segunda-feira, 8 de junho de 2020

Iniciativas tentam contornar apagão de dados da covid-19

Após governo Bolsonaro esconder dados da epidemia e levantar temor de que vai passar a maquiar contagem, jornais formam parceria para coletar dados. Conselho de secretários de Saúde também lança painel com informações.

O presidente Jair Bolsonaro
 
Após minimizar coronavírus, Bolsonaro passou a aplicar política para dificultar o acesso aos dados da doença no país

Após a decisão do Ministério da Saúde de reduzir drasticamente a transparência dos dados sobre os impactos da covid-19 no país, novos meios de monitoramento vêm surgindo para tentar suprir a lacuna deixada pelo governo de Jair Bolsonaro.

Entre as iniciativas estão uma parceria de coleta de dados entre grupos de comunicação rivais e um novo painel controlado pelos secretários estaduais de Saúde.

Na última sexta-feira, o governo federal parou de publicar os dados consolidados da epidemia, como o total de mortes e casos de covid-19 no país. O Painel Coronavírus do Ministério da Saúde chegou a ser retirado do ar. Posteriormente, voltou mutilado, sem os números totais e desprovido de quase todas as suas ferramentas, como gráficos e tabelas.

Foi a culminação de semanas de redução de transparência, que se intensificou depois da saída de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde e o aumento da influência militar na pasta. O governo também passou a atrasar propositalmente a divulgação de dados e dar ênfase a aspectos "positivos" da pandemia.

Além de diminuir a transparência, as atitudes do governo levantaram o temor de falsificação dos dados. No fim de semana, um bilionário cotado para assumir um cargo no Ministério da Saúde afirmou que a pasta pretende fazer uma "recontagem" no número de mortos e acusou, sem provas, as secretarias estaduais de inflarem as cifras.

No domingo, o governo federal chegou a anunciar que voltaria a divulgar os dados completos da epidemia, mas acabou por reforçar a desconfiança sobre a qualidade de seus números ao publicar dados contraditórios.

Num primeiro momento, apontou que o número de mortes registradas entre sábado e domingo havia sido de 1.382. Depois, reduziu a contagem para 524, atribuindo a diferença a um erro na soma de dados de alguns estados.

Confira iniciativas lançadas para contornar o "apagão" de dados:

Parceria entre veículos de comunicação

Os jornais O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e O Globo e os portais G1 e UOL anunciaram uma colaboração para coletar dados sobre a epidemia nos 26 estados e no Distrito Federal.

Equipes desses veículos vão dividir tarefas, compartilhar dados e elaborar um balanço diário que será fechado às 20h.

"Numa sociedade organizada como a brasileira, é praticamente impossível omitir ou desfigurar dados tão fundamentais quanto o impacto de uma pandemia. Com essa iniciativa conjunta de levantamento de dados com os estados, deixamos claro que a imprensa não permitirá que nossos leitores fiquem sem saber a extensão da covid-19", afirmou Sérgio Dávila, diretor de redação da Folha, em comunicado divulgado pelos veículos.

Painel Conass

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), que reúne os titulares das 27 secretarias de Saúde da federação, lançou no fim de semana o Painel Conass, que é atualizado todos os dias às 18h30 (horário de Brasília) – ou seja, bem antes do horário do governo federal, que empurrou na semana passada a divulgação de seu boletim diário para as 22h.

O site disponibiliza dados da doença por estado e o total do país, mais ou menos como o antigo portal do Ministério da Saúde fazia até a última sexta-feira. Os dados são coletados com as secretarias estaduais de Saúde.

"A tentativa autoritária, insensível, desumana e antiética de dar invisibilidade aos mortos pela covid-19 não prosperará", disse o presidente do Conass, Alberto Beltrame, no último sábado.

Dados Transparentes

Comandado pelo médico João Gabbardo, que atuou como braço direito do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, o Dados Transparentes é similar ao Painel Conass e também acompanha a pandemia por meio da coleta de dados com as secretarias estaduais de Saúde. No momento, Gabbardo ocupa o cargo de secretário executivo no Comitê de Contingência do Coronavírus do governo de São Paulo.

Brasil.io

O Brasil.io é formado por uma força-tarefa de 40 voluntários que compilam diariamente boletins epidemiológicos das 27 secretarias estaduais de Saúde. O site já estava no ar antes de o governo começar a reforçar sua política de dificultar o acesso às informações.

Além de disponibilzar dados totais do país, o site apresenta ferramentas que não estavam disponíveis no Portal Coronavírus do Ministério da Saúde nem mesmo antes do apagão, como dados por munícipio.

Lagom data

Criado pelo jornalista especializado em análise de dados Marcelo Soares, o Lagom Data também apresenta um panorama nacional sobre a covid-19 e uma série de mapas e gráficos interativos sobre a prevalência da doença nos municípios e estados brasileiros.

Extensão do Chrome para ver dados apagados pelo governo

Uma extensão do navegador Google Chrome disponilizada no domingo é capaz de restabelecer parte dos dados que passaram a ser ocultados pelo governo Bolsonaro.

A extensão, chamada "Transparência Covid-19", está na loja oficial do Chrome e é capaz de revelar novamente os antigos dados do Painel Coronavírus do Ministério da Saúde, como os números totais de mortes e casos. No entanto, as antigas tabelas, gráficos e curvas não aparecem com a ferramenta.

Fonte: Deutsche Welle, a emissora internacional da Alemanha.  Jornalismo independente em 30 idiomas.

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