domingo, 4 de agosto de 2013

Paturi

O mundo fica sem graça quando perde um cara engraçado como o Paturi. Sabia como poucos a arte de fazer cócegas no raciocínio dos outros e, assim, segurar por horas seguidas a alegria em derredor.

Baixinho, boleia estufada e carroceria arrebitada, ligeiro no andar, Artur Buéres - esse o nome que lhe foi dada na pia batismal, fazia jus ao apelido que lhe deram e carregava sem crises existenciais desde os tempos escolares.

Quem indo aos lençóis maranhenses, mais precisamente ao Caburé, não aportou na Pousada do Paturi e ali se sentiu em casa, sendo então recebido pelas alegrias mais bem-vindas?

O Paturi não era um palhaço no sentido circense do termo. Era um homem cordial que trabalhava muito, sempre prestativo, movido a bom humor.

Antes de entrar como personagem na história do Porto do Itaqui, escrita pelo Bentinho, o nosso grande Bento Moreira Lima, com quem trabalhou ao lado do também nosso almirante Washington Viegas, Artur Buéres foi dono de uma banca de revistas na Praça João Lisboa em frente ao Moto Bar.

As línguas mais afiadas e mentes mais lépidas da cidade efervesciam naquele circuito, eis que do outro lado, mas bem em frente, ao lado do relógio, se reunia toda noite o Senado da Praça sob a presidência de Michel Nazar e secretaria-geral de Lourenço Vieira da Silva. O Senado sucedeu ao DIVA, o antigo Departamento de Informação da Vida Alheia. Era ali que o Língua de Trapo, tio avô do Dr. Peta, recheava seus informes para a seção que mantinha diariamente no Jornal Pequeno.

A banca de revistas e jornais do Paturi, à entrada do Moto Bar, capitaneado por seu Serafim, um português gorducho e calvo, bochechas lembrando camarão seco, era parada obrigatória de quem entrasse ou saísse daquele corredor estreito onde as mesas se encompridavam formando o bar.

O Paturi sabia perguntar com graça pelas novidades aos seus fregueses. À noite sabia de mais coisas do que as que o jornal publicaria no dia seguinte. Era uma grande fonte.

Na semana passada, quando estivemos Euridice e eu, almoçando em sua Pousada, ele contou que uma vez o Zildeni Falcão, seu fornecedor de revistas, notou numa checagem que em determinados dias havia revistas a menos, as quais depois retornavam à exposição na banca.

Por quais mãos e sob quais olhos passeavam as revistas? Capricho e Amiga e outras com fotonovelas ele as levava para as moças lerem nos cabarés da Rua de 28 de Julho e adjacências. Era assim generoso o nosso amigo Paturi.

A lua inundava suavemente as trevas sobre o Rio Preguiças quando o Paturi, na semana passada, nos levou a um passeio na lancha - o instrumento de trabalho, que depois de tantas economias havia comprado. Estava com a Suzana, sua mulher e com a Maria Paula, sua filha.

Por volta da meia noite, a Pousada ainda em movimentos de freguesia, o casal Paturi nos serviu o jantar. Chamou-me a atenção o prazer com que ele garfava cubos de macaxeira cozida na manteiga.

Naquela noite o gerador de luz da Pousada ao lado pifou e o dia seguinte amanheceu sem água. Um caos. O Paturi mandou fazer uma gambiarra para levar energia do seu motor para a caixa dagua do concorrente e assim aliviou a barra dos turistas, quase todos de São Paulo.

Era novamente noite quando o Paturi fez questão de nos levar, a mim e a Euridice, de volta a Barrerinhas. Ele nos levou ao Aluizio, do Resort Rio Preguiças, conseguindo o impossível na ocasião, uma vaga para um casal. Prometeu que retornaria na noite seguinte para jantar conosco e depois nos levar a uma vaquejada. Não voltou.

Ontem, manhã bem cedo, o Aluizio me ligou para me dar a noticia mais triste numa manhã de domingo. A alegria do Paturi parou de vez.

Quando ligamos para dar a noticia ao Washington, ele já estava lá.

(Jornal Pequeno, 28.07.13.)

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