quinta-feira, 12 de junho de 2008

Sobre Hienas e Otários

Sabido entre nós que ninguém se assume, pelo menos perante os outros, como tendo sido alguma vez na vida um otário, é sabido também que por essa premissa o malandro quando entra em ação não começa em desvantagem.

É que ele sabe perfeitamente que se nada der certo não perdeu nada, e se der tudo certo será tudo certo mesmo, sem risco algum, a vitima do golpe nunca irá contar nada a ninguém.

E não irá contar porque, como bem lembra Fernando Pessoa, no seu famoso Poema Em Linha Reta, ninguém conta a ninguém as suas fraquezas, os seus tropeços, todos só preferem contar os seus sucessos, as suas vantagens.

(“Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos tem sido campeões em tudo. Toda gente que eu conheço e que fala comigo nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho, nunca foi senão príncipe, todos eles príncipes na vida.”)

E assim tem sido, quase sempre. A pessoa que cai na lábia do malandro e consente, de alguma maneira, que ele realize o seu proveito, logo se apercebe ridicula, depois cúmplice. Tardiamente avalia o resultado, possivelmente uma contravenção, talvez um crime.

Por isso mesmo, depois de lograda, a pessoa prefere o silencio, o que só estimula o malandro a prosseguir sobranceiro, senhor do tempo e da razão, e mais, pregador das moralidades públicas, do fura bolo ao cata piolho, todos os dedos em riste apontando nos outros os mal feitos em que ele próprio se especializou.

As vitimas de seus golpes contabilizam os prejuízos materiais e pagam com o silêncio cúmplice para que nao se tornem públicos seus prejuizos morais.

Escaldadas, só cuidam de mudar de calçada quando os avistam de longe em sua direção. Sofrem em silencio e se falam, quando falam, é a favor. Jamais dirão em publico ou em estado de sã consciência que em algum momento serviram como otários.

Um achaque ali, uma chantagem acolá, e a pessoa limpa nas ações das mãos e nas intenções da alma se deixando levar, otário inteiro refém do medo e da lábia do malandro.

Por aqui mesmo, neste nosso planeta animal, sabemos de historias incríveis, daquelas de se ficar horas imaginando, incredulamente, como pessoas tão experientes na vida, tão preparadas de estudos, tão merecedoras de suas aspirações, as mais legitimas, escorregaram nas cascas de banana de malandros locais.

Tem gente da Paraiba que depois de uns dois uisques conta tudo como foi e se indigna bravamente ate contra si mesmo por nunca antes na historia deste País alguem ter sido tão otário. Caiu com a metade e o malandro anda solto por aí, rico e serelepe.

Malandros sorridentes, a boca aberta mais parece um teclado de piano. Malandro tipo alegrete, nada a ver com vinagrete, o molho para o churrasco. Alegrete é o malandro alegre, cujo mantra é o não interessa a que preço, mas hei de vencer, hei de vencer, nao interessa a que preço.

Agora, quem não está achando graça de nada, mesmo porque já se escasseiam as razoes para rir, é o nosso Povo, novamente chamado para, em sufrágio universal e secreto, opinar, opinar, o que quer dizer votar, votar.

Ontem chegou-me às mãos, em texto integral, uma pesquisa qualitativa através da qual, segundo os entendidos, o Povo em geral, diante das poucas coisas que está conseguindo enxergar, anda muito entediado.

Tomando-se como verdade a tradução literal da pesquisa, o campo agora está mais aberto para malandragens, e não é só para grandes malandros, os iniciantes estarão entre os que certamente mais se darão bem.

Para a sorte do nosso Povo, especialmente o das capitais,ainda bem, quanto a esses malandros velhos ou moços, não os conhecemos por estas paragens, quero dizer não os temos mesmo, de jeito nenhum, nas vitrines da Rua Grande, da Brigadeiro, ou da 25 de Março.

Não haveria otário se não houvesse malandro nem a malandragem que não é só do malandro, é também do otário.

Ah você está rindo de que? Ninguém por aqui é hiena, rapaz.

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