concorda que a imunização será fundamental para acabar com a pandemia.

"Outras medidas têm um impacto importante, mas o conhecimento que adquirimos no último ano mostra que não há outra estratégia além da vacinação que será capaz de fazer isso", diz a infectologista.

Rafael Barifouse, de São Paulo para a Da BBC News Brasil, em 17.12.2020

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Um plano incoerente

Documento da Saúde é coerente com um presidente que nega a importância das vacinas      

No fim da semana passada, o Ministério da Saúde entregou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um “plano nacional de vacinação” contra a covid-19 que, a bem da verdade, não chegava a ser propriamente um plano. O documento não continha data para início da campanha, não determinava que imunizantes seriam utilizados para cada grupo e previa vacinar apenas um quarto da população – 51,4 milhões de brasileiros. Ou seja, com boa vontade, o tal “plano” não passava de uma mal elaborada carta de intenções. A urgência do momento, com mais de 181 mil mortos e um nítido crescimento do número de infectados, requer muito mais do que isso.

Diante de tão relevantes lacunas, incompatíveis com a gravidade da crise e imperdoáveis pelo tempo que o governo federal teve para, se assim quisesse, preparar um bom plano de vacinação de toda a população, o ministro Ricardo Lewandowski, relator de uma ação no STF que trata da obrigatoriedade da vacina, determinou que a pasta reescrevesse o documento estabelecendo um cronograma com a previsão de início e término da vacinação de todos os brasileiros.

Questionado pelo Estado, o Ministério da Saúde afirmou que “seria uma irresponsabilidade” inserir no documento um cronograma de vacinação e um rol de imunizantes para cada grupo a ser vacinado sem “dados científicos suficientes”. Ora, à frente da pasta está um general intendente da ativa. O ministro Eduardo Pazuello sabe muito bem que um plano pode ser condicionado. A cada variável, prevê-se uma determinada ação.

Mas o plano não foi mal-ajambrado por acaso. É resultado direto, primeiro, da falta de disposição do governo federal de enfrentar a emergência sanitária com a seriedade que ela impõe. O presidente Jair Bolsonaro sempre negou a gravidade da pandemia e em nenhum momento nesta triste trajetória de nove meses mostrou qualquer sinal de compaixão por seus concidadãos ou de respeito aos fatos e às recomendações das autoridades sanitárias. Ao contrário, pôs-se a afrontar tanto uns como as outras em um sem-número de ocasiões. Nunca será demais rememorar que Pazuello é o terceiro ministro da Saúde nomeado por Bolsonaro em meio à pandemia. Seus antecessores foram defenestrados exatamente por não terem se curvado diante do total descaso do presidente pela vida dos brasileiros.

Em sua deliberada cegueira negacionista – ou melhor, com os olhos voltados apenas para sua campanha à reeleição –, Bolsonaro também jamais manifestou qualquer interesse em viabilizar uma campanha de vacinação séria contra a covid-19 para toda a população. O presidente chegou a dizer que preferia gastar dinheiro com o “tratamento” da doença – sabe-se bem qual – do que com vacinas, o que é incoerente com seu discurso em favor da retomada da “vida normal” da atividade econômica. Pois, se há algo que pode determinar a volta sustentável da atividade econômica, é uma bem-sucedida campanha de vacinação. Jair Bolsonaro deveria ser o primeiro a mobilizar toda a estrutura de governo para este fim. Se não por compaixão, por mero pragmatismo.

O plano de vacinação ao qual a Nação teve acesso na semana passada, portanto, é um plano bastante coerente com um governo que nega a gravidade da pandemia e jamais considerou a vacinação de toda a população uma prioridade nacional. A forma atabalhoada como foi elaborado e as flagrantes lacunas que continha dão a entender que o “plano” nada mais foi do que uma tentativa do governo federal para não ficar para trás na absurda disputa política que trava com o governo de São Paulo sobre a primazia na campanha de vacinação.

A única disputa que importa neste momento é a da ciência e da boa governança contra um vírus que já enlutou dezenas de milhares de famílias no País. Passa da hora de o ministro da Saúde agir à altura do desafio e honrar a tradição de excelência do Brasil em campanhas de vacinação. As condições objetivas estão dadas. A ver até quando vai sua disposição de negá-las por subserviência.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de São Paulo - 15 de dezembro de 2020 



O Brasil tem 181.978 mortes e 6.934.539 casos confirmados de coronavírus até as 13h desta terça-feira (15)

Mortes: 181.978

Casos: 6.934.539

Até as 20h de segunda-feira (14), quando foi divulgado o último balanço consolidado, o país tinha 181.939 mortes (520 confirmadas nas 24 horas anteriores ao boletim) e 6.929.409 casos (27.419 confirmados nas 24 horas anteriores).

Em média, 650 mortes foram confirmadas por dia nos últimos 7 dias. Essa média móvel é a maior desde 6 de outubro e representa um aumento de 24% em relação à média de duas semanas atrás, o que indica tendência de alta.

Das 27 unidades da federação, 18 têm tendência de alta nas mortes: PR, RS, SC, ES, MG, SP, DF, MS, MT, AC, AP, PA, RR, TO, AL, BA, PB, PE e RN (veja a situação de cada um abaixo).

A média móvel de casos está em 43.049 por dia – o que significa que, nos últimos 7 dias, foram confirmados em média 43.049 novos casos de coronavírus no país. O número é 13% maior que o de 2 semanas atrás, o que indica estabilidade.

Brasil, 14 de dezembro

Total de mortes: 181.939

Registro de mortes em 24 horas: 520

Média de novas mortes nos últimos 7 dias: 650 (variação em 14 dias: +24%)

Total de casos confirmados: 6.929.409

Registro de casos confirmados em 24 horas: 27.419

Média de novos casos nos últimos 7 dias: 43.049 por dia (variação em 14 dias: +13%)

Estados

Subindo (17 estados + o DF): PR, RS, SC, ES, MG, SP, DF, MS, MT, AC, AP, RR, TO, AL, BA, PB, PE e RN

Em estabilidade, ou seja, o número de mortes não caiu nem subiu significativamente (6 estados): RJ, GO, RO, PA, PI e SE

Em queda (3 estados): AM, CE e MA.

G1, em 15.12.2020


Bolsonaro reconhece Biden como presidente eleito dos EUA

O presidente brasileiro esperou até que o Colégio Eleitoral sacramentasse a vitória do candidato democrata sobre Donald Trump para enfim congratulá-lo. 

"Saudações ao Presidente @JoeBiden, com meus melhores votos e a esperança de que os EUA sigam sendo 'a terra dos livres e o lar dos corajosos", escreveu o presidente brasileiro em seu perfil no Twitter. "Estarei pronto a trabalhar com o novo governo e dar continuidade à construção de uma aliança Brasil-EUA, na defesa da soberania, da democracia e da liberdade em todo o mundo, assim como na integração econômico-comercial em benefício dos nossos povos", completou Bolsonaro, que dias atrás disse ter ouvido de fontes que "teve muita fraude lá" nas eleições norte-americanas, e que, portanto, preferia esperar o resultado final do pleito.

Twitter / Jair Bolsonaro

Juan Guaidó: “Não quero usar a palavra negociação; causa muitos conflitos dentro da Venezuela”

O líder oposicionista, ainda reconhecido como presidente interino 60 países, diz que manterá a agenda do Parlamento, apesar de o chavismo ter acabado de retomar o controle da Assembleia Nacional

Juan Guaidó posa para uma foto durante uma sessão em setembro de 2019 em seu gabinete na assembleia.CARLOS BECERRA / BLOOMBERG

Já faz quase dois anos desde que Juan Guaidó (La Guaira, 37 anos) assumiu a presidência da Assembleia Nacional da Venezuela. Em questão de semanas, deixou de ser um político quase desconhecido para liderar a oposição ao chavismo. Como chefe do Parlamento, ele se proclamou presidente interino e, com forte apoio da comunidade internacional, tentou forçar a queda de Nicolás Maduro, a formação de um Governo de transição e a realização de eleições com garantias.

No entanto, a revolução bolivariana continua expandindo seu poder. Em 6 de dezembro, recuperou o controle do Legislativo em eleições marcadas por denúncias de fraude e que registraram apenas 30% de participação. Guaidó respondeu com uma consulta alternativa realizada online ao longo da semana passada e concluída no sábado com uma votação presencial. Líder do partido Vontade Popular, o mesmo de Leopoldo López, Guaidó busca conter o desgaste, a desmobilização e as críticas internas motivadas pelo fracasso da estratégia. Nesta entrevista a EL PAÍS, realizada por videoconferência, ele mostra a sua determinação em manter ativa a Assembleia Nacional de maioria oposicionista, a partir de 5 de janeiro, quando os novos deputados tomarão posse.

Pergunta. Qual a confiabilidade da consulta que vocês acabam de convocar?

Resposta. Para além do esforço que o comitê organizador fez, devemos comparar isto com o que é. Um movimento cívico, organizado a partir da sociedade civil, que é claro, no meu caso, eu promovi pessoalmente. Foram cinco dias de participação muito bem-sucedidos porque conseguiram passar mensagens importantes, apesar da pandemia e da perseguição e ao contrário do que foi o dia 6 de dezembro [realização das eleições legislativas]. Primeiro, que a organização e união são fundamentais na Venezuela. Segundo, a rejeição da fraude, mas também elevar a luta e a solução para o conflito em eleições presidenciais e parlamentares. Seria um erro comparar com o 6 de dezembro, até mesmo porque o 6 de dezembro foi feito usurpando as ferramentas e os recursos do Estado.

P. Mas quão fidedigno será um resultado que não foi auditado? Não estão cometendo um erro semelhante ao que criticam?

R. Não, essa é a grande diferença. Não se pode comparar um processo como aquele com um de manifestação de voluntários e participação cívica. Hoje ainda temos pessoas presas por terem entregue um panfleto ou terem armado um local [de votação].

P. Em 5 de janeiro terminará a legislatura da Assembleia Nacional de maioria oposicionista que foi conquistada de modo contundente em 2015, pelo qual você é reconhecido como presidente interino por cerca de 60 países. Desse dia em diante, quem será Juan Guaidó?

Juan Guaidó durante uma entrevista em seu gabinete da Assembleia em 2019. CARLOS BECERRA / BLOOMBERG

R. O reconhecimento internacional e a presidência interina hoje são instrumentos de defesa do que resta de democracia na Venezuela. A continuidade institucional é o princípio que estamos abraçando neste momento, por não ter havido uma eleição válida, para dar continuidade ao mandato da Assembleia Nacional e da presidência interina. Com que base? O artigo 233 da Constituição, a não eleição realizada em 6 de dezembro. Mas o mais importante é a defesa dos venezuelanos, das pessoas. Não podemos permitir um vazio na interlocução. Para chegar a uma solução, vamos necessitar de força interna e do diálogo legítimo do povo da Venezuela, o que significa manter e instalar em 5 de janeiro a continuidade constitucional do Parlamento.

P. A partir de 6 de janeiro, então, você vai continuar se considerando presidente interino?

R. Pela Constituição e a continuidade institucional com base no Parlamento nacional. Não podemos cair na armadilha. O que eles estão querendo? Aniquilar a alternativa democrática, por isso, por exemplo, não aceitaram a oferta muito sensata que a Europa fez recentemente para afastar a fraude e reunir condições para um processo reconhecido e competitivo. Maduro não está interessado na legitimidade desse processo do 6 de dezembro.

P. Você foi proclamado presidente interino e reconhecido para conseguir um objetivo: cessação da usurpação, um Governo de transição, eleições livres. Dois anos depois, nada disso foi alcançado. O seu Governo interino deve ser mantido da forma como está estruturado ou precisa ser modificado e reduzir cargos?

R. Acho que deveria ser melhorado para se tornar mais rápido. A pressão internacional tem que ser facilitada, mas também as garantias para aqueles que hoje apoiam Maduro. Qualquer transição cria incertezas, mesmo nas democracias. Em suma, a partir de 5, 6 de janeiro o que temos que fazer é fortalecer a coalizão internacional, a mobilização interna para fazer pressão, mas também as garantias, o marco para a transição.

P. Todos esses objetivos que você enfatizou muitas vezes também perderam credibilidade. Nestes dois anos, as expectativas foram muito altas e há muitas críticas à estrutura desse Governo interino. Essa estrutura deve ser mantida?

R. A revisão tem a ver com o objetivo e também com o ambiente da Venezuela. Hoje, a vida cotidiana na Venezuela é uma façanha, desde pôr gasolina até comprar comida. Se quisermos ampliar o reconhecimento do Parlamento nacional, a rejeição da fraude e aumentar as pressões, provavelmente não precisamos de 36 embaixadores, precisamos de 44. Mas, na Venezuela, como protegemos aqueles que foram nomeados pelo Governo interino?

P. No ano passado, nós lhe perguntamos sobre o fracasso de seus planos e você pediu para não confundir esse termo com frustração. Você ainda acredita que não fracassou?

R. Continuo acreditando que as pessoas querem a saída de Maduro. Nosso grande mandato é sair da ditadura, conseguir a transição e eleições livres. Tudo o que for orientado nesta direção funcionará. Ver de outra forma é dar razão à ditadura, que torturou, assassinou e roubou eleições. É preciso melhorar processos, mas sem perder de vista o contexto. Por exemplo, a desigualdade de informação. Nas emissoras de âmbito nacional a consulta popular não foi mencionada nenhuma vez, não se falou em fraude e Juan Guaidó não pôde ser citado em nenhum programa.

P. Qual foi seu principal erro nestes dois anos?

R. Acho que há duas coisas a melhorar no curtíssimo prazo. A primeira, produzir a certeza de que haverá uma transição, dar garantias precisas a todos os setores. Um exemplo pontual é como melhorar um processo como o da Noruega ou o que transcorreu em 30 de abril. As garantias são essenciais para gerar pressões e dilemas para a ditadura. E o outro elemento importante é a gestão da construção de consensos efetivos. O que isto significa? Unidade, que tem que ser em dois sentidos: a estabilidade e a governabilidade, mas também tem que ser audaz.

P. Do primeiro se deduz que a força interna talvez tenha sido um pouco deixada de lado pela força internacional, especificamente por causa do grande apoio que os EUA lhes deram. Isso foi um erro?

R. Não, mais do que isso são as garantias. Em nível interno, temos visto grandes mobilizações, grandes manifestações, mas podemos conseguir fortalecer esse quadro. Há muita gente no entorno de Maduro que também está cansada.

P. Até agora apelaram para o imediatismo. Um dos seus lemas era “o momento é agora”, mas se olharmos para o futuro se vislumbra uma espécie de travessia do deserto. O que virá agora e como você vai convencer todo o universo antichavista de que você é a pessoa certa para continuar liderando essa tentativa de forçar a mudança?

R. Aí tudo se resume, em forçar uma solução, o que podemos oferecer no curto prazo. Para poder oferecer garantias, é necessário um diálogo legítimo. Como conseguir isso? Por meio do Parlamento nacional. O Parlamento tem uma liderança e uma direção, que neste caso a presidência interina assume em razão da situação extraordinária que a Venezuela atravessa. E nisso há um consenso político de todos os partidos da alternativa democrática. Para além da pessoa, creio que existe um absoluto consenso político, tirando as diferenças públicas que vocês conhecem e que eu reconheço, mas que são opiniões e casos pessoais.

P. E a solução vai passar por uma negociação?

R. Não quero falar de negociação porque o termo é diferente, pelo que se entende na comunidade internacional e o que vivemos na Venezuela. Quando Maduro fala em negociação, ele o faz de maneira retórica, para diminuir a solução do conflito. A solução para o conflito passa por eleições presidenciais e parlamentares. Mais do que negociação, eu gostaria de falar em garantias para conseguir uma eleição. Para isso precisamos de pressão, de força, porque Maduro mostrou voluntariamente que não concorda com uma negociação. Os exemplos mais próximos são os enviados de Bruxelas a Caracas, a comissão de reivindicações, a mediação do Reino da Noruega. Eu troco a palavra negociação para torná-la mais específica e pôr na mesa garantias a todos os setores para conseguir uma eleição presidencial e parlamentar e assim não distorcer o conceito, porque Maduro até o tornou pejorativo ao fazer mau uso dele.


Manifestantes gritam slogans durante um protesto contra o presidente Nicolás Maduro e seu Governo em Caracas, Venezuela, na terça-feira, 10 de março de 2020.CARLOS BECERRA / BLOOMBERG

P. Ou seja, não se vai negociar a saída de Maduro, mas, sim, poderiam negociar as condições para que haja um cenário que permita aos venezuelanos decidir a saída ou não de Maduro.

R. Não quero usar a palavra negociação, de novo, porque isso gera muitos conflitos dentro da Venezuela. E peço ajuda à comunidade internacional para dar significado a isto, porque, se assim não for, alimentamos a narrativa da ditadura. As garantias vão permitir eleições presidenciais e parlamentares. Considero que é importante que Maduro saia e isso passa por outros mecanismos de pressão. Mas as garantias são direcionadas até mesmo ao seu entorno.

P. Durante o processo de paz com as FARC na Colômbia, o Governo comentava sobre o problema que tinha internamente ao usar uma ou outra palavra. Você sabe que a comunidade internacional fala de uma saída negociada, mas essa palavra assusta muito porque talvez o setor extremo, mais conservador, que há na Venezuela o rejeitaria. Você acha que precisa mudar esse equilíbrio entre o que tem que dizer para o lado de fora e o que tem que dizer para o lado de dentro?

R. Não tenho meios na Venezuela para explicar isso. O mecanismo de comunicação com os cidadãos para nós é o Twitter. E apenas oito em cada dez venezuelanos têm acesso diário à Internet.

P. E por essa virtualidade você é mais presidente interino para a comunidade internacional do que para os próprios venezuelanos.

R. Eu não falaria em virtualidade, mas em eficácia para sair de Maduro. No final do dia a grande necessidade do povo da Venezuela é sair de Maduro.

P. Haverá uma mudança em Washington, onde vocês tiveram em Trump seu maior apoiador na comunidade internacional. O que esperam de Joe Biden? Você teria preferido que Trump tivesse vencido a eleição novamente?

R. O mais importante com a Administração do presidente eleito Biden é simples: oferecer aos nossos aliados a oportunidade de resolver o conflito. Queremos a abordagem bipartidária que tivemos até agora. Em relação à Administração do presidente Trump, o agradecimento dos venezuelanos pela determinação na luta pela democracia. Mas, no final das contas, os americanos elegem, nós respeitamos 100% esse processo, antes, durante e depois da eleição. Queremos que a solução do conflito sirva também como segurança para todo o continente.

P. Dias atrás você pediu o reforço das sanções. Por quê? Acha que as medidas tomadas até agora serviram para alguma coisa?

R. Mais do que fortalecer, falei em homologar. Porque a ditadura, através do Irã ou de outros países, tenta contornar as sanções, então as pressões não surtem o efeito desejado. Quando falo em fortalecer, quero dizer melhorar, sustentar de modo eficaz.

P. E as que foram adotadas até agora conseguiram alguma coisa?

R. São a única ferramenta que levaram a ditadura, por exemplo, a sentar-se com a Noruega, a sentar-se com a Europa, são a única ferramenta que há que realmente dói para eles. Hoje não estamos no cenário de um Governo ruim. [Maduro] é um criminoso de lesa humanidade que tortura, assassina e reprime sistematicamente.


O líder da oposição Juan Guaidó chega para dirigir uma sessão legislativa no teatro municipal de San Antonio, em Caracas, Venezuela, na terça-feira, 18 de fevereiro de 2020. MATIAS DELACROIX / AP

P. Você sabe que na UE existem muitas posições diferentes. Teme que a partir de agora alguns países retirem o apoio a seu cargo?

R. Tenho plena confiança no apoio da UE à causa venezuelana e no entendimento da intenção da ditadura de aniquilar a alternativa democrática.

P. Entenderia que a UE mantivesse esse apoio à causa venezuelana, que o mantivesse como interlocutor, mas não continuasse a reconhecê-lo com o título de presidente interino?

R. Acho que o fortalecimento em si mesmo é importante, tanto do cargo como da instituição. E acho que há uma compreensão disso. O contrário seria, novamente, validar a tese da ditadura.

P. Se a UE não continuar lhe reconhecendo como presidente interino, considera que isso valida Maduro?

R. Não valida Maduro, mas é preciso insistir na proteção da alternativa democrática. O que acontece se a ditadura me sequestra? Esse sempre é um risco latente.

P. Não gosta da palavra negociação, mas tanto a UE como a Noruega patrocinaram em várias ocasiões uma espécie de mediação, uma exploração de uma via de saída. Vocês estão dispostos a participar de alguma iniciativa com essas características?

R. Quem não quer a negociação é Maduro. Se quisesse uma negociação, teria concordado com algo. A ditadura joga muito com a propaganda. Estamos dispostos a fazer tudo o que estiver próximo de garantias no menor tempo possível.

P. Há um nome que pairou na conversa, embora não tenha sido citado. Pode-se fazer uma oposição sólida sem que Juan Guaidó e Henrique Capriles estejam juntos?

R. Pode-se fazer oposição, sem dúvida, não é uma questão de pessoas. Acho que isso a facilita, mas não são fatores exclusivos. Por exemplo, Henrique faz parte de um partido político, o Primeiro Justiça, que está absolutamente alinhado com tudo o que temos falado. Não é um fator determinante, mas seria um fator facilitador.

JAVIER LAFUENTE e FRANCESCO MANETTO, da Cidade Do México e de  Bogotá para o EL PAÍS, em 15.12.2020. 

Apagão do Google põe em evidência os riscos da era do teletrabalho

Falha revela a dependência de milhões de empresas e pessoas das gigantes digitais

Tela de um celular com aplicativos do Google. / CHESNOT / GETTY IMAGES

Milhões de pessoas e empresas em todo o mundo dependem do Google para se comunicar, organizar sua agenda ou trabalhar online. Na manhã desta segunda-feira, vários serviços da empresa ―Gmail, Youtube, Google Maps e o serviço de armazenamento em nuvem Google Drive— ficaram fora do ar por 45 minutos. Esta falha, decorrente de um problema de armazenamento interno no sistema de autenticação, revelou a grande dependência que os usuários têm das gigantes tecnológicas. Não é a primeira vez que algo assim acontece. Mas agora, com o boom do teletrabalho resultante da crise do coronavírus, esses acidentes são muito mais graves.

Ricardo Pérez, professor de Sistemas de Informação da IE Business School, diz ser algo “raro” a ocorrência dessas quedas. “O normal é que sejam tão curtas que nem percebamos, sejam solucionadas rapidamente ou inexistam.” Falhas como essa ajudam a entender o enorme impacto que as gigantes da tecnologia têm na vida cotidiana de milhões de pessoas e empresas. “Houve falhas tanto em calefadores de pessoas que têm Nest [linha de produtos de automação residencial do Google] até em televisores com Chromecast ou Android e os serviços usados por mais de seis milhões de empresas”, diz ele.

Google fica temporariamente fora do ar no mundo todo

Esta não é a primeira vez que o Google fica fora do ar neste ano. Outro apagão global no serviço ocorreu em agosto, e a empresa de Mountain View declarou ter sido resolvido 13 horas depois. Naquela ocasião, os usuários não conseguiam anexar documentos às caixas de correio do Gmail e houve falhas quando tentavam fazer videochamadas com o Meet ou editar arquivos armazenados no Google Drive. Outras empresas, como a Amazon Web Services, o WhatsApp, o Facebook e o Instagram também sofreram quedas em 2020.

“Nós necessitamos que esses serviços sejam robustos e funcionem 24 horas por dia, nos sete dias da semana, porque estamos em uma sociedade cada vez mais digital”, afirma Fernando Suárez, presidente do Conselho Geral das Faculdades Oficiais de Engenharia da Computação. “Nós os utilizamos nas relações com a administração pública, o trabalho, a educação ou nas relações pessoais”, acrescenta.

O impacto da queda de serviços como o Google é maior hoje do que antes da pandemia. No caso da Espanha, nos últimos 10 anos apenas 4% da população do país trabalhava em casa. Mas os confinamentos e as restrições de mobilidade fizeram essa fatia disparar em 2020, chegando a 16,4%, de acordo com um estudo publicado em setembro pela Randstad. As empresas dependem principalmente dos serviços da Microsoft, Amazon, Salesforce, Slack ou Zoom. “Se há um ano estivéssemos em uma reunião e esses serviços digitais parassem, continuaríamos a conversar cara a cara. Hoje, isso é impossível para muita gente. O impacto é difícil de medir, mas é muitíssimo maior do que há alguns meses”, diz Pérez, que acredita que essas quedas farão as empresas pensarem em um plano B ou em até que ponto é conveniente para elas depender de apenas um provedor.

Perdas milionárias em horas

Os serviços do Google ficaram inativos por menos de uma hora nesta segunda-feira. Para Guillermo García, doutor em Economia e professor da Universidade San Jorge, esta falha “talvez não represente uma ameaça direta ao teletrabalho, mas deveria nos fazer repensar a tremenda dependência que temos dos grandes da indústria”. Ele considera que nem grandes nem pequenas empresas estão preparadas para essas quedas e seus negócios serão afetados: “Empresas que dependem da tecnologia do Google, como a Uber, com milhões de usuários que usam o Google Maps para contratar seus serviços, podem ter perdas milionárias em questão de horas”.

Quanto maior e mais tecnológica for a empresa, “maiores serão as perdas sofridas”, diz García. Ele acrescenta que Netflix, Uber ou Cabify sofreriam graves consequências se os seus serviços digitais ficassem fora do ar. Contudo, “nas empresas com uso menos intensivo de tecnologia e de menor porte, essas perdas serão pequenas e com pouco impacto no negócio principal”.

Apurar responsabilidades

Calcular o impacto econômico desse tipo de queda é complicado. E também apurar responsabilidades. Sergio de Juan-Creix, advogado especialista em direito digital da Croma Legal e professor da UOC, observa que, embora normalmente ao pagar por um serviço que apresentou falhas o cliente tenha o direito de solicitar reembolso, as empresas de tecnologia geralmente têm contratos nos quais não assumem a responsabilidade se o problema estiver além de seu controle. “Teríamos que descobrir a origem do problema e se a culpa é do Google”, diz ele. “Além do mais, há danos que são muito difíceis de provar, praticamente impossíveis”, acrescenta. Ele se refere à perda de negócios que poderia ocorrer por causa do serviço fora do ar: “Imagine que por causa dessa queda eu não tenha conseguido enviar um e-mail confirmando um contrato que teria que fechar dentro de 30 minutos e, assim, perdi essa oportunidade”.

No entanto, existe um vazio jurídico que isenta essas empresas online de responsabilidade e que representa um tratamento desigual em relação a outros serviços essenciais, como telefonia ou eletricidade. Por exemplo, se o serviço de telefonia móvel cair ou houver um corte de energia, as empresas são obrigadas a indenizar seus clientes, de acordo com a legislação espanhola de proteção ao consumidor. Mas se o WhatsApp for cortado ou o Google Maps não funcionar, não há nenhuma compensação regulamentada, por se tratar de um serviço teoricamente gratuito.

Diante da dependência inevitável dos serviços digitais, os gigantes da tecnologia concentram seus esforços em evitar esses acidentes. Embora não ocorram com muita frequência, poderia acontecer de serviços como Google, Microsoft ou Zoom ficarem fora do ar por uma semana, por exemplo? Para Pérez, isso parece “praticamente impossível”. “Teria que haver um desastre de proporções mundiais”, afirma. As gigantes da tecnologia se empenham muito em evitar esses problemas porque há muito em jogo: “Há uma briga pela confiança do usuário. Cada falha do Google é uma grande vitória para a concorrência”, conclui.

Isabel Rubio, de Madrid para o EL PAÍS, em 15.12.2020

Aras diz que suposto uso da Abin por Flávio Bolsonaro "é grave"

No entanto, procurador-geral da República afirmou que denúncia carece de provas. "Nós não trabalhamos com narrativas. Nós trabalhamos com fatos e provas, por enquanto temos fatos transmitidos pela imprensa", ressaltou.


Augusto Aras, Procurador Geral da República
                                                            (crédito: LeonardoPrado)

O procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou que solicitou informações à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) sobre o suposto uso da entidade de inteligência para auxiliar a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Relatórios produzidos pela instituição teriam sido repassados aos advogados do parlamentar na tentativa de anular investigações que correm contra ele por suspeitas de corrupção no caso das rachadinhas.

Aras afirmou que os fatos são "graves", mas que até o momento, "não existem provas", apenas informações publicadas na imprensa. “O fato em si narrado é grave, o que nós não temos são provas desses fatos. Nós não trabalhamos com narrativas. Nós trabalhamos com fatos e provas, por enquanto temos fatos transmitidos pela imprensa”, disse o procurador-geral ao ser questionado por jornalistas.

Ele afirmou que o Supremo tem entendimento de que denúncias feitas na imprensa não consistem em provas e que é necessário elementos que embasem a abertura de investigação formal. Mais de 50 parlamentares enviaram pedidos para que a PGR investigue o caso.

“Na verdade, nós recebemos somente ontem (segunda-feira) as representações do deputado Marcelo Freixo (PSol-RJ) e mais 50 deputados. Estas representações não trazem elementos materiais, trazem apenas notícias de jornal", disse o procurador.

Chefe do Ministério Público afirmou, contudo, que uma investigação será aberta para tratar do caso. “O MP vai ter de fazer a investigação. Vamos fazer perguntas aos órgãos competentes, ficamos à mercê dessas respostas. Sem os elementos ao menos indicados pela imprensa estaremos com dificuldade para fazer essas investigações, mas a imprensa contribuiria muito se fornecesse os elementos materiais”, completou Aras.

Prazo de 24 horas

A ministra Cármen Lúcia deu prazo de 24 horas para que a Abin e o GSI expliquem as denúncias. A determinação foi emitida em nome do ministro Augusto Heleno e do diretor-geral da Agência, Alexandre Ramagem. A produção de dois relatórios para auxiliar a defesa de Flávio foi revelada pela revista Época.

A publicação afirma que o setor de inteligência do governo orientou a abertura de uma notícia-crime na Procuradoria-Geral da República pelos advogados questionando suposta defesa, sem autorização da Justiça, nas contas pessoais do senador Flávio Bolsonaro. Além disso, teria orientado a demissão de auditores da Receita e servidores da Controladoria-Geral da União (AGU). De fato, pelo menos um servidor da Receita foi desligado, "a pedido".

Renato Souza / Correio Braziliense, 15.12.2020.   

Mutação do coronavírus não é razão para pânico

Nova variante do Sars-Cov-2 descoberta no Reino Unido parece ser capaz de se espalhar mais rapidamente, mas isso não a torna necessariamente mais perigosa.


       Micrografia eletrônica de transmissão de covid-19, com uma célula apoptótica fortemente                                                     infectada com partículas de coronavírus.

Os vírus estão em constante mutação, e essas mutações costumam ter efeitos mínimos

A mutação do novo coronavírus recentemente confirmada no sul do Reino Unido está se espalhando mais rapidamente do que a variante anterior, afirmou o ministro da Saúde britânico, Matt Hancock. Já há mil casos de pessoas infectadas pelo vírus com a mutação.

"Identificamos uma nova variante do coronavírus, que pode estar associada à disseminação mais rápida no sudeste da Inglaterra", disse ele, numa declaração na Câmara dos Comuns. Segundo Hancock, porém, isso não significa que a nova variante seja necessariamente mais perigosa.

Mutações como essa não são raras. Na China, por exemplo, origem da pandemia, uma nova variante do patógeno circulava há seis meses. No verão europeu, outra variante rapidamente se espalhou por metade da Europa a partir da Espanha.

Os vírus estão em constante mutação, e essas mutações geralmente têm efeitos adicionais mínimos.

Como o corpo reage a mutações?
Normalmente, o corpo humano é capaz de se proteger de vírus. Ele produz anticorpos que o defendem de ataques e o tornam imune aos patógenos. No entanto, caso o vírus já tenha sofrido alguma mutação e os anticorpos formados estejam programados para uma variante mais antiga, esses anticorpos serão menos eficazes.

É por esse motivo que se fica resfriado com tanta frequência. O corpo já produziu os anticorpos contra o resfriado anterior, mas não para a variante que sofreu mutação.

Mas não há razão para pânico, porque um vírus não se torna necessariamente mais perigoso devido a uma mutação. Algumas delas podem até mesmo enfraquecer um vírus.

Como ocorrem as mutações?
Quando o corpo humano desenvolveu anticorpos contra um determinado patógeno, sendo assim capaz de evitar o surgimento de uma doença, o vírus precisa mudar seu invólucro para não ser reconhecido pelos anticorpos e células do sistema imunológico. Para sobreviver, portanto, ele tem que alterar suas proteínas externas e desenvolver novas cepas.

Para se multiplicar, os vírus usam uma célula hospedeira. Quando a atacam, eles levam a informação genética de seu próprio núcleo para a célula infectada. É assim que as células do corpo geram milhões de cópias virais. Porém, com essas reproduções ocorrem também pequenos erros de cópia, e cada um desses erros altera o código genético do vírus, ou seja, ele sofre uma mutação.

Por que a nova variante se espalha mais rapidamente?
Como todos os coronavírus, o Sars-Cov-2, responsável pela covid-19, é um vírus RNA com uma taxa de mutação quase mensal.

Essas diferentes variantes também ajudam a explicar por que um patógeno desencadeia ondas de infecções de gravidade diferente em certas regiões do mundo e por que as infecções podem se desenvolver de maneira tão distinta de uma pessoa para outra.

A nova variante registrada no Reino Unido tem várias mutações na proteína spike do coronavírus – devido a uma deleção de gene faltam dois aminoácidos, o que pode facilitar a propagação do patógeno.

Uma deleção semelhante já havia sido observada no Leste Asiático. Lá, no entanto, a variante do Sars-Cov-2 causou infecções mais leves, pois aparentemente a mutação enfraqueceu o coronavírus.

As novas vacinas se tornam assim ineficazes?
O Reino Unido foi o primeiro país da Europa Ocidental a iniciar uma campanha de vacinação em grande escala. A mutação recém-registrada não torna as novas vacinas ineficazes. Elas são todas projetadas para codificar a informação da proteína spike do coronavírus de tal forma que nosso sistema imunológico é estimulado a despeito de eventuais mutações.

Felizmente, são necessárias mais do que algumas mutações para que um vírus altere suas proteínas de maneira que possam contornar a proteção imunológica.

No entanto, sabe-se que os vírus da gripe, por exemplo, sofrem mutações muito rapidamente, e por isso as vacinas precisam ser reajustadas a cada nova temporada para permanecerem eficazes.

Consequentemente, as vacinas contra a covid-19 terão que ser ajustadas em algum momento. Mas as informações coletadas durante a crise e as capacidades de produção recém-desenvolvidas garantirão um fornecimento rápido de vacinas também no futuro.

Deutsche Welle, 15,12,2020

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Mourão: ‘Campanha para 2022 foi colocada na rua cedo demais e não dá mais para ser recolhida’

Vice-presidente afirma que disputa entre o presidente Bolsonaro e o governador João Doria deve continuar ‘até o desfecho das urnas’

O vice-presidente da República, Hamilton Mourão, afirmou, em entrevista exclusiva ao “Papo com Editor”, do Estadão/Broadcast, que a disputa eleitoral de 2022 foi colocada em pauta “cedo demais”. Para ele, o embate entre o presidente Jair Bolsonaro e seu adversário político João Doria (PSDB), governador de São Paulo e um dos pré-candidatos à sucessão, deve continuar até o “desfecho nas urnas”.

“A campanha eleitoral para 2022 foi colocada na rua cedo demais. Então, a partir daí, é aquela história, ela partiu e não dá mais para ser recolhida. Na minha visão, vai continuar esse clima (de embate)”, avaliou. O vice-presidente opinou que Doria “vem fazendo uso dos mais variados meios para se colocar em evidência e sempre buscando ser um contraponto ao nosso governo”.

Apesar disso, a briga política se mantém no campo declaratório e da retórica, segundo Mourão. “Esse embate está muito nas palavras. Quando vocês forem olhar ações concretas, não tem ação concreta. Nem o governo federal está prejudicando o governo de São Paulo e nem o governo de São Paulo vai fazer uma nova Revolução de 32”, comentou.

Mourão é presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal


Vice da República, Hamilton Mourão Foto: Adriano Machado/Reuters

Vacina contra covid-19

Na visão do vice-presidente, a discussão está pautada, em especial, na questão da vacina contra a covid-19, que para ele é usada como “instrumento político”. “Está havendo uma discussão muito grande em torno de algo que ainda não existe”, opinou Mourão, ao lembrar que o Brasil ainda não tem imunizantes certificados.

Desde o início da pandemia, Bolsonaro e Doria divergem sobre a estratégia de combate ao vírus. Ao contrário do chefe do Executivo, o governador também defende a obrigatoriedade da vacina e a adoção do imunizante de origem chinesa, a Coronavac, produzida em parceria com o Instituto Butantan. Apesar das constantes críticas públicas entre os dois, Mourão aposta que a briga possa “cansar” e esfriar até 2022. “O embate está nas palavras, não tem ação concreta e já vem cansando. Vamos aguardar os próximos passos. Julgo que vai ficar nessa figura de retórica e talvez em determinado momento até dê uma arrefecida”, acrescentou.

‘Faz algum tempo’ que não temos conversa particular, diz Mourão sobre Bolsonaro

Em mais um sinal do distanciamento com o chefe do Executivo, Mourão disse, durante a entrevista, que “faz algum tempo” que não tem conversas particulares com o presidente Bolsonaro. Questionado sobre planos para uma reunião privada com o presidente sobre temas fora do Executivo, Mourão respondeu: “Se for provocado, sim”.

“A realidade é que faz algum tempo que não temos uma conversa particular”, disse. O vice-presidente também negou possíveis planos de passar o Natal junto do presidente. “É um momento que é mais da família”, disse. Nesta semana, o vice-presidente disse que pretende despachar com Bolsonaro sobre a decisão sobre a reestruturação da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban).

Em relação às eleições de 2022 e uma possível repetição da chapa de 2018, Mourão negou que tenha tratado sobre o assunto com Bolsonaro. Mas, se mostrou disponível caso seja convidado. “Até o presente momento, o presidente Jair Bolsonaro não tocou nesse assunto comigo. Estou pronto para acompanhá-lo caso ele deseje e vá ser candidato em 2022, porque tudo é possível daqui para lá”, disse.

Apesar de ser mais receptivo com a imprensa do que Bolsonaro, o vice-presidente afirmou que prefere uma “posição secundária” no governo e não de evidência. “Desde o primeiro momento sempre me coloquei numa posição para assessorar o presidente Bolsonaro da melhor forma possível e buscar facilitar as ações dele”, explicou.

No início de novembro, contudo, Bolsonaro e Mourão divergiram sobre as eleições nos Estados Unidos. Enquanto o vice-presidente disse que eventualmente o governo reconheceria a vitória de Biden nos EUA, o chefe do Executivo negou que tivesse conversado com Mourão sobre o assunto, expondo o distanciamento entre os dois. A vacina contra a covid-19 e, recentemente, a tecnologia 5G também já foram temas de opiniões opostas de Bolsonaro e Mourão.

Emilly Behnke, Silvia Araujo e Gustavo Porto, O Estado de S.Paulo  / 4 de dezembro de 2020 


Colégio Eleitoral dos EUA confirma vitória de Joe Biden

Com votação dos 55 delegados da Califórnia, democrata supera a maioria de 270 votos necessária para chegar à Casa Branca, Trump anuncia saída do procurador-geral William Barr de seu governo.


Presidente e vice presidente eleitos dos EUA, Joe Biden e Kamala Harris

O Colégio Eleitoral dos Estados Unidos confirmou nesta segunda-feira (14/12), como era previsto, a vitória do democrata Joe Biden na eleição presidencial frente ao atual presidente, o republicano Donald Trump.

Com a votação dos 55 delegados da Califórnia, onde Biden venceu com cerca de 63% de votos, o democrata superou amplamente a maioria de 270 votos necessária para chegar à Casa Branca, horas depois do início das votações do Colégio Eleitoral em cada estado.

Com isso, o democrata se aproximou de confirmar os 306 delegados do Colégio Eleitoral, contra 232 de Trump. Considerando o voto popular, Biden teve 81,3 milhões de votos (51,3%) contra 74,2 milhões (46,8%) de Trump.

A cerimônia de posse de Biden enquanto o 46.º Presidente dos Estados Unidos está agendada para o dia 20 de janeiro. 

No sistema eleitoral dos Estados Unidos, os delegados do Colégio Eleitoral confirmam, em suas reuniões em cada estado, o que foi votado nas urnas pelos milhões de americanos nas eleições, realizadas há um mês e meio.

A grande mídia já previa em 7 de novembro que Biden alcançaria 306 votos eleitorais e arrancaria a presidência de Trump, mas o atual presidente desde então se recusou a admitir a derrota, alegando, sem apresentar provas, ter ocorrido fraude eleitoral maciça, o que foi repetidamente refutado pelas autoridades eleitorais.

Essa campanha inédita realizada por Trump deu especial significado à votação no Colégio Eleitoral, que normalmente costuma ser um mero passo burocrático para ratificar um resultado já amplamente conhecido e aceito.

Trump anuncia saída de Barr

Trump não reagiu de imediato às notícias do Colégio Eleitoral, mas em uma aparente tentativa de tirar o foco, foi ao Twitter logo depois para anunciar que o procurador-geral do país, William Barr deixará o cargo nos próximos dias.

"Bill vai sair [do cargo de procurador-geral dos EUA] pouco antes do Natal para passar os feriados com a família", escreveu o presidente, acrescentando que Barr vai ser substituído por Jeff Rosen, "uma pessoa excecional" que era até agora procurador-geral adjunto.

Trump vinha expressado repetidamente sua insatisfação com Barr nas últimas semanas, devido às questões legais relacionadas com a eleição presidencial.

O presidente americano se irritou que Barr tenha declarado não ter encontrado evidências de fraudes eleitorais generalizadas e também com o fato de o procurador-geral não tê-lo informado durante a campanha eleitoral que o Departamento de Justiça tinha aberto uma investigação contra Hunter Biden, um dos filhos do presidente eleito. 

Deutsche Welle, em 14.12.2020