quinta-feira, 7 de junho de 2018

Entre Bobby Kennedy e Dona Ivone Lara

Por Edson Vidigal

Dona Ivone Lara, todos se lembram, foi a autora da melodia e dos versos que amplificados por incontáveis vozes de interpretes de muito respeito despertaram em forma de sonho um sentimento chamado saudade outorgando-lhe uma sublime missão – sonho meu, sonho meu, vai buscar quem mora longe sonho meu!



A poetisa desta obra prima era negra que ralou muito nas noites paulistanas cantando em boates, churrascarias, enfim onde a chamassem. Com tenacidade e integridade alcançou décadas depois o sucesso, melhor dizendo, o reconhecimento nacional.



Não há mortalidade para quem constrói com idealismo e boa fé um consistente legado. Dona Ivone Lara fez história e, por isso, a homenagem que, por causa de idiotas reações racistas, não aconteceu.



Isso porque Fabiana Cozza, a atriz escolhida pela família de Dona Ivone Lara para personificar a sambista e compositora num musical de antecipado sucesso, não é uma negra negrinha, uma negra retinta, é filha de pai negro e de mãe branca. A certidão de nascimento qualifica-a como parda.

Os muros escolhidos pelos racistas na desqualificação da atriz na porta de entrada do estrelato foram os das chamadas redes sociais. Fabiana Cozza não se amofinou. Em sua carta de renúncia ao papel da grande dama do samba – D. Ivone Lara, um sorriso negro - que iria representar nos teatros do Rio de Janeiro e de São Paulo, escreveu:

- O racismo se agiganta quando transferimos a guerra para dentro do nosso terreiro. (...) Renuncio porque vi a guerra sendo transferida mais uma vez para dentro do nosso ilê (casa) e senti que a gente poderia ilustrar mais uma vez as páginas dos jornais quando eles transferem a responsabilidade pro lombo dos que tanto chibataram. E seguem o castigo. E racismo vira coisa de nós, pretos. E eles comemoram nossos farrapos na Casa Grande. E bebem, bebem e trepam conosco. As mulatas.
Vitória da intolerância sempre a dar gás ao que não presta. O patrulhamento de parte dos negros contra uma mulher nascida e criada nos quilombos favelados não é coisa só do Brasil.

Nos Estados Unidos da América do Norte, por exemplo, aconteceu que Raquel Dolezal, uma ativista incansável da causa negra, depois de alcançar o topo numa das maiores organizações do movimento, passou a sofrer perseguições e patrulhamentos de grupos mais radicais porque numa entrevista se identificou como transracional. Sua origem é caucasiana.

Não obstante o apoio que recebeu de celebridades afro-americanas, como Whoopi Goldberg, dentre tantas, continuou sofrendo perseguição. Há documentário na Netflix contando a história de Raquel Dolezal.

No caso brasileiro, Fabiana Cozza, a atriz, não só foi indicada ao papel no musical pelos familiares de D. Ivone Lara como era amiga da homenageada, frequentadora de sua casa, onde cantavam em alegres e inspirados duetos.

Até ontem, quarta feira, dia 06 de junho, passaram-se 50 anos de uma das maiores tragédias no cenário politico dos Estados Unidos com gravíssimas repercussões nas lutas contra o racismo e a intolerância no mundo civilizado. 


Após um breve de discurso no salão de um hotel em São Francisco, na Califórnia, agradecendo pela vitória eleitoral que lhe garantiria a indicação democrata à Presidência da República, Bobby Kennedy, àquela altura um dos lideres contra o racismo ao lado do Doutor King, não escondendo cansaço físico, foi aconselhado a voltar ao seu quarto encurtando distancia e poupando tempo pelo atalho da cozinha.

E passando por lá entre aplausos do pessoal da cozinha, Bobby foi baleado na cabeça por um rapaz de 22 anos de idade, Shihan Bishara Shihan, imigrante palestino, empregado da cozinha, o qual julgou que assim vingaria o seu povo contra o apoio dos Estados Unidos na guerra dos 6 Dias vencida por Israel.  tempo pelo atalho da cozinha.



Bobby Kennedy tinha 43 anos de idade quando foi abatido a tiros quando ao sua jornada pelos direitos civis, contra o racismo, a intolerância, enfim, pelos ideais de igualdade e liberdade, se auspiciava em mais uma etapa vitoriosa.




A propósito de Bobby Kennedy, o grande advogado e professor de direito constitucional-tributário Ives Gandra Martins registra:


"Conheci Kennedy em 1964, no hotel em que fazia campanha para o Senado. Eu era advogado no Brasil de Charles Guggenheim, que dirigia sua campanha publicitária. Hospedei-me no hotel que Bob alugara para a campanha, a convite de meu cliente. Foi uma grande perda.
Belo (o seu) artigo."

Nenhum comentário: