segunda-feira, 15 de junho de 2009

Sai, Sarney!

O que você vai ler a seguir é o comentário de Ricardo Noblat, do jornal O Globo, em seu blog hoje:

"Sai, Sarney!

Vez por outra lemos a respeito de político japonês que se matou depois de ter sido acusado de corrupção.

O mais recente foi Toshikatsu Matsuoka, ministro da Agricultura, em maio de 2007. Ele aceitou suborno de um empresário e pediu reembolso de despesas que sempre foram cobertas por seu gabinete.

A ser processado e talvez preso, preferiu se enforcar.

O próximo domingo será um dia tristemente histórico para a Inglaterra. Pela segunda vez, um presidente da Câmara dos Comuns, o equivalente à nossa Câmara dos Deputados, renunciará ao cargo, acusado de má conduta. O primeiro a renunciar foi Sir John Trevor em 1695. Seu crime? Ter embolsado grana de um comerciante em troca do apoio à aprovação de uma lei.

Michael Martin, 63 anos, presidente da Câmara dos Comuns há quase dez, não se vendeu a ninguém nem tirou vantagens ilícitas do cargo. Mas foi conivente com os colegas que tiraram.

Deputados com direito a verba para bancar moradia em Londres conseguiram reembolso por gastos para consertar quadras de tênis, limpar fossas, comprar cadeiras de massagem e aparelhos de televisão de tela plana. Os mais ousados cobraram até pelo aluguel de filmes pornográficos.

O cordato Martin avalizou os desmandos. Uma vez que eles foram descobertos pela imprensa, tentou encobri-los. Como a tarefa se revelou impossível, pediu ajuda à polícia para identificar as fontes de informações dos jornalistas. A polícia nem se mexeu.

Por fim, Martin se rendeu. Seguirá o exemplo dado por Trevor há 314 anos.

Aqui já assistimos a renúncia de presidentes da Câmara e do Senado enrolados em denúncias de quebra de decoro. Foi o caso de Severino Cavalcanti, presidente da Câmara. E de Jader Barbalho, Antonio Carlos Magalhães e Renan Calheiros, presidentes do Senado.

Diferentemente de Trevor no passado, e agora de Martin, eles não abandonaram os cargos premidos pelo sentimento de vergonha. Renunciaram para não ser cassados. Foi um ato sem vergonha. Assim puderam preservar os direitos políticos e voltar ao Congresso reeleitos.

José Sarney está no olho do furacão que varre o Senado desde que ele foi eleito em fevereiro último para presidi-lo pela terceira vez. A primeira foi em 1995.

O que existe de podre no Senado não é obra exclusiva dele. Um presidente do Senado não pode tudo, muito menos sozinho.

Mas é um escárnio Sarney continuar fingindo que nada tem a ver com a crise mais grave da história do Senado. Não apenas tem a ver: Sarney é o principal responsável por ela. A semente da crise foi plantada no primeiro mandato dele como presidente do Senado.

"Eu só tenho a agradecer ao Dr. Agaciel Maia pelos relevantes serviços que ele prestou", disse Sarney ao se despedir do ex-diretor-geral do Senado, defenestrado da função devido à crise.

Agaciel foi nomeado por Sarney. Ao longo de 14 anos, acumulou poderes e cometeu toda a sorte de abusos com a concordância explícita ou velada de Sarney e dos que o sucederam no comando do Senado.

Na semana passada, ao som da música do filme "O Poderoso Chefão", Agaciel casou a filha Mayanna sob as bênçãos de Sarney, Renan Calheiros e de dois outros ex-presidentes do Senado – Garibaldi Alves e Edison Lobão.

Para lá do inchaço do quadro de funcionários do Senado, do pagamento de horas extras não trabalhadas, da criação de diretorias fantasmas, da homologação de licitações suspeitas e da assinatura de decretos secretos, há fatos que dizem respeito diretamente a Sarney e que o deixam mal na foto.

Dono de imóvel em Brasília e inquilino da mansão destinada ao presidente do Senado, Sarney recebeu durante mais de um ano auxílio-moradia de R$ 3.800,00 mensais reservada a senadores sem teto.

Flagrado, primeiro negou que recebesse. Depois se apropriou do mote de Lula e disse que não sabia.

Um neto de 22 anos de Sarney assessorou durante mais de um ano o senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA). Foi a maneira que Cafeteira encontrou, segundo admitiu, de agradecer ao pai do rapaz por tê-lo reaproximado de Sarney.

Há uma sobrinha de Sarney lotada no ex-gabinete da filha dele no Senado, Roseana Sarney, atual governadora do Maranhão. E há outra empregada no gabinete do senador Delcídio Amaral (PT-MTS) em Campo Grande. Essa ganha sem trabalhar.

É possível acreditar que o pai da crise esteja de fato empenhado em resolvê-la? Ou que reúna condições para tal? E quem disse que seus pares estão interessados em refundar o Senado?

A essa altura, uma só coisa depende de fato de Sarney: a renúncia à presidência do Senado para atenuar as nódoas recentes de sua biografia."

2 comentários:

João Augusto disse...

Ministro, na Saúde Mental faz-se uso do Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais e está na sua versão IV, como insrtrumento técnico, ele é amplamente conhecido por DSM-IV(de 1994), verificando se existe um transtorno como o descrito pelos Senadores notei que o DSM IV não faz referência a isto, mas já que estão realizando discussões para a preparação da revisão nº V, irei sugerir um ítem para estudo, trata-se da Amnésia Seletiva para Escândalos Políticos, ainda solicitarei a suspeita de que tal transtorno possa ser contagioso e afetar o discernimento moral, provavelmente algo relacionado aos neurotransmissores na região pré-frontal do cérebro. Atualmente poderia ser enquadrado no seguinte ítem. Que tal?!
F44.0 - 300.12 Amnésia Dissociativa (anteriormente Amnésia Psicogênica). Enquadrando-se no critério C (Os sintomas devem causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo)

Anônimo disse...

Boa noite Ministro Vidigal, meus respeitos.
Alguns estudantes que se envolveram e se posicionaram contra o que se convencionou chamar de "Golpe Militar de 64" ainda estão vivos. Outros não. Por um motivo ou por outro, já não estão mais neste nosso plano terrestre. Viraram pó.
Eu vivi e convivi com alguns. Tanto com os que já não estão mais aqui, quanto com alguns que ainda respiram o mesmo ar que respiramos.
O militar (Exército, Marinha ou Aeronáutica) virou inimigo visceral, mesmo que fosse membro da própria família. Ninguém envolvido (entenda-se, "contra" o Golpe) suportaria viver mais tempo sob o relho dos militares.
Anos depois, aí por volta de 1995, voltei a conversar com alguns e o sentimento de repulsa havia amenizado, era mais leve.
O simples fato de "voltar a pensar numa outra Ditadura" já provocava náuseas. Mas isso já não é tão forte.
Isso tudo foi, aos poucos, sendo substituído por um "nojo" ao político. Essa coisa é tão grave que, aqueles que imaginamos que não se envolvem com patifarias - Pedro Simon, por exemplo - são tidos e havidos como "pessoas diferentes, esquisitas, "bestas" que não se aproveitam do que os outros, comprovadamente, navegam. O mar de lama é fétido!
Fico imaginando se algum daqueles estudantes do passado não topariam trocar um novo regime de exceção por essa porcalhada que está aí. Certamente, quem conviveu com tudo aquilo diria: "nada nestga terra se compara àquele regime." É. Pode até ser. Mas a política que está hoje valendo no Brasil não está muito distante "daquilo". Abraços.