sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Queiroz depositou mais de 20 cheques em conta de Michelle Bolsonaro

Depósitos que somam R$ 72 mil ocorreram entre 2011 e 2018 e foram descobertos após quebra do sigilo do amigo do presidente e ex-assessor do senador Flávio. Repasses contrariam versão de Bolsonaro sobre suposto empréstimo
Michelle e Jair Bolsonaro

    Michelle e Jair Bolsonaro
Bolsonaro alegou ter emprestado 40 mil reais a Queiroz

O ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro Fabrício Queiroz depositou 72 mil reais na conta de Michelle Bolsonaro, esposa do presidente Jair Bolsonaro, entre 2011 e 2018, segundo uma reportagem da revista Crusoé. Os repasses foram descobertos com a quebra de sigilo bancário do ex-policial militar e contrariaram a versão sobre o caso apresentada pelo presidente.

A quebra do sigilo bancário de Queiroz foi autorizada pela Justiça no âmbito da investigação sobre um esquema de "rachadinha"  – prática ilegal através da qual os funcionários de parlamentares são coagidos a devolver parte de seus salários – no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). O filho do presidente foi deputado estadual entre 2003 e janeiro de 2019, e Queiroz foi seu assessor entre 2007 e 2018.

Segundo a reportagem, Queiroz depositou ao menos 21 cheques na conta de Michelle entre 2011 e 2018, em valores que somam 72 mil reais. Até agora, era conhecido apenas um repasse de 24 mil reais do ex-assessor para a esposa do presidente.

Quando o caso veio à tona, no final de 2018, Bolsonaro afirmou que os repasses feitos por Queiroz a Michelle eram referentes a uma dívida de 40 mil reais que o ex-assessor tinha com o presidente. Bolsonaro alegou que os valores haviam sido depositados na conta de sua esposa por ele não ter tempo de ir ao banco.

Os depósitos de Queiroz a Michelle divulgados pela Crusoé foram confirmados pelo jornal Folha de S.Paulo, que noticiou ainda que a esposa de Queiroz, Marcia Aguiar, também repassou dinheiro em 2011 para a primeira-dama, por meio de seis cheques que somaram R$ 17 mil. Com isso, os valores repassados para a primeira-dama somam R$ 89 mil, bem acima do suposto empréstimo de R$ 40 mil que Bolsonaro mencionou. 

Nenhum repasse de Bolsonaro a Queiroz aparece nos extratos, segundo a Crusoé. A quebra de sigilo bancário mostrou ainda que o ex-assessor movimentou em dez anos um valor bem acima de seus rendimentos. 

Entre 2007 e 2018, 6,2 milhões de reais em crédito foram registrados na conta de Queiroz. Deste valor, cerca de 2 milhões de reais vieram de repasses de funcionários do gabinete de Flávio, o que poderia comprar o esquema da "rachadinha". Outros 900 mil reais têm fontes não identificadas.

Para o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ), Queiroz era o operador do esquema de "rachadinha" no gabinete do filho do presidente. O ex-assessor é amigo de longa data do presidente e foi por intermédio dele que conseguiu uma vaga no gabinete de Flávio.

O caso da "rachadinha"

Queiroz é investigado por lavagem de dinheiro, peculato, ocultação de patrimônio e organização criminosa. Ele foi preso em junho em Atibaia, interior de São Paulo, num imóvel do advogado Frederick Wassef, que até então defendia Flávio no caso da "rachadinha". Pouco após a prisão, o filho do presidente anunciou que Wassef não era mais seu advogado. Em julho, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) concedeu a Queiroz o benefício de prisão domiciliar.

Em meados de maio, a Polícia Federal afirmou que iria investigar a afirmação feita pelo empresário Paulo Marinho de que o senador Flávio Bolsonaro foi informado com antecedência de que a Operação Furna da Onça, que atingiu Queiroz, seria deflagrada.

Marinho é suplente de Flávio no Senado, pré-candidato à prefeitura do Rio de Janeiro pelo PSDB e foi uma figura importante na campanha presidencial de Bolsonaro.

A Furna da Onça, um desdobramento da Lava Jato, foi deflagrada em novembro de 2018. Flávio teria revelado a Marinho em 13 de dezembro de 2018 que soube antes da operação. À época, Queiroz estava sumido, e Flávio disse a seu suplente que mantinha contato indireto com Queiroz por meio de um advogado.

Em 6 de dezembro de 2018, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), um órgão do Ministério da Fazenda, detectou uma série de operações bancárias suspeitas de mais de sete dezenas de assessores e ex-assessores da Alerj. O documento foi produzido no âmbito da Furna da Onça.

Na lista constava o nome de Queiroz. O ex-assessor, que também é amigo de Jair Bolsonaro desde a década de 1980, logo passaria a ser personagem central da primeira crise do novo governo.

Segundo o relatório inicial do Coaf, Queiroz, que morava em um apartamento simples em um bairro de classe média baixa do Rio, movimentou 1,2 milhão de reais em um período de 12 meses entre 2016 e 2017, época em que estava lotado no gabinete de Flávio. O documento apontou que as movimentações eram "incompatíveis com o patrimônio, a atividade econômica ou ocupação profissional" de Queiroz.

O mesmo relatório detalhou as operações bancárias realizadas pelo ex-assessor. Entre elas estava o depósito de um cheque de 24 mil reais na conta da esposa de Bolsonaro, Michelle Bolsonaro. No total, Queiroz sacou dinheiro em 176 oportunidades, em 14 bairros do Rio. Vários dos saques eram idênticos e fracionados, o que levantou suspeitas de tentativa de ocultação.

O relatório ainda citou a filha de Queiroz, Nathalia Melo de Queiroz, que foi beneficiada pelos recursos movimentados pelo pai. Nathalia foi funcionária do gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro entre dezembro de 2016 e outubro de 2018.

Em março de 2019, Queiroz quebrou o silêncio, oferecendo à Justiça pela primeira vez explicações sobre as suspeitas de corrupção que pairavam sobre ele. O ex-assessor disse ao Ministério Público que recolhia parte dos salários de servidores do gabinete, mas negou ter se apropriado dos valores.

Segundo a explicação que Queiroz prestou por escrito ao MP-RJ, o dinheiro recolhido dos funcionários do gabinete era usado para contratar assessores informais e "expandir a atuação parlamentar" de Flávio nas bases eleitorais. O ex-assessor também afirmou que Flávio não sabia do esquema.

Apesar das declarações, as investigações apontam que parte das despesas pessoais de Flávio teriam sido quitadas por Queiroz em dinheiro vivo, com recursos desviados no esquema da "rachadinha". 

Fonte: Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas. 

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Cicatrizes na ‘Paris do Oriente Médio’

Explosões agravam a situação do Líbano, assolado pela pandemia e pela crise econômica

A negligência de autoridades libanesas pode ter feito o que nem a guerra civil do Líbano fez em 15 anos (1975-1990): destruir metade de Beirute, uma das mais belas capitais do Oriente Médio, em questão de segundos. Ao menos duas grandes explosões ocorreram na região portuária da cidade na tarde de terça-feira passada. A última, devastadora, obliterou o porto da capital libanesa e provocou uma onda de choque que destruiu tudo o que encontrou pela frente em um raio de aproximadamente 20 km. Há relatos de cipriotas que ouviram o barulho das explosões. O Chipre está a cerca de 230 km ao noroeste de Beirute, o que dá a dimensão do horror que a população local sofreu.

O desastre deixa, em números provisórios, mais de 130 vítimas fatais e quase 5 mil feridos. E esses números tendem a aumentar nos próximos dias porque equipes de resgate ainda trabalham na remoção dos escombros. Além disso, há 300 mil pessoas desabrigadas. Não há brasileiros entre os mortos e feridos com gravidade. Uma fragata da Marinha do Brasil a serviço da ONU havia deixado o porto de Beirute antes das explosões.

Trata-se de mais uma tragédia que se abate sobre uma cidade que ao longo dos últimos anos vinha se recuperando lentamente de uma violenta guerra civil e de outros conflitos na região. O ministro das Relações Exteriores de Israel, Gabi Ashkenazi, negou peremptoriamente qualquer envolvimento de seu governo com as explosões havidas em Beirute. Em nota conjunta, assinada com o ministro da Defesa, Benny Gantz, Ashkenazi informou que “o governo de Israel está em contato com o governo do Líbano por meio dos canais diplomáticos e de segurança para oferecer ao país vizinho ajuda médica e humanitária”. Já o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, insinuou que as explosões podem ter sido causadas por um “ataque com algum tipo de bomba”, sem apresentar qualquer evidência que sustentasse sua alegação.

Segundo fontes ligadas ao governo libanês, a causa mais provável da primeira explosão foi um incêndio provocado por um curto-circuito numa fábrica de fogos de artifício instalada na região portuária. Esta explosão teria ocasionado outra, de maior potencial destrutivo, num armazém contíguo, local onde estavam estocadas 2,75 mil toneladas de nitrato de amônio apreendidas há nada menos do que seis anos. O nitrato de amônio é uma substância normalmente usada na produção agrícola, mas pode se tornar explosivo sob altas temperaturas. O uso de nitrato de amônio para fins bélicos foi uma das razões para o confisco do material pelo governo. Temia-se pelo acesso do Hezbollah à carga tão perigosa.

O erro fatal das autoridades responsáveis pelo armazém no porto de Beirute que foi pelos ares foi ter armazenado uma quantidade tão grande de nitrato de amônio em um mesmo local, por tanto tempo, e sem as necessárias medidas de segurança, segundo os especialistas. A Justiça do Líbano determinou que todos os funcionários com poder de mando no armazém desde 2014 sejam postos em prisão domiciliar até o final da investigação para apurar as causas da tragédia.

As explosões se somaram a uma severa crise econômica que assola o Líbano com mais gravidade há pelo menos dois anos, fruto de corrupção e irresponsabilidade fiscal, e à pandemia de covid-19. Hospitais foram destruídos, aumentando ainda mais o sofrimento na nação amiga. O instável equilíbrio de poder entre grupos de cristãos, muçulmanos sunitas e muçulmanos xiitas também poderá sofrer abalos com o agravamento dessas crises.

Em nota, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil se solidarizou com o governo e o povo do Líbano. Cerca de 10 milhões de libaneses, entre nativos e descendentes, vivem no País, um terço deles em São Paulo. É um contingente maior do que a população do Líbano. A dor dos amigos libaneses, que muito contribuíram para o crescimento do Brasil, é a dor dos brasileiros.

Editorial /Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
06 de agosto de 2020 | 03h00

'Chegamos a essa tragédia por um acúmulo de erros', diz Drauzio Varella sobre pandemia de Covid-19 no Brasil

"Primeiro, nós não nos preparamos adequadamente para a chegada do vírus aqui, e, sabidamente, ele vinha", disse o médico. Drauzio lembrou que, apesar das recomendações de cientistas sobre a necessidade de isolamento para conter a disseminação do vírus, houve "contradição" nas orientações dadas à população pelos governos estaduais e o federal.

"Todo o pessoal de ciência dizendo 'o isolamento é fundamental', e o governo federal apontando na direção oposta", disse.


2. Retomada econômica

'Tinha que ter sido um isolamento muito rápido e muito eficaz', explica Drauzio Varella

"Você não vai encontrar um epidemiologista digno desse nome que te diga que está na hora de abrir. Não vai pegar um país que está tendo mil mortes por dia e achar que está tudo bem, que as pessoas podem ir para a rua", afirmou.

Para Drauzio, o problema do isolamento é que ele precisava ter sido efetivo e começado nas fase inicial. "Tinha que ter sido um isolamento muito rápido. E muito eficaz, abrangente, chegar a níveis de 60%, 70%, porque aí você consegue ter um controle da epidemia."

3. Resistência ao isolamento social

Coronavírus surpreende pela 'variedade de quadros clínicos', defende Drauzio Varella

Drauzio foi questionado sobre o porquê de as pessoas não adotarem as medidas de proteção necessárias contra a Covid-19. O médico disse acreditar que, devido à variedade clínica da doença – que, em algumas pessoas, não causa sintomas e, entretanto, pode ser letal em outras – alguns grupos, principalmente os mais jovens, não fazem o isolamento social.

"Nós não temos uma consciência de que, se eu vou para a rua e pego o vírus, eu estou fazendo mal para a sociedade, porque eu vou manter esse vírus por mais tempo em circulação e vou espalhar também."

4. Volta às aulas

Crianças podem 'transmitir o vírus para dentro de casa', explica Drauzio Varella

O médico foi questionado sobre sua opinião em relação à volta das aulas. Ele disse não saber quando seria o momento certo dessa volta, mas avaliou que "ninguém sabe".

"Com toda essa disseminação que temos no país, não é só colocar a criança na escola, porque não é colocar a criança. A criança não é transportada por telepatia. Alguém vai ter que levar, ou ela vai ter que frequentar um transporte coletivo, volta para casa depois", lembrou o médico.
Drauzio pontuou, ainda, que, apesar de as crianças parecerem ser menos atingidas pela Covid-19, não ficou demonstrado que elas transmitem menos a doença.

"É um vírus altamente contagioso. Isso que as pessoas esquecem", disse. "Se você se expõe, você se infecta com o vírus. Quanto mais gente se expõe, mais gente se infecta, mais tempo dura a epidemia", lembrou.

5. Corrida pela vacina

Drauzio Varella explica os desafios da produção e da distribuição da vacina para Covid

Drauzio alerta que a perspectiva de, no futuro, uma vacina ser aprovada não resolve imediatamente o problema da disseminação da Covid-19 no Brasil.

"A vacina não vai resolver o problema atual", afirmou. "Pode ser que, quando chegue essa vacina, ela não vá ser tão necessária quanto é agora, porque pode ser que, até metade do ano que vem, você vai ter já uma epidemia mais arrefecida".

"Agora é hora de evitar aglomeração, de usar máscara", reforçou o médico. "Eu acho que não usar máscara na rua é um absurdo tão grande que eu fico olhando essas pessoas. O que leva um cidadão a andar sem máscara? Que estupidez do comportamento humano é esse? Uma pessoa no auge de uma epidemia, morrendo gente, se negar a pôr a máscara?", questionou.

6. Resposta imunológica

Drauzio Varella explica como atua o sistema imunológico no combate ao coronavírus no corpo

Drauzio também falou da complexidade da resposta imunológica do corpo à Covid-19.

"Quando entra um microrganismo, primeiro ele [o sistema imunológico] reconhece e monta uma resposta contra. Essa resposta tem dois braços: primeiro ele joga anticorpos em cima do microrganismo invasor, que funcionam como mísseis", explicou o médico.

"E, ao mesmo tempo, ele ativa várias células do sistema imunológico, vários tipos de glóbulos brancos, os linfócitos, macrófagos, os neutrófilos e outras células para correr e destruir o vírus, inclusive o vírus que já conseguiu entrar dentro das células que infectou. É a chamada imunidade celular. A dos anticorpos é chamada de humoral", completou.

Imunidade contra o coronavírus: tire dúvidas sobre como anticorpos e células T atuam contra a Covid-19

"Contra os vírus, a imunidade mais importante é a celular, não é a humoral [de anticorpos]", explicou Drauzio.

"Essa imunidade [celular ao vírus] é mal conhecida. Ela é toda dirigida para os anticorpos, porque são os anticorpos que você vai usar para testar a eficácia da vacina. Mas, na verdade, pode ser que eles não sejam tão importantes", disse.

Publicado originalmente por G1. Entrevista concedida hoje pela manhã à GloboNews.

Abuso de autoridade, Secretário de Transportes de São Paulo é preso por ordem de Bretas

Em mais uma decisão questionável, baseada em acusação sem materialidade, o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, mandou prender o secretário de Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo, Alexandre Baldy.

Bretas mandou prender secretário por suspeita de crimes anteriores ao mandato

O secretário de São Paulo foi ministro das Cidades no governo Michel Temer e foi preso por fatos relacionados a um hospital em Goiânia durante a administração de um adversário político. Nenhum dos fatos invocados tem conexão com a Justiça Federal do Rio de Janeiro.

Segundo a Polícia Federal, são cumpridos seis mandados de prisão temporária e 11 de busca e apreensão em uma investigação de desvios na Saúde envolvendo órgãos federais no Rio e em São Paulo. Os alegados crimes são anteriores ao mandato de Baldy na Secretaria dos Transportes.

Marcelo Bretas, cujas decisões são repetidamente revogadas por falta de fundamento legal, mandou prender pessoas e vasculhar os domicílios de pessoas em Petrópolis (RJ), São Paulo, São José do Rio Preto (SP), Goiânia e Brasília. De acordo com o G1, um pesquisador da Fiocruz, Guilherme Franco Netto, foi preso em Petrópolis.

As acusações elencam a eventual prática de corrupção, peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa, e após procedimentos de praxe, serão encaminhados ao sistema prisional, informou a PF em nota.

Fonte: Consultor Jurídico, 06.08.20.

Brasil está relaxando medidas de isolamento além do razoável, alerta cientista

Medidas de afrouxamento de quarentena devem ser tomadas a partir do momento em que o país reduz a taxa de transmissão do novo coronavírus.

Enquanto o Brasil enfrenta média diária de mais de mil mortes por covid-19 e tem sucessivos recordes de novas infecções pelo novo coronavírus, diversas regiões flexibilizaram a quarentena.

Cenas de bares e restaurantes lotados, praias cheias e lojas com muitos clientes se tornaram comuns nas últimas semanas.

A flexibilização do isolamento social no país não se restringe às cidades que atualmente têm queda de casos de covid-19 ou apresentam números estáveis, como São Paulo (SP) e Manaus (AM).

Ela também ocorre em municípios com crescimento de números de mortes e novas infecções pelo novo coronavírus, como cidades do interior.

Especialistas de todo o mundo apontam que um risco da flexibilização é o fato de que muitas pessoas podem pensar que a situação da pandemia está contornada.

Desta forma, podem ter a falsa impressão de que a vida pode voltar a ser como era antes da propagação do Sars-Cov-2, nome oficial do novo coronavírus.

Na Europa, por exemplo, os casos voltaram a subir recentemente em diversos países, após o fim da quarentena. Por lá, autoridades apontam um número crescente de regiões com surtos localizados de covid-19. Em razão disso, governantes locais pediram mais cautela aos cidadãos.

Em meio à flexibilização da quarentena no Brasil, a microbiologista Natalia Pasternak, pesquisadora do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de São Paulo (USP), considera que muitas pessoas "não entenderam que a pandemia continua no seu auge no país".

O país já registrou mais de 95 mil mortes por covid-19 e quase 3 milhões de casos. Apesar disso, cenas de pessoas que vivem como se nada estivesse acontecendo são frequentes. Em locais reabertos, há constantes situações de clientes sem máscaras ou sem adotar o distanciamento social, de ao menos 1,5 metro.

"As coisas não podem ser reabertas e parecer que liberou geral", critica Pasternak.

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A flexibilização

A OMS recomenda que uma região só flexibilize o isolamento social quando os casos se tornam esporádicos e concentrados em algumas localidades, em um nível que não sobrecarregue o sistema de saúde.

A entidade também aponta que esse afrouxamento da quarentena deve ser acompanhado de testes em massa para identificar os casos, isolá-los, tratá-los e monitorar os pacientes positivos e as pessoas com quem tiveram contato.

Ainda segundo a OMS, é recomendável que antes de flexibilizar o isolamento a região consiga proteger os mais vulneráveis a surtos, como em favelas, onde há grande concentração de pessoas em espaços pequenos.

A organização também orienta que sejam tomadas medidas para evitar transmissão do vírus em locais de trabalho e que a população seja conscientizada da importância de combater a pandemia.

Um dos principais critérios apontados por especialistas para que a reabertura de uma região aconteça com segurança é avaliar a taxa de reprodução do coronavírus, ou Rt, que deve ser menor que 1 — o número indica quantas pessoas podem ser contaminadas por quem está com o vírus.

Quando essa taxa é maior que um, significa que o infectado pode transmitir o vírus para mais de uma pessoa. Assim, representa que o número de casos pode aumentar exponencialmente. Muitos países esperaram esse índice ficar abaixo de um, indicando assim desaceleração de novos casos, para afrouxar as medidas de isolamento.

De acordo com o Imperial College, de Londres, a taxa atual de reprodução do vírus no Brasil é de 1,08, índice que representa que a transmissão continua descontrolada no país — há mais de três meses, esse número é superior a 1.

Mesmo sem seguir adequadamente as recomendações da OMS para reabertura da economia e com a taxa de reprodução do vírus acima de 1, diversos Estados brasileiros têm flexibilizado o isolamento social.

Em virtude da dimensão do Brasil, especialistas apontam que é difícil que haja uma mesma medida para todos os lugares. Desta forma, recomendam que cada autoridade local defina o melhor momento para a reabertura, com base em critérios como análise da curva de casos e mortes na região e a quantidade de leitos disponíveis em hospitais.

'A cooperação das pessoas é fundamental'

Mesmo com país batendo constantes recordes de novos casos e com média de mais de mil mortes diárias, diversas regiões estão reabrindo estabelecimentos
Para Natalia Pasternak, que é presidente do instituto de divulgação científica Questão de Ciência, uma das grandes dificuldades no Brasil é que muitas pessoas não perceberam que são as principais responsáveis pelo controle da epidemia.

"A cooperação de todos é fundamental. É preciso haver engajamento, porque o vírus não circula sozinho. Ele circula com as pessoas."

"Tenho a impressão de que até hoje não conseguimos comunicar para as pessoas, de forma efetiva, que elas fazem parte da solução e que o comportamento delas vai dizer quando isso acaba", acrescenta.

A especialista pontua que a flexibilização no Brasil ocorre após baixa adesão da quarentena no país e grande pressão econômica para a reabertura dos estabelecimentos.

"Decidiram flexibilizar muito mais pela exaustão de uma quarentena mal feita. Esse não é um fator ideal. Se fosse uma quarentena feita corretamente, com grande adesão, agora poderíamos estar reabrindo com mais segurança", explica.

"Foi tudo difícil desde o começo. Nunca tivemos muito apoio da população para uma boa quarentena", declara.

"Muita gente pensou que achatar a curva significaria que todos iriam contrair o vírus em algum momento e a pandemia aconteceria mais devagar, porém duraria para sempre. Mas não é verdade. A quarentena funciona, porque impede que o vírus encontre mais pessoas suscetíveis até reduzir a taxa de transmissão."

Uma das grandes dificuldades para comunicar sobre a importância da quarentena, aponta Pasternak, foi causada pelo presidente Jair Bolsonaro, que por diversas vezes questionou os riscos da pandemia e foi contra o isolamento social.

"Se ele fosse uma pessoa sensata, poderia estar coordenando nacionalmente as diretrizes para reabertura (da economia) com segurança. Mas ele não é sensato, é a primeira pessoa a fazer bagunça com as informações. Não temos diretrizes do Governo Federal, que poderia colaborar no atual momento. Sequer temos um ministro da Saúde", diz — atualmente, o Ministério da Saúde é comandado pelo general Eduardo Pazuello, ministro interino.

As consequências da flexibilização com mais de mil mortes diárias
Pasternak ressalta que a flexibilização da quarentena precisa ocorrer com segurança, com as pessoas usando máscaras e adotando o distanciamento físico, sem aglomerações.

"Mas não é o que está acontecendo em muitos locais. Falta entendimento para muitas pessoas, que se aglomeram em locais que não tinha necessidade de ir neste momento, como em lojas ou shoppings."

Ela destaca que, com a reabertura da economia, o transporte público também fica cheio. "As pessoas precisam trabalhar e não é possível pedir isolamento nos ônibus ou metrôs. É uma situação que demonstra a falta de comunicação e logística nessa pandemia", diz.

A cientista não descarta que a flexibilização da quarentena cause uma segunda onda, nos locais em que os casos de coronavírus estabilizaram ou diminuíram, ou piore a situação de lugares que enfrentam a primeira onda de Sars-Cov-2.

"É difícil prever. Mas pode, sim, acontecer uma segunda onda bastante elevada ou piorar a atual situação de alguns lugares, pois estamos relaxando as medidas além do razoável. As pessoas estão se aglomerando em um período que o vírus ainda está em grande circulação", diz.

"O Brasil é muito grande. Há locais que já saíram da primeira onda, como Manaus e São Paulo, mas em outras regiões, como no Sul e no Centro-Oeste, os casos estão aumentando agora. Por conta do tamanho do país, as regiões serão atingidas em tempos e intensidades diferentes", explica Pasternak.

O aumento de casos após a reabertura de uma região é natural, segundo Pasternak. "O vírus não foi a lugar nenhum e dificilmente vai ser erradicado. O que temos que fazer é controlar a transmissão dele, vigiar e controlar novos casos e surtos que podem se tornar novos focos da epidemia", declara.

"Por isso, o ideal é que a reabertura aconteça somente quando a taxa de transmissão do vírus estiver abaixo de um. Somente assim, cada vez menos haverá pessoas suscetíveis a infectar os outros", afirma a cientista.

A especialista frisa que a decisão de reabertura de uma cidade tem que ser tomada por uma equipe multidisciplinar, que inclui diversos especialistas da área da saúde, e não pode se restringir a atender os interesses da economia.

"É preciso avaliar se os números, ao menos, estão caindo com frequência. Também é necessário analisar a capacidade de leitos de UTI nos hospitais da região. Tudo isso precisa influenciar a decisão de um gestor", detalha a cientista.

Restaurante vazio em área turística de Barcelona; na Europa, países que encerraram a quarentena viram casos aumentarem em alguns locais e lançaram alertas para a população
"Acredito que os gestores são pressionados por vários setores da economia, que estão atuando no desespero. Claro que a economia foi prejudicada. Mas é preciso que um comitê interdisciplinar avalie essa situação. Abrir com segurança é o que todos queremos. Ninguém aguenta mais ficar em casa, mas é preciso avaliar corretamente e tomar os cuidados necessários", ressalta.

Ela considera, por exemplo, que é equivocado reabrir estabelecimentos como bares, restaurantes e academias em regiões que enfrentam alta de casos de covid-19.

"Nenhum gestor vai reabrir imaginando que aquilo vai prejudicar a população. Mas isso é falta de compreensão da gravidade, é acreditar que a situação já está melhorando mesmo com os números crescendo. São apostas ruins, que confundem esperança com realidade", declara a especialista.

'Quarentena não é castigo'

Pasternak afirma que a quarentena não pode ser vista como um castigo. "Ela deve ser colaborativa, as pessoas precisam se sentir parte da solução e não pensar que estão sendo proibidas de algo. É preciso que todos tenham essa consciência, para que possamos nos sair da melhor forma", declara.

Ela lamenta o fato de que muitas pessoas não entenderam a importância da quarentena no Brasil. "Não conseguimos uma adesão maciça, uma quarentena com 70% da população, por conta dessa dificuldade de comunicação com a sociedade. Ao falharmos nisso, ficamos nessa quarentena meia-boca. E, assim, as pessoas engajadas sentem que estão se sacrificando à toa."

Um estudo feito no Brasil, publicado recentemente pela revista Science, apontou que o país não tem, atualmente, medidas suficientes em vigor para conter a disseminação do novo coronavírus.

O estudo revelou que, apesar de insuficiente para conter a expansão do coronavírus, o fechamento do comércio e de escolas em São Paulo e no Rio de Janeiro após o início da pandemia reduziu a taxa de transmissão do vírus para até um terço do identificado antes das medidas.

Os cientistas que participaram do estudo afirmaram que existe a necessidade urgente de que o Brasil adote medidas como testagem em massa, mapeamento de contatos entre pessoas contaminadas e alternativas de distanciamento social.

"Até vacinas e medicamentos estarem disponíveis, as medidas sociais de distanciamento são essenciais para reduzir o número de infecções e salvar vidas", disse o cientista Nuno Rodrigues Faria, professor do Imperial College e da Universidade Oxford e um dos autores do estudo, em entrevista à BBC News Brasil no mês passado.

Para Pasternak, ainda há tempo para que as pessoas entendam a importância de adotar medidas para se proteger do novo coronavírus.

"A gente precisa encontrar maneiras de fazer as pessoas entenderem a necessidade do isolamento social, de usar as máscaras quando saem nas ruas e do distanciamento. Se não fizermos isso, vamos continuar com essa quarentena pela metade e esse platô no alto, com muitas mortes e novos casos por dia", afirma a especialista.

Fonte: Vinícius Lemos - @oviniciuslemos, 
da BBC News Brasil em São Paulo

quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Brasil registra 57.152 novos casos e mais 1.437 mortes pela covid-19

Até o momento, 2.859.073 pessoas foram infectadas e 97.256 morreram em razão da pandemia

O Brasil registrou 57.152 novos casos de covid-19 e 1.437 mortes pela doença nesta quarta-feira (05/08) e se aproxima dos 3 milhões de infectados e 100 mil óbitos. Até o momento, 2.859.073 pessoas foram infectadas e 97.256 morreram em razão da pandemia. Se, por um lado, não há previsão para que o país se veja livre do vírus, com taxas de transmissão com nível descontrolado, a boa notícia é que mais de 2 milhões de brasileiros que contraíram o vírus e tiveram o diagnóstico confirmado estão curados da doença. 

A porcentagem de recuperados está em 70,7%, atualmente. Nas últimas semanas houve um aumento nesses índices e os técnicos atribuem essa melhora aos esforços dos profissionais da saúde aliado ao aumento do número de testagens, detectando casos menos graves e ainda nos primeiros estágios da contaminação. 

No entanto, a situação da doença no Brasil está longe de ser controlada. Próximo de atingir a marca de 100 mil mortes pela doença, o país tem 20 estados e o Distrito Federal com mais de mil óbitos pelo novo coronavírus. Somente seis UF’s ficaram de fora da lista e têm menos de mil vítimas da covid-19: Rondônia (918), Amapá (588), Acre (547), Roraima (532), Mato Grosso do Sul (442) e Tocantins (415).

Quem lidera o ranking brasileiro é São Paulo, com 24.109 óbitos pelo novo coronavírus. O Rio de Janeiro é o segundo com mais fatalidades, com 13.855 vítimas da doença. Os dois são os únicos estados que têm mais de 10 mil mortes. 

Em seguida estão: Ceará (7.867), Pernambuco (6.758), Pará (5.818), Bahia (3.736), Amazonas (3.317), Minas Gerais (3.195), Maranhão (3.103), Espírito Santo (2.646), Paraná (2.164), Rio Grande do Sul (2.163),  Mato Grosso (1.945), Rio Grande do Norte (1.933), Paraíba (1.922), Goiás (1.830), Alagoas (1.633), Distrito Federal (1.572), Sergipe (1.525), Piauí (1.417) e Santa Catarina (1.306).

Quase todos os municípios do país já registraram casos e só 67 cidades ainda não têm nem um caso confirmado dentro dos próprios limites. Já quando se avalia as cidades que já confirmaram mortes, esse número é menor. “Temos 3.627 cidades com óbitos, sendo que 1.523 identificaram um óbitos na última semana. A grande maioria têm registros de um a 10 óbitos”, declarou o secretário de Vigilância em Saúde, Arnaldo Correia.

O secretário voltou a associar os fatores sazonais com comportamento da covid-19 no Brasil, ao avaliar as hospitalizações e óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) confirmados para covid. “No início, quando lá na região Norte, Nordeste você tinha um nível de hospitalização muito alto e no Sul, muito baixo, agora, devido a sazonalidade, você tem muito mais hospitalização e número de óbitos na região Sul do que no Norte e Nordeste do país.”

Uma curva mais homogênea ao longo do enfrentamento da pandemia é observada da região Sudeste. Segundo o secretário, esse cenário se dá em razão de dois fatores: “o período sazonal nas 24ª e 25ª semanas, e, mais no início, uma relação com os estados de São Paulo e Rio de Janeiro, onde se deu o início da pandemia.”

Fonte: Correio Braziliense

STJ mantém suspenso pagamento de R$ 34 milhões a magistrados do Piauí

Não se defere pagamento de verba de natureza pecuniária por mandado de segurança antes do trânsito em julgado da ação que a discute. A medida viola severamente a ordem e a economia públicas e cria risco de que eventual decisão contrária se torne inócua tendo em vista a possível aplicação da teoria do fato consumado e do recebimento de boa-fé em razão de decisão judicial.

Com esse entendimento, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça manteve a suspensão de segurança concedida monocraticamente pelo presidente, ministro João Otávio de Noronha, quanto ao pagamento de benefícios a magistrados do Piauí. Os valores poderiam chegar a R$ 34 milhões.

O caso discute o pagamento da diferença da parcela autônoma de equivalência salarial (PAES) aos magistrados ou sucessores piauienses que tenham passado à inatividade ou falecido antes de setembro de 1994. Há decisão administrativa que entende devido o recebimento desses valores.

O que se seguiu foi série de liminares. Em decisão administrativa cautelar, o presidente do Tribunal de Justiça do Piauí suspendeu o pagamento. A Associação dos Magistrados Piauienses, parte interessada, impetrou mandado de segurança para anular essa decisão, e assim conseguiu.

Em dezembro de 2018, o ministro João Otávio de Noronha apreciou o pedido de contracautela, derrubando novamente o pagamento, decisão confirmada por unanimidade nesta quarta-feira (5/8) pela Corte Especial. 

Destacou que a medida liminar deferida implica em pagamento a servidores públicos, o que é vedado pela legislação e, consequentemente, fere severamente a ordem pública. 

“A fração que tal quantia representa diante do orçamento do Tribunal de Justiça do Piauí não elide a relevância do valor, que é a grave lesão identificada. Isso não é o modo correto. Isso tem exposto a magistratura. Muito. Acredito que cabe discutir, transitar em julgado, e aí se paga. Não por liminares”, concluiu o ministro.

Fonte: Consultor Jurídico / Por Danilo Vital

Em reunião, Bolsonaro afirmou que enviaria tropas ao STF, diz revista

Presidente teria dito a ministros, durante encontro no Planalto, em meio, que decidiu intervir na suprema corte para ''restaurar sua autoridade''

Durante uma reunião realizada no Palácio do Planalto, em 22 de maio, com parte da equipe ministerial, o presidente Jair Bolsonaro chegou a dizer que iria enviar tropas para "intervir" no Supremo Tribunal Federal (STF), de acordo com a revista Piauí.

A publicação traz detalhes do encontro, que teria contado com a presença do ministro-chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos e do general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

De fato, a agenda do presidente, divulgada oficialmente pelo Planalto, registra um encontro entre o presidente e os três ministros militares. De acordo com a reportagem, logo no começo do encontro, o chefe do Executivo deixou claro a intenção. "Vou intervir!", disse.

As declarações, teriam assustado Heleno, que foi o último a chegar na sala. No entanto, Ramos teria visto a ideia com bons olhos, para "recuperar a autoridade do presidente". Bolsonaro estava irritado com uma decisão do ministro Celso de Mello, do Supremo, que havia encaminhado à Procuradoria Geral da República (PGR) três notícias-crime apresentadas por partidos políticos.

Desistência
 
Entre as solicitações, estava a que pedia a busca e apreensão do celular de Bolsonaro. O presidente teria desistido por intervenção de Heleno, que teria dito que "ainda não é o momento" de uma investida autoritária. Outro fato que teria pesado, é o fato da ausência de argumento legal contundente para explicar o ato autoritário.

Na tarde do mesmo dia, uma sexta-feira, Heleno divulgou uma nota pública, que incendiou o meio político. “O Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República alerta as autoridades constituídas que tal atitude é uma evidente tentativa de comprometer a harmonia entre os poderes e poderá ter consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional.”, escreveu Heleno.

Ditadura
 
Dias depois do presidente ser dissuadido da ideia de atentar contra a democracia, o ministro Celso de Mello repassou, a contatos próximos, um texto que alertava sobre a escalada do autoritarismo e do risco do Brasil ter que novamente enfrentar uma ditadura.

"Guardadas as devidas proporções, o 'ovo da serpente', à semelhança do que ocorreu na República de Weimar (1919-1933) , parece estar prestes a eclodir no Brasil", teria escrito Celso de Mello. Em trecho seguinte, o decano, ministro mais antigo e respeitado da Corte, afirmou que é necessário resistir a derrocada da democracia.

"É preciso resistir à destruição da ordem democrática, para evitar o que ocorreu na República de Weimar quando Hitler, após eleito por voto popular e posteriormente nomeado pelo presidente Paul von Hindenburg, em 30/01/1933, como chanceler (primeiro ministro) da Alemanha (Reichskanzler), não hesitou em romper e em nulificar a progressista, democrática e inovadora Constituição de Weimar, impondo ao país um sistema totalitário de poder viabilizado pela edição, em março de 1933 , da lei (nazista) de concessão de plenos poderes (ou lei habilitante) que lhe permitiu legislar sem a intervenção do Parlamento germânico", escreveu Celso de Mello.

Na ocasião, fontes procuradas pelo Correio, junto ao Supremo, informaram que o texto repassado por Mello não foi enviado a todos os demais ministros, e que teve como alvo pessoas próximas e de confiança do decano.

A intenção, seria. de acordo com as fontes, que foram consultadas novamente nesta quarta-feira (5/8), alertar sobre os riscos para a democracia. Mas a recomendação seria evitar alarde e tentar criar uma reação por parte das instituições sem gerar caos social — cenário favorável aos apoiadores da ruptura constitucional.

Fonte: Correio Braziliense / Renato Souza
postado em 05/08/2020 13:19

O que se sabe sobre a megaexplosão em Beirute

Uma explosão, seguida de incêndios e outras explosões menores até a devastadora detonação final. Catástrofe equivale a terremoto de 3,3 na escala Richter e foi sentida até em Chipre. Mas muitas perguntas estão em aberto.

Imagem aérea da zona portuária de Beirute completamente destruída
    
Imagem aérea da zona portuária de Beirute completamente destruída
Área próxima ao porto de Beirute completamente destruída de decorrência à explosão devastadora de terça-feira (04/08)

Uma explosão seguida de um segundo estouro devastador atingiu fortemente Beirute. A causa da detonação devastadora parece esclarecida, mas não o gatilho. Muitas perguntas ainda estão em aberto. Enquanto isso aumenta o número de vítimas. Confira o que se sabe sobre as explosões.

O que aconteceu?

Por volta das 18 horas (horário local) da terça-feira, houve uma explosão na área portuária da capital libanesa. Seguiu-se um incêndio e algumas pequenas explosões, que culminaram numa detonação maciça e sua consequente onda de choque.

Ao menos 100 pessoas morreram e mais de quatro mil ficaram feridas, segundo relato da Cruz Vermelha divulgado nesta quarta-feira (05/08).

O primeiro-ministro do Líbano, Hassan Diab, afirmou ainda na terça-feira que 2.750 toneladas de nitrato de amônio apreendido haviam explodido. O material ficou armazenado num armazém por seis anos sem as devidas precauções. Há especulações que se trata da carga de um navio que estava a caminho da Geórgia para Moçambique. No entanto, existem declarações distintas sobre o motivo pelo qual a carga foi confiscada.

Segundo a revista alemã Der Spiegel, as autoridades libanesas teriam proibido o navio cargueiro de continuar viagem em 2013 devido a vários defeitos. A tripulação ficou sem combustível e provisões, e o proprietário aparentemente abandonou o navio. A tripulação foi autorizada a deixar o Líbano após uma disputa jurídica. O navio foi deixado em Beirute com a carga, que foi alojada num armazém.

Uma enorme nuvem em forma de cogumelo se formou no céu durante a detonação. Uma onda de choque se expandiu rapidamente pela cidade. Houve danos a quilômetros de distância. No porto de Beirute, os contêineres ficaram amassados como latinhas de sardinhas, com o conteúdo espalhado pelo chão.

Houve focos de incêndio em navios, carros ficaram carbonizados. Nas ruas circundantes, vidraças e vitrines ficaram destruídas. Uma enorme fumaça pairou sobre toda a área do porto. Mesmo horas após as explosões, helicópteros circulavam a área para combater as chamas. Equipes de resgate vasculharam os escombros durante a noite em busca de mortos e feridos.

Em discurso à nação, Diab prometeu que os responsáveis pelo desastre "pagariam por isso". Ele não mencionou a origem da primeira explosão, também não num segundo breve discurso televisionado nesta quarta-feira.

Equipe de resgate encontra sobrevivente sob escombros de explosões em Beirute

Equipe de resgate encontra sobrevivente sob escombros de explosões em Beirute
Socorristas encontram sobrevivente, nesta quarta-feira (05/08), sob os escombros da devastadora explosão em Beirute

Para que é utilizado o nitrato de amônio?

O nitrato de amônio é um sal inodoro formado a partir de amônia e ácido nítrico, bastante utilizado na agricultura, para a produção de fertilizantes, e na construção, para explosivos.

Como poderia pegar fogo?

Ainda não está claro por que o nitrato de amônio explodiu. O professor de química Jimmie Oxley, da Universidade de Rhode Island, disse à agência de notícias AFP que o nitrato de amônio é difícil de inflamar sob condições normais de armazenamento e a temperaturas moderadas. Ele suspeita que houve uma pequena explosão que iniciou a reação química do nitrato de amônio.

Especialistas em explosões e substâncias explosivas analisaram gravações em vídeo para a agência de notícias AP. Segundo eles, a primeira detonação e os incêndios menores podem estar relacionados à queima de fogos de artifício.

Em casos normais, o nitrato de amônio é armazenado sob condições estritas: o produto químico não deve estar perto de combustíveis ou fontes de calor. Em muitos países da União Europeia (UE), o nitrato de amônio precisa ser misturado à cal por motivos de segurança. A substância levou a numerosas explosões perigosas no último século – desde acidentes, ataques industriais e atentados.

Em setembro de 1921, a explosão de nitrato de amônio numa fábrica da Basf, na cidade alemã de Ludwigshafen, resultou na morte de mais de 500 pessoas. A bomba fabricada para o atentado de Oklahoma, em 1995, também continha a substância. E o extremista de direita norueguês Anders Breivik também usou o componente químico no carro-bomba detonado em Oslo, em julho de 2011.

Poderia ter sido um atentado?

Não há evidencia pública das autoridades libanesas de que a explosão foi deliberada. Na noite de terça-feira, o presidente dos EUA, Donald Trump, disse que generais americanos informaram que as explosões foram aparentemente causadas por "algum tipo de bomba". "Parece um ataque terrível", disse Trump.

Quando questionado sobre as declarações de Trump, um porta-voz do Pentágono retrucou à AFP: "Não temos nada para você. Você precisa entrar em contato com a Casa Branca para obter esclarecimentos".

Libanon Explosion in Beirut

Presidente do Líbano, Michel Aoun (2º da esq. à dir.) visitou o local das explosões em Beirute, nesta quarta-feira (05/08)

Como está a situação em Beirute?

O governador da província de Beirute, Marwan Abboud, disse que entre 250 mil e 300 mil pessoas perderam suas casas. Segundo Abboud, um relatório de segurança alertou em 2014 para uma possível explosão em Beirute porque materiais altamente explosivos não estariam armazenados corretamente.

As equipes de resgate continuam procurando por vítimas sob os escombros. Durante a noite, uma queda de energia em grandes partes da cidade afetou as buscas. Segundo relatos de autoridades de segurança, ao menos 100 pessoas ainda estão desaparecidas. Vários países ofereceram ajuda e estão enviando equipamentos, especialistas e cães treinados para procurar as vítimas.

Os hospitais de Beirute, que já estavam sobrecarregados devido à epidemia de covid-19, ficaram completamente lotados com a chegada dos numerosos feridos. "É literalmente um desastre" resumiu o ministro da Saúde do Líbano, Hamad Hassan.

Por que os danos são tão grandes?

A explosão principal foi ouvida em todo o país – e também em Nicósia, a capital do Chipre, localizada a 240 quilômetros no Mar do Mediterrâneo. Segundo sismólogos, a explosão equivaleu a um terremoto de magnitude 3,3 na escala Richter. A explosão causou uma onda de choque maciça.

Prédios próximos ao porto desabaram. Até no aeroporto, situado a nove quilômetros de distância, janelas estouraram. Estima-se que a onda de choque teve a força de um tornado. O armazém estava localizado perto de um distrito comercial e de entretenimento.

Fonte: Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas

Os cinco pilares do bolsonarismo


Militarização, suposta vontade do povo, messianismo, hostilidade à ciência e anticomunismo sustentam pensamento da extrema direita no Brasil. Não levar a sério movimento bolsonarista pode ser erro fatal, opina colunista.

  Jair Bolsonaro acena sobre um cavalo  
Jair Bolsonaro acena sobre um cavalo
"Para seus seguidores, Bolsonaro é o salvador da pátria"

É fácil considerar ridículos Bolsonaro e seus seguidores. Eles mesmos vivem dando oportunidade para isso, quando, por exemplo, o presidente celebra um pacote de hidroxocloroquina com seus fãs em frente ao Palácio da Alvorada.

O noticiário sobre Bolsonaro é fortemente influenciado por tais anedotas, negligenciando a metodologia por trás da loucura. Surge a impressão de um louco e seus seguidores aloprados, que não se deve levar a sério. Isso seria um erro fatal.

O bolsonarismo, como a nova extrema direita na Europa e nos Estados Unidos, não caiu do céu, mas tem uma história por trás, tem uma lógica interna e busca seus objetivos. Cinco pilares do pensamento bolsonariano podem ser identificados. Alguns são especificamente brasileiros, outros pertencem ao cerne da mentalidade da nova direita internacional.

1. Militarização

Há mais generais no gabinete de Bolsonaro do que na Venezuela, governada por um regime ditatorial. Atualmente, quase 3 mil militares estão espalhados por ministérios e outros órgãos federais. Os soldados no Brasil estão assumindo cada vez mais tarefas civis, como a construção de estradas ou a proteção da Floresta Amazônica.

O governo também planeja construir cerca de 200 novas escolas militares até 2023. O conteúdo do ensino inclui a alegação de que o golpe de 1964 foi "necessário para impedir o avanço do comunismo".

O professor de Harvard Yascha Mounk, especialista em movimentos populistas, considera "preocupante" a crescente influência dos militares no Brasil.

O fascínio bolsonariano por armas anda de mãos dadas com esse novo militarismo. "Quero um povo armado", disse Bolsonaro, facilitando a aquisição de armas. O resultado: este ano, o número de vendas de armas aumentou 200% em relação a 2019. São as classes média e alta brancas que se armam. Na Venezuela, a militarização da sociedade levou à criação de esquadrões da morte que aterrorizam os oponentes de Nicolás Maduro.

2. Bolsonaro como executor da vontade do povo

Para os seguidores de Bolsonaro, o que ele quer é automaticamente o que os brasileiros querem e vice-versa. Isso tem pouco a ver com democracia, mas já faz beira com o fascismo.

Como Bolsonaro não tem maioria no Congresso, ele está em constante atrito com ele. Por isso, governa quase exclusivamente por decretos.

A frustração daí derivada leva a ataques constantes ao Congresso e ao STF. Os seguidores de Bolsonaro exigem que seu ídolo finalmente governe em paz. Nem Bolsonaro ("Jair Bolsonaro, ganhou, porra! Vamos entender isso!"), nem seus fãs ("58 milhões votaram no Bolsonaro. Quantos votaram no STF?", diz um tuíte) parecem entender o que significa a separação de poderes.

Nisso, Bolsonaro é como seus colegas Erdogan, Putin, Orbán e Trump, que ou desativaram o parlamento e a Justiça ou estão em constante conflito com eles. O professor de Harvard, Steven Levitsky, coautor do best-seller Como morrem as democracias, alerta que a democracia brasileira está em risco porque os constantes ataques às instituições democráticas a enfraquecem enormemente.

3. Messianismo

O bolsonarismo tem um componente pseudo-religioso, expresso no culto de Bolsonaro como o Messias do Brasil. Para seus fãs, de "mito" ele se tornou o "salvador da pátria". Ele mesmo se vê como aquele que "salvou o Brasil do comunismo". Foi por isso que Deus salvou sua vida após o atentado a faca.

Se a ideia for levada mais adiante, significaria que Bolsonaro seria infalível. De fato, até a menor crítica a ele é respondida com uma agressividade que lembra o fundamentalismo religioso. A pessoa recebe então telefonemas, como o autor deste texto, em que o interlocutor é xingado aos gritos. Como alguém se atreve a insultar "nosso presidente". "Bolsonaro salvará o Brasil, seu lixo!"

4. Hostilidade à ciência

A pseudo-religiosidade do bolsonarismo é acompanhada por uma hostilidade à ciência e à razão, que se tornou particularmente clara durante a pandemia de coronavírus. Bolsonaro elogiou a hidroxocloroquina como uma cura milagrosa tal um charlatão medieval. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, afirmou que a pandemia é uma conspiração globalista.

Essa hostilidade à razão já era evidente em 2019, quando dezenas de milhares de incêndios queimaram na Bacia Amazônica, e Bolsonaro chamou os dados do Inpe de "mentiras".

Como todos os novos movimentos de direita, o bolsonarismo também nega as mudanças climáticas – embora estas estejam progredindo a uma velocidade impressionante. Universidades, cientistas, intelectuais e meios de comunicação não devem mais moldar o discurso social. Essa tarefa cabe agora ao suposto senso comum dos bolsonaristas. É então que um inverno frio vira prova de que não há mudanças climáticas.

Linhas complexas de pensamento e diferenciações são algo suspeito para o bolsonarista. Em troca, o movimento oferece a seus discípulos o conforto de uma falsa certeza.

5. Anticomunismo

No dia em que assumiu o cargo, Bolsonaro gritou que o povo havia começado a "se libertar do socialismo". Muitos se perguntaram sobre que socialismo ele estava falando. O Brasil também era um país capitalista sob o PT, onde bancos, grandes corporações e o agronegócio obtiveram enormes lucros.

Para o especialista em literatura João Cezar de Castro Rocha, um livro intitulado Orvil é parcialmente responsável por essa paranoia – "livro" escrito de trás para frente. Escrito pelos militares logo após a redemocratização, a obra descreve como a esquerda do Brasil supostamente se infiltrou nas instituições desde a década de 1970. É a partir disso que o bolsonarismo deriva sua "guerra cultural" contra tudo e contra todos que considera suspeitos. Portanto, o governo destrói de dentro para fora os ministérios e secretarias da Educação, Cultura, Meio Ambiente, Família e seus órgãos vinculados.

Para o bolsonarismo, não importa nem um pouco o quão plausíveis suas alegações são. Jair Bolsonaro prometeu no Piauí, em agosto de 2019, que vai "varrer essa turma vermelha". Nesta semana, foi revelado que ele quer fundar um Centro de Inteligência Nacional na Abin, para combater "ameaças à segurança do Estado".

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Philipp Lichterbeck queria abrir um novo capítulo em sua vida quando se mudou de Berlim para o Rio, em 2012. Desde então, ele colabora com reportagens sobre o Brasil e demais países da América Latina para jornais na Alemanha, Suíça e Austria. Ele viaja frequentemente entre Alemanha, Brasil e outros países do continente americano. Siga-o no Twitter em @Lichterbeck_Rio.

Fonte: Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas. 

terça-feira, 4 de agosto de 2020

Explosões deixam dezenas de mortos em Beirute

   Capital libanesa contabiliza os danos após duas explosões em sequência na região portuária. Impacto foi sentido a quilômetros de distância.

Duas explosões deixaram uma grande nuvem de fumaça no céu de Beirute, no Líbano.

Duas explosões deixaram uma grande nuvem de fumaça no céu de Beirute, no Líbano.

Duas enormes explosões em sequência sacudiram Beirute nesta terça-feira (04/08), deixando dezenas de vítimas. Uma grande nuvem de fumaça no céu da capital do Líbano podia ser vista a quilômetros de distância. Segundo dados do Ministério libanês da Saúde, ao menos 60 pessoas morreram e mais de 3 mil ficaram feridas.

Imagens divulgadas pela imprensa libanesa mostravam pessoas presas em escombros após as explosões ocorridas na região portuária da cidade, cuja origem ainda não foi ainda esclarecida.

A primeira explosão parece ter tido origem num depósito de fogos de artifício. A segunda, muito mais potente, parece ter sido potencializada por um grande de silo de grãos que ficava ao lado depósito. Testemunhas relatam que o impacto das explosões pode ser sentido a quilômetros de distância.

Explosões atingem Beirute

O distrito comercial de Hamra também sofreu danos, com vitrines e fachadas de lojas destruídas e vários automóveis danificados. Alguns bairros sofreram cortes no fornecimento de energia.

O primeiro-ministro libanês, Hassan Diab, afirmou que o país entrará em luto oficial nesta quarta-feira. "Prometo a vocês que esta catástrofe não passará impune. Os responsáveis pagarão por isso", disse Diab, em discurso transmitido pelas emissoras do país. "Os fatos sobre esse perigoso armazém, que está no local desde 2014, serão divulgados. Não vou comprometer a investigações."

O chefe da segurança interna do Líbano, Abbas Ibrahim, disse que uma das explosões ocorreu em um local que abrigava material altamente explosivo confiscado anos atrás pelas autoridades. Ele evitou especular sobre os motivos do incidente. "Não podemos nos antecipar às investigações" afirmou. O presidente Michel Aoun convocou uma reunião de emergência do Conselho Nacional de Defesa.

Relatos na imprensa local afirmam que o ministro libanês do Interior, Mohammed Fahmi, teria confirmado que um depósito do porto de Beirute armazenava nitrato de amônio, material utilizado na fabricação de bombas, que teria sido a causa do incidente. A emissora libanesa Mayadeen citou o diretor nacional de alfândegas do país dizendo que toneladas dessa substância teriam explodido.

O diretor da Cruz Vermelha no Líbano, George Kettaneh, afirmou que centenas de feridos foram levados para os hospitais, mais muitos outros ainda estão presos em edifícios na área mais atingida pela explosão. A emissora libanesa LBCI relatou que o hospital Hotel Dieu tratava mais de 500 feridos, entre os quais, dezenas de pessoas necessitavam de cirurgias. O local já estava no limite de sua capacidade. Os médicos lançaram um apelo por doações de sangue.

As explosões ocorreram em um momento em que o Líbano atravessa a pior crise econômica em décadas, que deixou quase a metade da população na pobreza. A economia entrou em colapso nos úlltimos meses, coma moeda local, a libra libanesa, perdendo cada vez mais valor em relação ao dólar. Várias empresas fecharam no país e o desemprego atinge níveis alarmantes.

O país aguarda para esta sexta-feira o veredito do julgamento dos acusados pelo assassinato do premiê Rafic Hariri, morto em um atentado com um caminhão-bomba em 2005. Quatro supostos membros da grupo fundamentalista xiita Hizbolá são julgados in absentia em um tribunal na Holanda pelo ataque que matou e ex-líder e outras 21 pessoas.

O Líbano ainda vive um acirramento das tensões com o país vizinho Israel, após o governo israelense anunciar que deteve quatro milicianos do Hizbolá que tentavam se infiltrar no país, o que o grupo nega.

Fonte: Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas. 

Brasil passa de 95 mil mortes pela Covid-19; infectados pelo novo coronavírus já somam 2.759.436

O número de mortes pela Covid-19 no Brasil passou de 95 mil, aponta o boletim das 13h do consórcio de veículos de imprensa formado por O GLOBO, Extra, G1, Folha de S.Paulo, UOL e O Estado de S. Paulo nesta terça-feira. Ao todo, são 95.078 óbitos. O total de contágios chegou a 2.759.436 Os números são consolidados a partir das secretarias estaduais de Saúde.

(Pandemia: Casos de coronavírus em presídios crescem mais rápido do que a média nacional e aumentam 134% em um mês)

As estatísticas da pandemia no Brasil são divulgadas três vezes ao dia. O próximo levantamento será divulgado às 20h. A iniciativa dos veículos da mídia foi criada a partir de inconsistências nos dados apresentados pelo Ministério da Saúde na gestão do interino Eduardo Pazuello.

Covid-19:  Aliados nos erros: Na pandemia, Bolsonaro e Trump miram suas bases e pregam descrença na ciência.

Desde o levantamento fechado da última segunda-feira, às 20h, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Roraima atualizaram suas estatísticas. Até o momento, são 7.771 casos de Covid-19 notificados pelas secretarias estaduais de Saúde desde a noite de ontem, além de 376 novas vítimas fatais.

Aos finais de semana, é comum haver um represamento nos números pelas secretarias estaduais em função do expediente reduzido, o que acaba sendo corrigido nos primeiros dias da semana. Normalmente, após uma pequena oscilação, os números voltam a crescer às terças-feiras no balanço fechado, às 20h.

Volta às aulas

A reabertura de escolas à medida que a pandemia de Covid-19 desacelera é algo que pode ser feito com sucesso, mas requer a testagem dos casos suspeitos e o rastreamento da maioria dos contatos dos infectados. Essa é a conclusão de um estudo liderado pela University College de Londres, que busca orientar a operação de retomada das aulas no Reino Unido.

Tempestade perfeita:Coronavírus faz alunos deixarem a rede privada, além de derrubar arrecadação que sustenta a educação pública

Apesar de ter sido ancorado na realidade britânica, o trabalho traçou vários cenários hipotéticos que podem ajudar a orientar os processos de reabertura em outros lugares.

“O relaxamento do distanciamento social no Reino Unido, que inclui a reabertura de escolas, precisa ser acompanhado de testagem de indivíduos sintomáticos e de rastreamento de contatos efetivo em grande escala, seguido de isolamento dos casos infectados”, escreveram os pesquisadores, liderados pela epidemiologista Jasmina Panovska-Griffiths.

Desigualdade

Levantamento inédito feito pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) aponta que foram abertos até junho no Brasil 19.825 novos leitos de UTI exclusivos para tratamento de Covid-19 - 44% deles (8.764) no Sistema Único de Saúde (SUS), e os demais na rede privada. Junto ao acréscimo de leitos, um alerta: a expansão manteve a desigualdade na distribuição de leitos pelo país, tanto geográfica quanto na relação entre sistemas público e privado.

As regiões que já concentravam o maior número de leitos de UTI foram justamente as que mais receberam novas instalações para receber pacientes com Covid-19, mantendo-se o déficit histórico de unidades de tratamento intensivo em vários estados.

Segundo o levantamento, o Sudeste concentra hoje 24.621 (52%) das unidades de terapia intensiva convencionais de todo o país: detém 46% do total de leitos públicos e 59% dos privados. Já o Norte tem a menor proporção: apenas 2.489 (5%) de todos os leitos, sendo 6% dos leitos públicos e 4% dos privados. 

Brasil nos holofotes

Em entrevista ao GLOBO no último domingo, o editor-chefe da revista científica Science, Holden Thorp, afirmou que o fato de o Brasil ter a segunda maior taxa de infecção e mortalidade do mundo, atrelado a elemento sociais e políticos, tornou o país objeto de especial interesse do meio científico.

Thorp, que é químico e foi reitor da Universidade da Carolina do Norte (EUA), traça ainda um paralelo entre a retórica anticiência de lideranças como os presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump, dos Estados Unidos, e os números alarmantes da Covid-19 em seus países.

Vírus avança no Brasil

O mais recente boletim epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde relatou que 5.475 municípios brasileiros, ou 98,2% de todas as cidades do país, têm pelo menos um caso de Covid-19 confirmado.

O documento revela que 134 municípios registraram seus primeiros casos entre a 29ª semana epidemiológica da doença (12 a 18 de julho) e a 30ª (19 a 25 de julho). Os dados são da última quarta-feira, e serão atualizados na semana que vem.

O coronavírus passa por um processo de interiorização no país. Na 13ª semana epidemiológica da pandemia (de 22 a 28 de março), 87% dos casos novos eram oriundos das capitais e regiões metropolitanas. Ao final da 30ª semana epidemiológica, porém, este índice caiu para 42%.

Fonte: O Globo, boletim das 13,00 hs

Onde está Juan Carlos

Segundo imprensa espanhola, rei emérito foi para a República Dominicana
Envolto em denúncias de corrupção, pai do atual monarca, Felipe VI, estaria passando temporada no país caribenho, que não será seu destino final

O rei emérito da Espanha, Juan Carlos I, teria ido para a República Dominicana após abandonar o país ibérico em meio a denúncias de corrupção, afirma a imprensa local. Ao notificar sua decisão na segunda-feira, o ex-chefe de Estado informou que a mudança busca permitir que seu filho, o rei Felipe VI, tenha “tranquilidade e sossego” para ocupar o trono, em uma tentativa de limitar os danos que o escândalo vem causando à monarquia espanhola.

A Coroa não negou ou confirmou o destino final do rei emérito, alvo de investigações iniciadas por promotores suíços e espanhóis sobre supostos fundos em paraísos fiscais. Segundo o jornal La Vanguardia, no entanto, ele teria saído do Palácio de Zarzuela no domingo e ido de carro até Porto, em Portugal, de onde embarcou em um voo para a República Dominicana. O governo dominicano, no entanto, disse não ter conhecimento de sua entrada.

Juan Carlos seria hóspede do magnata do açúcar Pepe Fanjul, um amigo antigo, com quem ficará temporariamente até que decida seu destino final. Fontes ouvidas pelo jornal ABC também afirmam que ele estaria no país caribenho, mas veículos da imprensa portuguesa noticiam que seu destino seria Estoril, balneário de luxo em Cascais, a 25 km de Lisboa. Segundo seu advogado, Juan Carlos continuará “a todo momento” à disposição  da Justiça. De acordo com o jornal El Mundo, Juan Carlos poderia retornar ao país em setembro.

A rainha emérita Sofía, por sua vez, continuará a morar em Zarzuela e a exercer suas obrigações oficiais, segundo fontes ouvidas pelo El País. Apesar de continuar casada com o rei emérito, os dois teriam há anos uma relação distante. No momento, ela passa férias no Palácio de Marivent, em Palma de Mallorca, para onde o rei Felipe, a rainha Letizia e suas filhas viajarão no próximo fim de semana.

O primeiro-ministro Pedro Sánchez, que na segunda já havia dito "respeitar" a decisão do ex-monarca, afirmou em uma entrevista coletiva que não tem informações sobre o seu paradeiro. A saída do rei emérito gerou desavenças no governo de coalizão que o seu Partido Socialista mantém com o Podemos: enquanto o premier defende Juan Carlos, seus aliados caracterizaram a decisão como uma tentativa de fugir da Justiça, comprometendo a monarquia.

— Aqui não estão sendo julgadas instituições, mas pessoas. O rei emérito já deixou claro que está à disposição da Justiça —  disse o primeiro-ministro. — Em tempos como esses, quanto temos uma pandemia que a humanidade não enfrenta há cem anos, a Espanha precisa de estabilidade e instituições robustas.

Paraísos fiscais

Juan Carlos subiu ao trono em 1975 após a morte do general Francisco Franco e era respeitado por seu papel na condução da Espanha da ditadura franquista à democracia. No entanto, sua popularidade caiu nos últimos anos, devido a uma série de escândalos que o levaram a renunciar em 2014.

Seus problemas mais recentes se intensificaram em 2018, quando agentes da Polícia Judiciária suíça chegaram à Espanha para investigar o gerente de fundos Arturo Fasana. Foram encontradas duas fundações com contas bancárias na Suíça. A primeira era a Zagatka, firma sediada em Liechtenstein que pertence a Álvaro de Orleans, primo distante do rei emérito, que pagou voos particulares de Juan Carlos I e Corinna Larsen, uma empresária alemã que seria sua amante. A segunda era a fundação panamenha Lucum, cujo primeiro beneficiário era Juan Carlos I e o segundo, Felipe VI.

Quando a notícia foi divulgada em março de 2020, Felipe anunciou que abriria mão da herança de seu pai. Na Casa Real, foi tomada a decisão de informar o governo e registrar em cartório a renúncia a qualquer dinheiro dessas contas no exterior. Pouco depois, os quase 200 mil euros (R$ 1,2 milhão) anuais que Juan Carlos recebia da Coroa também foram suspensos.

Entenda: Em meio à crise do coronavírus, rei da Espanha se vê envolvido em escândalo financeiro

A investigação suíça revelou que Fasana depositou na conta da Lucum no banco privado Mirabaud US$ 100 milhões (64,8 milhões de euros na época) vindos do Ministério das Finanças da Arábia Saudita. Quatro anos depois, o dinheiro foi transferido por ordem do então rei para uma conta em Nassau (Bahamas), no banco Gonet & Cie, em nome da empresa Solare, de Corinna. O promotor Bertossa embargou as contas dos suspeitos e abriu um processo secreto de lavagem de dinheiro contra os envolvidos.

O rei emérito não é alvo de processos formais na Suíça ou na Espanha e, no início de junho, foi decidido que a Promotoria do Supremo Tribunal espanhol assumirá o caso para determinar se há indícios de que Juan Carlos cometeu algum crime após sair do trono, quando perdeu sua imunidade. Os investigadores trabalham principalmente com suspeitas de lavagem de dinheiro e crime fiscal.

Fonte: O Globo e El País
04/08/2020 - 09:15 / Atualizado em 04/08/2020 - 15,31

Rei da Espanha recusa herança do pai

O Rei da Espanha, Felipe VI, renunciou a toda e qualquer herança a que tivesse direito da parte do seu pai, Don Juan Carlos I, o Rei Emérito, de 82 anos, que auto-exilou-se, de forma provisória,  na República Domicana, em meio a investigações do ministério público de que teria recebido comissões supostamente ilegais do Rei Abdallah, da Arábia Saudita, quando depois de ter abdicado ao Trono, esteve no país árabe intermediando interesses privados.

O ex-Chefe de Estado espanhol  havia anunciado ontem, dia 03, segunda feira, sua decisão de deixar o País como melhor forma de ajudar o seu filho, o Rei Felipe VI, no "exercicio de suas responsabilidades". Ele não quer que o alarido público recriminando a sua conduta contaminem  o grande prestigio e a autoridade real do atual Monarca. 

O Tribunal Supremo espanhol anunciou em junho uma investigação sobre os casos e os possíveis crimes do monarca, mas apenas os que lhe são atribuidos a partir de 2014, quando perdeu sua imunidade com a abdicação.

As suspeitas se concentram na comissão de 100 milhões de dólares (85 milhões de euros) que teria recebido secretamente do rei Abdallah, da Arábia Saudita, em uma conta do Swiss bank em 2008.

Importante papel na transição

Juan Carlos de Bourbon e Bourbon foi rei da Espanha sob o nome de Juan Carlos I durante 39 anos, um dos reinados mais longos da história, desde que foi proclamado em novembro de 1975.

O rei nasceu em Roma no dia 5 de janeiro de 1938. Após passar sua infância na Itália, Suíça e Portugal, em 9 de novembro de 1948 pisou pela primeira vez na Espanha, onde fixou sua residência, afastado de sua família. Em 1969, por proposta do general Francisco Franco, foi designado como seu sucessor na chefia de estado, com o título de rei.

Com a morte do ditador, teve um papel chave no processo de redemocratização e impediu um novo golpe de estado, fomentado pela guarda civil espanhola.

Imagem abalada

O rei emérito teve grande popularidade durante décadas por seu papel durante a transição espanhola, mas nos últimos anos sua imagem perdeu força por causa de vários escândalos antes de sua abdicação.

Em 2012, ele quebrou o quadril em uma caçada em Botswana durante um safári de luxo pago por um empresário saudita. Ele estava acompanhado da ex-amante Corinna Larsen, em meio à crise econômica na Espanha.

Após o episódio polêmico houve o escândalo de corrupção que levou seu genro Iñaki Urdangarin à prisão. Em um gesto sem precedentes, dom Juan Carlos pediu no dia 18 de abril de 2012 desculpas publicamente: "Sinto muito; me equivoquei e não voltará a acontecer".

Com sua reputação prejudicada, Juan Carlos cedeu a coroa ao filho em 2014. Veja o vídeo abaixo:
Juan Carlo se aposentou da vida pública em 2019.

Da redação do blog com informações do G1 / O Globo

"Democratice’ e democracia

Armas não podem ficar em mãos de pessoas perigosas e as redes de fake news são isso: armas. Em artigo n' O Estado de São Paulo hoje,  Eliane Cantanhede analisa o tema que segue na pauta, a despeito da opinião radicalmente contrária de alguns "democratas" baseados em Brasília.

Levante a mão quem nunca teve de desmentir as fake news mais absurdas, até grotescas, em grupos de família, amigos, às vezes até de trabalho? De repente, do nada, aquela pessoa que convive com você há anos, que parece (ou parecia) razoável, antenada e inteligente, passa a compartilhar mentiras tão primárias e sem nexo que qualquer um deveria jogar automaticamente no lixo. É como lavagem cerebral, crença religiosa, negação da verdade. A pessoa perde a racionalidade e entra no vale-tudo a favor do seu mito e contra os adversários desse mito.

As redes de fake news atingiram uma audácia inaceitável, apesar de não terem começado com os Bolsonaros – porque o PT também era craque nisso no poder – nem serem exclusivas do Brasil – porque a eleição de Donald Trump nos EUA e a vitória do Brexit no Reino Unido são exemplos de como a internet é usada para transformar mentira em verdade. Se impacta tão decisivamente a vida, o voto e as eleições, pode mudar o mundo. E para pior. Depende de quem tenha mais dinheiro, recursos tecnológicos e falta de escrúpulos.

Assim como é fundamental distinguir “democratice” de democracia, é preciso evitar a confusão entre liberdade de expressão e de opinião, de um lado, e agressão e mentira, de outro. Não uma mentirinha inocente, mas uma arma feroz contra a verdade e a realidade, para propaganda enganosa, destruição de biografias e até ameaça à segurança física de cidadãos e autoridades. Armas, de qualquer espécie, não podem ficar em mãos de pessoas perigosas, de instinto criminoso.

Uma coisa é censura, proibir a opinião, a livre manifestação. Outra é o ministro do Supremo Alexandre de Moraes bloquear contas usadas como armas para espalhar o ódio, criar realidades paralelas, confundir incautos, destruir reputações, disparar injúria, calúnia, difamação e até convocação para estuprarem filhas de ministros do Supremo. Moraes não concluiu nada disso da cabeça dele, mas, sim, com provas concretas, cópias de mensagens e dados sobre contas reais e inventadas, inclusive levantados pelo próprio Facebook.

Alvo de um furioso ataque em massa e acusado criminosamente até de pedófilo pelas redes que são alvo de Alexandre de Moraes, o youtuber Felipe Neto deu uma entrevista à GloboNews, no domingo, condenando o “momento de validação do negacionismo e do obscurantismo” e comparando os autores desse tipo de ataque a “ratos que saíram do esgoto, de forma violenta e grotesca”. E ele também fez questão de destacar: “Não estou falando de opiniões divergentes, sim de negacionistas científicos, péssimos revisionistas históricos, pessoas que intencionalmente deturpam, manipulam e negam o que a ciência diz”.

O bom da história é que, como no mundo todo, o Brasil também debate intensamente a liberdade de expressão e a internet, na mídia, na sociedade, no Congresso e no Supremo, que, aliás, tem um segundo semestre bem animado pela frente. Um semestre que começou ontem, com o ministro Edson Fachin suspendendo o compartilhamento de dados da Lava Jato com a Procuradoria-Geral da República (PGR). A decisão confirma o que previmos aqui: os absurdos do governo Bolsonaro uniram o Supremo, os ataques à Lava Jato vão desunir.

E é assim, desunida e com pauta quente, que a Corte vai se posicionar quanto ao falso dilema entre fake news e liberdade de expressão, além de passar por uma dança de cadeiras. Em setembro, a presidência vai de Dias Toffoli, tido como ministro mais próximo de Bolsonaro, para Luiz Fux, considerado o mais suscetível às pressões da opinião pública. E, em novembro, sai o supertécnico Celso de Mello e entra o primeiro ministro da lavra de Bolsonaro. Só “terrivelmente evangélico” ou também terrivelmente bolsonarista?

segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Estranho liberalismo

Nova CPMF seria para financiar o Renda Brasil e aumentar a chance de reeleição de Bolsonaro, opina Denis Lerrer Rosenfield, professor de filosofia na UF-RGS, neste artigo publicado hoje pelo jornal O Estado de S.Paulo
 
O assim chamado projeto de reforma tributária do governo federal é assaz estranho. Tardou 18 meses para ser apresentado, pois, da forma que foi feito, poderia ter sido entregue na segunda semana do mandato, em fevereiro de 2019. Com um pouco de preguiça, na quarta! Foi enviada à Câmara dos Deputados, com pompa e entrega pessoal, uma simples unificação do PIS e da Cofins, quando nessa Casa e no Senado tramitam duas PECs que, além de contemplarem esses pontos, são muito mais completas e abrangentes. Já há toda uma discussão em curso, comissão mista, relator, conversas avançadas com os secretários estaduais da Fazenda para incluir no projeto o ICMS, e assim por diante. Não faz o menor sentido o governo entrar em cena somente agora, salvo se a razão for política, e não econômica. 

Tendo perdido protagonismo, ele tenta resgatá-lo. Seu risco consistia e consiste em ser deixado de lado, tornando-se mero ator coadjuvante, sem maior relevância. Foi ressentida uma necessidade de exposição política, veiculando a seguinte mensagem: também faço parte do jogo! Entrando como novo ator, criou toda uma encenação relativa a fatiamento, tentando embaralhar o debate. 

As falhas negociais são gritantes, porque a primeira etapa pressupõe as demais, com a alegação de que algo não contemplado neste momento o será depois, sem que se saiba se haverá depois ou, caso exista, qual será sua proposta. Não dá para confiar. Os diferentes agentes econômicos e sociais ficam literalmente pisando em falso, alguns com medo de ter seus interesses contrariados se disserem algo antes do tempo, sem que se vislumbre, porém, o próprio tempo! Em vez de entrar numa discussão séria, aproveitando os projetos existentes, o governo optou pela desorientação. 

Houve um antecedente esclarecedor, que já prenunciava o que estava por vir. Quando da negociação do Fundeb, na última hora o governo tentou emplacar a transferência de parte dos recursos, voltados para a educação básica, para o Renda Brasil. Dessa maneira traria para si uma bandeira, preparando o caminho para seu próprio projeto político, dando-lhe visibilidade e apresentando uma justificativa social. 

No fatiamento, ficaram por enquanto de fora o aumento do Imposto de Renda da Pessoa Física, incidindo sobre os rendimentos mais elevados, tributação de heranças e dividendos, renúncias com o intuito de maior justiça social, questões essas, aliás, já presentes nas PECs em tramitação. Em seu lugar reaparece uma ideia que mais parece obsessão: a recriação da CPMF. Parece que apenas isso importa. Tenta-se criar um clima favorável que possa eventualmente reverter a indisposição relativa a esse novo tributo. Por que tal afinco, quando parlamentares enviaram várias mensagens sobre a dificuldade de sua aprovação, para além de uma opinião pública avessa a essa proposta?

O objetivo é claro: recriar a CPMF para financiar o Renda Brasil que, por sua vez, serviria de instrumento para a reeleição do presidente Bolsonaro. Nessas condições suas chances seriam elevadas, repetindo a experiência lulista/petista. 

Não há nada de reformismo, liberalismo ou algo que o valha nessa proposta. Com o presidente Bolsonaro entrando no modo calmaria, negociação, suas chances de conclusão do mandato se potencializam, afastando o espantalho do impeachment. Tendo se dado conta de que sua aprovação popular não apenas se estabilizou, mas aumentou, optou por sair do modo sobrevivência para entrar no modo reeleição, sem se preocupar com o modo governabilidade, que implicaria projetos, ideias e negociações para tirar o País da imensa crise em que está imerso.

De liberalismo não há nada aí. De lulismo/petismo, sim! De populismo também. Estão cada vez mais parecidos, apesar de um vociferar contra o outro. Devem se amar secretamente. Lula teve a brilhante ideia de unificar os diferentes projetos sociais do governo FHC, dando-lhes novo nome, aumentando sua abrangência e seu financiamento. Nascia o Bolsa Família, criando uma clientela política cativa sob a roupagem do benefício social, assegurando sua reeleição e a eleição de sua sucessora. O presidente Bolsonaro pretende fazer o mesmo: renomear o Bolsa Família como Renda Brasil, aumentar o número das famílias beneficiadas e duplicar ou triplicar o seu financiamento. Sua reeleição estaria praticamente assegurada.

E como poderia fazê-lo? Recriando a CPMF. Não deixa de ser esquisito que um governo que se diz liberal na área econômica pretenda criar um novo imposto, chamado de digital ou seja o que for, onerando todos os contribuintes, isso depois de todo um discurso contra as políticas econômicas tucana e petista. A CPMF foi criada como IPMF no governo Itamar, perdurou até o governo petista e só foi derrubada por uma ampla concertação da oposição na época, com o ex-presidente Lula esbravejando a respeito. Também nisso o atual governo está sendo um discípulo de governos tão criticados.

Onde fica o liberalismo? E a coerência? 

Produção de cloroquina coloca Bolsonaro na mira da Justiça

    MP quer apurar responsabilidade de presidente na ordem para Exército aumentar fabricação de medicamento sem eficácia comprovada contra covid-19. Há suspeita de superfaturamento na compra de insumos.

Jair Bolsonaro

Bolsonaro defende uso da cloroquina contra covid-19 mesmo sem nenhuma comprovação científica de sua eficácia

O medicamento defendido pelo presidente Jair Bolsonaro para combater a pandemia de covid-19, mesmo sem nenhuma comprovação científica de sua eficácia, entrou na mira da Justiça. Uma investigação foi solicitada pelo Ministério Público (MP) para apurar se houve superfaturamento na compra de insumos para fabricação dos comprimidos de cloroquina pelo Exército.

Solicitado pelo subprocurador-geral do MP junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) Lucas Furtado, o pedido aguarda o parecer da secretaria do órgão para, então, ser analisado pelo plenário do tribunal.

O processo apura ainda a responsabilidade direta do presidente na decisão de aumentar expressivamente a produção de cloroquina "sem que haja comprovação médica ou científica de que o medicamento seja útil para o tratamento da covid-19", afirma o documento.

A compra do insumo, adquirido da Índia, sem licitação, custou seis vezes mais que o valor pago pelo Ministério da Saúde no ano passado. Finalizada no Laboratório Químico e Farmacêutico do Exército, a produção do comprimido aumentou 84 vezes nos últimos meses em relação ao mesmo período do ano passado, segundo o MP.

"Todo estudo científico produzido relatava a ineficácia da droga contra a covid", diz Furtado à DW Brasil sobre a motivação do processo. Caso as irregularidades sejam comprovadas, Bolsonaro pode sofrer diversas sanções, como multas e pagamento pelo dano causado.

O pedido de investigação argumenta que a fabricação em massa do remédio seria um desperdício de dinheiro público que deve ser devidamente apurado. "E os responsáveis (devem ser) penalizados na forma da lei, especialmente se há suspeitas de superfaturamento na aquisição de insumos", pontua o documento.

O pedido do sub-procurador gerou reação entre deputados bolsonaristas. José Medeiros, do Podemos (MT), pediu que o TCU investigue a atuação de Furtado.

Promovida por Bolsonaro como solução contra a doença que já matou mais de 94 mil brasileiros até início de agosto, a cloroquina foi banida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no tratamento da covid-19. Administrada desde a década de 1950 contra malária, o remédio pode provocar efeitos colaterais graves, como problemas cardíacos, e ainda aumentar o risco de morte em pacientes com o novo coronavírus.

No Brasil, porém, Bolsonaro orientou o Exército a aumentar a produção do comprimido na pandemia. "Temos informação de que mais de 1,5 milhão de reais foram gastos para produção de cloroquina. O laboratório do Exército aumentou sua produção em 100 vezes desde o início da pandemia", afirma Débora Melecchi, do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Até 23 de junho, o Ministério da Saúde havia distribuído 4,4 milhões de comprimidos de cloroquina para os estados brasileiros.

"A rigor, esta aquisição [do insumo supostamente superfaturado] deveria ser fiscalizada pelo órgão de controle interno das Forças Armadas. Mas sabemos que eles não vão fazer nada, uma vez que o chefe do Executivo está fazendo propaganda da cloroquina", comenta Rudnei Marques, do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), que acompanha a investigação do TCU.

Questionado sobre o volume da produção do medicamento e o pedido de investigação do TCU, o Exército não respondeu às perguntas da DW Brasil.

Onde a cloroquina falta

Além do Exército, o laboratório público da Fiocruz produz os comprimidos, mas para uso exclusivo contra a malária, informou a entidade por e-mail. Os medicamentos à base de cloroquina e hidroxicloroquina são fabricados também por empresas farmacêuticas como Cristáila, EMS, Sanofi e Apsen.

No início da pandemia, a propaganda de Bolsonaro a favor da droga provocou uma corrida às farmácias e o medicamento sumiu das prateleiras. Pacientes que precisam da cloroquina para tratar doenças crônicas como malária, lúpus e artrite reumatoide ainda encontram barreiras para comprar a substância.

Infografik Verkauf von Chloroquin in Brasilien PT
Uma pesquisa feita pela Biored, órgão da sociedade civil que reúne associações de pacientes, mostrou que 65% dos entrevistados tinham dificuldade para acessar o remédio antes da pandemia. Esse percentual subiu para 84% depois que o coronavírus se instalou no país. A pesquisa foi feita em junho com 699 pacientes que sofrem de artrite reumatoide e lúpus.

"Esses pacientes ficam sem medicamento acima de 40, 60 dias, o que pode levá-los a atendimento hospitalar num sistema que já está sobrecarregado com casos de covid-19", afirma Melecchi.

Em falta, o remédio também ficou mais caro. Um paciente que gastava mensalmente 100 reais, hoje precisa desembolsar cerca de 450 reais com farmácias de manipulação. Por recomendação do governo federal, apesar de a ciência dizer o contrário, os estoques de cloroquina são priorizados para pacientes com covid-19, conta Melecchi.

É difícil saber o quanto a indústria farmacêutica lucrou no meio desta confusão. "Eles não informam quanto o faturamento aumentou, mas dados do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) mostram que o consumo de cloroquina pelos brasileiros cresceu 358% durante a pandemia", pontua Flávio Emery, presidente da Associação Brasileira de Ciências Farmacêuticas.

Dados da Sindusfarma obtidos pela DW Brasil confirmam o salto de vendas em março. Nos meses seguintes, a saída do produto continuou em alta, em comparação com o mesmo período de 2019.

Mas não são somente os pacientes de doenças crônicas que dependem da cloroquina que estão sofrendo os efeitos desta política que priorizou o fármaco sem eficácia comprovada no tratamento da covid-19.

Pacientes graves que chegam aos hospitais enfrentam diversas dificuldades. Há relatos sobre a falta do chamado kit intubação, composto por 22 medicamentos.

"Houve compra de novos respiradores, mas a compra dos remédios não acompanhou. Há uma morosidade muito grande do governo na compra dos kits", pontua Melecchi. "O que o governo federal distribuiu para 10 estados há poucas semanas é uma quantidade mínima, já está acabando, ou acabou".

Algumas dessas compras, segundo o CNS, foram feitas via Organização Pan-Americana da Saúde (Opas). Assim como o presidentes dos Estados Unidos,Donald Trump, Bolsonaro tem ameaçado retirar o apoio à agência, o que significaria, junto com EUA, um corte de 65% no orçamento da Opas.

Além de suprimentos contra a covid-19, a compra de outros insumos importantes para brasileiros corre risco se houver um afastamento da Opas. "O Brasil adquire medicamentos para o tratamento da Aids através da Opas. Se esses remédios não chegarem mais ao país, será um caos", lamenta Melecchi.

O Ministério da Saúde também foi questionado pela DW Brasil, mas não respondeu às perguntas até a publicação desta reportagem.

Fonte: Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha. Jornalismo independente em 30 idiomas.

quinta-feira, 30 de julho de 2020

Ex-candidato presidencial nos EUA que se recusava a usar máscara morre após contrair covid-19

Herman Cain, de 74 anos, soube de seu diagnóstico em 29 de junho, nove dias depois de participar de um comício de Trump na cidade de Tulsa, Oklahoma, onde ele e muitos outros se reuniram sem usar máscaras

O ex-candidato republicano à presidência dos Estados Unidos Herman Cain, um apoiador do presidente Donald Trump que se recusava a usar máscara durante a pandemia de coronavírus, morreu nesta quinta-feira, 30, após contrair covid-19, como informou seu site e seu perfil no Facebook.

Cain, de 74 anos, soube de seu diagnóstico em 29 de junho, nove dias depois de participar de um comício de Trump na cidade de Tulsa, Oklahoma, onde ele e muitos outros se reuniram sem usar máscaras contra a disseminação do coronavírus.

Ele passou a maior parte do mês de julho em um hospital da região de Atlanta. "Estamos com o coração partido e o mundo ficou mais pobre: ​​Herman Cain foi para ficar com o Senhor", dizia a declaração em seu site. Cain sofreu complicações respiratórias por causa do vírus.

Muitos apoiadores de Trump rejeitaram o conselho de especialistas em saúde pública e se recusaram a usar máscaras faciais, o que pode impedir a propagação do vírus, tornando essa escolha um tipo de declaração política no país.

Pouco antes de anunciar seu diagnóstico, em 2 de julho, Cain voltou a defender sua posição e manifestar apoio à não exigência de máscaras em um evento de 4 de julho em Monte Rushmore, em Dakota do Sul, que teve a participação de Trump.

"Máscaras não serão obrigatórias para o evento, que contará com a presença do presidente Trump. AS PESSOAS ESTÃO FARTAS", tuitou o republicano.

Mensagens de condolências chegaram de importantes conservadores, enquanto alguns liberais usaram a ocasião para promover o uso de máscaras. "Herman Cain fará falta, ele foi uma das maiores vozes conservadoras de todos os tempos. Nunca esquecerei seu rosto sorridente", disse Jenny Beth Martin, co-fundadora do Tea Party Patriots, no Twitter.

Cain, que se considerava um homem do ABC - American Black Conservative - ​​havia acabado de começar a apresentar um novo programa na Newsmax TV e esperava desempenhar um papel na campanha eleitoral de 2020, informou o comunicado.


Ele fez sua fortuna como diretor-executivo da Godfather's Pizza e liderou algumas pesquisas no início da corrida para a nomeação presidencial republicana de 2012, impulsionada por sua proposta 9-9-9 para um imposto corporativo, de renda e de vendas de 9%.

Durante a campanha presidencial de 2016, ele se tornou um defensor de Trump, que no ano passado planejava nomear Caim para uma cadeira no poderoso Conselho de Governadores do Sistema de Reserva Federal dos EUA, que estabelece taxas de juros de referência.

A indicação em potencial enfrentou resistência imediata, mesmo dentro do Partido Republicano, quando os críticos expressaram preocupação com indicações partidárias de Trump servindo em um conselho tradicionalmente apartidário. 

Economistas e investidores de Wall Street também questionaram as qualificações de Cain para ocupar a vaga e lembraram as múltiplas acusações de abuso sexual e má-conduta que surgiram contra ele durante sua campanha, em 2012. Cain sempre negou as acusações, mas depois de saber que uma das mulheres que alegava ser sua vítima disse que testemunharia contra ele nas audiências de confirmação na Câmara, ele retirou seu nome da indicação./Reuters e EFE  

Redação, O Estado de S.Paulo
30 de julho de 2020 | 15h27