quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Sem Medo de Sonhar


Ao Jornalista Manoel dos Santos Neto, do Jornal Pequeno, concedi a entrevista que segue: 

Ainda tinha nove anos pela frente, no cargo vitalício de ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) quando, na presidência da Corte, renunciou a tudo e veio se juntar à luta política do Maranhão. Edson Vidigal afirma que, por força dos deveres e impedimentos da magistratura, estava longe da política, mas não estava distante da realidade social do seu Estado. 

Nas férias forenses, quando muitos iam curti-las na Europa ou noutros lugares mundo afora, ele e Eurídice, sua mulher, se encafuavam no sítio de Caxias ou em São Luís em alguma casa de praia de velhos amigos, querendo o anonimato nas ruas, subindo ou descendo ladeiras da ilha.


Vidigal diz que para largar tudo e voltar de vez a morar no Maranhão, juntando-se à luta política, inspirou-se em Moisés, o Príncipe do Egito, que um dia constatando que nem Príncipe era, mas apenas um hebreu, se despojou de tudo, largou o Palácio do Faraó e foi se juntar ao seu Povo - escravizado aos milhões por aquele poder devastador e cruel.

Candidato a governador nas eleições de 2006, seus 15% dos votos, na terceira colocação, empurraram para o segundo turno a decisão final, do que resultou na eleição de Jackson, que ele apoiou decisivamente.

Jornal Pequeno – E agora, ministro, por que a candidatura ao Senado e não ao Governo?

Vidigal – Porque a administração do Jackson foi interrompida numa rasteira judicial em que quatro juízes, engabelados em sua boa-fé, o tiraram do cargo para entregá-lo a quem perdeu as eleições. E isso tudo aconteceu à revelia de preceitos constitucionais, e os recursos que interpusemos não foram julgados até hoje em Brasília.

Como já estamos às vésperas da nova eleição, será melhor agora deixar que o Povo, que é o Juiz maior, decida. Mas com esse acidente de percurso da cassação injusta do Jackson em que a Democracia e a República saíram muito feridas, meu lugar agora é no Senado. É lá que tenho uma importante missão a cumprir.

Jornal Pequeno – Como assim?

Vidigal – O Senado configura a união indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios realizando a República. Quem vota aqui para senador não tem noção precisa do que é o Senado e do muito que um senador pode fazer pelo bem do Estado.

Jornal Pequeno – Boas leis...

Vidigal – Não só boas leis, fazendo-as ou melhorando-as. O poder do Senado é incomensurável. O Senado tem responsabilidades enormes não só quanto à governabilidade do País, mas também quanto aos interesses nacionais nas questões de política externa.

Jornal Pequeno – Por exemplo...

Vidigal – Quanto à governabilidade, te aponto no caso do Maranhão dois graves problemas que podem ter solução a partir do Senado. Primeiro, a navegabilidade dos nossos rios e também os rios como fonte de abastecimento de água para as populações ribeirinhas. Pela Constituição, os serviços de água, esgotos e lixo são da competência dos Municípios. Mas como obter água abundante e saudável para o Povo beber nessas centenas de cidades e milhares de povoados se os rios não estiverem sadios?

Podemos buscar fontes de financiamentos no exterior para um ousado projeto de recuperação da nossa bacia hidrográfica, que é uma das maiores do Brasil, recuperando a navegabilidade, criando portos fluviais, criando empregos e rendas para milhões de pessoas e, ainda, instalando estações de captação para as redes municipais de abastecimento de água.

No caso de São Luís, onde já temos racionamentos de água na maioria dos bairros, o que vai resolver em definitivo será a instalação de no mínimo três usinas de dessalinização captando a água do mar. Como canta o Djavan – sabe lá o que é morrer de sede em frente ao mar?

A Petrobras tem essa tecnologia, eu passei um dia em alto mar na plataforma P-16 e a água que se bebe lá é dessalinizada. Não falo de ficção científica, falo de realidade possível para 1 milhão de pessoas numa ilha que não vai ter água para beber dentro de 10 anos se não agirmos rápido com uma solução definitiva. No Senado podemos trabalhar isso porque os empréstimos externos para investimentos são resolvidos lá.

Jornal Pequeno - Collor foi cassado pelo Senado. Os senadores também são juízes?

Vidigal - É o Senado, sim, que processa, julga e cassa o Presidente da República, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os Ministros de Estado, os Comandantes Militares, o Procurador-Geral da República, o Advogado Geral da União, nos crimes de responsabilidade.

Jornal Pequeno – Mas quase ninguém sabe disso...

Vidigal – Mas é aí nessa fonte de poder enorme que o gato pula e o demônio farreia. Como essas autoridades, a começar pelo Presidente da República, podem ser emparedadas pelos senadores faz-se um jogo de toma-lá-dá-cá, resultando daí a promiscuidade com que as coisas acontecem ou não acontecem.

Uns apoiam os Presidentes em troca de benefícios concretos a favor do seu Estado, outros barganham interesses escusos, vantagens pessoais, empregos para os parentes e aderentes. Os Ministros do Supremo e Tribunais Superiores, por exemplo, só podem ser nomeados depois de sabatina e aprovação do Senado.

Os senadores são processados e julgados pelos Ministros do Supremo. E os Ministros do Supremo são processados e julgados pelo Senado. Sabes quantos senadores já foram condenados pelo Supremo? Nenhum. E quantos ministros já foram julgados e condenados pelo Senado? Nenhum. Isso não é muito interessante?

Jornal Pequeno – O que mais pode o Senado?

Vidigal - A avaliação periódica do Sistema Tributário Nacional é função do Senado. A lei declarada inconstitucional é tirada de circulação pelo Senado. A Mesa do Senado preside o Congresso Nacional onde o voto do senador pode aprovar ou rejeitar projetos sobre matéria financeira, cambial e monetária, instituições financeiras e suas operações.

O voto do senador pode brecar ou deixar passar o tratado, o acordo ou o ato internacional que o Presidente da República, ou alguém em seu nome, tenha assinado lá fora, se isso causar prejuízo ao Brasil. O Senado pode chamar qualquer Ministro de Estado para que diga aos senadores o que anda fazendo no seu Ministério. Pode fiscalizar as obras do Governo e até mandar interrompê-las se constatar irregularidades.

Jornal Pequeno – Pode adiantar em resumo pontos de sua atuação caso seja eleito senador?

Vidigal – Vou estar atento a tudo até para melar, quando for o caso, propostas que eu entenda contrárias aos interesses da economia ou atentatórias aos direitos individuais ou coletivos. Não vou permitir violações ao direito à informação, à liberdade de expressão, ao direito à privacidade, à intimidade, aos direitos humanos, enfim tudo que está na Constituição terá que ser respeitado e cumprido.

Vou defender leis e medidas orçamentárias garantindo melhorias no sistema de saúde pública, na educação e na segurança. A saúde, em primeiro lugar. Mas com ela, a educação e a segurança. Vou estar muito acordado para as tentativas de violação à liberdade de imprensa e ao direito de propriedade. No campo institucional vou trabalhar pela reforma eleitoral buscando definir com a sociedade, com os partidos e as entidades representativas dos que têm interesse direto no aperfeiçoamento da democracia, um novo formato de justiça eleitoral.

Jornal Pequeno – Fazendo leis?

Vidigal – Não só fazendo leis, repito. Precisamos, sim, ainda de algumas leis essenciais à vida republicana. Por exemplo, leis que não dêem margem a que o Judiciário legisle no vazio que as leis mal feitas, mal redigidas, e até as leis inexistentes, propiciam. A cassação do Jackson enseja muita reflexão sobre a rotina comportamental em muitas áreas do Judiciário, ainda reféns de um sentimento de tirania, que em alguns casos beira o fascismo.

Quer ver outra coisa? Os cargos de Vice-Presidente, de Vice-Governador, de Vice-Prefeito servem pra quê? Decerto que não é para ficar azarando o titular esperando que morra ou que renuncie ou que seja cassado. A Constituição da República vem dizendo, há 22 anos, desde 1988 quando foi promulgada, que o cargo de Vice deve ter funções e atribuições regulamentadas por Lei Complementar.

Significa que o cargo de Vice não é só como naquele poema do José Chagas, uma canção da expectativa. O Vice deve ter funções permanentes ajudando nas tarefas cotidianas do titular. Disso também irei cuidar quando eu for senador.

Jornal Pequeno – Qual a sua opinião sobre os Tribunais de Contas?

Vidigal – Vou trabalhar para que sejam submetidos ao controle orçamentário e administrativo de um Conselho Nacional, nos moldes do CNJ que já afastou juízes que não souberam se comportar direito. Existem incontáveis denúncias sobre desvios de função de Conselheiros de Tribunais de Contas, cujas ações em muitos casos têm servido mais à manipulação política, à coação, à intimidação de agentes públicos que ousem discordar dos grupos políticos dominantes.

Não acho correto o que tem acontecido em muitos casos. Processos param ou correm dependendo da conveniência política da ocasião. Isso para se falar do mínimo. Tem Prefeito, que nem é desonesto, que morre de medo das ameaças políticas só porque se apavora quando lhe falam nos fantasmas e nos ectoplasmas nos Tribunal de Contas.

Jornal Pequeno – De que forma sua campanha pode ser utilizada para denunciar a realidade social do Estado?

Vidigal – A campanha eleitoral tem uma função didática. É na campanha que os candidatos expõem suas ideias para o julgamento final nas urnas. O debate é essencial. Não pode ser como corrida de automóveis em que o piloto por melhor que seja perde para a máquina mais poderosa. No debate há que vencer a ideia. Na urna há que vencer o melhor, o mais preparado.

Jornal Pequeno – O senhor apoiou o Lula nas últimas eleições e agora o Serra para Presidente. Por quê?

Vidigal – O Lula não é candidato. O mandato dele termina no dia 31 de dezembro deste ano. O candidato a Presidente do meu partido é o Serra.

Jornal Pequeno – E a lei da ficha limpa?

Vidigal – Acho a ideia ótima, mas podemos melhorar a lei que foi feita às pressas. A lei na verdade surgiu para complementar a Constituição no quesito das inelegibilidades em que se exige a vida pregressa afinada com o princípio da moralidade para o exercício do mandato.

Isso se vincula com os princípios da administração – Art.37 da Carta, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade ou transparência e eficiência. Quando fui Ministro do TSE me bati muito para enxertar o principio da moralidade como condição indispensável para o exercício do mandato. Fiz de tudo, mas não deu. Esbarrava sempre na necessidade de uma lei complementar, a qual afinal só veio agora.

Essa lei precisa de uma fase de transição para se acoplar com a lei à qual veio se emendar. Por isso, entendo que não poderia ser aplicada nas eleições deste ano. A Constituição, no Art.16, prescreve o principio da anualidade. E se não respeitarmos o que é constitucional, não teremos amanhã Estado de Direito. Vamos cair num fascismo, vamos viver sob as ordens e as vontades do bandalho.

Jornal Pequeno – As oposições vão estar unidas num segundo turno para governador?

Vidigal – Não tenho a menor dúvida. Conheço o Flávio quando ainda era menino de pipo na casa dos pais, o Sálvio e a Rita, meus amigos, na Rua de Santana. Ele tem berço, se amarra a princípios e tem espírito público. Fui um dos apoiadores do seu desembarque na política em 2006 no Maranhão. Estaria me enganando se o imaginasse fora da campanha, longe da vitória que iremos alcançar no segundo turno das eleições com o Jackson.

Jornal Pequeno – Quem são os suplentes da sua chapa?

Vidigal – Um amigo meu me falou: oh Vidigal, vê se arranja dois suplentes com grana para bancarem a tua campanha porque sem grana não vai dar... Eu ainda acho graça. Grana, mermão, grana ajuda, mas não é tudo. Então pedi ao PDT que me indicasse o primeiro suplente e o PDT me indicou o Léo Costa. A princípio seria a professora Sandra Torres, ex-vice-prefeita de São Luis, pessoa muito bem qualificada para me substituir eventualmente no Senado, mas estava inelegível porque não se desincompatibilizara a tempo.

O PDT indicou então o Léo Costa, que é um professor, um sociólogo, um político experiente, que foi prefeito de Barreirinhas e que atua na equipe que conclui o Plano de Governo do Jackson. Pedi ao Madeira, prefeito de Imperatriz, que é uma grande liderança no sul do Maranhão e importante prócer do PSDB nacional, que indicasse o outro suplente e a sua escolha recaiu na pessoa do Lula Almeida, advogado, professor, ex-secretário de Estado, uma pessoa muito bem articulada no sul do Estado e tão qualificada quanto o Léo Costa para eventual convocação para exercer o mandato de senador pelo Maranhão.

Do ponto de vista da grana, comparando com o que vemos nas ostentações dos adversários, tanto o Léo Costa, quanto o Lula Almeida e eu, somos três lascados somando esperanças que, apesar da grana que é muita do outro lado, o nosso idealismo somado vai tornar vitoriosa a ideia de que nós temos direito a sonhar com um Maranhão melhor para todos ainda neste nosso tempo. Para o sonho virar realidade estamos trabalhando muito. (Jornal Pequeno, 29.08.10).

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