quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Despedida de Deltan reforça discurso político e dá pistas sobre atuação

Tom dado pelo procurador à sua despedida, mesclando a emotividade de pai ao engajamento de militante, dá boas pistas de para onde o desfecho deve caminhar

Depois de uma longa trajetória como coordenador formal da Operação Lava Jato, acusações de abuso de poder e conluio com o magistrado – todas deixadas de lado pela prescrição resultante da procrastinação repetida da análise de seu caso pelo Conselho Nacional do Ministério Público –, Deltan Dallagnol deixa a operação.

As razões apresentadas dizem respeito a questões familiares – a saúde de sua filha pequena. Porém, a despedida teve o mesmo tom impresso pelo Procurador da República à sua atuação no cargo: um discurso político voltado a cativar o apoio popular à operação, apresentada por ele como se fosse uma instituição do Estado em si mesma e não um instrumento a serviço de uma tal instituição, o Ministério Público.

Deltan sinaliza que como procurador e – mais importante – como cidadão, seguirá em sua luta contra a corrupção. É mais importante este segundo papel porque nele Dallagnol poderá fazer de política de forma ainda mais desabrida. Quem sabe, como Sergio Moro, deixando sua posição no sistema de Justiça e entrando de vez na política partidária.

É um desfecho ainda em aberto. Mas o tom dado pelo procurador à sua despedida, mesclando a emotividade de pai ao engajamento de militante, dá boas pistas de para onde deve caminhar.

Ainda faltam dois anos para as eleições de 2022. Nelas, Moro tende a figurar como estrela de primeira grandeza. Que papel terá Dallagnol, seu escudeiro na escalada para a popularidade?

     
Cláudio Couto, o autor desta análise, é cientista político e coordenador do mestrado profissional em gestão e políticas públicas da Fundação Getúlio vargas - SP. Publicado originalmente pelo O Estado de S.Paulo, edição de  02 de setembro de 2020.

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