quarta-feira, 4 de março de 2009

Os Atos de Campanha Eleitoral e os Abusos de Poder

Francisco Rezek foi Ministro do Supremo Tribunal Federal e Presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Antes disso foi Procurador do Ministério Público Federal, da primeira safra de concursados. Foi Professor Titular de Direito Penal da Universidade de Brasília, UnB. Foi Chanceler do Brasil e por ultimo Juiz da Corte Internacional de Justiça, em Haia.

Findo o seu mandato em Haia, voltando a advocacia, seu primeiro caso na Justiça Eleitoral é o do Governador Jackson Lago, do Maranhão.

Nesta entrevista a Rodrigo Haidar, da Revista Consultor Juridico, o advogado Rezek antecipa o que vai fazer.

Leia a entrevista:

ConJur — O senhor sustentou no julgamento que não se pode misturar atos políticos corriqueiros com abuso de poder político. Quais os limites entre um e outro?
Francisco Rezek — Não se pode pretender policiar de um modo milimétrico o tom da campanha política, a ponto de se dizer que houve abuso de poder político em um comício porque tal ou qual palavra se pronunciou. Isso é uma lástima. É um indício sério de transferência do cenário político para o cenário judiciário. No julgamento, somente o ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o relator ao admitir que, no episódio de Imperatriz, houve algum tipo de negociação de votos. Esse argumento não deixa de ser importante. Mas os demais — Felix Fischer, Fernando Gonçalves e Carlos Britto — acompanharam o relator na posição cassatória sem ver qualquer indício de compra de votos. Nada disso. Eles cassaram pelo suposto abuso de poder político, já que estão fartos de saber que não há ali abuso de poder econômico. José Reinaldo e Jackson Lago não têm poder econômico.

ConJur — O vídeo exibido no julgamento não mostra que se passou do ponto?
Francisco Rezek
— O abuso do poder político teria sido praticado por José Reinaldo Tavares no sentido de ajudar os chamados candidatos anti-Sarney. Entrou-se, então, em um domínio de complicado julgamento. O vídeo exibido mostra um comício em praça pública, que é típico de todas as campanhas políticas. Não mostra nada além do que se vê em qualquer democracia do mundo. Talvez os físicos sejam diferentes, as roupas, o clima, mas não se vê nada ali que não pudesse acontecer em Helsinki [Estocolmo], Roma, Atenas, Madri, Washington, na Cidade do Cabo, em qualquer lugar, em qualquer democracia deste mundo.

ConJur — Não foi o que entendeu o Ministério Público.
Francisco Rezek — Por isso que o parecer do procurador Francisco Xavier Pinheiro me pareceu uma lástima tão grande. Ontem, o doutor Antonio Fernando teve a bondade de substituir o procurador. O parecer é lido por mim como uma lástima completa, uma página obscura na história do Ministério Público. Mas a verdade é que o parecer foi pouquíssimo considerado. Só o relator, Eros Grau, o considerou. Os demais não. O ministro Lewandowski fixou-se unicamente no episódio Imperatriz e rejeitou todo o resto. Fischer, Gonçalves e Carlos Britto fixaram-se na questão de abuso de poder por causa do comício e desprezaram também todo o resto. De toda a carga acusatória que o procurador da República resolveu jogar na mesa patrocinando a posição dos perdedores nas eleições, que ele patrocinou por inteiro, a maior parte foi desbancada.

ConJur — Então, o senhor considera que, medidos por essa régua, a Justiça acabará cassando todo mundo?
Francisco Rezek — Tenho a impressão de que nós partiremos para isso. Agora, o mais grave não seria isso. O mais grave não seria o furor cassatório que simplesmente passasse uma borracha no voto popular de modo generalizado. O mais grave seria se esse impulso cassatório fosse tendencioso.

ConJur — Como assim? O senhor se refere ao TSE?
Francisco Rezek — Não. Não estou me referindo ao tribunal, mas sim ao Ministério Público Eleitoral. Com que critérios o Ministério Público está ditando a agenda do TSE? Quais os critérios usados para dar ou deixar de dar pareceres? Ou para devolver ou deixar de devolver os autos? Que princípios o MP está adotando para ditar, como está ditando, a agenda da Justiça Eleitoral? Esse é ponto que preocupa. Se fosse apenas um furor cassatório inteiramente generalizado, já seria uma coisa de extrema gravidade. Já seria a abolição do princípio democrático. Mas mais grave seria se esse furor tivesse endereços certos, endereços escolhidos em função de simpatias de qualquer natureza.

ConJur — Objetivamente, há processos contra os adversários de Jackson Lago nas mãos do MP?
Francisco Rezek — Sim. Costumamos dizer que os casos que remanescem são apenas dos perdedores contra os vencedores. Isso porque os vencedores vão festejar a vitória, não vão entrar em juízo contra ninguém. Mas, por acaso, neste caso concreto, existe sim alguma coisa dos vencedores contra os perdedores em juízo simplesmente porque andou devagar. E o relator é o mesmo ministro Eros Grau e o procurador é o mesmo Xavier Pinheiro. O caso chegou ao TSE na época em que o procurador estava devolvendo os autos em que propôs a entrega do mandato à candidata derrotada por Jackson Lago. Ele tinha isso em mãos muito antes de termos a primeira sessão do tribunal, em que ele sustentou seu parecer escrito.

ConJur — O senhor acha que há a possibilidade de virar o jogo no TSE?
Francisco Rezek — Não creio, mas tenho grandes esperanças na solução da questão constitucional pelo Supremo.

ConJur — E qual é a questão constitucional?
Francisco Rezek — A questão constitucional é claríssima e é uma questão não resolvida pelo TSE. A questão de saber o que acontece quando se suprime dessa maneira, há mais de meio caminho, o mandato de um governador eleito. O que se faz, então? Convoca-se nova eleição? Direta ou indireta? Chama-se o derrotado para assumir? Sobre isso o TSE não tem posição consolidada. E sobre isso, qualquer que fosse a posição do TSE, a última palavra é necessariamente do Supremo Tribunal Federal.

ConJur — O senhor recorrerá ao Supremo depois de novo recurso ao TSE? Ou irá direto ao STF?
Francisco Rezek — Há Embargos de Declaração ao TSE, mas isso não tem a virtude de reverter o que quer que seja. Isso é apenas uma cobrança ao tribunal. Para que, eventualmente, seja mais preciso nas razões que nortearam a maioria, para que a parte possa dirigir-se ao Supremo sabendo direito o que está atacando.

ConJur — Mantida a cassação de Jackson lago, o senhor pedirá o que ao STF? Novas eleições?
Francisco Rezek — Não sei ainda. Até porque talvez eu me anime a pedir um pouco mais ao Supremo. Em nome da Constituição, talvez eu ataque a própria cassação do mandato.


3 comentários:

Anônimo disse...

MINISTROS, você deveria ter feito a sustentação oral no lugar do Daniel Leitei, você sem dúvida é mais preparado e respeitado. Por causa dessas coisas que o Jackson foi cassado! Erros bestas....

Rossana disse...

A sensação é de desânimo.
Estamos num Estado democrático de direito, ou não?
Ministros do STF, atentai; o povo do Maranhão, depois de rasteiras diversas, de factóides fabricados às vésperas de eleições e de uma imensidão de abusos econômicos, midiáticos e políticos praticados pela poderosa família Sarney, conseguiu, democrática e legitimamente, dar a Jackson Lago, um mandato de governador deste Estado.

Anônimo disse...

Para mim, o mais patético foi ver o ministro Ribeiro e Versiani ensinando Brito e Grau acerca da contagem dos votos devido a contradição da fudamenteção teórica. Além disso, Grau irritou-se com Ribeiro sobre a eleição indireta, sem saber Grau que Ribeiro era contra esse tipo de eleição devido a jurisprudência do tribunal e Grau todo sem jeito não sabia onde enfiar a cara. O Problema é que infelizmente em algumas situações a justiça acaba se politizando devido as indicações futuras, pois devemos concordar que o presidente da república não indica ningém sozinho.