quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Afastamento de Wilson Witzel: entenda

Por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), governador do Rio foi afastado do cargo por suspeita de participação em esquema de corrupção. Primeira-dama também é alvo das investigações.
Por G1 Rio

Veja como funcionava o esquema de corrupção na saúde do Rio

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou, na ultima sexta-feira (28), o afastamento imediato do governador Wilson Witzel (PSC) do cargo por suspeitas de corrupção. Também determinou buscas contra a primeira-dama, a advogada Helena Witzel, que tem contratos com empresas envolvidas no esquema de desvio de recursos.

Nesta quarta-feira (2), o STJ julga se mantém Witzel afastado do cargo de governador do RJ. Quinze ministros analisam a decisão individual (monocrática) que tirou Witzel do cargo.

Além do afastamento do governador, o STJ expediu 17 mandados de prisão, sendo 6 preventivas e 11 temporárias, e 83 de busca e apreensão. A Procuradoria-Geral da República denunciou nove pessoas.

Denunciados:

Wilson Witzel

Helena Witzel

Lucas Tristão

Mário Peixoto

Alessandro Duarte

Cassiano Luiz

Juan Elias Neves de Paula

João Marcos Borges Mattos

Gothardo Lopes Netto

Para cumprir os mandatos, foi deflagrada uma operação batizada de Tris in Idem, uma referência ao fato de se tratar do terceiro governador do estado que se utiliza de esquemas ilícitos semelhantes para obter vantagens indevidas – os outros dois foram Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão.

O que é investigado?

Governador Wilson Witzel (PSC) e a mulher, Helena Witzel, são investigados por corrupção em contratos do governo do estado — Foto: Reprodução/TV Globo

Governador Wilson Witzel (PSC) e a mulher, Helena Witzel, são investigados por corrupção em contratos do governo do estado — Foto: Reprodução/TV Globo

A ordem de afastamento e os mandados de prisão e de busca e apreensão são decorrência das investigações da Operação Favorito e da Operação Placebo -- ambas realizadas em maio, e da delação premiada de Edmar Santos, ex-secretário de Saúde.

O ministro do STJ Benedito Gonçalves, que determinou o afastamento de Witzel do cargo, apontou em sua decisão que o Ministério Público Federal (MPF) descobriu uma “sofisticada organização criminosa, composta por pelo menos três grupos de poder, encabeçada pelo governador Wilson Witzel”.

A suspeita é de que o governador tenha recebido, por intermédio do escritório de advocacia de sua mulher, Helena Witzel, pelo menos R$ 554,2 mil em propina. O MPF descobriu transferência de R$ 74 mil de Helena Witzel para a conta pessoal do governador

Por conta dessa suspeita, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pede reparação aos cofres públicos no valor de R$ 1,1 milhão do governador do Rio de Janeiro.

A descoberta do esquema criminoso teve início com a apuração de irregularidades na contratação dos hospitais de campanha, respiradores e medicamentos para o enfrentamento da pandemia do coronavírus.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) afirma que o governo do RJ estabeleceu um esquema de propina para a contratação emergencial e para liberação de pagamentos a organizações sociais (OSs) que prestam serviços ao governo, especialmente nas áreas de Saúde e Educação.

Além disso, os procuradores apontam que a primeira-dama possui “vínculo bastante estreito e suspeito” com as empresas do empresário Mário Peixoto, que fornece mão de obra para o governo do Rio de Janeiro desde a gestão de Sérgio Cabral.

As investigações revelaram que Peixoto era o verdadeiro dono de várias empresas, que têm contratos milionários com o governo do estado, e que tinham à frente vários “laranjas" para tentar ocultar a verdadeira propriedade delas.

Quais as suspeitas sobre o governador?

A denúncia apresentada pela PGR ao STJ aponta que Wilson Witzel teria recebido pelo menos R$ 554,2 mil em propinas, por intermédio do escritório de advocacia de sua mulher, Helena Witzel.

Segundo os procuradores, o governador tem "participação ativa no conhecimento e comando das contratações com as empresas investigadas". Troca de emails comprovariam as suspeitas.

De acordo com a denúncia apresentada pela PGR ao STJ, Wilson Witzel "aceitou promessa e recebeu vantagem indevida no valor de R$ 274.236,50 (duzentos e setenta e quatro mil, duzentos e trinta e seis reais e cinquenta centavos), ofertada e paga pelo empresário Mário Peixoto".

A outra parte da propina recebida por Witzel são R$ 280 mil pagos pelo Hospital Jardim Amália (Hinja), de Volta Redonda, no Sul Fluminense, que pertence à família de Gothardo Lopes Netto, ex-prefeito da cidade.

Segundo o STJ, a quebra do sigilo telemático de Wilson Witzel permitiu identificar dois e-mails que ele enviou para a mulher, Helena Witzel, com o contrato de prestação de serviços do escritório de advocacia dela com o hospital. O documento aponta que ela receberia R$ 30 mil por mês do hospital. Os investigadores descobriram que ela recebeu R$ 280 mil deste contrato.

Conforme consta na acusação encaminhada ao STJ, a contratação do escritório de advocacia consistiu em artifício para permitir a transferência indireta de valores de Mário Peixoto e Gothardo Lopes Netto para Wilson Witzel.

Quais as suspeitas sobre a primeira-dama?

Helena Witzel sempre teve um papel importante nas decisões do governo

Segundo os procuradores, o escritório de advocacia de Helena Witzel possui “vínculo bastante estreito e suspeito” com empresas envolvidas em esquemas de corrupção no governo do estado.

Ela tem contratos com as empresas investigadas, que são de propriedade do empresário Mário Peixoto, preso pela operação Lava-Jato diante dos esquemas de corrupção comandados pelo ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral.

As investigações apontaram que a contratação do escritório da primeira-dama serviu para facilitar a transferência indireta de valores desviados dos contratos do governo do estado com as empresas investigadas. A quebra de sigilo mostrou que Witzel enviou e-mails para Helena Witzel com a minuta de um contrato de prestação de serviço de advocacia relativo ao escritório dela.

O caminho do dinheiro de Witzel, segundo a delação — Foto: Editoria de Arte/G1

O caminho do dinheiro de Witzel, segundo a delação — Foto: Editoria de Arte/G1

Ao determinar buscas contra Helena Wiztel, o ministro do STJ, Benedito Gonçalves, enfatizou que, segundo o MPF, “o escritório de advocacia da primeira-dama, reativado sem qualquer outro advogado além da primeira dama e sem qualquer funcionário, bem ainda sem a realização de qualquer serviço (...), foi utilizado para escamotear o pagamento de vantagens indevidas ao governador”.

Segundo a investigação, o escritório recebeu cerca de R$ 554,2 mil em dez meses, entre agosto de 2019 e maio de 2020. Desse montante, R$ 280 foram pagos pelo Hospital Jardim Amália, R$ 112,6 mil pela DPAD Serviços Diagnósticos, R$ 59,3 mil pela Cootrab Cooperativa Central de Trabalho e R$ 102,2 mil pela Quali Clínicas Gestão e Serviços de Saúde.

O estreito elo de Helena Witzel com a atuação política do marido também foi evidenciada pela ligação dela com o Partido Social Cristão (PSC), do qual Witzel é filiado. Reportagem do Jornal O Globo publicada em maio revelou que a primeira-dama era contratada pelo partido, com salário de R$ 22 mil.
Ex-secretário de Saúde detalhou em delação premiada como se dava o loteamento de cargos no governo Witzel — Foto: Arte/G1

Ex-secretário de Saúde detalhou em delação premiada como se dava o loteamento de cargos no governo Witzel — Foto: Arte/G1

Os núcleos da propina no governo Witzel — Foto: Editoria de Arte/G1
Os núcleos da propina no governo Witzel — Foto: Editoria de Arte/G1


Quem mais é investigado?
Pastor Everaldo - um dos alvos da operação. — Foto: Alexandre Durão/G1

Pastor Everaldo - um dos alvos da operação. — Foto: Alexandre Durão/G1


No total, são 17 mandados de prisão, sendo 6 preventivas e 11 temporárias, e 83 de busca e apreensão.

Mandados de prisão cumpridos:

Pastor Everaldo, presidente do PSC;

Lucas Tristão, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico;

Gothardo Lopes Netto, médico e ex-prefeito de Volta Redonda;

Filipe de Almeida Pereira, filho do pastor Everaldo

Laercio Pereira, filho do pastor Everaldo;

Alessandro Duarte, empresário;

Cassiano Luiz, empresário.

Os alvos de mandados de busca foram a primeira-dama, Helena Witzel, o vice-governador, Cláudio Castro, o presidente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), André Ceciliano (PT) e o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT-RJ) Marcos Pinto da Cruz.

Quem assume o governo?

Diante do afastamento do cargo de governador determinado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), quem assumiu o lugar de Witzel foi o vice-governador Cláudio Castro, que também é investigado, mas não teve o afastamento determinado pela Justiça até então.

Caso Castro seja afastado, o segundo na linha sucessória do cargo é o presidente da Assembleia Legislativa do Estado (Alerj), deputado André Ceciliano, que também é investigado no mesmo esquema de corrupção

Se os três – governador, vice-governador, e presidente da Alerj – forem afastados do cargo, quem assume o governo é o presidente do Tribunal de Justiça do Rio, atualmente comandado pelo desembargador Claudio de Mello Tavares.

Se o governador e vice forem afastados definitivamente do cargo, será realizada nova eleição. A legislação estabelece que se a vacância do cargo ocorrer nos dois últimos anos do mandato, a eleição para ambos os cargos deve ser feita pela Assembleia Legislativa.

O que dizem os envolvidos?

Wilson Witzel: O governador afastado declarou, em um pronunciamento no Palácio Laranjeiras, que está "indignado".

Witzel se disse perseguido pelo governo federal e fez ataques ao ex-secretário Edmar Santos.

"Mais uma vez quero manifestar a minha indignação e uma busca e apreensão e, mais uma vez, é uma busca e decepção. Não encontrou um real, uma joia, simplesmente mais um circo sendo realizado", disse Witzel. "Você não pode afastar um governador com a suposição de que ele vai fazer algo."

"Edmar nos enganou a todos. Um tenente-coronel da Polícia Militar, professor da Uerj, ex-diretor do Pedro Ernesto. Esse vagabundo entra na saúde do Rio de Janeiro quando eu avisei que não toleraria corrupção e não tolero corrupção. Tentou ludibriar a todos nós."




Helena Witzel: O advogado José Carlos Tórtima que não "nada há nos autos da investigação, nos quais foi decretada a referida medida, de objetivo e concreto, que de alguma forma leve a crer que a Doutora Helena Witzel tenha, de qualquer forma, concorrido para os atos ilícitos cogitados pelo Ministério Público Federal requerente da cautelar."

E acrescenta:

"O contrato de serviços advocatícios, apontado, sem idôneo fundamento, como suspeito, no mencionado requerimento, nada tem de irregular, visto que a Dra. Helena Witzel efetivamente prestou os serviços para os quais foi contratada, como contrapartida dos honorários por ela recebidos. Não se pode criminalizar a advocacia.

De resto, o mencionado contrato apresenta-se como o único argumento manejado pelo órgão do Ministério Público Federal, como motivo de suspeita em relação à suposta participação da Dra. Helena Witzel nos alegados atos ilícitos. Em todas as contratações sempre foi exigido que o cliente declarasse não ter relações com o Estado do Rio de Janeiro.

A Defesa tem convicção de que a ação penal não prosperará."

Pastor Everaldo: Em nota, a defesa do Pastor Everaldo afirmou que ele sempre esteve à disposição de todas as autoridades e reitera a sua confiança na Justiça.

Também por meio de nota, o PSC informou que confia na Justiça e no amplo direito à defesa de todos os cidadãos e que o pastor, assim como o governador Wilson Witzel, sempre estiveram à disposição das autoridades.

Cláudio Castro: o advogado Carlo Lucchione informou que não tem ainda como dar algum tipo de posicionamento porque ainda não teve acesso ainda ao processo e que ainda não esteve com o governador interino.

André Ceciliano: Em nota, a defesa do presidente da Alerj afirmou desconhecer as razões da busca e apreensão em seus gabinetes no prédio da Rua da Alfândega e no anexo, "mas ele está tranquilo em relação à medida e se pôs à disposição dos agentes da PF seu gabinete no Palácio Tiradentes, que não estava incluído no mandado".

"Ceciliano reitera a sua confiança na Justiça e afirma que está pronto a colaborar com as autoridades e a contribuir com a superação desse grave momento que, mais uma vez, o Rio de Janeiro atravessa. Ele também colocou seus sigilos bancário, fiscal e telefônico à disposição das autoridades."

Gothardo Lopes Netto: A defesa afirmou desconhecer as razões e fundamentos legais que motivaram a decisão da decretação da medida prisional. "Por isso, a defesa não possui neste momento meios para apresentar maiores esclarecimentos".

Em nota, o Tribunal Regional do Trabalho disse que tentou falar com o desembargador Marcos Pinto da Cruz, sem sucesso, e que o TRT está à disposição para colaborar e tem total interesse no esclarecimento dos fatos.

Alessandro Duarte e Cassiano Luiz: os advogados Ricardo Braga e Patrick Berriel afirmaram que "a prisão dos empresários é absolutamente desnecessária e desproporcional, especialmente quando se demonstrou possível a imposição de medidas cautelares alternativas à prisão ao governador. A ausência de qualquer ato ilegal praticado pelos empresários será provada na ação penal que tramita no Superior Tribunal de Justiça".

Mário Peixoto: “Mário Peixoto não tem qualquer tipo de vínculo societário com as empresas que contrataram o escritório de advocacia da primeira-dama Helena Witzel. Trata-se de mais uma ilação do MPF, o que será demonstrado pela defesa ao longo do processo. A defesa se insurge mais uma vez contra o prejulgamento que se tem feito nesta causa, onde a regra tem sido prender para depois investigar, em claro desprestígio ao constitucional princípio da presunção de inocência", afirmaram os advogados Alexandre Lopes e Afonso Destri.

"Infelizmente, contrariando o princípio da presunção de inocência, a prisão foi ilegalmente decretada. O caso será levado ao Supremo Tribunal Federal, que se encarregará do restabelecimento da legalidade.”André Moura: A assessoria jurídica afirmou que o secretário recebeu com surpresa a ação de busca e apreensão, "já que o seu nome nem sequer é mencionado na decisão".

Laércio Pereira e Filipe de Almeida Pereira: “A prisão temporária que recai sobre os filhos do Pastor Everaldo é extremamente injusta e desnecessária. A ordem se deu apenas para serem ouvidos, mas poderiam ter sido intimados que atenderiam à intimação e prestariam todos os esclarecimentos", diz a nota do advogado Marcos Crissiuma, que defende os dois filhos do pastor Everaldo.

André Moura: A assessoria jurídica afirmou que o secretário recebeu com surpresa a ação de busca e apreensão, "já que o seu nome nem sequer é mencionado na decisão".

"Os agentes da Polícia Federal saíram de mãos vazias da residência do secretário, e o auto circunstanciado de busca e apreensão da operação conclui que 'Nada de Interesse para a investigação foi encontrado'".

O G1 ainda não conseguiu contato com a defesa de Lucas Tristão.

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