quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Hi, Ted!

No Palácio do Planalto, quando o elevador pára no terceiro andar e se você acha que é inadiável ir ao banheiro, é só tomar o rumo da esquerda, dobrar o corredor ainda à esquerda, e está lá.

Num quase meio dia, que as câmeras de segurança decerto registraram, eu me sentindo assim sem poder adiar, me entreguei lentamente ao satisfatório exercício de tirar água do joelho.

Estou ali na minha micro-baia concentrado e quando levanto o olhar pendendo-o para a direita ao lado, eis quem vejo ali, igualzinho, no mesmo exercício, concentrado, tirando sua aguinha do joelho – Ted Kennedy.

Abaixei a vista discretamente fingindo desinteresse na constatação. A Constituição do Brasil garante o direito à privacidade e à intimidade. Nós dois estávamos ali sob a tutela e a proteção desses direitos.

Ted Kennedy ali ao meu lado, nós dois ali em sonoras mijadas no Palácio do Planalto, era miragem, não podia ser ele.

Dei outra olhadela discretamente, ele virou-se para mim, o queixo largo, os olhos azuis, a cabeleira branca, e soltou o cumprimento – hi!

Eu vendo que ali não era mesmo o lugar de se puxar conversa, só correspondi – hi, mister Kennedy, senator Kennedy, hi!

Aquela altura, já conclusos, acomodado os ditos cujos, cada um a seu modo, em seus respectivos confortos, saímos juntos, quase emparelhados.

Ele ia ser recebido, no gabinete ao lado, pelo Presidente da República. E eu só havia saltado ali porque estava aperreado.

Anos depois, eu estava com Eurídice na Avenida Pensilvânia, em Washington DC, na segunda posse de Bill Clinton. Nós dois ali sentados numa arquibancada, num frio daqueles de roer os ossos, esperando começar o desfile dos Estados quando percebemos bem em frente, próximo a nós, quem?

Ted Kennedy, cachecol envolto no pescoço, num elegante casaco, com uma mulher linda, Victoria, uma advogada famosa, com quem há poucos anos antes havia se casado.

O que me chamou mais a atenção foi o republicanismo da cena.

Uma celebridade como Edward Moore Kennedy, o Senador Ted Kennedy, ali no meio de todo mundo, um homem comum, pessoa normal, numa arquibancada a céu aberto, esperando o desfile dos Estados para aplaudir, como o vimos aplaudindo, a delegação de Massachusetts, aliás, uma das ultimas a se apresentar.

O trabalho de Ted Kennedy como Senador pelas causas mais nobres no mundo esfacelou as anotações negativas que a sua vida privada de quando mais jovem, agarrado a mulheres e a generosas doses de uísques, deixou transpirar para os sensacionalismos que alimentaram o horror de muitos pelos Kennedys em geral.

Os Kennedys formaram uma família de políticos, cada um a seu tempo. Mas nenhum deles, nem o Presidente John, nem o Procurador Geral Robert e nem o Senador Teddy se envolveram ou se deixaram envolver em maracutaias em suas vidas publicas.

O Senador Teddy morreu ontem aos 77 anos de idade, abatido por um tumor maligno no cérebro.

Um comentário:

Anônimo disse...

Olá Ministro, long time!
Quando o senhor diz: "sem maracutaias", entendo eu que está querendo dizer: sem nomear parentes, aderentes, sem jogos de interesses! Estou certo?
Acredito, também que, mesmo diante das doses de uísque ele não "esquecia" nada!
Ora Ministro, o senhor vai, nas entrelinhas, querer comparar um jacaré com um côco d´água?
Abraços.