sexta-feira, 12 de março de 2010

Razões de Cardoso

Um dos Deputados de grande categoria, moral e intelectual, do PT de São Paulo, José Eduardo Cardoso acaba de anunciar que se retira da disputa eleitoral. Diz que não lhe é mais possível concorrer num campo em que o debate das idéias cede lugar à fisiologia da caça aos votos. Cardoso é um intelectual, Professor de Direito na USP, pessoa de grande respeito no Congresso Nacional.

No ano passado ele veio a São Luis apoiar a chapa de Augusto Lobato à direção do PT estadual sendo recebido em almoço na nossa casa. Conversamos bastante sobre o futuro do Maranhão nessa atual circunstância do Brasil. José Eduardo Cardoso é um excelente interlocutor. Vamos continuar conversando.

Renuncia à candidatura à reeleição, mas continua Secretário Geral do PT nacional. Em longa mensagem dirigida aos seus companheiros de partido ele dá as razões da sua desistência.

Trechos da mensagem:

* Hoje um político sério no Brasil pode vir a ser punido ou mesmo correr o risco de perder o seu mandato, por um mero descuido ou erro formal. Será então exposto à impiedosa execração pública que o tratará como um criminoso de alta periculosidade, com seu nome e fotografia estampado pelos órgãos de comunicação, sem que se busque saber, exatamente qual "delito", de fato, ele cometeu. Seus familiares, mesmo conscientes da lisura ética do punido, amargarão a vergonha e a zombaria pública, recebendo também uma sanção social implacável.

* Já os corruptos cuidadosos que podem pagar bons e caros técnicos que os assessoram, costumam não cometer erros desta natureza, ao engendrarem suas grandes "falcatruas". Bem assessorados, quase sempre saem "limpos" das disputas eleitorais e aptos a continuar a assaltar os cofres públicos com a mesma desenvoltura de sempre. Quando, porém, eventualmente, são pegos pelas malhas da lei, já possuem os cofres nutridos para pagar bons advogados e fortuna suficiente para fugir da execração social em lugares acolhedores do mundo.

* Não bastasse isso, a generalização e a banalização da idéia de que todo político é "desonesto", não pode deixar de abater ou desestimular os que buscam comportar-se com a dignidade e a ética que o respeito ao voto popular exige. Não há nada pior para alguém que vive com dignidade no mundo da política, do que, diante de uma acusação qualquer, ver que a sua palavra ou a ausência de provas incriminadoras, não afasta nunca a "certeza" da sua "culpa".

* Se na vida comum se costuma dizer injustamente que "onde há fumaça há fogo" (injustamente, porque a fumaça pode ter outras "causas químicas"), na vida de um político, o senso comum costuma sentenciar que se há "a leve aparência da fumaça, a existência do fogo é certa". E não admite, jamais, prova em contrário.
Por isso, me empenhei muito na defesa da reforma política. Defendi o financiamento público das campanhas, por entender que as formas atuais de financiamento privado das eleições geram corrupção e uma real ausência de isonomia entre os candidatos.

* Defendi o voto em lista partidária porque entendo que, em uma eleição, um partido deve disputar seu programa de forma unitária, sem que pessoas que estão do mesmo lado busquem os votos um dos outros, personalizando a competição e reduzindo a chance de uma politizada e madura disputa eleitoral. Tinha e tenho consciência de que somente uma reforma política aguda e radical poderia romper com a cultura dominante de execração preconceituosa de todos os que optam pela vida política, forçando a diferenciação do joio do trigo pela sociedade. Mas junto com outros companheiros de luta, fui derrotado.

Admiro e aplaudo, portanto, todos aqueles companheiros que, tendo a mesma visão ética que possuo da ação política, ainda conseguem transformar o desestímulo em energia para uma disputa proporcional dentro deste sistema eleitoral e desta conjuntura adversa, como, aliás, fiz tantas vezes. Só que todos devem saber respeitar os seus limites e avaliar, diante do que sentem e vivem, quando poderão ser mais úteis em outras frentes de luta, na defesa da mesma causa.

* É o que hoje, após tantos anos de atividade parlamentar, percebo em mim mesmo diante da perspectiva de participar de um novo pleito eleitoral para a disputa de uma vaga na Câmara dos Deputados. Aprendi na minha vida a não entrar em disputas quando não se tem ânimo para enfrentá-las ou não se sente prazer e alegria em fazer um bom embate, mesmo quando a vitória é possível.

* O sistema político brasileiro traz no seu bojo o vírus da procriação da corrupção e das práticas não republicanas, mas também inocula , ao mesmo tempo, outro vírus que atinge o ânimo dos que gostam do Parlamento, mas não gostam das condições, das regras, das calúnias e das incompreensões que forjam o caminho do acesso e o exercício de um mandato proporcional. Embora tenha lutado muito contra o primeiro, fui, lamentavelmente, atingido pelo segundo.

* Por isso, deixarei, ao final deste ano, a Câmara dos Deputados, mas não abandonarei a militância política. Estarei sempre à disposição do meu Partido e do projeto político-ideológico que defendo para o país, para assumir qualquer tarefa que me traga ao espírito o ânimo e a alegria do bom embate, na construção de uma sociedade justa e fraterna. Peço de todos os que sempre me apoiaram, mesmo que eventualmente agora os decepcione, a compreensão deste gesto fundado em razões estritamente pessoais e de foro íntimo.

*  Minha decisão não é uma renúncia à causa, mas apenas uma mudança do campo de atuação política. Quero deixar a paralisia que o desestímulo em disputar uma candidatura proporcional me traria, transformando-a em energia positiva para novos embates políticos. Quero me voltar integralmente à construção da nossa candidatura presidencial, à eleição dos nossos governadores e governadoras, e à eleição de uma bancada parlamentar forte que possa comandar a realização de uma verdadeira reforma política democrática.

5 comentários:

Anônimo disse...

É óbvio que o atual sistema político favorece aos corruptos, que o atual sistema de financiamento favorece a cobrança do "investimento" feito, que o atual sistema não favorece a eleição dos mais capazes, o atual sistema nem mesmo favorece que os partidos possam escolher as melhores lideranças para representá-los, mas é um completo absurdo que em nosso País os bons políticos, aqueles que mantém os pudores, tenham de se afastas dos cargos eletivos para poder ter o Poder de lutar por uma política mais justa, uma política que contemple o bem comum, que contemple uma sociedade mais justa e fraterna, desse jeito o senso comum ganha força, saindo os bons políticos sobram os maus, assim separa-se o trigo e mantém-se o joio.


Nina Pimenta

Carlos Tenorio disse...

A atitude deste deputado esta correta, muitos do maranhão deveriam fazer o mesmo, mas pelas suas fichas sujas

João Augusto disse...

É uma atitude nobre, com tantos esquemas, mensalões, alianças espúrias,crise dos partidos "éticos" etc. não é de se estranhar que um homem que preze seu nome afaste-se desse mar de lama fétido que se tornou nossa política.

É lamentável que mais um tenha recuado sob o arsenal dos corruptos.

Anônimo disse...

A esse conjunto de coisas, todos resolvemos chamar de "democracia". Mamãe gostava de comer galinha caipira pegando os pedaços com a mão; meu tio que morou alguns anos na Sicília, só conseguia comer peixes com o talher adequado; eu aprendi a comer "capitão" amassando o feijão, a farinha e o toucinho com a mão. Em resumo: todos "comiam". Existe alguma diferença?

Eduardo Tajra disse...

SDS Ministro Edson Vidigal,
Eu realmente gostaria que os corruptos é que se sentissem incomodados e fossem embora da política.

O pior é que muitos psicopatas escolhem a política como "profissão" e vivem de praticar crimes protegidos pela imunidade que na verdade é utilizada para garantir a impunidade em diversos crimes. Sabe do mais? Quantos psicopatas nós temos na política? Os psicopatas são carismáticos, de personalidade magnética, frios e calculistas, incapazes de sentir remorso, vergonha, culpa ou qualquer outra coisa que os aproximem de serem seres humanos. Dá no que pensar, não é? Nos EUA o caso Watergate forçou a 1° renúncia de Presidente daquele país, após o mesmo ser perdoado pelo Presidente Ford e ter saído impune após a renúncia, quando todos pensavam que ele ia se safar desta impunemente eis que o mundo assiste perplexo o ex-presidente Nixon desculpar-se pelos erros e crimes cometidos, mas aqui... aqui nem assim, nem antes, nem durante e nem depois, aqui temos a certeza da impunidade os mensalogates, sanguessugates,os nepotismogates, os alopradogates, os Faktorgates, os censurogates, os tapetãogates, os Dantogates, as Passagenogates, os cartoes corporativogates, os Senadogates, etc, etc, etc. todos ficam livres assim, sem desculpas, sem renúncias, sem punições e o nosso País tem a pretensão de se transformar em uma potência reconhecida. Nós já somos uma potência, infelizmente, a potência do jeitinho, dos corruptos de boa vida. Clamamos por justiça, ainda que tardia, qualquer Justiça desde que justa, que venha a saciar nossa ânsia ou que pelo menos venha a cessar nossas ânsias.