E sobrenatural,
é bom saber, inclui tudo. Desde temporadas em segredo pelos terreiros do Codó a
chamamentos noturnos e incansáveis para que os ectoplasmas larguem do serviço
em algum lugar e com a pressa das ambulâncias compareçam.
Não é de hoje
que os fantasmas, estando onde estiverem, depois de longamente evocados, são
trazidos à colação. Uns camaradas, outros nem tanto. Todos, enfim, inimigos
declarados da mesmice e da tristeza.
Há no mundo do
sobrenatural quem, chegando ao mundo dos comuns mortais, possa provocar mais
alegrias desarrumadas do que os fantasmas ?
Aqui, os
fantasmas compareceram e votaram durante décadas nas eleições majoritárias e
nas proporcionais e ninguém os venceu. Enquanto não largaram do titulo de
eleitor, os seus candidatos foram imbatíveis.
Mais tarde,
cansados desse dever cívico de votar, votar, e nada acontecer de bom para o
povo, os fantasmas resolveram se entregar a outros afazeres.
Vocês não se
lembram que o PT naqueles tempos em que perdia eleições presidenciais,
uma atrás da outra, tinha sempre o seu 'Governo Fantasma' com o companheiro
Lula de presidente e o companheiro Cristovam Buarque como Ministro da Educação
?
Nenhum desdouro
nisso.
Os ingleses até
hoje se interessam pelo seu Governo Fantasma, seja o dos trabalhistas, seja o
dos conservadores. Os fantasmas atuam mostrando como as coisas seriam
diferentes se eles fossem Governo.
Na eleição
seguinte, quem está Governo pode não estar mais, e os fantasmas então mudam de
lado. Se depender só deles estarão sempre na oposição.
Mas tem gente
que morre de medo de ver fantasma. Imagino que se comparados com algumas
pessoas, levando em conta o medo que elas produzem e impingem aos outros, os
fantasmas não devem ser assim tão medonhos.
Consta que foi
Plínio, o Jovem, em Atenas, na Grécia, no primeiro século depois de Cristo, o
primeiro a ver um fantasma.
Ele voltava do
ateneu onde Péricles, o tribuno gago, fizera um comício anunciando uns
convênios com a prefeitura de Tróia e outras de Frigia, na Ásia Menor, quando
deu de cara com um fantasma balançando correntes e assumindo aos poucos a
fisionomia de um cara barbudo querendo bater com um martelo de madeira em sua
cabeça.
Heródoto andou
pesquisando e descobriu que, em outras encarnações, o fantasma barbudo havia
freqüentado a escolinha do partidão, onde com certeza ninguém lhe ensinara a
ser tão tendencioso e perverso.
Na Inglaterra,
em Tedworth, por volta de 1600, um fantasma baterista atazanou a vida de muita
gente batendo tambores à noite. Outra diversão sua era bater nos móveis das
casas, em especial nas camas onde houvesse gente dormindo.
Um dos lordes
ficou com tanto medo que despachou da Corte seguranças do Reino, ganhando
diárias em libras esterlinas, para proteger da barulheira do fantasma baterista
a sua casa em Tedworth.
Hoje ninguém fala
mais sobre os fantasmas então atuantes na judicatura do Maranhão.
Ninguém sabe
dizer ainda o que levou os tais fantasmas, outrora mais ocupados com o serviço
eleitoral, a incursionarem por novas jurisdições, incluindo as cíveis e
criminais, que sintetizam questões de tantos interesses e de tantos
interessados.
O que se sabe é
que os fantasmas gostaram tanto desse ramo de distribuir justiça – a cada um o
que é seu, segundo uma igualdade – que em suas assombrações não só vestiram
togas como passaram a receber salários iguais aos dos Juízes de verdade.
As coisas andam
tão besuntadas de mediocridades e mesmices que pedir, a estas alturas, ao
sobrenatural que nos envie mais Juízes Fantasmas ou Fantasmas Juízes pode ser,
quem sabe, a grande saída nesta encruzilhada de incertezas, e de tanto
desalento e introspecção. A tal da insegurança jurídica segue se achando a
inarredável.
Edson Vidigal,
advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da
Justiça Federal.
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