quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Brasil vive fuga recorde de investidores estrangeiros, e questão ambiental pode piorar quadro

Nos primeiros oito meses do ano, US$ 15,2 bilhões deixaram o país, maior volume para o período desde 1982

As queimadas na Amazônia e, mais recentemente, no Pantanal, tendem a afastar os investidores estrangeiros do Brasil Foto: João Paulo Guimarães / AFP

O Brasil está perdendo atratividade para os investidores estrangeiros. Os efeitos da crise global provocada pela pandemia e as incertezas em relação à retomada da trajetória do controle de gastos públicos no próximo ano reduziram o apetite pelos ativos brasileiros. Com o avanço de queimadas e desmatamento, esse quadro tende a se agravar, segundo especialistas e gestores.

Os dados do fluxo cambial mostram um quadro inédito de saída de recursos externos. Nos primeiros oito meses deste ano, US$ 15,2 bilhões deixaram o país, o maior volume para o período desde que o Banco Central (BC) começou a compilar as estatísticas, em 1982. Além disso, os investidores estrangeiros retiraram R$ 87,3 bilhões da Bolsa brasileira de janeiro a 17 de setembro de 2020.

Isso é quase o dobro do registrado em todo o ano passado, quando saíram R$ 44,5 bilhões. É a maior saída da série da B3, iniciada em 2008.

Os dados do fluxo cambial consideram os resultados das exportações e das importações do país, a chamada conta comercial, e o fluxo financeiro de investimentos, aportes em títulos ou dividendos remetidos e recebidos do exterior, a conta financeira. As saídas se concentram exatamente na conta financeira: foram US$ 89,6 bilhões no período de 12 meses até agosto.

Acordo Mercosul-UE: Custo ambiental supera vantagem econômica, aponta relatório da França

Já a conta comercial tem saldo positivo de US$ 36,2 bilhões nessa comparação.

Já os números de saída de estrangeiros da Bolsa não consideram a entrada de capital por meio de ofertas públicas de ações, os IPOs.

Investimento cai 27%

Em uma audiência virtual promovida na terça-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente do BC Arminio Fraga alertou para a piora da imagem do Brasil no exterior.

— Em função da piora concreta das taxas de desmatamento e de sinais abundantes de que prevalece hoje uma certa tolerância com a questão, o Brasil tem merecido uma imagem bastante negativa na cena internacional. O mesmo obscurantismo que nos prejudicou e nos prejudica no combate à pandemia nos afeta também nos temas ambientais — disse Arminio.

Ele ressatou que qualquer hesitação nessa área “reforça essa percepção negativa que hoje se abate” sobre o Brasil, que corre o risco de se tornar um pária.

Antes das eleições de 2022:Governo decide acelerar estudos para privatizar os aeroportos Santos Dumont e Congonhas

Esta imagem negativa no exterior também pode ser observada nos dados sobre investimento estrangeiro, que registrou o menor resultado para um primeiro semestre em mais de uma década. Nos primeiros seis meses deste ano entraram US$ 22,8 bilhões, o menor patamar desde os US$ 13,9 bilhões registrados em 2009 e uma queda de 27% na comparação com o mesmo período de 2019.B

Ainda assim, contrariando os dados do BC, em seu discurso na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que os investimentos cresceram:

— O Brasil foi, em 2019, o quarto maior destino de investimentos diretos em todo o mundo e no primeiro semestre de 2020, apesar da pandemia, verificamos um aumento de ingresso de investimentos em comparação com o mesmo período do ano passado.

Arminio ressaltou que o desmatamento vai prejudicar cada vez mais o agronegócio, as exportações e os investimentos estrangeiros no Brasil:

— O desmatamento e outros crimes ambientais, além de agravarem o problema global, trazem enorme risco para o ecossistema do agronegócio, nosso setor mais bem-sucedido, e também para a oferta de energia no nosso país.

Segundo ele, isso prejudica também cada vez mais o acesso a mercados para os produtos brasileiros:

— Basta lembrarmos o acordo com a União Europeia. A crescente ênfase, por parte das melhores empresas do mundo, do trio chamado em inglês ESG, traduzindo, meio ambiente, social e governança, reduz a atratividade do Brasil como destino de investimentos.

Daniela da Costa-Bulthuis, gestora para o Brasil da holandesa Robeco Asset, também alerta para as consequências da atual política ambiental para o futuro do país:

— O país está perdendo o capital de longo prazo, que é o que vem para ficar e que vai aumentando os investimentos ao longo do tempo. Em um exemplo hipotético, o estrangeiro pode ficar receoso de investir em uma fábrica de alimentos no Brasil e, dali a certo tempo, algum produto agrícola brasileiro ser proibido no mercado internacional por causa de práticas contra a preservação ambiental.

‘O trem já partiu’

Para Daniela, o governo deveria escutar o que a comunidade estrangeira tem a dizer:

— Quando os investidores estrangeiros alertam sobre a situação ambiental brasileira, não é uma questão política. Estamos olhando os dados oficiais, e eles apontam que o desmatamento está avançando. E o Brasil não é o único país que recebe alertas de investidores estrangeiros.

Eric Christian Pedersen, diretor de Investimentos Responsáveis, da gestora finlandesa Nordea Asset Management, considera que, no curto prazo, o risco maior diz respeito à aprovação do acordo entre Mercosul e União Europeia (UE). Isso porque a questão ambiental tem grande espaço na agenda europeia.

Daniela ressalta que, hoje, conservação ambiental e economia estão ligados:

— No mundo atual, não é possível conduzir atividade predatória no meio ambiental no longo prazo. Pode-se chegar a um ponto em que não haja fertilizante que faça a terra ser produtiva.

Arminio vê relação de dependência entre meio ambiente e atividade econômica:

— A persistir o aumento da temperatura do planeta, as consequências serão devastadoras. O trem já partiu, e todo cuidado é pouco. Estima-se que o impacto econômico e social ao longo do tempo será maior que o da pandemia. Imagino até bem super.

Gabriel Shinohara, André de Souza, Gabriel Martins e Rennan Setti /Publicado oriiginalmente por O Globo, edição de 23/09/2020 - 08:16.

'Faltam coordenação e metas para superar a pandemia', diz Pedro Parente

Na visão de ministro do FHC que livrou o País do apagão em 2002, sem articulação 'ou a vacina dá certo ou não se sabe o que virá'.

Entrevista com Pedro Parente, presidente do conselho da BRF

Pedro Parente cursou engenharia eletrônica e administração de empresas, mas sua imagem pública, no País, é a de um bem-sucedido gestor de crises. Na mais famosa delas, a do apagão, em 2001-2002, ele chefiava a Casa Civil do governo FHC e presidiu um comitê de gestão de crise com amplos poderes. Conseguiu tirar o Brasil do buraco graças à forte colaboração da população, que reduziu o consumo de energia e ajudou a preservar a água nos reservatórios. “Foi bonito de ver a adesão da sociedade, sem necessidade dos cortes compulsórios”, recorda o executivo nesta conversa.

No Brasil de hoje, com o coronavírus fazendo vítimas, o chamado “ministro do apagão” põe o dedo no que considera o “X” da questão: “a falta de coordenação entre os organismos envolvidos” e “uma enorme diferença entre a visão da autoridade máxima e a dos outros responsáveis pelo setor”.

Pedro Parente dirigiu três ministérios durante o governo FHC e foi presidente da Petrobrás durante gestão Temer. Hoje, ele está na BRF.

É uma análise de peso de quem já esteve lá. Entre outras, Parente dirigiu três ministérios no governo FHC – Planejamento, Casa Civil e Minas e Energia. Depois, passou à área privada, onde atuou no grupo RBS, na Bunge e na TAM. No governo Temer, presidiu a Petrobrás. Mas voltou à iniciativa privada no comando de um dos maiores grupos mundiais no setor de alimentos, a BRF, onde hoje preside o conselho de administração. “O foco da empresa agora é crescimento”, avisa.

Como vê o futuro do País? “Sinto uma grande frustração quando vejo a enorme diferença entre o País que somos e o que poderíamos ser. Espero que a gente supere as diferenças para viver num Brasil plural e com uma agenda comum.” Aqui vão os melhores momentos da conversa:

O sr. comandou o combate à crise do apagão no governo FHC. Que acha da gestão da atual crise sanitária?

Nesta crise de agora, vejo uma questão marcante: a falta de coordenação entre todos os organismos envolvidos. No apagão, esses órgãos eram todos federais – o Operador Nacional do Sistema (ONS), a Anel, o BNDES, ministérios – e a cooperação foi assegurada. Nesta da covid-19, tem União, Estados e municípios, e não se pode dizer que a articulação tenha acontecido de modo a reduzir o impacto da crise.

Em suma, não houve coordenação.

Houve uma tentativa no início, com o ministro (Luiz Henrique) Mandetta, mas ela acabou não acontecendo. No apagão, a articulação foi feita por delegação direta do presidente ao chefe da Casa Civil, que naquele momento era eu.

Que horizontes o sr. vê no combate à pandemia? 

Uma característica desta crise é a falta de confiabilidade nas informações – o número de pessoas infectadas, as mortes, os que se curaram... – e isso prejudica a definição de políticas adequadas ao tamanho real do problema. A segunda é o desafio de se entender o que vai acontecer daqui para frente, como retomaremos a vida normal. Assim, me parece que virou uma típica situação da bala de prata: ou a vacina vem e dá certo, ou não sabemos o que vai acontecer. Pois, sem o acompanhamento dos casos e dos contatos feitos pelas pessoas infectadas, como vamos definir as ações?

Como era essa organização durante o apagão de 2001?

Naquela ocasião, o governo cometeu um erro de avaliação. Recebemos da área de energia a informação de que havia probabilidade de 5% de termos falta de energia. Imaginávamos que, caso necessário, um corte de 5% não seria uma coisa complicada. Não foi o que aconteceu. Dado o fato de que o nosso sistema dependia da natureza naquele momento, havia risco grande de coisas aleatórias afetarem. Aí, numa reunião na Câmara de Política Energética, os técnicos disseram que seria preciso um corte de energia em todas as cidades do Sudeste – no caso de São Paulo, por 4 ou 8 horas. Imagina o susto da equipe ao ouvir isso.

Assim de repente? Do zero para essa informação de 8 horas?

De repente, não. Mas governos têm o péssimo hábito de preferir escutar os otimistas, e não os realistas. Aí, quando a situação mostrou-se de uma gravidade maior, Pedro Malan defendeu junto a FHC que o problema deveria ser coordenado pelo chefe da Casa Civil, que no momento era eu. Apresentei ao presidente proposta de criação de um comitê de crise que deveria ter total autonomia e recursos. Ele concordou, saiu a MP e o comitê funcionou muito bem.

Por que deu certo?

Porque tínhamos meta de redução da energia. Sugerimos a redução voluntária e houve enorme adesão. Dissemos que cada residência tinha de economizar 20% da média do gasto de um ano antes. E foi bonito de ver a colaboração de todos e a preservação dos reservatórios de água. Sem necessidade de cortes compulsórios.

No caso da pandemia, hoje, como vê seu impacto na economia?

Vejo dois. O primeiro é, sem articulação, o tempo bem maior para que o País volte à normalidade. A crise poderia estar sendo menos longa e com custo menor em termos de saúde, vidas, empregos, fechamento de empresas. O segundo impacto é que, com uma boa coordenação, você teria informações mais eficientes, uma previsibilidade maior. Hoje, vivemos num grau de incerteza muito grande.

E como está, nesse cenário todo, a BRF? No começo, sei que houve temor no setor de distribuição de alimentos, com um município querendo fechar tudo, outro querendo abrir... 

Quando bateu a gravidade do problema, houve muitos desencontros entre Poderes estaduais e municipais. Trabalhamos com viveiros de frangos e porcos onde tem de chegar alimento, ração. Os frangos não podem passar um dia a mais no viveiro. Felizmente, a empresa se preparou com antecedência, já em fevereiro. Criamos um comitê interdisciplinar, com a participação de um infectologista renomado da USP, o Esper Kallas. Fizemos também um acordo com grupo médico do Einstein. 

Como isso funcionou?

Às vezes, surgia um problema numa cidade onde tínhamos uma unidade de produção, e mandávamos um aviãozinho com os médicos para orientar os prefeitos. Doávamos leitos hospitalares, equipamentos de UTI. Hoje, estamos numa situação quase normalizada. Digo “quase” porque ainda temos a questão de readequar o nível ótimo de estoques.

E o setor de exportação, voltou ao patamar anterior? 

Para nós, essa é uma área fundamental. Temos um fator positivo que é a diversificação de mercado, cada vez mais trabalhando com produtos de marca, de valor agregado, reduzindo o impacto dos preços de commodities como milho e soja. A diversificação permite que 50% das vendas sejam no exterior.

A China tem um peso nisso?

A demanda da China tem forçado uma elevação de preços no mercado internacional. E essa influência só não é maior porque ela é que autoriza planta por planta a ser construída. Recentemente, preocupados com o risco de transmissão do coronavírus pelos animais importados, os chineses determinaram, sem base científica, o fechamento de plantas em diversos países, inclusive uma das nossas. Mas tudo o que a gente pode vender para a China está vendendo.

Pode dar números? Com a pandemia, o consumo caiu muito?

Tivemos uma redução de produção, em algumas unidades, por ocorrência da covid-19 em funcionários. Houve uma queda de produção que, no global, pode ter chegado a 10% ou 15%. 

Como presidente do conselho da BRF, se fosse listar hoje as três maiores preocupações do grupo, quais seriam?

Observo que, em primeiro lugar, estamos num setor estratégico. Um setor que continuará com demanda crescente por muitos anos se levarmos em conta, em especial na Índia e na China, o fenômeno da urbanização. Isso leva a uma sofisticação do consumo: as famílias deixam de consumir proteína vegetal e passam à proteína animal. Então, a empresa, sob o ponto de vista da equação financeira, está numa situação muito melhor do que há dois anos. A questão agora é crescimento.

Hoje fala-se muito em ESG, a política ambiental, social e de governança, que já é uma prática quase recorrente de empresas. Ou não?

Essa é uma demanda crescente, que veio para ficar. Houve, creio que no ano passado, um importante manifesto de um conjuntos de CEOs que integram o ranking da Forty and Five Hundred, dizendo que hoje a empresa não tem mais de satisfazer o acionista. Ela tem de atender às comunidades, aos empregados, a sua cadeia de fornecedores e clientes.

Você, como cidadão, o que espera do País daqui para frente?

Eu sinto uma grande frustração quando vejo a enorme diferença entre o País que somos e o que poderíamos ser. Com os recursos que temos, os nossos empreendedores, os jovens com novas mentalidades. Espero que a gente supere as diferenças, para voltarmos a ser um País diverso, plural, onde se respeitem as diferenças e se crie uma agenda comum. Tem muita coisa que se poderia fazer, aqui, sem depender dos outros.

*QUEM É: PEDRO PARENTE, PRESIDENTE DO CONSELHO DA BRF. ELE É ENGENHEIRO E ADMINISTRADOR, FOI MINISTRO DO PLANEJAMENTO, DA CASA CIVIL E DE MINAS E ENERGIA DO GOVERNO FHC. PRESIDIU A PETROBRÁS NO GOVERNO TEMER E FOI VICE-PRESIDENTE DA RBS.

Entrevista concedida a Sonia Racy,  de O Estado de S.Paulo. Publicada originalmente em 23 de setembro de 2020 | 05h00

Mendacidade na ONU

Jair Bolsonaro usou os holofotes da Assembleia-Geral da ONU para reiterar suas irresponsáveis imposturas acerca de graves temas

Como se estivesse em uma de suas corriqueiras “lives” nas redes sociais, nas quais fala o que lhe dá na telha e dá livre curso às mais delirantes teorias conspirativas, o presidente Jair Bolsonaro usou os holofotes da abertura da Assembleia-Geral da ONU para reiterar suas irresponsáveis imposturas acerca de graves temas.

A vergonha só não foi maior porque depois de Bolsonaro quem discursou foi seu guia, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que estava mais afiado do que nunca – entre outras barbaridades, ele defendeu que a ONU responsabilize a China pela pandemia.

Como sempre colocando seus estreitos objetivos eleitoreiros acima dos interesses do País, Bolsonaro começou seu discurso reiterando pela enésima vez a farsa segundo a qual, “por decisão judicial”, todas as medidas de isolamento para combater a pandemia de covid-19 “foram delegadas a cada um dos 27 governadores das unidades da Federação”. Todos sabem, contudo, que não houve nenhuma decisão judicial com esse teor.

Há tempos o Supremo Tribunal Federal (STF) esclareceu que, conforme o princípio federativo expresso na Constituição, o governo federal não podia anular unilateralmente decisões de governos estaduais e municipais para combater a pandemia, como pretendia Bolsonaro, mas isso não o eximiu de cumprir as responsabilidades próprias da União.

Sem nenhum compromisso com os fatos, contudo, o presidente Bolsonaro reafirmou a patranha segundo a qual seu governo foi dispensado judicialmente de responsabilidade sobre a múltipla tragédia. Acrescentou, como se isso não bastasse, que grande parte da crise foi causada pela imprensa, que “politizou o vírus, disseminando o pânico entre a população”. “Sob o lema ‘fique em casa’ e ‘a economia a gente vê depois’, quase trouxeram o caos ao país”, acrescentou o presidente, repetindo para uma audiência internacional o discurso falaz que costuma fazer em seus rompantes mitingueiros.

E tudo isso resume apenas os cinco primeiros parágrafos do pronunciamento, obviamente destinado não a mudar a imagem do Brasil, visto hoje como pária em muitos círculos internacionais, mas sim a reafirmar aos bolsonaristas fanáticos a disposição do presidente de continuar a ser o Bolsonaro de sempre.

Assim, Bolsonaro pintou na ONU o quadro de um Brasil glorioso, que “alimenta o mundo” e que avança a despeito dos muitos inimigos – nunca nomeados e desde sempre interessados apenas em obstar o sucesso do País. O Brasil, disse Bolsonaro, “desponta como o maior produtor mundial de alimentos” e, por isso, segundo seu raciocínio, “há tanto interesse em propagar desinformações sobre nosso meio ambiente”.

“Somos vítimas de uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal”, disse Bolsonaro, negando o que todos são capazes de ver, isto é, o aumento substancial da destruição daqueles biomas sob seu governo – que sustenta um discurso irresponsável de desenvolvimento baseado no relaxamento da legislação ambiental.

“A Amazônia brasileira é sabidamente riquíssima. Isso explica o apoio de instituições internacionais a essa campanha escorada em interesses escusos que se unem a associações brasileiras, aproveitadoras e impatrióticas, com o objetivo de prejudicar o governo e o próprio Brasil”, declarou Bolsonaro. Na mesma linha da conspiração, em audiência no STF acerca da questão ambiental, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, havia dito que “não podemos admitir e incentivar que nações, entidades e personalidades estrangeiras, sem passado que lhes dê autoridade moral para nos criticar, tenham sucesso em seu objetivo, obviamente oculto, mas evidente, que é prejudicar o Brasil e derrubar o governo Bolsonaro”.

Assim, os próceres do governo Bolsonaro não se envergonham de levar às mais altas tribunas as teses mais doidivanas acerca de temas de enorme relevância para o Brasil e o mundo, apostando na confusão. Debalde: como mostra a crescente fuga de investidores estrangeiros, cada vez menos gente cai nessa conversa, que só prejudica a nação brasileira.

Editorial - Notas & Informações, O Estado de S.Paulo / 23 de setembro de 2020 | 03h00

Aos 20 anos, Carlos Bolsonaro comprou imóvel de R$ 150 mil com dinheiro vivo

Filho do presidente pagou valor em espécie por apartamento em 2003; montante corrigido é de R$ 366 mil

 O vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos) tinha apenas 20 anos, em 2003, quando se dirigiu a um cartório no centro do Rio e pagou R$ 150 mil em dinheiro por um imóvel. O montante corresponde hoje a R$ 366 mil, em valores corrigidos pelo IPCA. Investigado por supostamente se apropriar dos salários de funcionários “fantasmas” na Câmara Municipal, Carlos vai disputar o sexto mandato este ano. 

Vereador no Rio, Carlos Bolsonaro, adquiriu apartamento na Tijuca em dinheiro vivo; ele não respondeu aos questionamentos da reportagem Foto: Wilton Junior / Estadão

O apartamento pago em “moeda corrente do País, contada e achada certa”, como diz a escritura que oficializou o negócio, fica na Rua Itacuruçá, na Tijuca, e ainda pertence ao parlamentar. Na eleição de 2016, ele declarou que o imóvel valia R$ 205 mil. O documento de compra e venda foi obtido pelo Estadão no cartório em que o negócio foi fechado. Foi a primeira aquisição imobiliária de Carlos, lançado à política pelo pai, o hoje presidente Jair Bolsonaro, em 2000, antes de fazer 18 anos.

Procurado, o vereador não respondeu à reportagem.

Apartamento comprado por Carlos Bolsonaro fica na Rua Itacuruçá, na Tijuca. Foto: Google Street View/ Reprodução

Uma advogada ouvida pelo Estadão sob condição de anonimato disse que a expressão “moeda corrente, contada e achada certa” na escritura não deixa dúvidas de que o pagamento foi feito em espécie. Essa prática não é crime, mas costuma ser apontada como indício de suposta lavagem de recursos, já que não deixa rastro no sistema financeiro se o dinheiro não passar por um banco. Segundo a especialista, a aquisição do imóvel por essa forma de pagamento só desperta estranheza se a origem dos recursos não estiver evidente. A reportagem não conseguiu contato com o casal que vendeu o apartamento. 

Carlos Bolsonaro é investigado por suspeita de nomear no seu gabinete funcionários que lhe repassariam, totalmente ou em parte, seus salários. Ao todo, 11 servidores estão sob investigação do Ministério Público. A maioria é ligada a Ana Cristina Siqueira Valle, que não é mãe de Carlos, mas foi casada com o pai do vereador.

Irmão de Carlos, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) também é investigado pelo Ministério Público do Rio por suposta prática de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no processo das “rachadinhas” (apropriação dos salários dos assessores) quando era deputado estadual. Neste processo, em que constam nomes coincidentes com a apuração que mira Carlos, investigadores se debruçam sobre pagamentos em dinheiro vivo feitos pelo parlamentar. 

O MP aponta indícios de que o senador fez pagamento “por fora”, em dinheiro, na aquisição de dois apartamentos em Copacabana, na zona sul. Nas escrituras, o valor declarado oficialmente era R$ 310 mil, mas no mesmo dia em que o negócio foi fechado, em novembro de 2012, o vendedor depositou em espécie, na própria conta, R$ 638 mil – e ele não havia feito nenhuma outra venda naquele semestre. 

O MP suspeita de lavagem dos recursos oriundos de esquema de “rachadinha”. Flávio nega ter cometido irregularidades e diz ser alvo de perseguição política, cujo objetivo seria atingir o governo Bolsonaro. 

Documento Carlos Bolsonaro / Pelo apartamento, o vereador do Rio pagou R$ 150 mil em dinheiro vivo. Foto: Reprodução

Bens

A apuração sobre o vereador Carlos Bolsonaro ainda está no início. O imóvel na Tijuca é um dos três que compunham a declaração de bens apresentada por ele em 2016 à Justiça Eleitoral – a deste ano ainda não está disponível. Os outros são em Copacabana e no Centro, que valeriam, há quatro anos, R$ 85 mil e R$ 180 mil, respectivamente.

O imóvel de Copacabana, comprado em 2009 por R$ 70 mil, foi pago por transferência eletrônica, segundo a escritura. O pagamento do imóvel do Centro foi dividido entre um sinal de R$ 40 mil em formato não especificado, R$ 120 mil por meio de transferência no fechamento do negócio e R$ 20 mil em uma nota promissória.

Antes de adquirir seu primeiro apartamento, Carlos morava com a mãe, Rogéria Nantes Bolsonaro, em um imóvel em Vila Isabel, na zona norte do Rio. Rogéria, que tentará voltar à Câmara Municipal em novembro, depois de 20 anos fora da política, também comprou o imóvel pagando em dinheiro em espécie. O preço em 1996 foi de R$ 95 mil, revelou o jornal O Globo. O Estadão confirmou a informação em cópia da escritura.

Ana Cristina Valle teve participação ainda mais ativa no mercado imobiliário enquanto foi casada com Bolsonaro, entre 1997 e 2008. Ela adquiriu 14 imóveis no período; cinco pagos em dinheiro vivo, segundo reportagem da revista Época publicada em julho. Em valores corrigidos, os pagamentos em espécie somam R$ 680 mil. Ela não foi localizada pela reportagem. 

Caio Sartori e Wilson Tosta, O Estado de S.Paulo - 23 de setembro de 2020 | 05h00

O adeus à empregada?

A pandemia forçou muitas famílias a se virar sem empregada e talvez faça o trabalho das domésticas ser mais valorizado. Quando a patroa limpa a casa, sente o peso do trabalho que sempre terceirizou.

Empregadas domésticas - as mensalistas vão se transformando cada vez mais em diaristas

Caros brasileiros,

Nunca imaginei ver um lado bom no coronavírus. Ele teve o poder de abalar uma instituição da sociedade brasileira que parecia insubstituível e inquestionável: a empregada doméstica.O vírus está forçando muitas famílias brasileiras a se virarem sem empregada há um bom tempo. De repente, a patroa e, às vezes, também o patrão começaram a aprender a cozinhar, lavar roupa, passar aspirador de pó, passar pano no chão e tomar conta das crianças.

 

            A empregada doméstica Nilza de Jesus, que ensinou a patroa a cozinhar pelo telefone

Uma amiga minha virou cozinheira. Com as dicas da empregada pelo telefone, começou a fazer pratos refinados, como lasanha de berinjela e suflê de legumes. E gostou. A empregada, que desde março está em casa recebendo salário, se impressionou com a chefe: "Em duas semanas, ela aprendeu tudo."

O coronavírus mudou as regras de casa. Cozinhar virou coisa de chefe. Programas de culinária na televisão, receitas no Instagram e dicas compartilhadas em grupos de Whatsapp fizeram milhares de pessoas no home office aprenderem a cozinhar.

Além disso, os sites de gastronomia viram um aumento gigantesco no tráfego desde o início da pandemia. O portal de receitas do UOL teve um crescimento de 230% na audiência em junho em relação a março. Já o canal do programa MasterChef no YouTube ganhou 129 mil novas inscrições durante o período de quarentena.

Quem não gosta de cozinhar talvez tenha se inspirado com os programas e pedido um prato especial num dos serviços de entrega de comida que tanto cresceram na pandemia. Para muitos restaurantes, esses eram os únicos meios de manter seu negócio vivo.

As empregadas que ficaram em casa também tinham que inventar uma maneira de ganhar dinheiro, pois muitos patrões, segundo a Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, não continuaram pagando o salário.

"Muitas mulheres tentaram fazer alguma coisa nova", disse Maria Noeli dos Santos, do Sindicato das Trabalhadoras Domésticas do município do Rio. "Algumas fizeram comida em casa e venderam para fora, outras ofereceram serviço de manicure. Se der certo, vão continuar."

Será que o coronavírus conseguiu, então, o que a PEC das Domésticas pretendia alcançar e ainda não conseguiu? A meu ver, a pandemia deu no mínimo um empurrão, ao fazer com que um trabalho essencial, sempre negligenciado e discriminado, fosse mais valorizado. Pois se a patroa limpa a casa, vai sentir o peso do trabalho que ela sempre terceirizou. Se o patrão cozinha, ele provavelmente vai declarar a nova atividade como "arte culinária".

No entanto, essa minha esperança em relação a uma valorização do trabalho doméstico infelizmente se depara com um cenário nada favorável: metade das 8 milhões de empregadas domésticas brasileiras trabalha sem contrato e ficou quase totalmente desamparada durante a crise do coronavírus.

No novo livro Coronavírus: O trabalho sob o fogo cruzado, o sociólogo Ricardo Antunes, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas na Unicamp, descreve a realidade cruel de uma crescente precarização. Segundo Antunes, as desigualdades já existentes no período pré-pandêmico adquiriram "um toque de crueldade": "A classe-que-vive-do-trabalho se vê na encruzilhada: morrer por covid-19 ou morrer de fome", escreve.

É verdade: muitas empregadas domésticas continuam trabalhando, arriscando a própria vida. Precisam do dinheiro, e a patroa não quer abrir mão do serviço, mesmo com o risco de uma infeção pelo coronavírus.

Mas a crueldade do coronavírus deve sacudir a sociedade brasileira. Depois que a crise passar, provavelmente cada vez menos mulheres vão voltar a trabalhar como empregadas, seja porque acharam uma alternativa, seja porque o empregador não chamou mais.

As mensalistas vão se transformando cada vez mais em diaristas, uma transformação que já vinha acontecendo há muitos anos. A pandemia deve contribuir ainda mais para essa mudança de perfil da categoria. Não adianta reclamar: a empregada não deve mais fazer parte da "tradicional família brasileira".

A autora deste artigo, Astrid Prange de Oliveira foi para o Rio de Janeiro solteira. De lá, escreveu por oito anos para o diário taz de Berlim e outros jornais e rádios. Voltou à Alemanha com uma família carioca e, por isso, considera o Rio sua segunda casa. Hoje ela escreve sobre o Brasil e a América Latina para a Deutsche Welle. Siga a jornalista no Twitter @aposylt e no astridprange.de.

Publicado originalmente por Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas. 

Bolsonaro gosta de ser um negacionista

Na Assembleia Geral da ONU, o presidente disse que o Brasil é vítima de uma campanha de desinformação sobre a Amazônia. Mas as imagens dos incêndios falam por si. Assim como os números da covid-19, opina Thomas Milz.

"Não se deve esperar nada de construtivo de Bolsonaro", escreve Thomas Milz

É tradição na ONU: o Brasil é sempre o primeiro país a discursar na abertura da Assembleia Geral. A novidade este ano foi o discurso ser gravado em vídeo, devido à pandemia de coronavírus. Com mais de 137 mil mortes pela covid-19 confirmadas, o Brasil é atualmente o segundo país com mais vítimas da doença, atrás apenas dos Estados Unidos. Logo no início de seu discurso, Bolsonaro se colocou na defensiva. Afinal, como explicar o desastre nacional para um mundo que conhece a sua terrível comparação do coronavírus com uma "gripezinha"?

Segundo o presidente, a culpa não cabe a ele. Pelo contrário. Ele teria sido vítima do Judiciário brasileiro, que o deixou de mãos atadas na luta contra a pandemia e cedeu poderes aos governadores. Quem observa a situação mais de perto sabe que Bolsonaro se recusou a lutar contra a pandemia, que descreveu como "histeria". E pior ainda: ele se baseou na cloroquina, medicamento antimalárico comprovadamente ineficaz contra a covid-19, e colocou o Ministério da Saúde sob o comando de um general que havia organizado a logística dos Jogos Olímpicos do Rio.

Mas a negação de qualquer culpa ou responsabilidade faz parte da mentalidade populista de Bolsonaro. Assim como inflar a própria atuação sempre que algo está indo bem. De acordo com Bolsonaro, o auxílio emergencial pago a mais de 65 milhões de brasileiros para enfrentar a crise gerada pela pandemia protegeu a economia de um desastre ainda maior. Isso é verdade. No entanto, ele não disse ao público internacional que foi o Congresso quem pressionou o governo a liberar o auxílio. E ele simplesmente mentiu quando disse que as parcelas do auxílio somam 1.000 dólares por pessoa.

O negacionismo de Bolsonaro se torna ainda mais óbvio em relação à destruição ambiental em curso na Amazônia. As nuvens de fumaça podem ser percebidas até em grandes cidades do extremo sul do Brasil, e a sua gigante propagação também pode ser vista em imagens de satélite da Nasa. E o fato de que o governo Bolsonaro está impedindo as autoridades ambientais de proteger as florestas é evidenciado pelos cortes drásticos nos orçamentos ambientais. Até membros de seu próprio governo admitem abertamente a paralisia das autoridades de fiscalização ambiental.

Ainda assim, Bolsonaro também repetiu diante da plateia virtual da Assembleia Geral da ONU seu mantra de que ninguém protege mais a natureza do que o Brasil e que apenas a comunidade mundial malévola se recusa a reconhecer isso. "Somos vítimas de uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal", disse Bolsonaro. Instituições internacionais estariam envolvidas em maquinações sombrias para prejudicar o seu governo e o Brasil, com a participação de associações brasileiras "aproveitadoras e impatrióticas".

Com isso, o presidente se dirige não apenas a organizações como o Greenpeace e o WWF e a ativistas como o ator Leonardo DiCaprio, mas também contra a própria ONU. A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP 25, deveria ter sido realizada no Brasil em 2019. Mas Bolsonaro se opôs. Reiteradamente, ele acusou a ONU de querer tirar a Amazônia do Brasil com a ajuda do acordo climático de Paris.

Mas é claro que Bolsonaro não se interessa pela imagem do Brasil no mundo. Em tempos de redes globais de informação e graças à cobertura vigilante da mídia, o mundo hoje sabe muito bem o que está acontecendo nas florestas brasileiras. Nesse ponto, Bolsonaro não tem nada a ganhar. O discurso dele se dirige à própria população, a quem tem que responder sobre as mortes provocadas pelo coronavírus, a crise econômica devido à pandemia e a destruição do meio ambiente. E a quem ele – ao contrário da opinião pública bem informada no exterior – ainda pode imputar sua distorção dos fatos.

Atribuir a culpa a poderes obscuros estrangeiros agrada a muitos brasileiros. As ameaças das fileiras da União Europeia de não ratificar o acordo comercial com o Mercosul vêm a calhar para que Bolsonaro se mostre vítima de intrigas internacionais. 

Dois problemas movem o mundo atualmente: a pandemia da covid-19 e as mudanças climáticas. Ambas as crises têm dimensões globais e só podem ser resolvidas em nível global. Um estadista inteligente, portanto, usaria instituições globais como a ONU para encontrar soluções. Antes de mais nada, para interesse do seu próprio país. Mas Bolsonaro não pensa em soluções. Como populista profissional, ele aceita as crises com gratidão, para poder colocar a culpa em inimigos imaginários. Não se deve esperar nada de construtivo dele.

O alemão Thomas Milz trabalha há 15 anos no Brasil como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. O texto acima reflete a opinião pessoal do autor, e não necessariamente da DW.

Publicado originalmente por Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas. 

terça-feira, 22 de setembro de 2020

Veja o que é #FATO ou #FAKE no discurso de Bolsonaro na ONU

Em vídeo gravado, em razão da pandemia, presidente diz que Brasil é vítima de uma campanha brutal de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal.

O presidente Jair Bolsonaro fez um discurso nesta terça-feira (22) na 75ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU). A fala foi apresentada por meio de um vídeo gravado. Por causa da pandemia de Covid-19, a reunião da ONU neste ano, baseada na sede da entidade em Nova York, teve de ser virtual.

Bolsonaro disse que o Brasil é "vítima" de uma campanha "brutal" de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal. Segundo ele, a floresta amazônica é úmida e só pega fogo nas bordas e os responsáveis pelas queimadas são “índios” e “caboclos”. Disse também que as orientações para as pessoas ficarem em casa na pandemia “quase” levaram o país ao “caos social”.

A equipe do Fato ou Fake checou as principais declarações de Bolsonaro. Leia:

“Por decisão judicial, todas as medidas de isolamento e restrições de liberdade foram delegadas a cada um dos 27 governadores das unidades da federação. Ao presidente, coube o envio de recursos e meios a todo o país”

#NÃOÉBEMASSIM. Veja o porquê: Em abril, o STF decidiu que os governos estaduais e municipais têm poder para determinar regras de isolamento e quarentena em razão da pandemia. A decisão da Corte reconheceu a autonomia das cidades e dos estados de tomar decisões na pandemia, mas não eximiu o governo federal de responsabilidade sobre a crise de saúde.

“Não eximiu, pelo contrário, reforçou a competência dos Executivos”, afirmou o ministro Luiz Fux em uma live transmitida pelo jornal “O Globo” em junho. “O Supremo não exonerou o Executivo federal das suas incumbências porque a Constituição Federal prevê que, nos casos de calamidade, as normas federais gerais devem existir. Entretanto, como a saúde é direito de todos e dever do estado, num sentido genérico, o estado federativo brasileiro escolheu o estado federado em que os estados têm autonomia política, jurídica e financeira”, disse Fux.

O governo federal, inclusive, tomou medidas sobre a pandemia nos últimos meses. Em julho, por exemplo, Bolsonaro sancionou uma lei que obriga o uso de máscaras em locais públicos de todo o país.

“Concedeu auxílio emergencial em parcelas que somam aproximadamente US$ 1.000 para 65 milhões de pessoas”

#NÃOÉBEMASSIM. Veja o porquê: No anúncio do programa, o governo definiu que o auxílio ia ser pago em três parcelas. Depois, estendeu para mais duas parcelas, todas de R$ 600. O último anúncio, em setembro, incluiu mais quatro parcelas, no valor de R$ 300 cada uma. Com isso, cada trabalhador aprovado no programa pode receber, ao final dos pagamentos, R$ 4,2 mil.

Na cotação mais atualizada do dólar, de 22 de setembro, o valor corresponde a aproximadamente US$ 766, e não US$ 1 mil. O auxílio recebido só é maior no caso de mães que são chefes de família, que recebem dobrado.

De acordo com o governo, as primeiras parcelas do auxílio atingiram, de fato, mais de 65 milhões de pessoas. O texto da prorrogação do benefício de setembro, porém, restringe quem pode receber as novas parcelas. Ele proíbe que alguns dependentes recebam o benefício. Detentos em regime fechado e residentes no exterior – que chegaram a receber parcelas de R$ 600 antes de serem excluídos do programa – também não terão direito.

Por isso, para os pagamentos das parcelas de R$ 300, está prevista a reavaliação dos beneficiários aprovados – tanto para o início dos pagamentos quanto no decorrer dos mesmos.

Ou seja, o número de beneficiários que irão receber as parcelas de R$ 300 será menor que o de beneficiários que receberam as parcelas de R$ 600.

“Mesmo sendo uma das 10 maiores economias do mundo, somos responsáveis por apenas 3% da emissão de carbono”

A declaração é #FATO. Veja o porquê: O país é o sétimo maior emissor do mundo, sexto se desconsiderar a União Europeia. É fato, porém, que é responsável por 3,4% das emissões globais. Os dados estão no Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), com base no CAIT, que é um cômputo de emissões do World Resources Institute.

“Mas 3% é muita coisa, ainda mais considerando que 44% das emissões vêm de desmatamento, que não gera riqueza. 3% é mais do que quase todos os países desenvolvidos emitem. É mais do que todos os países europeus emitem individualmente, mais do que o Japão emite individualmente, mais do que a Austrália emite individualmente”, afirma o Observatório do Clima.

“No tocante às mudanças climáticas, o Brasil não é o maior vilão, mas também não é o mocinho. Ao considerar também as emissões de desmatamento (normalmente fora dos rankings globais), o Brasil é o 4º país que mais contribui para o aquecimento global. Só perde para EUA, China e Rússia”, afirma o professor Raoni Rajão, do Departamento de Engenharia de Produção da UFMG e coordenador do Laboratório de Gestão de Serviços Ambientais.

"Nossa floresta é úmida e não permite a propagação do fogo em seu interior. Os incêndios acontecem praticamente nos mesmos lugares, no entorno leste da floresta, onde o caboclo e o índio queimam seus roçados em busca de sua sobrevivência, em áreas já desmatadas"

A declaração é #FAKE. Veja o porquê: A floresta permanece úmida em algumas regiões, mas o avanço do desmatamento e a abertura de estradas levaram à perda de parte de suas características originais, e, assim, a Amazônia se tornou mais suscetível a grandes incêndios, explica o ambientalista Antonio Oviedo, assessor do Instituto Sócio-Ambiental (ISA), ONG presente na Amazônia há 25 anos.

“Afirmar que a floresta é úmida como um todo era algo verdadeiro há 60 ou 70 anos; hoje, com 20% desmatado, isso não é mais um fato. Ela é úmida em áreas como no interior do Rio Solimões ou no alto do Rio Negro, onde não tem muitas estradas, mas mesmo lá o fogo já tem entrado, por conta do desmatamento. Quando se fragmenta a floresta em blocos, vem o efeito de borda. Quanto mais bordas tiver, mais seca fica, e facilita a entrada do fogo”, afirma Oviedo.

Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), ONG que desde 1995 trabalha pelo desenvolvimento sustentável na região, reforça que “o desmatamento, a exploração da madeira e outras atividades humanas mudam a condição da floresta úmida como barreira ao fogo”, e que “a floresta não queima sempre no mesmo lugar”, ao contrário do dito pelo presidente Bolsonaro, mas, sim, onde o incêndio é provocado.

Porta-voz do Greenpeace, Rômulo Batista, há 15 anos na Amazônia, lembra que não se pode mais falar da região como uma floresta primária. “A Amazônia sofre com desmatamento, extração de madeira, clareiras, e isso faz com que mais sol entre no interior da floresta e seque a matéria orgânica, o que favorece quando há incêndio. Ela queima mesmo úmida. De 1º de setembro até hoje, 44% dos focos foram em áreas de floresta já degradadas”, esclarece.

Sobre os focos na área do “entorno leste” da floresta, citada por Bolsonaro, esta não é a região onde se concentra o maior número de incêndios florestais, de acordo com dados de 2019 do IPAM. Nenhum dos dez municípios líderes em focos localiza-se no extremo leste amazônico, nos estados do Maranhão e do Tocantins – as cidades ficam no Amazonas, Pará, Roraima, Rondônia e Mato Grosso. As regiões da BR-319 (Porto Velho-Manaus), BR-163 (trecho Cuiabá-Santarém) e BR-364 (trecho Porto Velho-Rio Branco) são especialmente críticas.

“O arco do desmatamento vem de Rondônia, no oeste da Amazônia, na região completamente oposta (à da fala de Bolsonaro), passa pelo sul do Amazonas e o norte do Mato Grosso, e sobe pelo leste do Pará”, afirma o porta-voz do Greenpeace.

A respeito da autoria dos incêndios, dados de satélite monitorados pela Nasa mostram que, neste ano, 54% dos focos na Amazônia tiveram como origem o desmatamento. Um novo sistema da agência espacial dos Estados Unidos capaz de apontar em tempo real a localização de queimadas e as razões pelas quais surgem, revelou, em agosto, que as pequenas queimadas para limpeza de pastagem foram responsáveis por 12,81% das ocorrências; já o desmatamento, por 54,34%.

Ainda sobre a relação entre os indígenas e as queimadas, o Observatório do Clima ressalta que uma nota técnica do IPAM também mostrou que apenas 7% das queimadas no ano passado ocorreram em terras indígenas, que correspondem a 25% da região. “Vamos desmistificar essa ideia que os indígenas queimam a Amazônia; 42% do desmatamento amazônico ocorre em terras públicas não destinadas ou sem informação cadastral. Ou seja, são áreas que estão sendo ocupadas por atividades como grilagem, particulares que querem se apossar de terras públicas”, aponta Ane Alencar, do IPAM.

“Não tem a mínima condição de imaginar que uma comunidade indígena é responsável por um incêndio de 200 km². Indígenas, caboclos e ribeirinhos fazem um roçado numa área de 20 x 20 metros, um fogo que não se alastra”, diz Antonio Oviedo, do ISA. “Sobrevoei áreas desmatadas, e depois queimadas, de 4 mil, 5 mil hectares. É inconcebível um pequeno agricultor, um ribeirinho ou uma família indígena fazer isso”, atesta o porta-voz do Greenpeace.

O Observatório do Clima, citando os dados da Nasa, também classifica as afirmações do presidente acerca da origem das queimadas como “mentira”. “As queimadas ocorrem por desmatamento, práticas agrícolas e incêndios que escapam para florestas.”

O ambientalista Raoni Rajão, professor da Universidade Federal de Minas Gerais, também afirma ser incorreto atribuir o fogo na Amazônia à agricultura de subsistência de “índios e caboclos”. “Grande parte das queimadas ocorre em áreas de desmatamento recente (e não em áreas agrícolas consolidadas), e é utilizada para acabar de ‘limpar’ as áreas para formação de pastagens principalmente”, diz Rajão.

O professor cita um estudo da UFMG em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) que mostrou que 52% das queimadas de 2019 ocorreram em imóveis médios e grandes. “[Nestes imóveis] também ocorreram 67% do desmatamento de agosto de 2019 até julho de 2020.”

“As grandes queimadas [no Pantanal] são consequências inevitáveis da alta temperatura local, somada ao acúmulo de massa orgânica em decomposição”

A declaração é #FAKE. Veja o porquê: Embora a alta temperatura e a baixa umidade relativa do ar agravem as queimadas e dificultem o combate às chamas no Pantanal, não é verdade que incêndios devastadores como os deste ano sejam inevitáveis ou provocados por fatores naturais. De acordo com Alexandre Martins Pereira, analista ambiental do Prevfogo-Ibama, a única causa natural para os incêndios florestais são as descargas elétricas atmosféricas - ou seja, os raios. Imagens de satélites da Nasa comprovam que o primeiro foco do incêndio que atingiu o Pantanal teve início em uma fazenda no dia 30 de junho, quando não houve ocorrência de raios na região.

Cruzando informações obtidas por essas imagens com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o inquérito da Polícia Federal concluiu que o fogo no Pantanal começou em quatro fazendas vizinhas. Isso reforça a tese de que o incêndio foi criminoso e provocado propositalmente pela ação humana, a partir do uso indevido do fogo para limpar áreas utilizadas para pastagem. As chamas se alastraram, destruindo 3 milhões de hectares do bioma, atingindo áreas de preservação, sua vegetação nativa e matando animais silvestres. Essa é a principal linha de investigação da PF.

Além disso, o monitoramento do Inpe também aponta que o número de focos de incêndios no Pantanal até o dia 21 de setembro deste ano é o maior da série histórica, iniciada em 1998. No período, foram registrados 16.119 focos de queimadas no bioma. O recorde anterior era de 12.536 focos em 2005.

A redução na fiscalização é parte relevante da política ambiental do governo Bolsonaro. Ex-funcionários dos órgãos de preservação relatam forte pressão do presidente e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ao cumprirem as atividades de vigilância. Em 2019, o ex-diretor do Inpe, Ricardo Galvão, foi demitido, mesmo com mandato vigente, após o governo questionar os dados do Inpe sobre a alta do desmatamento na Amazônia. O órgão voltou a ser atacado ao divulgar os dados das queimadas do Pantanal – desta vez, pelo vice-presidente Hamilton Mourão. Na reunião ministerial de 22 de abril, o ministro Ricardo Salles sugeriu que o governo aproveitasse que a cobertura da imprensa estava focada na pandemia para “passar a boiada” e afrouxar regulamentações ambientais.

“O Brasil já participou de mais de 50 operações de paz e missões similares, tendo contribuído com mais de 55 mil militares, policiais e civis, com participação marcante em Suez, Angola, Timor Leste, Haiti, Líbano e Congo”

A declaração é #FATO. Veja o porquê: Segundo o Ministério das Relações Exteriores, os dados são verdadeiros e constam da página oficial do Itamaraty. De acordo com informações do primeiro semestre deste ano, atualmente, o Brasil participa com 258 efetivos em nove missões das Nações Unidas nos seguintes locais: Líbano, Sudão do Sul, Saara Ocidental, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, Darfur, Chipre, Abyei e Iêmen.

“No primeiro semestre de 2020, apesar da pandemia, verificamos um aumento do ingresso de investimentos, em comparação com o mesmo período do ano passado. Isso comprova a confiança do mundo em nosso governo”

A declaração é #FAKE. Veja o porquê: Segundo dados do Banco Central, os investimentos diretos no país somam US$ 22,841 bilhões no primeiro semestre deste ano, uma queda de 26,6% na comparação com o mesmo período do ano passado (US$ 31,147 bilhões). É o menor valor, para esse período, desde 2009 (US$ 13,895 bilhões), ou seja, em 11 anos. Naquele momento, a economia mundial sentia o impacto da crise do "subprime", uma crise imobiliária que aconteceu nos Estados Unidos em 2008 e gerou impactos na economia mundial.

Por Clara Velasco, Laís Modelli, Roney Domingos, Alexandro Martello, Hellen Guimarães e Roberta Pennafort, G1, O Globo e CBN / 22/09/2020 18h24  Atualizado há 9 minutos.

Entidades condenam discurso de Bolsonaro na ONU

Para organizações ambientalistas como Greenpeace e Observatório do Clima, presidente "envergonhou" o Brasil mais uma vez com sua fala "delirante" e "irresponsável". Discurso não foi digno de um chefe de Estado, diz WWF.

Jair Bolsonaro aparece em telão na ONU / Nas Nações Unidas, Bolsonaro acusou índios de queimarem Amazônia e disse que a floresta não pega fogo porque é úmida

Organizações não governamentais que lutam pela defesa do meio ambiente condenaram nesta terça-feira (22/09) o discurso do presidente Jair Bolsonaro na Assembleia Geral das Nações Unidas, em que o líder brasileiro voltou a minimizar a crise ambiental que assola o país.

As entidades afirmaram que Bolsonaro "envergonhou" mais uma vez o Brasil perante a ONU, e tacharam o discurso – gravado previamente devido à pandemia de coronavírus – de "delirante", "constrangedor", "negacionista", "irresponsável" e "infundado".

"Em pouco mais de 14 minutos de uma fala calculadamente delirante, o presidente mais uma vez expôs o país de forma constrangedora e confirmou as preocupações dos investidores internacionais que pensam em sair do Brasil", escreveu em nota o Observatório do Clima.

"Ao negar simultaneamente a crise ambiental e a pandemia, o presidente dá a trilha sonora para o desinvestimento e o cancelamento de acordos comerciais no momento crítico de recuperação econômica pós-covid", completa o texto, que ainda acusa Bolsonaro de usar a tribuna das Nações Unidas para fazer campanha à reeleição, em vez de promover o país.

Para a rede composta por 50 organizações não governamentais e movimentos sociais, o discurso "não foi voltado à comunidade internacional, mas sim à claque bolsonarista em casa".

"Não teve o objetivo real de prestar esclarecimentos sobre a situação do Brasil a parceiros comerciais e consumidores preocupados, muito menos de propor uma visão de país, como era a tradição, mas de combater a realidade e inventar inimigos imaginários."

Citado na nota, o secretário-executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, afirmou que Bolsonaro ameaça a economia brasileira ao "negar a realidade e não apresentar nenhum plano para os problemas que enfrentamos". "O Brasil pagará durante muito tempo a conta dessa irresponsabilidade. Temos um presidente que sabota o próprio país."

Já o Greenpeace chamou atenção para as queimadas que devastam a Amazônia e o Pantanal e batem índices recordes sob o governo Bolsonaro. "O discurso [...] aconteceu enquanto o país arde em chamas e testemunha a destruição de seus biomas e suas riquezas naturais", alerta.

"A política antiambiental do atual governo está derretendo a imagem do Brasil lá fora e prejudicando a economia nacional", insiste a ONG. "O país que antes já foi visto como liderança na questão ambiental foi o que mais destruiu suas florestas no mundo todo, em 2019, segundo dados da Global Forest Watch. Em 2020 os dados mostram que a situação só se agravou."

Mariana Mota, coordenadora de políticas públicas do Greenpeace Brasil, afirmou que o drama ambiental vivido pelo Brasil é resultado da política do governo Bolsonaro, e negar ou minimizar essa realidade só "agrava a difícil situação que o país enfrenta".

"Lamentavelmente, já estamos habituados a ouvir o presidente faltar com a verdade, desqualificar a ciência e buscar culpabilizar terceiros em vez de assumir a responsabilidade constitucional que possui. Entretanto, quando o faz na Assembleia Geral da ONU, diante de centenas de líderes de países, de investidores e do mundo todo, o presidente piora ainda mais a imagem do Brasil e agrava as sérias crises que enfrentamos", disse Mota.

"Ao invés de negar a realidade, em meio à destruição recorde dos biomas brasileiros, o governo deveria cumprir seus deveres constitucionais em prol da proteção ambiental e apresentar um plano eficiente para enfrentar os incêndios que consomem o Brasil", completou.

Por sua vez, a entidade WWF-Brasil considerou que Bolsonaro proferiu "uma fala cheia de acusações infundadas e ilações sem base científica que não condiz com o papel de um chefe de Estado".

"Declarar que as queimadas são provocadas pelos 'índios e caboclos' [povos tradicionais descendentes de indígenas e brancos] é a maior delas", disse Gabriela Yamaguchi, diretora de sociedade engajada da organização.

"Como um roteiro de ficção, o discurso uniu palavras-chaves das Nações Unidas com descrições de um Brasil que não existiu em 2020, em completo negacionismo da realidade do país e desconsiderando a urgência e seriedade dos desafios globais que o secretário-geral da ONU, António Guterres, tão bem descreveu", acrescentou Yamaguchi.

A fala de Bolsonaro

Em seu discurso de abertura da 75ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas nesta terça-feira, o presidente afirmou que o Brasil é vítima de uma campanha de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal, e defendeu sua gestão da pandemia de covid-19.

Em relação ao meio ambiente, ele aproveitou a fala para se defender das críticas à sua política ambiental, proferidas por outros países e uma série de organizações em meio à alta do desmatamento e das queimadas na Amazônia e no Pantanal.

Bolsonaro afirmou que o agronegócio brasileiro segue "pujante" e que o Brasil tem e respeita "a melhor legislação ambiental do planeta".

"Mesmo assim, somos vítimas de uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal. A Amazônia brasileira é sabidamente riquíssima. Isso explica o apoio de instituições internacionais a essa campanha escorada em interesses escusos, que se unem a associações brasileiras, aproveitadoras e impatrióticas, com o objetivo de prejudicar o governo e o próprio Brasil", disse, sem nomear qualquer instituição.

O presidente ainda culpou os indígenas e caboclos por incêndios na Amazônia e, sem citar estudos científicos ou especialistas, questionou a ocorrência de queimadas de grande porte.

"Nossa floresta é úmida e não permite a propagação do fogo em seu interior. Os incêndios ocorrem sempre nos mesmos lugares, no entorno leste da floresta, onde o caboclo e o índio queimam o roçado para sua sobrevivência, em áreas já desmatadas."

Bolsonaro também afirmou que o Brasil é líder na conservação de florestas tropicais e tem "a matriz energética mais limpa e diversificada do mundo".

Em razão da pandemia de covid-19, a assembleia da ONU deste ano ocorre de maneira virtual. O Brasil, como é tradição, abriu as intervenções de líderes mundiais.

Publicado originalmente por Deutsch Welle, em 22.09.20

Na ONU, Bolsonaro diz ser vítima de campanha de desinformação

Presidente defende política ambiental do governo e afirma que Amazônia e Pantanal sofrem campanha de desinformação internacional. Ele também elogia sua gestão da epidemia de covid-19, que já matou 137 mil.    

Jair Bolsonaro discursa na ONU / Sobre a pandemia, Bolsonaro disse que implementou várias medidas econômicas que "evitaram o mal maior"

No discurso de abertura da 75ª sessão da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), o presidente Jair Bolsonaro disse nesta terça-feira (22/09) que o Brasil é vítima de uma campanha de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal e defendeu sua gestão da pandemia do novo coronavírus.

Ele também usou o discurso para atacar a imprensa, apelou ao combate à "cristofobia" e elogiou o presidente americano, Donald Trump, na mediação de conflitos no Oriente Médio. Em razão da pandemia de covid-19, a assembleia deste ano ocorre de forma virtual. O Brasil, como é tradicional, abriu as intervenções de líderes.

Bolsonaro começou o discurso afirmando que o "mundo necessita da verdade para superar seus desafios" e lamentou as mortes em decorrência da covid-19. Ele disse que "parcela da imprensa brasileira também politizou o vírus, disseminando o pânico entre a população". Para Bolsonaro, "sob o lema fique em casa e a economia a gente vê depois" a imprensa quase trouxe "o caos social ao país".

Ele acrescentou que o governo dele "de forma arrojada, implementou várias medidas econômicas que evitaram o mal maior". Bolsonaro afirmou que, desde o início da pandemia, o Brasil tinha "dois problemas a resolver, o vírus e o desemprego, e ambos deveriam ser tratados simultaneamente e com a mesma responsabilidade".

Ao longo do ano, Bolsonaro reiteradamente minimizou a gravidade da pandemia de covid-19, doença que chamou de gripezinha. Ele se mostrou contra as medidas de isolamento social e participou de eventos públicos nos quais abraçou e cumprimentou apoiadores. Dois ministros da Saúde deixaram o governo por causa de divergências com o presidente.

Bolsonaro, porém, destacou que "estimulou, ouvindo profissionais de saúde, o tratamento precoce da doença, destinou 400 milhões de dólares para pesquisa, desenvolvimento e produção da vacina de Oxford no Brasil" e frisou que "não faltaram, nos hospitais, os meios para atender os pacientes de covid-19".

As declarações do presidente contrariam dados do Ministério da Saúde e das secretarias estaduais da Saúde. O Brasil registrou 4,6 milhões de casos do novo coronavírus, com mais de 137 mil mortes confirmadas pelas autoridades brasileiras. O número de mortos é inferior apenas ao dos Estados Unidos.

Meio ambiente

O presidente também usou parte do seu discurso para se defender das críticas à sua política ambiental. O governo dele vem sendo criticado por outros países e por organizações não governamentais devido à alta do desmatamento e das queimadas na Amazônia e no Pantanal.

O desmatamento na Amazônia brasileira chegou a 1.359 km2 em agosto e foi o segundo maior registrado para o mês nos últimos cinco anos, segundo dados do Inpe. Entre agosto de 2019 e julho de 2020, 9.216 km2 foram desmatados na região, uma área quase duas vezes maior do que a do Distrito Federal. Esse foi o maior valor dos últimos cinco anos. Houve um aumento de 35% na destruição da floresta em relação ao registrado entre agosto de 2018 e julho de 2019, quando 6.844 km2 foram desmatados.

No Pantanal, mais de 16 mil focos de incêndios foram detectados pelos bombeiros de janeiro a setembro deste ano, mais do que o triplo do mesmo período do ano passado, também segundo dados do Inpe.

Bolsonaro afirmou que o agronegócio brasileiro segue "pujante" e que o Brasil tem e respeita "a melhor legislação ambiental do planeta". "Mesmo assim, somos vítimas de uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal. A Amazônia brasileira é sabidamente riquíssima. Isso explica o apoio de instituições internacionais a essa campanha escorada em interesses escusos, que se unem a associações brasileiras, aproveitadoras e impatrióticas, com o objetivo de prejudicar o governo e o próprio Brasil", afirmou, sem nomear qualquer instituição ou associação.

Bolsonaro culpou os indígenas e caboclos por incêndios na Amazônia e, sem citar estudos científicos ou especialistas, questionou que haja queimadas de grande porte. "Nossa floresta é úmida e não permite a propagação do fogo em seu interior. Os incêndios ocorrem sempre nos mesmos lugares, no entorno leste da floresta, onde o cabloco e o índio queimam o roçado para sua sobrevivência, em áreas já desmatadas." O presidente também afirmou que, em seu governo, "os focos criminosos são combatidos com rigor e determinação".

Bolsonaro afirmou que o Brasil é líder na conservação de florestas tropicais e tem "a matriz energética mais limpa e diversificada do mundo". Ele pontuou que o país preserva 66% da sua vegetação nativa e que, apesar de ser uma das dez maiores economias do mundo, é responsável por apenas 3% das emissões mundiais de carbono.

Publicado originalmente por Deutsche Welle, em 22.09.20

Brasil passa de 138 mil mortes por covid-19; mais 836 óbitos são registrados em 24h

O Brasil chegou a um total de 138.108 mortes e 4.591.604 casos oficialmente confirmados de covid-19, segundo o boletim do Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass) desta terça-feira (22/9).

Desse total, foram registrados nas últimas 24 horas 836 óbitos e 33.536 novos casos da doença.

O Estado com o maior número de óbitos é São Paulo (34.266), seguido pelo Rio de Janeiro (17.798) e Ceará (8.850).

O Brasil ultrapassou a marca de 100 mil mortes por covid-19 no dia 8 de agosto e continua como o segundo país do mundo com maior número de mortes na pandemia do novo coronavírus, depois apenas dos Estados Unidos, que tem mais de 199 mil mortes pela covid-19, segundo levantamento da Universidade Johns Hopkins.

O Brasil foi superado em número de casos, entretanto, pela Índia, (5,3 milhões), agora em segundo lugar depois dos EUA (6,7 milhões de casos).

Fonte: BBC News / Brasil

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

País tem 136.997 óbitos confirmados e 4.547.150 diagnósticos de Covid-19.

O Brasil tem 136.997 mortes por coronavírus confirmadas até as 13h desta segunda-feira (21), segundo levantamento do consórcio de veículos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde.

Desde o balanço das 20h de domingo (20), 7 estados atualizaram seus dados: BA, CE, GO, MG, MS, RN e RR.

Veja os números consolidados:

136.997 mortes confirmadas

4.547.150 casos confirmados

Às 8h, o consórcio publicou a primeira atualização do dia com 136.923 mortes e 4.544.347 casos.

No domingo, às 20h, o balanço indicou: 136.895 mortes, 330 em 24 horas. Com isso, a média móvel de novas mortes no Brasil nos últimos 7 dias foi de 747 óbitos, uma variação de -5% em relação aos dados registrados em 14 dias.

Em casos confirmados, já são 4.544.262 brasileiros com o novo coronavírus desde o começo da pandemia, 15.915 desses confirmados no último dia. A média móvel de casos foi de 30.587 por dia, uma variação de -10% em relação aos casos registrados em 14 dias.

Progressão até 20 de setembro

2 estados apresentaram alta de mortes: RJ e RO.

Estados

Subindo (2 estados): RJ e RO

Em estabilidade, ou seja, o número de mortes não caiu nem subiu significativamente (14 estados): PR, RS, MG, SP, GO, MS, MT, AP, PA, BA, MA, PE, PI e RN

Em queda (10 estados e o DF): SC, ES, DF, AC, AM, RR, TO, AL, CE, PB e SE

Essa comparação leva em conta a média de mortes nos últimos 7 dias até a publicação deste balanço em relação à média registrada duas semanas atrás (entenda os critérios usados pelo G1 para analisar as tendências da pandemia).

Por G1 - 21/09/2020 08h00  Atualizado há 6 horas

Huck fala em desejo de ‘liderar uma geração’ na política; ‘Estou aqui’, diz sobre 2022

Apresentador foi questionado se ‘tem coragem’ de ser candidato a presidente durante reunião em São Paulo

O apresentador de TV Luciano Huck (sem partido), cotado para disputar a Presidência em 2022, chamou para si nesta segunda-feira, 21, o protagonismo em debater e propor medidas para transformações sociais, econômicas e ambientais no País. Em reunião do Conselho Político e Social (Cops) da Associação Comercial de São Paulo da qual o Estadão participou, ele disse querer “mobilizar, liderar e fomentar uma geração”. 

Huck foi questionado por um integrante do Cops se “tem coragem” de ser candidato a presidente. “Estou aqui”, respondeu, antes de ponderar que, por enquanto, se vê como “cidadão ativo” e dizer que atua sem intenções de poder.

“Eu quero mobilizar, liderar, fomentar uma geração para que a gente participe ativamente das transformações que o Brasil precisa. Ninguém vai entregar isso de graça para a gente”, disse Huck em relação a desigualdades sociais no País. “Sobre a questão da coragem (de se candidatar a presidente), estou aqui, não é? Estou aqui conversando sobre temas que não são óbvios para mim, como energia, reformas. Tenho estômago para ouvir opiniões diversas, para estar em cena num momento tão delicado do País. Neste momento, estou sentado aqui como cidadão ativo, que está no debate público.”

O apresentador evitou falar diretamente da próxima eleição presidencial e pediu foco aos temas das cidades em função do pleito deste ano. “(Não quero) personificar ou ‘fulanizar’, em mim ou outra pessoa, um debate eleitoral majoritário que não está em voga neste momento. Isso mais atrapalha que ajuda, e Brasil afora tem gente mais preocupado com a eleição (de 2022) do que em atender as necessidades das pessoas. Temos neste ano um ciclo eleitoral nas cidades e a política começa nas cidades.”  

Entusiasta de movimentos de renovação e formação política como o RenovaBR e o Agora!, Huck disse que o caminho para melhorar a situação do País está na política. “Só o Estado, que é gerido pela política, tem o poder exponencial de transformação. E a política é gerida pelos políticos. Acho importante esta convocação geracional, atrair o que tem de melhor na sociedade civil para chegar perto da política.”

Huck afirmou que vê o Brasil sem lideranças que promovam o debate. “A demonização da política e a não harmonia entre Poderes estão ligadas à questão da liderança. (É preciso) uma liderança que concilie e dialogue, e não que assopre brasa com discursos sectários. Precisamos retomar o diálogo.”   

A participação de Huck na reunião do Cops estava marcada para acontecer em março deste ano, mas foi adiada por causa da pandemia de coronavírus e por isso aconteceu nesta segunda.

‘O lugar do Brasil é como a maior potência verde do planeta’

Huck também falou sobre sustentabilidade e defendeu que o Brasil se torne uma nação agroindustrial sustentável, aliando o potencial da agronegócio à preservação ambiental. Para ele, esta é uma forma de atrair investimentos e transformar o País em uma “potência verde”. 

“O mundo quer investir em economias limpas”, disse. “É uma oportunidade de ouro com o nosso potencial. Precisamos de lideranças que enxerguem com clareza essa oportunidade. O que tem prevalecido nos últimos anos é a visão que endossa o extrativismo predador. A aceleração do desmatamento, a não importância (dada) às queimadas como não as estivéssemos vendo. Essa é a década da bioeconomia, com floresta em pé.”

Huck diz ver convergências entre bandeiras do agronegócio e do ativismo ambiental. “Converso com os dois lados e encontro pontos em comum”, afirmou, sem dar exemplos. “Dá para romper com o litígio. Precisamos romper radicalmente com o debate raso, o litígio entre agricultura e meio ambiente, produção e sustentabilidade.”

Matheus Lara, O Estado de S.Paulo - 21 de setembro de 2020 | 13h39

A aritmética da demagogia

O pensamento mágico pode até iludir alguns eleitores, mas causa mais danos ao País, no longo prazo, do que a pandemia

Visto de Brasília, o Brasil é um paraíso tão pródigo que, nele, as leis da matemática não se aplicam. No pensamento mágico predominante na capital federal, o Orçamento tende ao infinito – nele cabe tudo, fazendo com que a soma das partes supere sempre, de longe, o todo. 

Já se sabe, por exemplo, que, tudo o mais constante, não há dinheiro para produzir um programa de transferência de renda que ao mesmo tempo compense o fim do auxílio emergencial para quem ficou à míngua na pandemia e substitua com vantagens o Bolsa Família, como queria o presidente Jair Bolsonaro, de olho no potencial eleitoral de tal iniciativa.

Quando a equipe econômica sugeriu que o programa fosse bancado com o congelamento das aposentadorias ou com a abolição de outros benefícios sociais, o presidente Bolsonaro foi às redes sociais para desancar seus assessores, acusando-os de falta de compaixão com os mais pobres – como se não fosse ele o presidente da República e, portanto, responsável por tudo de bom e de ruim que seu governo produz. Como Bolsonaro não demitiu até agora nenhum de seus desalmados economistas, presume-se que talvez aceite suas ideias, desde que sejam tratadas com discrição.

Para todos os efeitos, contudo, Bolsonaro anunciou que havia desistido do Renda Brasil, como disse em sua agastada mensagem, acrescentando que o assunto estava “proibido” no governo e que manteria o que já existe – o Bolsa Família – e “ponto final”. Mas eis que o “ponto final”, menos de 24 horas depois, se tornou vírgula.

O relator do Orçamento de 2021, senador Marcio Bittar (MDB-AC), foi a Bolsonaro para lhe propor que o natimorto Renda Brasil fosse revivido. A ideia, segundo disse o parlamentar, é incluir o programa bolsonarista no Orçamento agora, mas sem especificar de onde viria o dinheiro para financiá-lo. O objetivo seria, em suas palavras, “evitar informações desencontradas, que vazam, em que pesem terem lógica, mas acabam abortadas”. Para o senador, “não adianta agora a gente especular do que vai tirar, de onde vai cortar”.

Por esse raciocínio, tudo poderia ser incluído no Orçamento, já que a decisão sobre quais serão as fontes de financiamento, crucial em qualquer planejamento, fica para depois. É espantoso, mas muito característico da fantasia fiscal brasiliense.

Bolsonaro, é claro, esqueceu-se rapidamente de seu peremptório “ponto final” e deu sinal verde ao relator do Orçamento para retomar a ideia de um novo programa de transferência de renda, que teria enorme potencial eleitoral. Autorizado pelo presidente, o senador Marcio Bittar foi conversar com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para tentar encontrar a quadratura do círculo – isto é, criar um novo auxílio sem fazer sacrifícios de qualquer natureza, vedados pelo presidente Bolsonaro.

A promessa é que o tal programa e talvez sua fonte de financiamento sejam revelados nesta semana, mas, a julgar por tudo o que se especulou, a realidade de hoje, de penúria fiscal e falta de alternativas, não terá mudado até lá: “Quero saber de onde o governo vai tirar para dar R$ 300 (valor atual do auxílio emergencial). Sei que nessa questão vamos ter muita dificuldade”, disse o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), designado presidente da Comissão Mista de Orçamento.

O fato, incontornável, é que o fim do auxílio emergencial lançará em breve milhões de brasileiros em angustiante incerteza, uma vez que a economia, embora com alguns sinais de recuperação, está muito longe de prover os empregos e a renda necessários para tanta gente vulnerável. Por isso, é claro que o governo e o Congresso devem se mobilizar para encontrar meios de amparar esses cidadãos enquanto a crise não passa. Mas a emergência não pode servir de pretexto para a irresponsabilidade fiscal eleitoreira travestida de socorro, enquanto se mantêm privilégios e se adiam as reformas que dariam ao Estado condições de fazer frente a crises como essa. O pensamento mágico pode até iludir alguns eleitores, mas causa mais danos ao País, no longo prazo, do que a pandemia.

Editorial / Notas & Informações, O Estado de S. Paulo - 21 de setembro de 2020 | 03h00



sexta-feira, 18 de setembro de 2020

A ostentação da burrice

                                

                              Bolsonaro insiste em fazer propaganda da cloroquina  / Reprodução

Para quem ainda observa de casa e em quarentena o Brasil de Bolsonaro, o mais excruciante é a ostentação da asneira. O presidente e sua corte não disfarçam a ignorância em todos os aspectos da vida, da economia ao meio ambiente, sexo, ciência, educação e cultura. Eles se superam a cada dia. Trombeteiam o desconhecimento. Só isso explica que Bolsonaro tenha dito ontem que as escolas não deveriam ter sido fechadas nem um só dia na pandemia. Nenhum presidente no mundo ousou dizer tal besteira. 

"Nós falamos naquele momento, conforme alguns estudos pelo mundo, que as crianças e os jovens, uma vez acometidos pelo vírus, a chance de partirem para a letalidade era próxima de zero", ressaltou Bolsonaro. "Eu entendo que alguns governadores foram tomados pelo pânico, proporcionado por essa mídia catastrófica que nós temos no Brasil. Não é uma crítica à imprensa, é uma constatação. Me desculpem". 

Além de ser uma mentira, até as crianças perguntariam: “Mas, presidente, e os professores e os serventes, e meus pais, meus avós? O senhor queria que eu fosse egoísta e contaminasse a todos em volta?” Desculpe, presidente, mas sua linguagem é tosca. Morte é “partir para a letalidade”? Seus ataques destemperados à imprensa confirmam sua insegurança. “Catastrófica” não é a mídia, mas sua gestão fake, presidente. Não é uma crítica, mas uma constatação.

Não podemos exigir sensatez e empatia de um ex-capitão nostálgico da ditadura militar, fã de torturadores e expulso do Exército por indisciplina. Seus filhos se apoiam na ressurreição da censura e em privilégios especiais para driblar investigações por corrupção. Na liderança do país e até de seu próprio gabinete ministerial, Bolsonaro é um desastre. Diz e se desdiz. Veta seu próprio veto. Endeusa e frita. Sua ausência de discernimento na diplomacia está destruindo o “made in Brazil”. Nossa marca é corroída. Nossa democracia também. Estamos queimando florestas e nosso filme.

Até aí, nenhuma novidade. Você pode até dizer que a ignorância é tática eleitoral. Não seria uma burrice sincera, mas uma falsificação oportunista e deliberada da verdade. A insistência em afirmações facilmente desmascaradas – sobre a eficiência da cloroquina ou o respeito à Floresta Amazônica – pode ser simplesmente uma obsessão por “fake news” como método.  

“Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”, dizia Joseph Goebbels, ministro da propaganda na Alemanha nazista. Nesse cenário, o jornalismo profissional, que vive da busca da verdade, é mesmo um inimigo. Por isso o presidente quer “encher a boca do repórter de porrada” e sua ameaça é aceita como normal pelo muy amigo da República, nosso procurador-geral, Aras, que desmerece o significado do prenome Augusto, o venerável. 

Como manter a esperança e a sanidade no apocalipse? Como não entrar em pânico diante da mistura de nacionalismo, armas, fanatismo religioso, milícia e desprezo por fatos e números? Alguns se refugiam na fé. Não é meu caso. A saída pode ser o aeroporto. 

A opção mais admirável é resistir e se aferrar à perspectiva histórica dos ciclos da humanidade, com suas pestes, seus êxodos, suas crises e guerras convencionais ou civis. Não sejamos ingênuos. Não vamos melhorar nem renascer após a pandemia. Mas “todo cambia”, como canta Mercedes Sosa. Devemos olhar Bolsonaro como uma “corcova da História” e não como uma tendência. Essa expressão é do economista Sérgio Besserman, um estudioso da tribo global do homo sapiens. Besserman enxerga benefícios na pandemia, entre eles a falência do “mais, mais e mais” e do “ter, ter e ter”. 

“Estamos numa revolução do porte do Iluminismo, do Renascimento. Tudo isso é amendoinzinho (peanuts) comparado com as próximas décadas. Se não fizermos nada, iremos para o pior cenário do aquecimento global. Para a extinção das espécies. O mundo precisa se preocupar com 100 anos à frente. Parecia que estava tudo bem? Metade dos gases estufa da atmosfera foi emitida nos últimos 30 anos, quando a gente já sabia de tudo e não fazia nada. E por isso a adolescente sueca Greta Thunberg tem razão”. 

Em novembro, na eleição presidencial americana, o mundo decidirá se a corcova se prolongará ou não. Se Trump for reeleito, sua vitória dará legitimidade ao discurso de Bolsonaro e de autoritários nacionalistas, populistas e xenófobos, como Orbán na Hungria, Erdogan na Turquia, Maduro na Venezuela, Putín na Rússia, Modi na Índia, Boris na Grã-Bretanha. 

Se Joe Biden derrotar Trump, Bolsonaro ficará sem seu maior aliado na ostentação da mentira e do “bullshit”. Besserman vai além: “Todos esses nacionalistas, ressentidos e saudosistas de ditaduras, de impérios, ou da sharia (a lei islâmica), se tornarão um bando de meia dúzia de malucos com a brocha na mão”. Assim espero. O desejo não move o mundo?

Ruth de Aquino, a autora deste artigo, nasceu no Rio de Janeiro. Jornalista desde 1974. Mestrado em Londres sóbre Ética na imprensa. Foi repórter, editora, diretora de redação, correpsondente em Londres e Paris. Escreve sobre o ser humano e suas contradições. Email; ruth.aquino@globo.com.br. Este artigo foi publicado originalmente por Época, em 19.09.2010.

Mundo chega a 30 milhões de casos de covid-19 e países retomam lockdowns

Novo aumento no número de casos e mortes na Europa já motivam governos a retomar medidas mais severas de isolamento; EUA, Brasil e Índia ainda lideram número de casos e mortes

Os contágios de covid-19 no planeta superaram a marca dos 30 milhões, de acordo com o levantamento em tempo real da Universidade Johns Hopkins. O número de mortes, segundo a mesma instituição, ultrapassou os 945 mil. Apesar do avanço da pandemia, países adotam lockdowns parciais e tentam retomar a 'normalidade' enquanto não há perspectiva de uma vacinação universal a curto prazo. 

Nesta sexta-feira, o governo do Reino Unido advertiu que poderá retomar o confinamento na Inglaterra após observar o aumento do número de casos, com as taxas de hospitalização dobrando a cada oito dias, segundo o Ministério da Saúde.

PIB Reino Unido

Homem usando máscara caminha em rua comercial vazia em Londres. Foto: Tolga Akmen/AFP

"Queremos evitar um confinamento nacional, mas estamos preparados para fazer isso, se necessário", disse o ministro da Saúde, Matt Hancock, à rede BBC. "Estamos preparados para fazer o que for necessário, tanto para proteger vidas, quanto para proteger a economia." 

De acordo com Hancock, novas restrições serão aplicadas a partir desta sexta em partes do nordeste da Inglaterra. Em várias cidades da região, que somam quase dois milhões de habitantes, ficará proibido o encontro entre pessoas que vivam em casas diferentes, e todos os locais de entretenimento terão de permanecer fechados entre 22h e 05h.

Além da Inglaterra, Israel começou a aplicar um segundo lockdown de sua população nesta sexta-feira devido ao ressurgimento da pandemia no país, que tem a maior taxa de contágio das últimas duas semanas.

O primeiro-ministro Binyamin Netanyahu alertou sobre "um aumento preocupante de infecções e pacientes gravemente doentes" para justificar o confinamento de três semanas, que coincide com alguns dos principais feriados judaicos, como o Yom Kipur. Um lockdown foi imposto no final de março e levantado em maio com a diminuição das contaminações, mas na semana passada os novos casos atingiram máximas diárias de mais de 5 mil diagnósticos positivos.

Israel / Coronavirus


        Judeus ultraortodoxos rezam separados por barreiras de plásticos em sinagoga. Foto: AP                                                                            Photo/Oded Balilty

A lista dos mortos - que já são 946.685 no mundo - é encabeçada pelos Estados Unidos, com 197.633. Na sequência, Brasil e Índia somam 135.031 e 84.372 mortes, respectivamente. Quanto ao número de casos, os três países também ocupam os primeiros lugares do ranking, com Brasil e Índia invertendo de posição.

OMS faz alerta sobre níveis de contágio 

Nesta semana, a Organização Mundial da Saúde alertou que o nível de transmissão da covid-19 na Europa está mais alto do que na primeira onda da pandemia, entre março e abril. A entidade se declarou preocupada com a redução do tempo de quarentena decidida ou planejada por alguns países, como a França. 

Novos surtos da epidemia e a maior quantidade de testes, em comparação com a onda de março-abril, levaram o número diário de casos a algo entre 40 mil e 50 mil. Na primeira onda, o dia 1º de abril registrou o recorde de 43 mil contágios, de acordo com a OMS Europa. O novo recorde absoluto diário foi registrado em 11 de setembro, com 54 mil contágios em 24 horas.

Austria Coronavirus


Em frente ao Palácio de Hofburg, algumas pessoas usam máscara. Foto: Leonhard Foeger

Na Áustria, que vem apresentando números tão altos quanto no primeiro semestre, o premiê Sebastian Kurz admitiu nesta semana que a intensidade dos novos contágios já configura uma segunda onda. O país retomou medidas restritivas. “A partir de agora, eventos em locais fechados não poderão ter mais de 10 pessoas. Estamos diante de um crescimento exponencial de novos casos na Áustria”, afirmou o premiê.

 “Os números de setembro deveriam servir de alerta para todos nós na Europa, onde o número de casos é superior aos registrados em março e abril”, disse o diretor da OMS no continente, Hans Kluge, que pediu atenção com a chegada do outono e com o início do ano escolar.

O governo da Grécia também adotou restrições, fechando bares de música ao vivo por 14 dias e tornando obrigatório o uso de máscaras em locais fechados – públicos e privados. Feiras e mercados abertos só poderão operar com 50% da capacidade. Além disso, diante do aumento dos contágios, Atenas e sua região metropolitana foram colocadas em alerta.

Espanha coronavirus


No centro de Madri, pessoas usam máscaras para tentar conter avanço do novo coronavírus. Foto: AP Photo/Manu Fernandez

Na Espanha, a maior preocupação é com Madri, a capital que responde por quase um terço dos 122 mil novos casos registrados nas últimas duas semanas. O  Ministério da Saúde alertou que a capacidade de alguns hospitais madrilenhos está perto do limite. A velocidade dos contágios também começou a afetar a capacidade de testagem. No país, 13% dos testes têm resultado positivo, cenário agravado na capital, onde o índice de positividade chega a 22%.

Olivier Véran, ministro da Saúde da França, incluiu as cidades de Lyon e Nice na lista de “zonas vermelhas” do país na quinta-feira, 17. O país agora tem 28 departamentos em estado crítico, entre eles Paris, Marselha, Bordeaux e Guadalupe, ilha francesa no Caribe. “Peço que, especialmente nas regiões mencionadas, os esforços sejam redobrados e para reduzir o número de encontros entre as pessoas”, afirmou.

Na América Latina e no Caribe, o coronavírus já provocou mais de 318 mil mortes e 8,5 milhões de contaminações. No Peru, onde há mais de 750 mil casos, o toque de recolher noturno e de domingo será flexibilizado graças a uma melhora recente nos números.  / AFP, Reuters e EFE 

Publicado originalmente por O Estado de S.Paulo, 18.09.20, atualizado às 14,09 hs.

O Brasil tem 135.203 mortes por coronavírus confirmadas até as 13h desta sexta-feira (18)

Desde o balanço das 20h de quinta-feira (17), 8 estados atualizaram seus dados: BA, CE, GO, MG, MS, PE, RN e RR.


Veja os números consolidados:

135.203 mortes confirmadas

4.466.828 casos confirmados

Às 8h, o consórcio de imprensa publicou a primeira atualização do dia com 135.066 mortes e 4.457.569 casos.

Na quinta-feira, às 20h, o balanço indicou: 135.031 mortes, 857 em 24 horas. Com isso, a média móvel de novas mortes no Brasil nos últimos 7 dias foi de 779 óbitos, uma variação de -9% em relação aos dados registrados em 14 dias.

Sobre os infectados, já são 4.457.443 brasileiros com o novo coronavírus, 35.757 desses confirmados no último dia. A média móvel de casos foi de 31.097 por dia, uma variação de -22% em relação aos casos registrados em 14 dias.

Progressão até 17 de setembro

No total, 2 estados apresentaram alta de mortes: RO e PE

A BA e o AP, que apresentavam tendência de queda nos óbitos, agora estão estável. O DF e os estados de MT, PI, SE e TO estavam em estabilidade e, hoje, mostram queda.

Estados

Subindo (2 estados): RO e PE.

Em estabilidade, ou seja, o número de mortes não caiu nem subiu significativamente (11): PR, RS, MG, RJ, SP, GO, MS, AP, PA, BA e MA.

Em queda (13 estados e o DF): SC, ES, DF, MT, AC, AM, RR, TO, AL, CE, PB, PI, RN e SE.

Essa comparação leva em conta a média de mortes nos últimos 7 dias até a publicação deste balanço em relação à média registrada duas semanas atrás (entenda os critérios usados pelo G1 para analisar as tendências da pandemia).

Fonte: G1 / O Globo, Globo News