quinta-feira, 25 de março de 2010

Um Estranho Desce o Rio


O poeta Bernardo Almeida, a quem sucedi na Academia Maranhense de Letras, tinha um enredo para um romance sobre o qual muito me falava, mas nunca o escreveu.

Chamar-se-ia Um Estranho Desce o Rio.

Era a história de uma banda de música que percorria cidades às margens do Rio Parnaíba, ora do lado do Piauí, ora do lado do Maranhão, num calendário que começava no Natal, passava pelas festas do Ano Novo, passava pelo carnaval e se encompridava até a Semana Santa.

Para cada tipo de evento a orquestra tinha a partitura compatível.

Aconteceu que numa dessas descidas pelo rio a balsa que transportava a orquestra encalhou perto de Fordão, um povoado entre Regalo e Tapuio, no lado do Piauí.

Aqui entra o estranho da história que o Bernardo, a mesma história, muitas vezes me contou.

O estranho, um cara excêntrico e com alguma grana, convence o mestre balseiro e este convence o maestro a saltar com a orquestra.

Acabam num cabaré desses de beira de rio e a animação é tamanha que atrai gente de outros povoados, as alegrias se prolongam, mas lá muito mais abaixo na outra margem do rio, em Bom Princípio, no Maranhão, há um padre em desespero.

O carnaval acabara e as vésperas estavam na regressiva da semana santa. A orquestra já tinha o repertorio pronto para a procissão do Senhor Morto.

Mas a festa na zona de Fordão continuava a atrair a caboclada, até então acostumada só a som de foles, zabumba, triangulo, no máximo rabeca, que era o mais sofisticado.

Leite de onça corria solto, o consumo de leite condensado esgotara o estoque nas vendas e o padre lá, em Bom Princípio, no desespero.

Que mierda, esconjurava o padre, essa orquestra não chega!

O problema é que a orquestra já era tradicional, a grande atração, na procissão do Senhor Morto.

O que fez o padre? Não podendo parar o tempo, prorrogou por mais duas semanas a Semana Santa na esperança que nesse intermezzo a balsa chegasse trazendo a orquestra, afinal, para a boa fé de todos e alegria geral.

Estou lendo que, para economizar energia, Hugo Chavez, o gênio político produzido pela corrupção ate então reinante na política e pelo anacronismo ate então dominante na administração pública da Venezuela, gênio este, venezuelano, que ainda não saiu da garrafa, decretou a prorrogação da semana santa por mais três semanas.

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