Newsletter semanal do jornalista Thiago Prado avança em série de entrevistas ouvindo Marcos Carvalho, responsável pela comunicação da campanha do ex-presidente em 2018, analisa a corrida pelo governo do Rio e recomenda documentário sobre o cantor Belo
(Bom dia, boa tarde boa noite, a depender da hora em que você abriu esse e-mail. Sou o editor de Política e Brasil do GLOBO, e nessa newsletter você encontra análises, bastidores e conteúdos relevantes do noticiário político.)
Os últimos dias, que expuseram o tombo na popularidade do presidente Lula na pesquisa do Datafolha e a denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) contra Jair Bolsonaro nesta terça-feira, estimularam falas importantes de analistas brasileiros sobre a possibilidade de surgimento de um outsider poderoso na corrida de 2026 ao Planalto.
Na segunda-feira, na Globonews, Felipe Nunes, da Quaest, comentou: "Estamos caminhando para um cenário muito parecido com o de 2018, quando violência e corrupção ganham protagonismo nas grandes cidades, com uma rejeição alta ao governo atual e ao Estado como um todo. Isso, combinado, faz com que a antipolítica possa ter protagonismo".
Na Veja, Thomas Traumann escreveu: "Pesquisas qualitativas feitas nos últimos dias em São Paulo indicaram que a rejeição aos políticos vai além das reclamações dos preços nos supermercados. Todos os políticos, e não apenas Lula, estão sendo criticados (...). Mais do que um novo Bolsonaro, há indicações que sugerem o desejo de um Javier Milei, alguém que promete cortar o estado assistencial petista".
Responsável pela comunicação da campanha de Jair Bolsonaro à Presidência em 2018, o empresário Marcos Carvalho é o quarto entrevistado da série da newsletter com estrategistas políticos e donos de institutos de pesquisa sobre a eleição do ano que vem. As outras conversas podem ser lidas nos links abaixo:
Carvalho chegou a ser nomeado na equipe de transição do ex-presidente para cuidar da comunicação do governo, mas acabou retirado da função após o vereador Carlos Bolsonaro se incomodar com o seu protagonismo na área. O estrategista, que em 2022 participou da campanha do petista Jerônimo Rodrigues ao governo da Bahia, também vê um cenário favorável para candidatos da oposição no ano que vem, e diz que nomes da direita de fora da política podem, sim, surpreender nas eleições.
Abaixo, os principais trechos da conversa.
O senhor considera que um discurso outsider pode emplacar de novo em 2026?
Acho, sim, que há nomes supercompetitivos. Pablo Marçal e Gusttavo Lima representam a nova política digital, com capacidade de mobilização online e conexão com o eleitorado jovem e evangélico. Se conseguir manter-se elegível, Marçal estará mais maduro depois da eleição em São Paulo. Já Gusttavo Lima tem audiência, 46 milhões de seguidores, é pai de família, empresário, pode ser bom candidato. Resta saber se conseguirão mostrar atributos funcionais e emocionais ao longo de uma campanha.
Você, que conviveu bastante com Bolsonaro, sabe que dificilmente ele vai apoiá-los...
A direita brasileira não se resume mais a Bolsonaro, e novas lideranças estão surgindo. Deixou de ser um movimento monolítico. Outro ponto: transferência de votos precisa ter um receptor compatível. Não necessariamente vai herdar os votos do Bolsonaro quem ficar ali puxando o saco dele.
Depois da denúncia desta terça-feira, uma eventual condenação no Supremo Tribunal Federal (STF) ou prisão não podem levar a um discurso de vitimização do ex-presidente, que volte a torná-lo relevante na sucessão?
Acho a expectativa desse efeito superdimensionada. Na minha cabeça, Bolsonaro seguirá inelegível, nem a pau vai reverter essa situação. Agora, até pelas conversas que tenho em Brasília, não passa pela cabeça de ninguém prender o Bolsonaro. Não vejo esse ânimo. Aliás, muitos no governo nem querem isso.
Acha ruim para o país Bolsonaro preso?
Não sou jurista, mas acho ruim, sim. Acirraria as disputas, precisamos caminhar para um ambiente de paz.
Tarcísio de Freitas não seria um nome mais competitivo para a direita vencer?
Se fosse candidato, sim. Mas acho que ele virá ao governo de São Paulo. Por vaidade, Bolsonaro vai manter a própria candidatura até o último segundo. Depois, a tendência é apontar o dedo para alguém da própria família. O problema é que, hoje, Bolsonaro é considerado um inapto para muitos eleitores de direita. A capacidade dele de indicar pessoas competentes é considerada suspeita.
E Romeu Zema e Ronaldo Caiado?
Zema tem um problema político, não está sendo bem-sucedido na consolidação do seu projeto no seu próprio reduto. Não elegeu prefeitos em Minas Gerais, perdeu na capital e nem sequer parece ter um sucessor claro. Já Caiado pode ser um nome viável por ter perfil de gestor, bom trânsito no agronegócio e um discurso moderado que não repele o centro.
Você crava, portanto, que a direita vencerá em 2026?
O Brasil caminha para uma eleição onde a direita terá um candidato favorito. Mas o quadro não é irreversível para Lula ainda. O problema é que o Planalto não tem uma comunicação digital eficiente. O governo fala muito, mas não se conecta. O eleitorado digital não quer discursos longos e técnicos, mas mensagens diretas, com storytelling envolvente.
Lula voltou a fazer o tradicional, agendas pelo Brasil com discursos longos e entrevistas para rádios locais. É um erro?
Problema não é o rádio ou o palanque. O problema é que não tem um corte depois dessa fala, e a mensagem carece de tração. Em dois anos, o governo não construiu uma rede de influenciadores orgânicos e depende da grande mídia, que perdeu influência no cenário digital. As novas gerações consomem informações via TikTok e Instagram, mas o governo insiste em um formato de comunicação que não dialoga com esse público. No Brasil, o TikTok ultrapassou o Google como ferramenta de busca entre jovens de 18 a 24 anos. Além disso, há ainda um problema de mensagem central em várias áreas.
Por exemplo?
Segurança. Na minha opinião, será o maior fator de decisão na eleição de 2026, especialmente para as classes C e D, que vivem diretamente os efeitos do aumento da criminalidade. A direita no mundo se apropriou desse tema de forma eficaz, enquanto a esquerda ainda não conseguiu construir uma narrativa convincente sobre segurança. Além disso, a direita fez muitos mais movimentos ao centro do que a esquerda. Saíram dos costumes e foram para a economia, e isso tem dado muito certo.
O caso do Pix foi um divisor de águas?
Foi uma anomalia, uma tragédia. Será usado até o último dia contra o governo. Mas não é só isso. O PT não é mais o Partido dos Trabalhadores. E isso é um problema. O Brasil mudou. O trabalhador de hoje não é o operário sindicalizado da década de 80. Viramos um país de pequenos empresários, MEIs, autônomos, prestadores de serviço, profissionais liberais, e esse público não se identifica mais com o PT. A esquerda ainda fala de emprego com carteira assinada, mas o Brasil real vive de trabalho informal, aplicativos, empreendedorismo digital. A nova geração não busca estabilidade, busca oportunidade. O governo não pode prometer um “emprego seguro”, mas precisa garantir um ambiente favorável ao crescimento individual.
Com tantos problemas em áreas da comunicação, segurança e economia, Lula pode acabar desistindo da disputa para não perder e manchar a biografia?
Até existe um talento no campo progressista que não é para agora: o prefeito do Recife, João Campos. Fora isso, mesmo com tantos problemas, Lula é o único candidato. Não existe outra pessoa.
Este texto foi originalmente publicado na newsletter "Jogo Politico". Reproduzido por O Globo, em 20.02.25
editado por Thiago Prado Por Thiago Prado na newsletter Jogo Político
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