terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Para Eles Também

Já se vão 20 anos da promulgação da Constituição que propõe um Estado de Direito Democrático para o Brasil e muito ainda está por ser feito no campo legislativo, incluindo a sua complementação e revisão.

Quanto ao Poder Judiciário, por exemplo, não faz sentido um Supremo Tribunal Federal, na verdade uma Corte Constitucional, atuando como 4ª. Instância ordinária civil e criminal.

E sendo uma Corte eminentemente política, porquanto constitucional, a vitaliciedade dos seus integrantes acaba gerando o inconcebível numa República, que é essa supremacia de uma Corte sobre todas as demais Cortes e demais Poderes da República.

Não pode ficar decidindo questões políticas, eminentemente políticas, quem é mantido arredio aos sentimentos populares. Por isso, o STF tem que ter um formato mais consentâneo com o espírito da Constituição da República. E os seus Ministros devem ter mandatos, vedada a recondução.

O Deputado Flávio Dino (PC do B-MA), em boa hora, propicia através de um projeto de emenda constitucional, o começo desse indispensável debate. A entrevista a seguir ele a concedeu ao jornal "O Estado de São Paulo", que a publica hoje com destaque no Caderno Nacional e com chamada na primeira página. Confira.

Por que o sr. diz que os ministros do Supremo devem ter mandatos?

Nós tínhamos um tribunal historicamente mais técnico que político. Na medida em que o Judiciário, em geral, e o STF, de modo mais evidente, assume crescentemente o papel de arbitramento de outros conflitos, que não aqueles classicamente submetidos ao Judiciário, mas sim conflitos que têm uma dimensão política, econômica e social cada vez mais ampla, a consequência para mim é que deve ter uma regra que permita uma alternância. Se há um tribunal com papel político mais alto e é vitalício, corre-se o risco de uma hiperconcentração de poder e, portanto, um desequilíbrio entre os Poderes do Estado. Com o Supremo assumindo crescentemente um papel político, um papel de supremacia sobre os outros Poderes, que haja mandato. Esse é o caminho democrático de alternância para que outras maiorias tenham possibilidade de se formar.

Como deve ser o mandato?

Minha proposta seria de um mandato de 11 anos. Ele não pode ser muito longo, porque equivaleria a vitaliciedade, mas não pode ser muito curto, porque teríamos instabilidade institucional, sem o tempo que permita a consolidação de orientação jurisprudencial e o amadurecimento das teses. Na Justiça Eleitoral, que o mandato é de dois anos, há um nível de instabilidade muito alto e a jurisprudência muda muito. As competências clássicas devem migrar para o Superior Tribunal de Justiça, como instância mais técnica. É a busca do modelo continental europeu, em que todos tribunais constitucionais têm mandato.

Como o ministro seria escolhido?

A escolha deve ser política, ou seja, pelo presidente da República, como hoje, introduzindo um sistema de lista feita pela comunidade jurídica e com a participação do Congresso.

O que passaria para o STJ?

Alguns temas que hoje vão ao Supremo e que são objeto de muita controvérsia devem ficar no STJ. Por exemplo, a competência criminal. O Supremo ficaria com essa competência apenas no que se refere a presidente e parlamentares. O STF julgar casos criminais, por mais relevantes, é atípico para tribunal constitucional.

Como o caso de Daniel Dantas?

Entre outros. Na verdade, Daniel Dantas é apenas um réu conhecido. Mas lá também têm João, Pedro e Maria. Se você pegar a pauta do Supremo, vai ver que o tribunal julga várias causas criminais por ano. Isso é uma atipicidade. A competência criminal do STF deve ser excepcionalíssima, até para que ele tenha tempo de se dedicar ao papel de definir grandes questões, como o uso de células-tronco embrionárias e o caso do aborto em casos de anencefalia.

Está correto o Judiciário definir questões por causa da omissão do Legislativo?
Houve um esvaziamento da política e a crise no processo decisório é a causa maior. De nada adianta se lamentar diante disso, é uma relação política, portanto, de poder e de força. O Judiciário avançou na competência do Legislativo por inércia do Congresso.

Quando o Congresso vota, o partido que perde recorre ao STF...

É outro ponto de reflexão, o modo como esgarçou em demasia a relação entre o governo e a oposição. É antológica a atitude da Mesa do Senado de levar ao STF um conflito interno do Congresso acerca da promulgação de uma emenda constitucional (que aumentou o número de vereadores). Esse é o exemplo máximo da chamada tribunalização da política, com o Senado e a Câmara litigando no Supremo. É um caso inédito no planeta.

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