quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Covid política e a renovação da política

Ativismo cívico é crucial para livrar o País dos vírus do populismo e do corporativismo.

A covid política é formada por dois vírus: o populismo e o corporativismo. O tratamento correto para desobstruir as artérias entupidas de uma nação sufocada pelo Estado corporativista e ineficiente é bastante conhecida. É preciso reduzir o tamanho e o custo do Estado, administrar com o devido rigor fiscal as finanças públicas e eliminar a insegurança jurídica causada pelo gigantesco cipoal de leis e normas conflitantes, que são agravadas pela arbitrariedade do Poder Judiciário em mudar constantemente o entendimento da legislação.

O corporativismo ataca as iniciativas que buscam desmantelar o Estado caro e ineficiente. Somos o País com a mais alta carga tributária entre os emergentes: taxamos 40% do produto interno bruto (PIB) do setor produtivo para financiar os privilégios do setor improdutivo. O Estado brasileiro é também o maior fomentador de desigualdade social. Nenhuma nação emergente tem uma discrepância média de salário tão alta entre os setores público e privado. No Brasil, a média do salário público é 67% maior que no setor privado.

Já o populismo debilita a confiança nas leis, nas instituições e na democracia com sua vocação para transformar a política num espetáculo circense. O menosprezo pelas leis e instituições, a incivilidade no trato pessoal e dos costumes, as piruetas da demagogia e as frases debochadas dos governantes minam a tolerância, fomentam o radicalismo e transformam a política num contexto vulgar de popularidade. É a “civilização do espetáculo”, como descreveu Vargas Llosa no seu magnífico livro em que retrata a ânsia de encararmos a vida como um espetáculo de entretenimento, pautado por sensacionalismo, frivolidade e banalidade.

O populismo e o corporativismo já deixaram sequelas importantes: uma década de baixo crescimento econômico, cinco anos consecutivos de desemprego recorde e a menor taxa de investimento privado dos últimos dois anos. Esse pesadelo deve continuar no próximo ano. Estudo recente do Fundo Monetário Internacional (FMI) estima que o PIB brasileiro vai crescer menos da metade da média dos países emergentes. Enquanto a média da economia dos emergentes deve crescer 4,8% em 2021, o Brasil crescerá apenas 2,2%. Ademais, há sinais preocupantes de que o governo ameaça romper com o teto de gastos para financiar seu programa de renda básica. A desconfiança do mercado com o populismo fiscal já causou danos expressivos. A taxa de juros dos títulos brasileiros de longo prazo triplicou com o temor de que o País caminhe rumo à insolvência fiscal.

Apesar de a maioria dos brasileiros achar que a economia está no rumo errado, a popularidade de Bolsonaro continua em alta. Segundo recente pesquisa do Ipesp/XP, 39% dos brasileiros consideram o governo ótimo ou bom. A popularidade do presidente não reflete apenas o gosto popular pela política de espetáculo e pelo dinheiro no bolso dos mais pobres conferido pelo auxílio emergencial. Ela denota também a ausência de oposição. O silêncio da oposição é perturbador; retrata falta de liderança, de alternativas e de propostas para o País. A democracia perde muito em qualidade e eficácia com a inexistência de uma oposição capaz de fazer o contraponto ao governo. A troca do circo da direita pelo circo da esquerda não é alternativa concreta; trata-se apenas de uma variação sobre o mesmo tema que continuará a aprisionar o País ao Estado ineficiente, que sufoca o setor privado, afugenta investidores e alimenta a desigualdade social.

O ativismo cívico é crucial para livrar o País dos vírus do populismo e do corporativismo. Muitos governantes e parlamentares comprometidos com as reformas do Estado contam com a pressão cívica para comprar as brigas políticas para avançar com as políticas públicas inovadoras. No Parlamento, deputados e senadores aprovaram a reforma previdenciária e o marco legal do saneamento, contrariando a pressão do corporativismo estatal. Nos Estados, os governadores Flávio Dino (MA), Eduardo Leite (RS), Renan Filho (AL) e Renato Casagrande (ES) estão empenhados em implementar políticas inovadoras e reformas do Estado.

Essa união da sociedade civil e de lideranças públicas reformistas é essencial para ganhar a opinião pública e pressionar o Congresso a votar as reformas administrativa e tributária. A primeira é vital para cortar despesas públicas e melhorar a qualidade e eficiência do serviço público. A segunda é essencial para simplificar regras e acabar com um dos sistemas tributários mais caóticos do mundo. Além dessas duas reformas, o Unidos Pelo Brasil, um movimento da sociedade civil, selecionou projetos de lei que já tramitam no Parlamento capazes de impulsionar a retomada da economia e do investimento privado. Se a agenda proposta pelo Unidos Pelo Brasil for aprovada, o PIB brasileiro poderá crescer 11,35% até 2025. A aliança da sociedade civil com as boas lideranças políticas é a melhor forma para renovar a política, fortalecer a democracia e mudar o destino do País para melhor.

Luiz Felipe D'Ávila, o autor deste artigo, é cientista politico. Autor de "10 mandamentos - do Brasil que somos para o País que queremos". Publicado originalmente em O Estado de São Paulo, edição de  28.10.2020.

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