sábado, 6 de abril de 2013

Jackson Vive

As pessoas em todas as idades acorriam comovidas às janelas ou às calçadas, muitas aos prantos, vendo passar o carro enorme dos bombeiros e lá em cima a urna de madeira polida com alças bronzeadas, medindo a altura de um homem, envolta em duas bandeiras, uma do Maranhão, a outra do PDT.

Não era o corpo de um daqueles que uma vez feridos na batalha são recolhidos no campo da carnificina e nunca mais voltam ao combate.

Era o corpo de um homem que já tendo morrido, nos últimos anos, pelo menos umas três vezes, tinha a lhe seguir uma procissão de lamentos inadiáveis e improrrogáveis tristezas.

Disse alguém que a historia quando se repete geralmente é farsa e daí encarar-se com naturalidade o choro radical de uns poucos, até então muito proximos, quase beirando à convulsão.

Eles pareciam tão condoídos e ao mesmo tempo em desafogo como se as suas lágrimas rasgassem historias, umas antigas outras recentes, quitando dividas que não deveriam nunca mais ser lembradas.

Talvez não imaginassem que aquele homem tão pranteado até a última coroa de flores sobre o tumulo nem estava ali.

Quando o arrancaram do Palácio dos Leões, quase o arrastando como quem retira na marra um intruso, assassinaram não só condutor de um Governo que seguindo bem nos seus propósitos e ações era agora interrompido. Mataram também, fatiando, as esperanças da maioria absoluta dos eleitores que o elegeram.

Octavio Mangabeira costumava acalmar os que o procuravam indignados com as teratologias da politica propondo: – Pense num absurdo. Pensou? Pois se ainda não aconteceu, está para acontecer na Bahia... 

Chamar de absurda aquela decisão do Tribunal Superior Eleitoral cassando o mandato do primeiro Governador de oposição eleito pelo voto direto nos últimos 50 anos é pouco.

Releio hoje as notas taquigráficas daquela noite apresentada ao País ao vivo e a cores pela TV Justiça como sendo uma sessão de julgamento e minha indignação só não se transmuda em cefaleia porque eu vi em DVD aquele filme “Sessão Especial de Justiça”, de Costa Gravas.

Foi na ocupação da França pelos nazistas quando o Governo central de então, colaboracionista, para acalmar Hitler, resolveu prender e levar a julgamento um bravo homem escolhido previamente para ser condenado. Num salão de hotel montaram um Tribunal e a farsa rolou.

Aquele julgamento do Jackson pelo TSE, sob as acusações mais injuriosas conquanto absurdas, lembra muito a “Sessão Especial de Justiça”.
Depois o mataram pelo engavetamento no TSE do outro processo igualmente falseado.

Quando nem havia mais horário eleitoral do rádio e na TV foi que o Ministro liberou o processo para afirmar que o Jackson podia ser candidato a Governador porque ele não era um ficha suja. Como nunca o foi.

Mataram o Jackson novamente quando no vazio causado pelo engavetamento do processo saíram dizendo que seus votos seriam nulos porque ele seria declarado ficha suja mesmo.

E ultimamente não faltam os que tentam matar – lhe outra vez ao renegarem seu legado de lutas e de compromissos com os humildes que só alcançarão a cidadania plena se tiverem respeitados os seus direitos às liberdades democráticas.

O carro enorme dos bombeiros seguia à frente da enorme procissão. O céu tingiu-se de nuvens cinza e a tarde pareceu mais triste com a chuva leve e miúda que caiu. Naquele céu aberto seguia um corpo humano, apenas um corpo que pela duração de uma vida materializou um homem.

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