sábado, 8 de janeiro de 2011

Lulu Librandi

As pessoas chegam e muitas vezes só nos damos conta delas depois que passam. É aí que elas crescem, ou não, no respeito por sua história. É que a história costuma, preferencialmente, dar relevo à diferença.

Daí que vendo este edifício hoje como um navio largado à mercê do salitre e das fadigas do tempo, condenando-se à decadência de uns outros da sua fileira nesta rua, me lembro da Lulu, resignando-me por ter sido em meus silêncios tão injusto com ela.

Lulu em sua passagem por aqui ganhou uma eleição e quem apenas estranhou aquele seu jeito de gerentona, mas achando que ela não passaria disso, logo teria que se acostumar ou no mínimo aceitar seu estilo atirado, algumas vezes quase autoritário.

Temos esse mau costume de votar e no dia seguinte entregar ao eleito a responsabilidade por tudo. Não acompanhamos as ações de governo, não protestamos ativamente, não sugerimos em função do coletivo, não cobramos resultados e se as coisas começam a não dar certo não elevamos a nossa indignação a desdobramentos eficazes.

As vocações autoritárias se afirmam mostrando resultados como nas ditaduras em que as coisas ou acontecem do jeito como o ditador quer ou não acontecem e as pessoas contaminadas pelo medo se acuam sem voz de protestos.

Outro tipo de ditador, este mais sutil, se afirma manipulando simpatias, chamando a atenção permanente para a vitrine dos seus pequenos feitos, que dada a insistência em propagandeá-los ganham aquela dimensão do nunca antes na historia deste prédio...

Na omissão de sempre, só atentando para a inépcia dos governos quando os desastres e suas conseqüências nos alcançam bem diretamente, nos lembramos vez em quando que somos cidadãos e que a democracia só funciona mesmo quando em latente estado de espírito, contagiando e animando a todos intermitentemente.

Éramos cidadãos na pequena República presidida pela Lulu e não sabíamos. Poucas vezes a vimos pessoalmente. Mas sabíamos que ela estava sempre em ação, dando ordens, reclamando, implicando, muitas vezes dando esporro no seu Ministério de poucos e obedientes Ministros, os da portaria, os da conservação, os da limpeza.

A Lulu tinha instrução, conhecia teoria geral do Estado, normas de direito constitucional e de ciência política.

Nas circulares que editava, mandando deixar debaixo da porta de cada morador, escrevia, por exemplo, coisas assim:

- O direito de propriedade é nocivo quando, em relação à vizinhança, não considera a segurança, o sossego e a saúde. Estes são os três escudos de proteção no relacionamento entre os vizinhos.

- Se não nos organizarmos e nos unirmos para aquilo que é bom, estaremos todos com problemas ao fim de um tempo.

Depois de apelar ao bom senso de todos e de relacionar suas proveitosas realizações e outras coisas boas a serem ainda feitas, a nossa sindica - Presidente editou instruções sobre consumo de energia e de água e condenando os que atiram pela janela bitucas de maconha, preservativos usados e absorventes.

Agora quando vemos o nosso prédio assim com esse ar de coisa decadente, anacrônica, parecendo até com o Maranhão, é que sentimos a falta que a Lulu nos faz.

 

Nenhum comentário: