domingo, 5 de agosto de 2012

Espantos


O homem nu só visível à altura dos telhados, os mais altos, já havia passado por São Paulo, esteve à vista das pessoas numa das regiões mais frequentadas, mas alvoroço mesmo ele só foi despertar quando o viram no alto do prédio de um conjunto, no centro do Rio de Janeiro.
A impressão que, aos poucos, nas primeiras horas do dia, foi se generalizando indicava que as pessoas, lá embaixo, iriam testemunhar um tresloucado gesto.
Um homem nu, em pé no alto do telhado de um edifício num lugar de muito movimento estaria querendo o que? Chamar a atenção de todos para o seu tresloucado gesto.
É um suicida, chama os bombeiros! Pula, pula, instigavam outros. As pessoas paravam incrédulas, uma pequena multidão foi se formando, vendedores ambulantes também foram chegando. Pula, pula, gritavam uns e a distancia era tão grande, entre o chão e aquela altura, que o homem nu parecia nem ouvir.
A guarda municipal chegou atarantada e isolou uma área indicando, pelos cálculos do comandante, o lugar onde o homem nu lá de cima poderia, eventualmente, cair.
Chama os bombeiros, já foram chamados, mas estão demorando, mas já foram chamados, é sempre assim, quando chegam o fogo já se alastrou, mas não é bem assim, os bombeiros somam uma corporação de heróis mal remunerados, mas que dão conta do serviço com idealismo e muita raça. É isso mesmo, mas estão demorando.
A estas alturas a gaiatice carioca se assanha e começam as especulações – é um senador querendo se redimir antes que estoure um novo escândalo e seu nome, afinal, reapareça mais explicito nos grampos!
Não, é um vascaíno arrependido! Nada, é um cara que se hospedou num hotel em Goiânia e sem querer, no café da manhã, sentou à mesma mesa de um sujeito que é a cara do Cachoeira! Tá lascado, vai já ser chamado pela CPI! Lorota homem – é o novo técnico do Flamengo que, antes mesmo de assumir, já perdeu o emprego!
Especulações de todos os matizes, chegam os bombeiros e meia hora depois a decepção estende seu manto sobre aquele aglomerado de maledicências.
O homem nu era uma escultura fazendo parte de uma exposição chamada “Event Horizont” do artista plástico inglês Antony Gormley, o qual anunciou depois que outras 30 (trinta), igualmente em tamanho natural, serão espalhadas por alturas estratégicas pela cidade.
Viro a página do jornal e leio que os familiares do cantor Wando, morto há alguns meses, estão brigando entre si pela herança, não só os direitos autorais de suas musicas, também a milionária coleção de calcinhas que as fãs em êxtase nos shows lhe atiravam.
É nisso que dá o sujeito em vida trabalhar tanto, formar um patrimônio para depois ficarem os parentes, merdeiros como diria a Berenice, se esfarrapando, em pé de guerra, por conta de inspirações que, antes, nunca tiveram. É triste.

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